"A entrevista aconteceu durante a XVII International
Lesbian and Gay Association Conference, no dia 22-6-1995.. No Rio Palace
Hotel, conversei com o professor Luiz Mott. Marcamos a gravação
para o próximo dia. Procuramos um salão mais reservado,
porém o frio artificial incomodava. Então, fomos nos acomodar
no espaço de circulação. Era a primeira vez que
aventurava fazer uma gravação num ambiente assim. Com
voz firme, Luiz Mott, para iniciar a narrativa, literalmente fechou
os olhos ao local. Num momento de alarido maior, preocupou-se com a
interferência sonora e sugeriu que trocássemos de lugar.
Fomos para o Salão Rio de Janeiro, onde acontecia a exposição
sobre Visibilidade Lésbica, continuamos até sermos interrompidos
por uma das organizadoras. Porém, como estávamos no final,
concluímos a gravação ali mesmo. Tranqüilo,
Luiz Mott brincou com uma criança instantes depois. Não
parecia a Persona Pública que logo à noite receberia o
Prêmio Felipa de Souza, concedido pela Comissão Internacional
de Direitos Humanos de Gays e Lésbicas." [Cláudio
Roberto da Silva]
"Meu nome é Luiz Roberto de Barros Mott. Nasci em 6 de maio
de 1946. Meu pai, Leone Mott, era italiano. Minha mãe, Odete
de Barros Mott, era brasileira... ela veio do interior de São
Paulo. Sou de uma família de oito irmãos... sou o sexto
mais novo. Vivi a primeira infância no bairro do Jardim São
Paulo, onde meu avô era dono de um cartório . Este bairro
é próximo à Santana. Estudei no Bom Retiro, no
colégio Liceu Coração de Jesus... fiz o primário
lá. Depois mudamos para um bairro melhor, o Sumaré, onde
terminei o quarto ano primário no Centro Nossa Senhora de Fátima.
Fui chamado de Nenê durante a infância. Nasci entre duas
irmãs, minha mãe teve um filho após o outro depois
do meu nascimento. Praticamente a cada ano e meio era um filho novo.
Entre eu e minhas duas irmãs, a mais velha e a menor, houve a
morte de duas irmãs gêmeas. Deste modo, permaneci mais
tempo que os demais na condição de filho Benjamim... como
filho caçula. Imagino que isso tenha contribuído para
que tivesse esse apelido: Nenê.
O segundo apelido que tive foi Chico Viramundo. Meus irmãos me
chamavam assim. Não sei se era um personagem que já existia
na época, mas com isso queriam representar um traço marcante
da minha personalidade, ou seja, andar muito... sou uma pessoa muito
curiosa. Já viajei bastante pelo mundo. Virar o mundo, significava
também virar a mesa. Acredito ter sido sempre uma pessoa contestadora.
Sobretudo, nos últimos vinte anos da minha vida. Tenho polemizado
sobre uma série de questões.
Vivi a infância numa família de classe média, católica...
toda família se reunia para a missa dominical. Convivi com meus
avós, a nona italiana era muito católica. A avó
brasileira, do lado materno, vivia um sincretismo religioso e social
acentuados. Essa avó materna... Antonieta, marcou muito minha
infância. Ela era amiga de animais, de criações,
dos netos. Apesar de ser uma família de oito filhos, desde menino
fui muito mimado por parentes, pelas avós, pelas tias. Acredito
que pelo fato de ser o caçula por mais tempo. Tanto que fui o
único a receber esse apelido afetuoso de Nenê.
Parece-me que a homossexualidade, talvez, tenha uma porção
genética. Essa minha porção genética homossexual...
associada às circunstâncias da minha criação,
fizeram-me um menino mais delicado que meus irmãos e primos.
Desde menino fui muito carinhoso, delicado... sensível. Isso
levou meus irmãos, sobretudo os gêmeos... mais velhos que
eu, a me discriminarem. Eles me chamavam de mulherzinha, mariquinha.
O que era um fator de grande sofrimento para [mim]. Minha mãe,
percebendo essa tendência de efeminado, procurou me estimular
a desenvolver as aptidões mais masculinas. Praticamente forçava-me
a aprender a jogar futebol, a ter brincadeiras mais masculinas, ao escotismo.
Quando mudei para o Sumaré tinha nove anos. Lá, morando
perto de uma igreja, alimentei a idéia de me tornar seminarista.
Fui ser coroinha nessa igreja, completamente inocente em termos de sexualidade.
Em parte a ida para o seminário foi estimulada pelos meus pais.
Ela também teve como significado a fuga de uma opressão...
de uma discriminação que sofria por parte dos meus irmãos...
sobretudo desses gêmeos. Eles simbolizavam o machismo do lado
paterno da família.
Minha primeira comunhão foi no dia 08 de dezembro de 1953...
no primeiro ano primário. É uma data marcante na minha
vida, até hoje eu me lembro... a cada ano faço o cálculo
de quantos anos faz que fiz a primeira comunhão. De 1953 à
1956 fiz o primário em São Paulo. Em 1957, com a idade
de dez para onze anos fui para Juiz de Fora.... estava terminando o
quarto ano primário. Se não me engano fiquei nesta cidade
até 1962... lá fiz todo o ginásio e dois anos do
clássico. Fui estudar na Escola Apostólica de São
Domingos... dos dominicanos, para me tornar seminarista... visto que
tinha o desejo de me tornar padre.
O seminário era um ambiente praticamente moderno, quando comparado
aos internatos e outros seminários da época. Os dominicanos
eram revolucionários no Brasil pré-ditadura militar. Havia
férias todos os finais de ano, coisa que a maioria dos seminários
e internatos não praticava. No seminário continuei muito
piedoso, delicado... foi bom porque desenvolvi certas potencialidades.
Na verdade, atribuo esse desenvolvimento ao seminário com muita
gratidão. Havia um coral em que participava, assim aprendi a
gostar de música clássica. Havia um clube agrícola,
no qual aprendi a cuidar das plantas... uma vez por semana nós
plantávamos, então tinha horta, tinha pomar. O seminário
foi uma experiência importante em termos de disciplina e de austeridade.
Foi uma mudança muito grande no que refere ao conforto. Não
havia chuveiro de água quente, de manhã cedo era só
café e pão seco... não tinha manteiga. A comida
não era excepcional como a que estava acostumado numa família
pequeno-burguesa de São Paulo. Foi dolorosa a separação
da minha família. Escrevia semanalmente, algumas vezes telefonava.
No sentido de formação, considero que o seminário
foi importante... tanto da minha personalidade, quanto da minha cultura.
Tive bons professores. Praticamente sai do seminário sabendo
falar francês, com noções de latim, de grego, uma
boa iniciação em inglês, conhecimento de história...
enfim, com uma boa formação humanística, mas com
uma grande falha em termos de formação técnica.
Nunca estudei química, física e matemática. Nestas
áreas sempre fui uma nulidade. Nunca fui reprovado... eu era
um aluno mediano. Apenas tive uma segunda-época em matemática
na primeira série ginasial. Também não fui um aluno
brilhantíssimo, mas com gosto pela leitura... lendo inclusive
em francês, já antes de terminar o curso colegial.
Em 1963, fui para o noviciado, passei um ano em Belo Horizonte: Noviciado
Dominicano. Naquela época era um ano completo, praticamente sem
sair do seminário... e usando batina. Foi uma experiência
interessante. Dramática em alguns sentidos. O superior que se
chamava frei Emanuel Retumba - não sei se por um sadismo perverso
ou por querer domar a minha independência, o meu pequeno-burguesismo
e o meu hedodonismo -, foi particularmente severo comigo. As vezes ainda
tenho traumas e pesadelos com esse padre-mestre.
No seminário, tanto quanto no noviciado, fui um adolescente marcado
pela espiritualidade. Realmente vivia o dia todo pensando em Deus. Era
uma pessoa com espiritualidade muito forte, um certo pieguismo. Sobretudo
uma espiritualidade já moderna no sentido da caridade, da solidariedade
e com grande preocupação pela Bíblia, cuja leitura
fiz várias vezes... com a preocupação em realmente
ser um santo, o ideal de todo cristão: ser perfeito como o pai
dos céus.
A minha iniciação sexual foi extremamente tardia, achando
como todo católico - sobretudo como seminarista - que a castidade
é uma virtude muito importante. Deste modo, evitava os maus pensamentos...
masturbação. A primeira experiência foi apenas por
volta dos dezesseis anos... e pouquíssimas vezes. Sentia uma
tendência homossexual, alguns sonhos, algumas fantasias, alguns
desejos, mas que eu reprimia com medo, considerando que era um pecado
muito grave dentro da moral cristã.
Durante mais de três anos tive uma relação platônica,
com um seminarista mais velho, Flaviano... mineiro. Esse Flaviano devia
ter uns dezessete e eu uns quinze anos. Depois soube que ele manteve
relações homossexuais com outro seminarista... também
muito meu amigo. Na época, contudo, não soube... só
soube posteriormente. Mantivemos uma amizade particular, bem no estilo
do livro famoso de Pierreffit "Les amitiés particulières",
depois recuperado pelo João Silvério Trevisan... no seu
livro sobre a experiência como seminarista. Não chegamos
a nenhum tipo de intimidade física. Nós trocamos inúmeras
cartas, tínhamos conversas muito amigáveis.... era um
grande amigo que tinha um forte componente homossocial, mas não
chegava ao homoerotismo.
No noviciado tive muitas tentações homoeróticas.
Algumas poucas masturbações, com grande angústia...
com imediata confissão e arrependimento. Lá, eu estava
entre noviços tentadores... todos com dezenove, dezoito, dezessete
anos, mas sempre procurava reprimir essas tendências.
Terminado o ano, fui para o Seminário Maior Dominicano em São
Paulo. Ainda hoje é na rua Caiubí, 126, em Perdizes. Era
um ambiente mais aberto. Podia visitar a minha família, podia
passear algumas vezes pela cidade. Por essa época, já
estudando filosofia, comecei a perceber que na verdade a minha fé,
o meu gosto pela religião e pela vida religiosa, não eram
tão fortes como imaginava. Para rezar, para estar pensando em
Deus, tinha que fazer um esforço muito grande. Comecei a me dar
conta que não devia ter vocação, pois se tivesse
vocação gostaria espontaneamente das coisas do céu.
Porém, tudo aquilo me causava desprazer e desconforto. Isso foi
amadurecendo na minha cabeça, então tive coragem de dar
esse primeiro passo corajoso. Mudei radicalmente o meu projeto de vida.
Era um sonho que praticamente alimentei dos sete aos dezessete anos...
durante dez anos o alimentei. Com dezessete para dezoito me dei conta
que era um equívoco. Essa experiência foi traumática
porque existe... querendo ou não, uma pressão familiar.
Mas me senti suficientemente forte para largar o convento. Foi exatamente
em 1964, no ano da "revolução". Apesar dos dominicanos
terem tido uma participação importante no movimento pré-ditadura,
politicamente eu era bastante alienado. Não me lembro do 31 de
março. Ao sair do convento voltei para a casa dos meus pais...
no Sumaré, em São Paulo, bem próximo às
Perdizes. Era o segundo semestre de 1964. Estava em dúvida sobre
o que fazer da minha vida! Certamente seria na área de humanidades,
mas não sabia se faria Direito ou outra coisa.
Na área de Ciências Sociais vi a possibilidade de continuar
mais ou menos na mesma linha do sacerdócio. Eu via as Ciências
Sociais como uma espécie de serviço social, auxiliando
a sociedade. Era uma época de fermentação de idéias
políticas, de reformas de base... poderia fazer da minha futura
profissão não mais o sacerdócio religioso, mas
uma prestação de serviço ao bem-comum. Fiz um cursinho
semi-intensivo e consegui entrar na Maria Antônia na USP. Eram
trinta vagas, entrei em sexto lugar em Ciências Sociais e também
entrei em quinto lugar em jornalismo.
Na fase de exames ocorreu um episódio interessante e dramático.
Durante as provas discursivas, elas ainda não eram de testes,
especificamente na prova de história geral caiu a Reforma Protestante.
Era um tema que tinha profundo conhecimento. Tinha duas horas para fazer
a prova. Porém, comecei a prova contando a história desde
a criação do mundo para chegar até Lutero... e
não chegava! Fui ficando assustado, com medo de terminar o período
da prova... sem ter chegado ao assunto principal! Fui atingindo tal
grau de excitação que fui tendo ereção e...
me melei todo! Enquanto terminava a Reforma Protestante tive um orgasmo
de nervoso...
Na faculdade, minha família continuava burguesa, então
para estudar pegava o carro do meu pai... nós tínhamos
mais de um carro. Raras vezes fui de ônibus ou de outro transporte.
Logo que comecei o curso de Ciências Sociais na USP, tentei me
aproximar da JUC - Juventude Universitária Católica, mas
não sei porque, não me interesei.
Na USP fui aluno de Carlos Guilherme Motta, de Gioconda Mussolini, de
Eunice Ribeiro Durham, de Ruth Cardoso, de Maria Isaura Pereira de Queiroz,
de Eva Blay, Rui Coelho - de saudosa memória -, Egon Shaden,
João Batista Borges Pereira, Célia - politicóloga,
acho que mulher de João Francisco -, de Luiz Pereira que foi
o meu professor de Sociologia I. Eeste último era o mais teórico...
o que assustava mais os alunos!!!
Ainda tinha um pouco de preocupação cristã na faculdade,
mas os três primeiros livros que lí... tiveram uma influência
definitiva na minha vida. Eles foram: As Regras do Método Sociológico
de Durkheim, Os Parceiros do Rio Bonito de Antonio Candido e A Ideologia
Alemã de Marx, apresentação de Florestan Fernandes.
Com a Leitura de A Ideologia Alemã, apesar de nunca ter me aprofundado
no marxismo, e depois estudando antropologia, me dei conta que as minhas
verdades absolutas, em termos de cristianismo, eram relativas... e muitas
delas equivocadas. Como sentia atração homoerótica
- cada vez mais forte -, fui vendo como o cristianismo era intolerante,
repressor e equivocado em relação a isso. Neste sentido,
o materialismo histórico poderia não só resolver
as minhas angústias existenciais, mas me ajudar a interpretar
melhor a realidade social, assim como a crise que vivíamos no
Brasil em 1965... logo depois do golpe.
Reatei algumas amizades de férias assim que saí do seminário.
Colegas e vizinhos que viviam próximos a casa de meus pais. Certa
vez um deles, um adolescente da mesma idade que eu, muito mais experiente...
falou-me que havia umas mulheres que era fácil transar, sobretudo
empregadas domésticas, lá mesmo pelo bairro do Sumaré.
Então, com desejo de reforçar a minha heterossexualidade,
já que os meus sonhos eram quase todos homoeróticos, tive
uma primeira experiência com uma mocinha negra... empregada doméstica.
A relação sexual foi no banco de trás de um Volks...
uma relação extremamente difícil anatomicamente,
mas cheguei ao orgasmo. Numa outra vez, encontrei outra menina que dizia
trabalhar num laboratório, mas depois descobri que era empregada
doméstica de uma amiga minha. Esta menina conseguiu meu telefone
através dessa amiga, telefonou e nos encontramos várias
vezes. Transamos algumas vezes no apartamento do meu irmão...
ele tinha uma quitinete para transar na rua Paim. Algumas vezes as relações
foram bastante satisfatórias, outras um fiasco... não
conseguia chegar ao orgasmo.
A minha curiosidade sexual era sobretudo homoerótica, mas não
aceitava isso: primeiro pela repressão cristã, depois
pelo estigma social. Esse mesmo amigo me disse que havia rapazes que
transavam perto da biblioteca pública Mário de Andrade.
Então fiquei extremamente curioso. Era a primeira vez que ouvia
falar sobre espaços freqüentados especificamente por homossexuais.
Uma noite fui andar de carro nessas redondezas e escolhi um rapaz...
era um nordestino branco. Fomos para um lugar mais retirado, alguma
rua mais tranqüila de algum bairro... se não me engano do
lado do Ipiranga.
Eu estava extremamente nervoso... tremendo. As primeiras vezes que tive
relações homossexuais no carro, geralmente de masturbação
recíproca, tremia compulsivamente... como se estivesse num frio
abaixo de zero. As primeiras relações foram prazerosas,
com muita intensidade, porém com muito nervosismo, com muito
descontrole... inclusive desse fator de ficar tremendo. Nessa relação
o rapaz queria que eu o penetrasse... que fosse o ativo. Como ainda
não tinha esse tipo de experiência, preferi que ele apenas
me masturbasse. A relação foi tão traumática
que não queria mais esse rapaz no meu carro... o que mostra o
nível de homofobia internalizada. Terminada a relação,
inventei um defeito no carro e pedi que o rapaz saísse para olhar...
uma coisa no motor atrás do carro. Imediatamente fugi com o carro
quando ele saiu. Nas primeiras vezes que transei, ao chegar em casa
tomava banhos desinfetantes, querendo me lavar daquele pecado... ao
mesmo tempo tão gostoso, mas tão rejeitado. No dia seguinte,
encontrei o cinto dele no meu carro... joguei fora. Imediatamente fui
a igreja para confessar. Essa foi a primeira vez... extremamente cheia
de culpa... de medo!
Na faculdade, um colega japonês que fazia estatística comigo,
praticamente se enamorou de mim e me convidou para transar. Essas outras
vezes foram menos traumáticas. Comecei a ter menos culpa. Com
o tempo deixei de acreditar em Deus. Portanto, deixei de ter qualquer
tipo de consciência pesada, no que refere a essa forma de relação.
Na faculdade, tive uma vivência discreta como homossexual. Cheguei
a namorar algumas colegas, ao mesmo tempo que mantinha uma vida homossexual
clandestina. Com rapazes tive um ou dois casos: um dentista jovem e
depois com um carioca.
Uma vez fui ao nordeste visitar a Bahia. Fui de carona com um caminhoneiro
conhecido. Ele parou e pegou duas prostitutas, uma para ele e outra
para eu. Foi uma relação extremamente desagradável.
Logo que cheguei na Bahia, percebi que peguei uma gonorréia.
Foi a minha primeira doença sexualmente transmissível.
Isso me causou um grande trauma, contribuindo para que afastasse a heterossexualidade
da minha vida... porém mantendo uma vida homossexual clandestina.
Minha irmã mais nova, Maria Lúcia Mott... que é
historiadora, percebia essas minhas tendências. Quando brigávamos,
algumas vezes ela chegou a dizer: "- Eu sei que você é
homossexual". O que foi motivo de ser agressivo com minha irmã...
acho que dei uns tapas nela... na medida em que não aceitava
e temia essa realidade.
Algumas vezes freqüentei boates em São Paulo, conheci uma
boate chamada "Entendes", depois a "Medieval"...
havia outras que hoje não me lembro o nome. No Rio de Janeiro
havia a boate "La Cueva." Conheci algumas poucas saunas. Porém,
via a homossexualidade como uma tendência passageira.
Não tive nenhum modelo homossexual durante toda minha infância
e adolescência. Na minha infância nunca vi nenhum homossexual.
Na seminário soube de um adolescente que fora expulso. Ele foi
pego transando com outro num bananal. De modo que não tive modelos.
Lembro do meu professor de história - o ex-ministro Murilo [Hingel]
- apontar a homossexualidade, ou a pederastia, como a causa da queda
do Império Romano. Neste sentido, minha visão era de uma
homofobia internalizada.
Participei ativamente dos movimentos de protesto durante o curso universitário
na USP. Fui a algumas reuniões da Ação Popular.
Fui convidado para uma reunião da política operária
[POLOP], mas nunca fui plenamente cooptado por algum grupo... fosse
político organizado, estudantil. Na universidade tive uma atuação
política não organizada. Não participava ativamente
de grupos. Embora participasse ativamente em passeatas. Fiquei preso
no DOPS... não sei se duas ou três vezes, passei uma ou
duas noites. Uma vez fui capa de primeira página do jornal Folha
de São Paulo. Não com o nome identificado, apenas a fotografia
onde era agarrado por vários policiais para ser colocado num
camburão. Nessa ocasião, rasgaram um lindo suéter
de lã inglesa do meu irmão... até hoje ele reclama!
Foi exatamente esse suéter que saiu na Folha de São Paulo.
O historiador Jimmy Green recentemente esteve no DOPS - ele está
fazendo uma pesquisa sobre o Movimento Homossexual no Brasil - e conferiu
minha ficha com vários episódios... inclusive depois de
me tornar líder de movimento homossexual. Em Campinas, numa atividade
realizada na SBPC... se não me engano em 1982 ou 83, ainda havia
agentes do DOPS participando. Nessa ocasião ouviram minha palestra
para averiguar o que haveria de subversivo.
Aproximei-me da Antropologia no período de graduação...
foi a área que mais me interessou. Como gostava do nordeste,
algumas vezes já tinha visitado a Bahia, tanto que havia pessoas
que me chamavam de Luiz da Bahia porque gostava muito de lá...
embora sem nenhuma ligação familiar ou qualquer outra,
a não ser a curiosidade.
Eu me interessei em estudar as feiras rurais... escolhi Sergipe. Consegui
uma bolsa da FAPESP em iniciação científica. A
professora Eunice Duhram, do Departamento de Antropologia da USP, foi
minha orientadora durante vários anos. Terminada a faculdade,
consegui uma bolsa na França, para fazer o mestrado em Antropologia.
Sempre estudando antropologia econômica: As Feiras. Passei dois
anos em Paris, morando na [Cité Universitaire, no Boulevard Jourdan,
no XIVème arrondissement. Em termos de experiência, considero
os melhores anos da minha vida... gostei de morar sozinho. Freqüentei
Paris, as artes, os museus. Tinha uma mobilete, então comecei
a minha vida como motoqueiro. Até hoje tenho carro e moto...
gosto muito de moto.
Gostei imensamente de viajar pela Europa... tive liberdade! Tive oportunidade
de ter uma vivência homossexual bastante livre. Transei com pessoas
de inúmeras nacionalidades, freqüentei boates. Em 1970,
encontrei a primeira revista homossexual, ainda muito tímida...
a Arcadie. A partir de 1972... se não me engano, existia a Frente
de Liberação Homossexual, mas não tive essas informações,
assim como não vi drogas na França. Esses fatos aconteceram
logo depois de Maio de 1968. Havia uma grande poluição
estudantil-política ...........................................................................................................................
Quando o Lampião foi fundado, tenho impressão que ainda
estava casado. Comecei a ler mais sobre homossexualidade. Casualmente,
encontrei um rapaz numa dessas aventuras noturnas... Sérgio!
Na época, eu devia ter uns trinta anos e ele uns dezoito ou dezenove.
Este foi um grande encontro! Pela primeira vez tinha encontrado um homossexual...
ele era pré-universitário, tinha o colegial, era bonito,
masculino, passivo e completamente tranqüilo em relação
a sua homossexualidade. Sem saber, ele provocou uma profunda revolução
na minha cabeça e no meu coração. Dei conta que
não queria mais viver essa ambigüidade. Queria estar apenas
com ele, realmente mudar de vida e assumir-me exclusivamente homossexual.
Isso após cinco anos de um casamento tranqüilo.
Foi um processo extremamente traumático. Na época, minha
mulher estava fazendo o mestrado. Essa revelação que desejava
me separar poderia prejudicá-la emocionalmente. Ela estava terminando
a tese de mestrado em antropologia na UNICAMP... sobre umbanda. De tal
modo que fui protelando essa revelação durante meses.
Quando ela terminou a tese, finalmente disse que queria me separar.
Ela reagiu negativamente... culpando-se. Eu não queria entrar
nos detalhes da separação, mas para evitar que ela se
auto-culpasse disse a verdade. Isso causou um trauma familiar enorme.
A minha família não sabia claramente. Primeiro falei com
minha irmã. Ela me dei todo apoio. Também falei com meus
pais, o que criou problemas no início, mas depois me aceitaram.
Quando falei a Peter Fry sobre o desquite... para asumir minha homossexualidade,
a primeira reação dele foi: "- Que loucura!".
O que me causou uma enorme decepção! Esperava uma atitude
mais solidária, um posicionamento mais favorável em relação
a meu ideal de vida, por parte de alguém que era do Lampião...
um homossexual assumido, mais velho que eu.. Peter Fry, editor do Lampião,
nunca deu apoio emocional, nem político a minha homossexualidade.
Minha ex-mulher mudou para sua cidade natal: Marília. Fiquei
em Campinas, morando com o Sérgio... numa outra casa que comprei.
Após um ano de felicidades, notamos que éramos muito diferentes
e resolvemos nos separar. Foi um momento de grande angústia!!
De repente me vi num meio solitário... com medo do futuro! Logo
em seguida tive novas amizades, novos amores. Logo depois de assumir,
escrevi um artigo... o primeiro sobre o assunto, chamava-se: "A
Homossexualidade no Brasil Colonial entre os Índios do Brasil".
Utilizei material da Inquisição. Era o meu primeiro contato
com esse tema. Esse artiguinho foi publicado no Lampião.
Campinas se tornou muito pequena para mim... muito familista. Há
muito tempo possuía uma fantasia de viver no nordeste... na Bahia.
Era o lugar do Brasil onde me sentia mais desejado sexualmente. Ao mesmo
tempo, onde encontrava os parceiros que mais preenchiam minhas fantasias
sexuais... sempre gostei de negros. Um pouco antes, fui ao Maranhão
fazer algumas conferências... lá conheci o Roldão.
Ele era um mameluco... um jovem artista com cara de índio. Embora
ele trabalhasse numa fundação cultural, tinha uma ideologia
ultra hippie... naturalista. Então ficamos de caso.
Ele morou uns meses comigo em Campinas. Depois mudei para Salvador e
me desfiz de inúmeras antiguidades... porque fui influenciado
por uma visão mais despojada do [Roldão]... do próprio
Sérgio que o tinha antecedido. Eu me desfiz de vários
bens. Fui para Salvador como professor visitante... com a intenção
de terminado esse trabalho... após um ou dois anos, caso não
fosse contratado, iria abandonar a universidade e viver numa praia...
criando cachorro, alguma coisa mais ligada na natureza. Aluguei um apartamento
ao chegar em Salvador. Morava com o Roldão. Foi uma relação
que não chegou a um ano. Um pessoa um pouco problemática...
infelizmente morreu de AIDS o ano passado. Conheci o Haroldo, um rapaz
de dezessete anos, mulato, estudante de Letras... depois fez Ciências
Sociais. No início da minha chegada, ele foi a grande paixão
da Bahia. Nós tivemos um caso de sete anos. Ele pertencia a uma
família de operários. Ele, muito reprimido, ouvia a mãe
dizer: "- Tem duas coisas que não suporto! Bicha e muriçoca!"
Mesmo assim fomos crescendo juntos. Depois de alguns meses, estávamos
juntos no Porto da Barra... atrás do Farol da Barra vendo o pôr
do sol, sentados discretamente, quando um rapaz nos viu sair de lá.
Na hora que fui pegar minha moto, ele me deu um bofetão na cara.
Ele era um grandalhão, não tive como reagir. Isso me deixou
profundamente abalado.
Nessa época, eu continuava recebendo o jornal Lampião.
Foi o período em que tinham se fundado alguns grupos: O SOMOS
de São Paulo, do Rio de Janeiro e de Sorocaba. Assim, tive a
idéia de fundar um grupo em Salvador. No fim do ano de 1979,
escrevi um anúncio no jornal Lampião dizendo: "Bichas
baianas, rodem a baiana... tudo bem! Mas deixem de ser alienadas. Vamos
fundar um grupo de discussão sobre homossexualidade... me escrevam!"
Como não tinha caixa postal, botei o endereço do meu apartamento.
Na época, um militante do Movimento Homossexual de São
Paulo... que era baiano, voltou a Bahia. Ele entrou em contato comigo,
colocou-me em contato com alguns anarquistas, jornalistas e professores.
Essas pessoas também tinham pensado em organizar algo relacionado
a Movimento Gay. Fizemos os primeiros contatos e marcamos a primeira
reunião do Grupo Gay da Bahia. Foi no dia 29 de fevereiro de
1980... era um ano bissexto!! Reunimo-nos, dezessete pessoas num sábado
à noite, estavam o Haroldo, Ricardo Lipper, o caso de Ricardo
Lipper que era o Antônio Carlos Pacheco, um outro que chamava-se
Alexandre Ferraz - anarquista-jornalista -, Carlinhos e o seu caso...
Wilson. Este último era negro... ele se separou do Grupo Gay
depois de dois anos e fundou o Adé Dudu. No livro de Edward MacRae
há uma pequena infomação sobre este grupo.
As primeiras reuniões do Grupo Gay foram no meu apartamento.
O nome - Grupo Gay da Bahia - foi Haroldo que sugeriu... depois de algumas
reuniões com discussões. A partir de então, divulgamos
a existência do grupo através do Lampião. Um dos
membro, chamado Roque Frazão, ofereceu a caixa postal dele, a
qual passou a ser a caixa postal do grupo. Até hoje é
a mesma, desde sua fundação... Caixa Postal 2552, Salvador
BA. O grupo inicialmente se reunia na minha casa. Depois conseguimos
a sede do grupo anarquista, no centro em Salvador... num lugar chamado
Relógio de São Pedro. Nós nos reunimos todos os
domingos... dez, quinze, vinte pessoas ou até mais. Com medo
de divulgar publicamente no início. Isso foi em 1980, ainda com
muita violência... o regime militar ainda era fortíssimo!
Nunca fiz uma profunda reflexão sobre a relação
do momento histórico com a questão do regime político
militar. A minha impressão é que quando surge o Lampião..
e o grupo SOMOS/SP, o Brasil já caminhava para uma abertura.
O regime militar estava mais fraco. Ele nunca foi muito rígido
em questão de repressão sexual. As boates funcionavam
livremente. Não me lembro de nenhuma batida policial. Nos anos
setenta. Quando estive na Colômbia, fui a uma boate onde a polícia
chegou e acendeu as luzes... as pessoas ficaram assustadas! Lá
havia uma repressão policial.
O meu tempo de universidade... a partir de 1965 até 1968, quando
eu estava na USP, a paquera homossexual e a prostituição
no Parque Trianon era imensa... maior do que é atualmente. Encontrei
numa dessas caminhadas noturnas, nada mais nada menos, que o professor
Luís Pereira. Meu seríssimo professor de Sociologia Sistemática.
Inicialmente ele não me reconheceu, entrou no meu carro e conversamos,
mas ele era muito feio e eu não quis. Sempre gostei de pessoas
mais jovens que eu. Depois ele percebeu que eu era aluno e a conversa
superficial. Ele morreu pouco tempo depois... não sei do? Ainda
não estávamos no tempo da AIDS.
Não acho que o regime militar teve alguma interferência
no aparecimento ou na repressão do homossexualismo. Ao meu modo
de ver, o Brasil acompanhava o Movimento Internacional de 1969 - o Stonewall...
lá em Nova Iorque. Neste sentido, a sociedade brasileira começa
a acompanhar essa liberação geral dos costumes, em termos
de boates, publicações, shows de strip-tease, anúncios
eróticos... a televisão se abre um pouco para algumas
temáticas eróticas, inclusive pequenas passagens homoeróticas.
Quando fundamos o grupo tínhamos medo. O primeiro documento que
publicamos e distribuímos em Salvador chamava-se: "A todos
os homossexuais da Bahia". Nele, não colocamos o local onde
nos reuníamos... com medo de algum tipo de repressão,
mas que era um temor meio difuso, não situado em algum setor
que imaginássemos nos agredir ou ameaçar.
O Grupo Gay da Bahia, através do jornal Lampião, desde
que foi fundado estabeleceu contato com os grupos do sul. Na Semana
Santa de 1980, aconteceu o Primeiro Encontro Brasileiro de Homossexuais
em São Paulo. Tive conhecimento dessa realização
porque eu lí no Lampião. O Grupo Gay da Bahia fora fundado
uma semana antes, mas não participamos. Na ocasião, não
tínhamos condição de ir a São Paulo. Porém,
soubemos das atividades, recebemos o material... até hoje temos
o cartaz. Ele está emoldurado na sede do Grupo Gay da Bahia.
O cartaz do Primeiro Encontro nem foi impresso... foi um tipo artesanal.
Depois de alguns anos, funcionando na sede do grupo anarquista, tivemos
possibilidade de comprar uma quitinete no centro de Salvador... na praça
Castro Alves, a partir de então o grupo passou a funcionar nesse
local. O nosso pequeno arquivo foi transferido para lá... até
então ele estava na minha casa na Barroquinha. Nesta pequena
sede o GGB funcionou talvez cinco ou oito anos. Tivemos que enfrentar
vários problemas com a discriminação da vizinhança,
mas nesse pequeno espaço conseguimos reunir vinte... trinta pessoas.
Inicialmente nos reuníamos às quartas, sextas e domingos.
Depois cortamos domingos... as reuniões eram só as quartas
e sextas. Em 1988 ou 1989, tivemos oportunidade de comprar um espaço
maior na Rua do Sodré. O primeiro andar de um casarão
histórico. É um espaço bem mais confortável,
com sessenta cadeiras, um arquivo, um sanitário. Montamos o Centro
Cultural Triângulo Rosa. O GGB passou a ter mais espaço,
com um local para fazer exposições. Já fizemos
inúmeras exposições de gravuras, de fotografias.
Realmente já é um Centro Cultural conhecido em Salvador.
O Grupo Gay da Bahia, logo que foi fundado, tomou como primeira campanha
a luta contra o parágrafo 302.0 - da classificação
internacional de doenças, da Organização Mundial
de Saúde -, o qual considerava o homossexualismo como desvio
e transtorno sexual. A partir de 1981, começamos a campanha nacional.
Conseguimos dezesseis mil assinaturas, assim como o apoio de políticos
importantes: Franco Montoro, Ulisses Guimarães, Darcy Ribeiro,
entre outros; e o apoio de cinco associações científicas
- a favor da despatologização da homossexualidade - que
finalmente redundou na principal vitória do Movimento Homossexual
até agora. Em 1985, o Conselho Federal de Medicina retirou a
homossexualidade da classificação de doenças. Internacionalmente,
esta alteração pela Organização Mundial
de Saúde só ocorreu no ano passado, em 1994. Neste sentido,
o Brasil se antecedeu em vários anos a essa conquista internacional.
Considero importante também a minha participação
na inclusão do dispositivo que proíbe a discriminação
por orientação sexual em setenta e três leis orgânicas
municipais e duas constituições estaduais.
No que refere a minha formação intelectual e acadêmica,
foi um equívoco ter escolhido Antropologia Econômica. De
fato, gosto das feiras porque gosto de antiguidades, mas não
gosto de estudar micro e macro economia. De modo que perdi muito tempo
com isso. Há vários anos passei adiante minha biblioteca
de antropologia econômica que era bastante importante. Depois
da Antropologia Econômica interessei- me pela Demografia Histórica.
Tenho vários trabalhos sobre Demografia Histórica... estudos
populacionais de Sergipe, Piauí, no século XVIII, XIX.
A Demografia Histórica abriu o espaço para a etno-história
da sexualidade.
Comecei estudando o material inquisitorial, estive mais de um ano na
Torre do Tombo em Lisboa. Na medida em que passo poucos dias num arquivo,
sou um pesquisador que tenho um grande tino... uma grande argúcia
de investigação. Consigo coletar grande quantidade de
documentos e descobrir coisas importantes. Modéstia parte, tenho
mais de duas mil páginas publicadas para a história...
mais de mil sobre a escravidão dos africanos e seus descendentes...
alguns documentos inéditos e a parte sobre sexualidade. Na Torre
do Tombo, descobri a existência de um material riquíssimo
em processos, denúncias, sumários... sobre os sodomitas
em Portugal e no Brasil colonial.
Quando consegui a primeira bolsa do CNPq, para ir fazer a pesquisa sobre
a história dos sodomitas em Portugal e no Brasil, fiquei com
medo da discriminação e da censura. Desta forma, apresentei
um projeto ao CNPq explicando que pesquisaria sobre moralidade na Inquisição
em geral. Porém, a minha ênfase era os mais de quatrocentos
processos de sodomitas e mais de cinco mil denúncias que copiei.
Esse vai ser o trabalho principal da minha vida. Até agora trabalhei
esse material apenas superficialmente porque sempre estive envolvido
com outras questões.
A minha contribuição, em termos da História da
Homossexualidade, ainda está por ser feita: o estudo dos mais
de cinco mil sodomitas luso-afro-brasileiros perseguidos pela Inquisição.
Este material coletado está na minha casa. Pretendo viver até
os cem anos para fazer vários volumes sobre esta história...
única na humanidade. Não há nenhum outro registro
tão minucioso sobre a história dos sodomitas - inclusive
sobre a sexualidade - como o dos arquivos da Inquisição
portuguesa. Este será o principal trabalho da minha vida... a
minha ópera magma!
Na verdade, minha contribuição à história
da homossexualidade concentra-se no fato de ter feito a primeira bibliografia
específica do tema no Brasil. Na época, foram mais de
trezentos títulos que coletei. Este levantamento foi publicado
nos Estados Unidos e no Brasil. Uma das pérolas do meu currículo
é ter apresentado e aprovado cinco moções contra
a discriminação homossexual em associações
científicas: a SBPC, a Associação Brasileira de
Antropologia, a Associação Brasileira de Demografia entre
outras. Desta forma, considero este momento muito importante na história
dos direitos humanos homossexuais no Brasil.
Ainda em termos da minha contribuição intelectual e política...
para os direitos humanos dos gays, lésbicas e travestis, há
o meu livro O Lesbianismo no Brasil. Até o momento é o
único livro que dá uma visão histórica,
literária e política sobre as lésbicas no Brasil...
desde os tempos da descoberta até os movimentos organizados.
Há um trabalho sobre os travestis, chama-se Gilete na Carne,
sobre as automutilações dos travestis da Bahia. Este trabalho
foi apresentado num congresso de antropologia... foi censurado pela
Revista de Antropologia da USP. O professor João Batista Borges
Pereira como editor da revista recusou publicá-lo. Em 1987, finalmente
ele foi publicado na Revista do IMESP - Instituto de Medicina Social
de São Paulo.
Fiz a pequena bibliografia sobre AIDS no Brasil. Modéstia parte,
em 1982 o Grupo Gay da Bahia foi a primeira ONG a iniciar a prevenção
da AIDS. Escrevi a primeira bibliografia sobre este tema. Além
disso, considero que meu trabalho sobre a prevenção da
AIDS no candomblé é pioneiro no Brasil... se não
me engano de 1990! No que refere ainda ao trabalho sobre a prevenção
da AIDS, há o primeiro texto em [Braile]. Durante muito tempo,
foi o único material destinado especificamente aos cegos no Brasil.
Até hoje, com quarenta e nove anos, este foi o
depoimento mais completo que prestei a respeito desse meu percurso como:
filho de uma família burguesa de São Paulo, seminarista,
estudante universitário e líder do movimento homossexual.
Tenho consciência que fiz história nessa curta existência.
Dei importantes contribuições à história
dos africanos e seus descendentes no Brasil. Essa área foi muito
importante porque descobri documentos inéditos. Eu publiquei
a biografia da Rosa Egipcíaca, setecentos e cinqüenta páginas,
editora Bertrand do Brasil. É a biografia mais extensa a respeito
de uma africana do século dezoito no mundo. Não tem nenhuma
documentação tão minuciosa quanto esta.
Colaborei em algumas áreas do conhecimento, escrevendo bibliografias.
Nos Estados Unidos, publiquei uma bibliografia sobre mercados camponeses
e feiras, uma bibliografia sobre Demografia Histórica, outra
sobre a História de Sergipe. Portanto, tenho consciência
que fiz história. Fiz história pela minha contribuição
às diferentes áreas da ciências humanas que pesquisei
e dei contribuições... seja escrevendo artigos originais,
seja fazendo bibliografias, seja ajudando outras pessoas
Essa é uma característica da minha personalidade. Herdei-a
da minha mãe e da minha avó materna... uma generosidade
em termos colaborar e de fazer o bem. Seja dar esmola... a quem pede
na minha porta ou na rua, seja ajudando conhecidos em pesquisas. Não
tem um livro sobre história colonial brasileira - que saia hoje
no Brasil - com agradecimento a algum documento que tenha passado para
essas pessoas. Então, tenho consciência que colaborei com
a historiografia brasileira. Não teoricamente... sou um etnógrafo.
Não tenho o menor constrangimento de dizer que sou um bom pesquisador...
um bom colecionador de documentos. Sou original na interpretação
de alguns temas. Corajoso em colocar problemas e também em relacionar
a pesquisa histórica com o presente. Não tenho teoria
profunda... não me envergonho porque a teoria passa e os fatos
continuam.
De modo que essa é minha contribuição, em termos
tanto de Demografia Histórica, quanto de História dos
africanos e seus descendentes no Brasil, assim como para a história
da sexualidade. Depois de Gilberto Freire, de Paulo Prado... pertenço
a geração mais recente que iniciou esses estudos. Tenho
como colegas... alguns deles, pelo estímulo, até se consideram
meus seguidores: Ronaldo Vainfas, Mary del Priorie e Laura de Melo e
Souza. São pessoas com uma profundidade analítica maior
que a minha porque são historiadores, mas freqüentemente
eles citam os meus trabalhos e os documentos que lhes passei.
A minha pessoa vai ficar na História do Brasil como o homossexual
que mais lutou pela cidadania dos gays, lésbicas e travestis.
Embora, pessoalmente, goste do termo homossexual, lastimo que as lésbicas
se recusem a utilizá-lo para se auto-identificar. Poderíamos
utilizar termos específicos apenas quando nos relacionamos entre
nós. Porém quanto ao movimento em si... com a sociedade
heterossexista, parece-me ser politicamente correto usar o termo homossexual,
englobando todas essas categorias distintas. Na única reunião
do grupo SOMOS que participei, a quinze anos atrás... se não
me engano na Politécnica da USP, fiquei chocado com o separatismo
lésbico.
Nessa reunião, estava a Alice do Coletivo das Feministas Lésbicas
de São Paulo... aquela que a poucos instantes interrompeu esse
depoimento, reclamando pelo fato de estarmos ocupando uma mesa no cantinho
de um salão - enorme - de exposição sobre visibilidade
lésbica... para ela nós estaríamos atrapalhando
a exposição. É lastimável a incompreensão
desta pessoa, presente desde o começo do Movimento Homossexual.
Porém, nessa reunião também estavam o Edward MacRae,
o Jorge Beloqui e outros líderes. Eu era um dos mais novos, mas
já era uma pessoa mais ou menos visível. O GGB já
havia sido fundado, era um grupo que estava se salientando... talvez
já tivesse um ano de existência! As lésbicas se
colocavam numa posição de se acharem mal contempladas...
diziam ser alvo de discriminação. Queriam se separar para
ter maior visibilidade. De fato, elas se separaram do SOMOS para fundar
o GALF (Grupo de Atuação Lésbico-Feminista)...
o primeiro grupo lésbico.
Quando fiz o livro sobre o lesbianismo no Brasil, o fiz com intenção
de contribuir para essa minoria tão pouco visível. Porém,
nos últimos três anos me envolvi numa polêmica!...
achava que o Movimento Homossexual Brasileiro, assim como o Encontro
Brasileiro de Homossexuais, devia manter esses nomes. As lésbicas,
contudo, insistiram que fosse chamado de Movimento de Homossexuais e
Lésbicas. Então, demonstrei o equívoco que seria
cometido, na medida em que lingüística e politicamente o
termo homossexual envolve tanto gays quanto lésbicas. Mas criou-se
toda uma polêmica sob a justificativa que lésbicas não
são gays.
A provocação - feita durante este depoimento - já
chega a ser de um nível que considero pequeno. Na verdade a história
vai mostrar este equívoco, pelo qual fui acusado de discriminar
as lésbicas... só pelo fato de achar que o nome do movimento
devia chamar: Movimento Homossexual Brasileiro. Nesse caso, questiono
esta atitude. Por que não escrevi O Homossexualismo Feminino
no Brasil? Porque estava tratando especificamente do lesbianismo! Porém,
no que refere a um movimento que reuni gays, lésbicas, travestis,
transexuais e recentemente bissexuais, será preciso acrescentar
uma nova minoria a cada reunião... ou então utilizar um
termo universal. A palavra homossexual foi inventada por um gay, o Benkert,
e parece-me que a sociedade entende seu significado perfeitamente. É
completamente redundante e falho, em termos de comunicação,
querer falar em lesbianidade e lesbofobia se se pode falar em homossexualidade
e em homofobia... incluindo tanto a discriminação dos
gays quanto das lésbicas. Na verdade, essa pretensa visibilidade
das lésbicas reflete uma androfobia. Infelizmente as lésbicas
do primeiro mundo, assim como as do Brasil... que estão entrando
pelo mesmo caminho, têm um ódio, uma fobia ao homem, a
qual considero negativa e prejudicial. Repito, a história há
de mostrar este equívoco!
A minha colaboração para o Movimento Homossexual foi tanto
prática, quanto intelectual. No sentido de resgatar as histórias
no passado, de realizar bibliografias de personagens célebres
que praticaram o homoerotismo. Em relação a história
do lesbianismo, descobri personagens, literatura, episódios que
até agora não tinham sido revelados. Para os travestis
também, na medida em que descobri o primeiro travesti na história
do Brasil. Francisco Manicongo, na cidade Salvador em 1591. Portanto,
em termos da história da homossexualidade o meu trabalho serve
de fonte e servirá de inspiração para muitos outros
trabalhos.
Não me interesso pela história contemporânea do
Movimento Homossexual. Não sei se é por causa que participo
nela, sendo uma peça importante nesse movimento... do que propriamente
uma postura, um distanciamente epistemológico. Na medida em que
sou ator e analista ao mesmo tempo... isso me constrange! Tenho uma
identificação maior, um gosto pessoal pela história
colonial, pela história do século XVI, XVII e XVIII. Deixo
isso para o Edward MacRae, para os outros estudarem o Movimento Homossexual.
Tratei dessas diferentes áreas em que considero que a minha pessoa
prestou uma colaboração importante. Falo isso não
com o cabotinismo ou como auto-promoção, mas poque acredito
que a verdade deve ser dita sem falsa modéstia. O meu trabalho,
o meu afinco e a minha garra devem servir de estímulo e emulação
para que mais pessoas assumam essas diferentes áreas e setores.
Por falta de outros colaboradores tive que assumir com exclusividade.
Pela minha vontade, gostaria de me concentrar exclusivamente no estudo
e na reconstituição da história dos sodomitas luso-brasileiros
perseguidos pela Inquisição. Este é meu tema predileto.
Não trabalharia com AIDS, deixaria o ativismo para outros, pois
em termos de preferência gosto de estudar a história inquisitorial.
Por falta de outras iniciativas fui obrigado a abraçar mais áreas.
Espero, portanto, que essa reconstituição sirva de estímulo
para que mais pessoas dividam o trabalho, reconstituindo toda história
da homossexualidade no Brasil.
No que se refere ao ativismo, enquanto líder gay, ouvi do teólogo-pastor
Thomas Han] - da Comunidade Outras Ovelhas de Buenos Aires - chamar-me
duas vezes do Patriarca do Movimento Homossexual. Fiquei orgulhoso porque
geralmente me chamo de Decano. Atualmente, sou o homossexual que durante
mais tempo, ininterruptamente, participa do Movimento Homossexual. Era
o João Antônio Mascarenhas. Em [1977], ele foi o primeiro
a ter a idéia de organizar os homossexuais em nosso país,
trazendo o Winston Leyland ao Brasil - diretor da editora Gay Sunshine
- para fazer conferências sobre liberação homossexual.
Mascarenhas é um dos idealizadores, senão o idealizador
do jornal o Lampião! Fundador do grupo Triângulo Rosa.
Infelizmente largou o Movimento, embora às vezes ainda dê
alguma assessoria. Se não fosse João Antônio Mascarenhas,
nem o Movimento Homossexual, nem o GGB seriam tão fortes. Ele
deu assessoria ao GGB inúmeras vezes, escreveu ofícios...
seu arquivo está todo conservado na UNICAMP.
Mantive contato com as lideranças históricas do Movimento
Homossexual, com os dinossauros, mas foi muito superficial. Estive uma
vez na casa de João Silvério Trevisan, mas nunca tomei
partido na questão da Convergência Socialista... inclusive
o Jimmy Green está presente aqui na ILGA. Não gosto de
participar de encontros nacionais, internacionais... de associação
nacional. Não gosto de participar de assembléias. Não
tenho aspiração, nem ambição política,
para ser chefe de departamento, para ser presidente de associação
nenhuma. Sempre gostei de trabalhar com ativismo local... acho que me
sinto mais a vontade!
Com Peter Fry, tenho uma posição extremamente crítica.
Os trabalhos dele sobre homossexualidade no Brasil pecam por uma falta
de visão... na medida em que ele considera que a pessoa está
homossexual e que não é homossexual. Não existe
o ser homossexual, mas o estar homossexual. Acho um equívoco!
Se ele tem dúvidas quanto a homossexualidade ser um definidor
de sua própria existência, para [mim], assim como para
milhões de gays e lésbicas, o ser homossexual implica
numa existência distinta, não separada... numa alternativa
a essa sociedade heterossexista.
Em relação ao Movimento Homossexual, a posição
de Peter Fry foi de desprezo. O prefácio do livro de Nestór
Perlongher - O Negócio do Michê -, onde ele diz que o michê
representa uma minoria que resiste heroicamente a identidade homossexual,
é uma visão extremamente irresponsável... na medida
em que vinte por cento dos assassinos de homossexuais são michês,
rapazes de programa com problemas de identidade. São homossexuais
egodistônicos. Peter Fry teve uma contribuição negativa
em termos da liberação homossexual, apesar de ter tido
a coragem de participar do corpo editorial do Lampião... logo
quando chegou ao Brasil, e ter sido processado junto com outros editores
durante a ditadura.
Meu contato com outros líderes do Movimento Homossexual foi muito
superficial. Encontrei Darcy Penteado uma ou duas vezes, tivemos conversas
rápidas. Tenho os seus livros, algumas gravuras... inclusive
com autógrafos, mas não tive maior contato. Aguinaldo
Silva... desprezo!!! Como editor responsável do Lampião,
esse indivíduo ficou com o riquíssimo arquivo da Lampião...
com o final e a dissolução do jornal. O Grupo Gay da Bahia
escreveu pedindo a transferência desse arquivo. Na ocasião
era o mais organizado. Eu mesmo escrevi insistentemente para ele, mas
o arquivo foi destruído. Por acaso tive a oportunidade de comprar
um livro, escrito pelo Rudge, hoje ele é um transexual, com os
dizeres: "- Eu Rudge, com oferta ao Lampião. Rudge."
Comprei num sebo. Sinal que: ou Aguinaldo Silva vendeu o material do
Lampião, ou então o destruiu com as cartas, manuscritos
e fotografias... tudo isso se perdeu! A posição atual
de Aguinaldo Silva, criticando-me e dizendo que não quer rótulos,
negando o seu passado de militante homossexual, o desqualifica a ficar
na história da liberação homossexual.
João Antonio Mascarenhas, considero uma personalidade importantíssima,
apesar de toda a sua personalidade elitista, pelo fato de ser uma pessoa
que possui bens, o seu perfeccionismo... mas é muito generoso!
Ele deu uma contribuição fundamental na organização
do Grupo Gay da Bahia, assim como em outras atividades do Movimento
Homossexual. O Edward MacRae, atualmente mais envolvido com o estudo
sobre drogas... sobre o Santo Daime, também foi fundador do grupo
Alegria-Alegria... uma dissidência do SOMOS. Ele teve uma polêmica
com Trevisan, pois posicionou-se apenas como um pesquisador, não
aparecendo como um dos participantes dessa entidade... mas o considero
uma pessoa correta.
Richard Parker é uma estrela, o expert internacional a respeito
da homossexualidade no Brasil... mas muito influenciado por Peter Fry
no que refere a visão chamada de construcionismo social da homossexualidade,
da qual não participo, na medida em que sou um essencialista.
Considero a homossexualidade como um componente universal, definidor
de personalidades para milhões de indivíduos.
Até então era o Decano, a partir de agora fui nomeado
o Patriarca... orgulho-me muito por isso! Não pretendo abandonar
o Movimento Homossexual... nunca! Quero ficar até o final dos
meus dias como militante, mesmo quando já tivermos muito mais
direitos conquistados. Isso faz parte do meu temperamento, da minha
maneira de ser... continuar polemizando e reivindicando os direitos
humanos para essa minoria.
A minha contribuição principal foi a fundação
do Grupo Gay da Bahia. Esta grupo liderou inúmeras campanhas
nacionais, exerceu um papel fundamental na fundação de
outros grupos como: o Dialogay de Sergipe; Grupo Lésbico da Bahia;
o Centro Baiano Anti-AIDS; o Grupo Gay do Amazonas; e o próprio
Dignidade... atualmente considero este último grupo mais dinâmico
e estruturado que o Grupo Gay da Bahia. Foi me vendo na televisão
que Tony Reis, fundador do Grupo Dignidade de Curitiba, teve o desejo
de ser alguém igual àquele gay que ele viu falando do
Grupo Gay da Bahia. Neste sentido, considero que a minha contribuição
ao Movimento Gay Brasileiro foi, é e está sendo profícua,
na medida em que ajudei a criar outras lideranças.
O Grupo Gay da Bahia infelizmente não tem outras lideranças.
Não que eu seja monopolizador, mas os principais coordenadores
do grupo, os mais dinâmicos, de nível universitário,
que falam outras línguas... dois deles casaram-se com outros
gays e foram para o exterior. Haroldo foi para a Alemanha e Edmo Santana
está na Austrália. Infelizmente tivemos um coordenador
muito dinâmico que foi afastado por problemas de má conduta.
Atualmente, Marcelo Cerqueira, é o grande amor da minha vida.
No encontro da ILGA completarei dez anos de união com ele. Casamos
no dia 08 de junho de 1994, numa cerimônia realizada no sindicato
dos bancários em Salvador... oficiada pela pastor Onaldo Pereira
da Igreja Pacifista Cristã. Nesses dez anos, ele tem sido a minha
grande força, é quem me dá estímulo... quem
me inspira em muitas atividades. Uma pessoa mais simples que o Haroldo,
mas que nos últimos anos se tornou universitário. Ele
está cada vez mais envolvido com o GGB, com a prevenção
da AIDS e que hoje - 22 de junho - estará presente quando eu
receber o prêmio Filipa de Souza. Esta personagem foi a primeira
lésbica a ser torturada e perseguida pela Inquisição
portuguesa em 1593... descobri e divulguei esse dado.
Este prêmio de direitos humanos me será outorgado hoje.
Ele é concedido pela Comissão Internacional de Direitos
Humanos de Gays e Lésbicas de São Francisco. É
o principal prêmio de direitos humanos de homossexuais no mundo.
Juntamente com outros dois: um da Tailândia e outro da Nova Zelândia.
Nesses quinze anos de luta pelos direitos humanos que estou envolvido,
esse prêmio me orgulha pelo reconhecimento da minha contribuição...
de uma forma significativa à maior visibilidade atual e histórica
dos homossexuais: gays, lésbicas e travestis no Brasil.
Fui vítima de graves ameaças a minha integridade física.
Há uns cinco anos, fui ameaçado depois de ter dito e divulgado
que Santos Dummont era homossexual.
Vou concluir esse longo depoimento, afirmando que se Jean Genet disse
que a homossexualidade foi uma benção para ele, a homossexualidade
foi uma graça para [mim]. Ela tornou-me mais gracioso, cheio
de graças. Enquanto cidadão... enquanto ser humano, ela
fez de mim uma pessoa que prestou contribuição. Foi muito
significativo o fato de ter assumido a minha homossexualidade, ao invés
de ter-me mantido na clandestinidade. Pelo meu depoimento, pela minha
coragem, pelas cartas que escrevi, pelos textos que divulguei... estou
certo que centenas, ou até milhares de jovens, de pessoas que
se assumiram, tornaram-se menos infelizes!
Não me arrependo um minuto sequer de ter feito esta opção.
No meu caso foi uma opção. Optei por tornar explícita
a minha orientação sexual mais reprimida. Espero ser lembrado
como alguém que acreditou na felicidade... que acreditou no sexo
e no amor entre pessoas do mesmo gênero como um direito fundamental
de cidadania. O amor é um direito humano fundamental. Termino
- como já fiz muitas vezes em conferências - com um poema
de Fernando Pessoa: "- O amor é essencial. O sexo é
um acidente. Pode ser igual ou pode ser diferente"; ou com uma
frase minha que se tornou o primeiro slogan do Movimento Homossexual
Brasileiro: "É Legal ser Homossexual".