Na
guarda do Santo Sepulcro
Durante
a primeira década do século XX, a guarda ao santo sepulcro,
destinada à Irmandade de São Benedito, era feita na antiga
matriz da cidade. A Irmandade do Santíssimo fazia a Guarda ao
Santíssimo, na nova Igreja.
Não
passara uma década, ainda, desde o dia em que, formalmente, os
africanos e seus descendentes haviam sido declarados homens
livres. Corriam os últimos anos da década subsequente ao 1888.
Na Botucatu
daquela época, porém, os costumes continuavam os mesmos. As
comemorações da Semana Santa, quase sempre nos princípios do
mês de abril, continuavam a mostrar sobrevivências que a
sociedade local, não conseguia superar. Visíveis em costumes,
diferenciações eram detalhadas nas atividades sociais,
praticadas separadamente pôr brancos e negros.
Toda vez que
chegava o mês de abril, as duas maiores Irmandades religiosas
locais, que regiam a participação dos segmentos nas
comemorações da semana, esforçavam-se pôr convocar seus
membros à participação. Publicavam editais nos jornais e
definiam nomes para a participação de cada um de seus membros.
As congregações
religiosas de que falamos eram ambas ligadas à Igreja Católica
local, presente no município desde seus primórdios. Uma delas
era a Irmandade de São Benedito, composta essencialmente pôr
africanos ou seus descendentes. A outra era a Irmandade do
Santíssimo Sacramento, reservada às pessoas de maior
influência na comunidade.
A Irmandade de
São Benedito, na Semana Santa, cuidava de uma vigília chamada
Guarda ao Santo Sepulcro. Esse ato era organizado em turnos, nos
quais apenas os homens estavam presentes. Tomava a Quinta e a
Sexta-feira Santas. Era a ele que se dedicavam os homens da
comunidade negra local. Sua convocação dava-se nas vésperas e
os turnos apareciam publicados no único jornal, O Botucatuense,
em forma de uma escala de presença. O interessante da escala é
que ela acompanhava o costume dos tempos da escravidão, quando
os negros eram chamados apenas pelo nome. No ano de 1898 a
escala apontava participações para Matheuzinho, Felippe,
Crispim, José, Procópio, Vergílio, Feliciano, Gabriel, Nabor,
Leopoldino, Zacharias, Brás, Benedito, Pedro e Mathias.
Todos esses nomes
estavam escalados para a vigília da Quinta-feira Santa, mas
repetiam-se na Sexta agregados aos de Adão, Cassemiro, João
Agostinho, Izidoro e Laurindo, numa lista que termina com
Antonio Ramalhete, Delphino e Joaquim Bento. A todos eles
dirigia João Maranhão, o presidente da Irmandade.
Ao contrário, a
Irmandade do Santíssimo agregava os mais proeminentes homens da
época. Eram comerciantes, políticos, funcionários públicos,
fazendeiros, também exclusivamente homens, que pudessem ser
definidos por nome e sobrenome. Compunham a Guarda de Honra ao
Santíssimo, também uma vigília, que, também, atravessava a
quinta e sexta-feira Santas. No mesmo ano estavam sendo
chamados, em duplas para turnos de uma hora, o Cel. Amando de
Barros e José Elias de Barros, Antonio Theodoro Aguiar e José
Pires A de Moura, João Ferreira Godinho e José Victoriano
Vilas Boas, Fernando Guimarães e Elias Ferrari, Jordão Pompeo
e Francisco Vieira da Silva, Carlos Pereira e Joaquim F.
Barreira, Dr. Ernesto Babo e Francisco B. Cunha e Mello, José
Cipryano de Oliveira e Francisco Xiffoni, Joaquim Pinhão e
João Santine, Benedicto Pedroso e Estevão Ferrary, Armindo
Cardoso e Joaquim Leandro de Oliveira, José Gonçalves Simões
e Manoel da Conceição.
A essa lista de
vigília da Quinta-feira Santa, acrescentavam-se nomes que,
também, viraram nome de rua na cidade: Floriano Simões e
Custódio Cardoso, Joaquim Jordão e Manoel Theodoro de Aguiar,
Estevão de Barros e Amador Paraizo, José Pitta e José
Francisco P. Eduardo, Eloy Aguiar e Francisco Pantaleão,
Avelino Carneiro e Alfredo Pereira, Alberto Pereira e José
Rodrigues Franco, Antonio Furquim e José de Oliveira Camargo,
João Rodrigo Caldeira e Antonio Cardoso do Amaral, José
Fagundes e Paschoal Mathias.
Em 1899 parece ter
havido uma mudança. Naquele ano a lista de nomes para a Guarda
ao Santo Sepulcro - atribuição exclusiva dos homens negros,
não aparece nas páginas do Botucatuense. Ou deixou de ser
feita ou deixou de ser prestigiada. Junto à escala dos homens
da Irmandade do Santíssimo vem uma lista de senhoras da
sociedade local, organizadas numa irmandade chamada Zeladoras do
Sagrado Coração de Jesus, que deveriam – segundo uma escala
– fazer a guarda ao Santíssimo. Na Quinta feira eram elas:
"DD Angélica Pinheiro e Genoveva Ednardo, DD Antonia de
Amaral e Evangelina Reimão, DD Maria Flora de Barros e
Francisca A do Amaral, DD Francisca Fleury e Andrezina de
Barros, DD Helena Creton e Olivia Torres, DD Maria A Cardoso e
Ambrozina Pereira, DD Maria Pedrozo e Brigida Vieira, DD Maria
Izabel Braga e Antonia da Cunha e, finalmente DD Eliza Camargo
Cesar e Freancisca T. Almeida. Na Sexta-feira vinham outras:
"DD Rosa Monteiro e Augusta Fleury, DD Malvina Ferra e
Marcelina Brito, DD Maria Cândida Ferreira e Anna Guimarães,
DD Maria R. Torres e Maria Cezar Marques, DD Justina das Dores e
Isolin Loncione e, finalmente DD Elvira de Barros e Donacia de
Alencar." Todas dirigidas por D. Francisca de Barros Fleury
, a presidente do apostolado.
Aparentemente, com
seu surgimento, as Zeladoras do Sagrado Coração de Jesus,
substituíram a Irmandade de São Benedito, durante as vigílias
da semana santa, realizadas na "Matriz Nova" (hoje
demolida). A Guarda ao Santo Sepulcro, nos moldes anteriores,
decaiu e a participação negra, a partir dali foi ficando, aos
poucos, restrita às atividades desenvolvidas na Igreja de Nossa
Senhora do Rosário dos Homens Pretos (depois São Benedito), no
antigo Largo do Rosário – depois Praça Carlos Gomes.
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