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Da pesquisa do Projeto ao Projeto de Pesquisa (1)
Por Venilson Luciano B. Fonseca (2)Quando enfrentamos dificuldades acadêmicas, um dos maiores problemas que surge é o Projeto de Pesquisa. Seja ele um Projeto de Monografia ou uma Dissertação de Mestrado, ficamos às voltas com angustiantes questões metodológicas e conceituais. Este pequeno artigo tem a pretensão de ajudar aqueles que se interessam pela pesquisa em si e também aqueles que desejam se aprofundar em temas que envolvam investigação.
Algo que sempre nos vem à cabeça antes de começar um Projeto é: O que eu vou pesquisar? Ou então: Como fazer um Projeto e sobre o quê fazer? Nas universidades que exigem a chamada monografia de final de curso, para efeito de integralização curricular, a maioria dos estudantes se vêem aterrorizados com o fato de terem de produzir uma pesquisa ao fim de um ciclo de estudos. As bolsas de iniciação científica, financiadas por órgãos de fomento à pesquisa, como CNPq, CAPES, são uma boa oportunidade para aqueles que desejam produzir bons projetos e boas pesquisas. Não obstante, mesmo os que não têm a obrigatoriedade da criação e execução de um projeto, encontram dificuldades na construção de pequenos trabalhos individuais ou coletivos. Portanto, aquelas perguntas feitas inicialmente são as principais fontes de angústia dos estudantes.
É preciso deixar claro desde já que não existe uma fórmula pronta e acabada de um bom projeto de pesquisa, como se fosse uma “receita de bolo”. Mas algumas considerações podem ser generalizadas. A primeira delas tem a ver com a elaboração de um problema ou de uma pergunta inicial. Em outras palavras, se você deseja resolver alguma questão com sua pesquisa, ela não pode estar resolvida antes do início de seus trabalhos. Não raro observamos projetos de pesquisa que começam com a pergunta inicial respondida, ou seja, o autor deseja pesquisar algo que de antemão já conhece a resposta. Aqui reside o primeiro erro. Como o próprio nome indica, pesquisa significa investigar, inquirir, indagar (BUENO-2000). Não se pesquisa algo que já se conhece. Por isso, é conveniente que um projeto de pesquisa comece a ser formatado após um período de amadurecimento do pesquisador. É necessário que ele esteja com uma carga de leitura bastante razoável para que possa argumentar e levantar objeções, questões ou hipóteses passíveis de serem desenvolvidas em seu trabalho. Este “amadurecimento” somente é conquistado se o pesquisador tenha lido e escrito bastante, anteriormente.
Em geral, um bom pesquisador produz um projeto de pesquisa consistente porque já enfrentou dificuldades semelhantes na elaboração de outros trabalhos científicos, como resenhas comentadas, resumos e artigos. Isto não significa que aqueles que não se enquadrem neste modelo não possam produzir bons projetos de pesquisa, mas suas dificuldades certamente serão maiores. Fato é que aprendemos a pensar um projeto e desenvolvê-lo, fazendo. É recomendável que se comece o quanto antes um projeto. Escreva, discuta, dialogue com outras pessoas. Não se deve abandoná-lo várias vezes, retornando de quando em quando. Seu texto corre o risco de ficar com grandes lacunas que seriam melhor identificadas quando têm-se uma disciplina mais rigorosa, de escrever sempre, de preferência todos os dias. Como nos lembra Hissa (2002:167), “O texto é também um produto do pensamento, de como ele está articulado. O texto é, ainda, produto da natureza do pensamento, de como ele se organiza para atingir um objetivo.” E para atingir o objetivo almejado, o pesquisador deverá tomar muito cuidado com aquilo que escreve, evitando a prolixidade e a confusão de idéias.
Existe uma série de recomendações e “caminhos” que o pesquisador pode percorrer. É importante ter sempre em mente a “estrutura” do projeto delimitada. Mas não basta estar na cabeça simplesmente. Deve-se colocar no papel o escopo do trabalho. Dito de outra maneira, após a identificação da pergunta inicial – seja ela referente a um fato, fenômeno, acontecimento. – é justo que se parta para um esquema parecido com este (LAKATOS & MARCONI In HISSA-1997): Tema/título; Introdução/apresentação; Justificativa; Objetivo(s); Cronograma inicial; Metodologia, Orçamento primário; Bibliografia. Detalhando um pouco mais: Tema – significa inserir seu trabalho em uma determinada área ou assunto. Pode-se pensar em um título provisório que encerre um resumo extremamente condensado do que vêm a ser o projeto, do que se trata. O leitor do seu projeto saberá, a partir do título, o que encontrará nas próximas linhas, despertando ou não o seu interesse. Introdução/apresentação – aqui se deve explorar, em linhas gerais, o que pretende desenvolver na pesquisa, seus limites e alcances. Neste item, é conveniente levantar as principais hipóteses, o que o levou a este tipo de questionamento, enfim, apresente verdadeiramente o projeto para o leitor, envolva-o com seu texto, que deve ser leve e de fácil acesso, até mesmo pelos leigos. Isto não significa amesquinhar o texto. Apenas seja suficientemente claro em suas formulações. Justificativa – este é o momento de “defender” a relevância de seu projeto para o leitor. Precisamos convencê-lo de que a realização da pesquisa é necessária e que irá contribuir – de alguma maneira – para o aprimoramento e/ou aprofundamento de determinada questão ou assunto. Evidentemente que não se pode confundir a relevância da pesquisa com urgência da mesma. Não podemos – e não devemos – acreditar que, qualquer que seja o projeto de pesquisa, o mundo não irá sobreviver se ela não for realizada. Deve-se ter uma noção de escala e de importância, conhecer os limites de seu projeto, caso contrário corre-se o risco de parecer ridículo e, principalmente, de super dimensioná-lo. Objetivo(s) – Neste tópico, devemos explicitar, de maneira clara, qual é o fim que se espera para a pesquisa, qual será a sua contribuição ao final do processo. Esta é a hora de dizer o que se pretende com a pesquisa, qual é a sua pergunta ou questão a ser respondida. Um outro ponto importante a ser evitado são as famosas “propostas”, “soluções”, “metodologias”, que constam de inúmeros projetos, principalmente nos objetivos. As “propostas” somente poderão surgir ao final dos trabalhos. Quando estiver com a pesquisa feita e chegado a resultados conclusivos sobre determinada questão, é que será possível começar outro projeto, em que se poderia “propor” alguma coisa. É como se ao final do trabalho percebêssemos que efetivamente ele começa. Metodologia – este é um dos pontos mais importantes de sua pesquisa. Nela deve constar o que pretende fazer para atingir seus objetivos. É o “como fazer” do projeto. Exemplificando, se desejamos conhecer o que uma comunidade local pensa acerca da poluição do rio que corre próximo a ela, nada mais justo do que elaborar um roteiro de entrevistas. É uma das maneiras possíveis de se atingir este objetivo. Por outro lado, se desejamos analisar a concentração química de determinado elemento neste mesmo rio, dificilmente a entrevista com moradores locais surtirá algum efeito. Portanto, a metodologia deverá ser bem elaborada e como todo o projeto, revista constantemente. Ela apontará possíveis erros de direcionamento, que serão corrigidos com o tempo. Cronograma inicial – talvez pareça uma sugestão muito conservadora, mas é importante definir metas e tempos para o desenvolvimento do trabalho. Sem um cronograma, fica muito difícil perceber o que não anda bem, onde estamos nos demorando demais, onde deveríamos gastar mais tempo, dentre outros. É com ele que se tem uma noção elucidativa do futuro desenrolar do projeto.
Outros pontos importantes, por vezes esquecidos, são a correta citação bibliográfica e a observância das normas acadêmicas de produção científica. Pode-se discutir a relevância das mesmas – e isto é um bom projeto de pesquisa – em qualquer outro momento, mas elas existem e é impreterível o cumprimento destas normas. Existem vários autores que têm livros a este respeito, facílimos de serem encontrados em qualquer biblioteca universitária.
Em síntese, todo e qualquer projeto de pesquisa é feito para ser modificado, melhorado ou mesmo abandonado quantas vezes forem necessárias (HISSA-1997). Uma boa pesquisa sempre irá começar por um bom projeto. E este último somente é desenvolvido se houver um esforço pessoal, muitas vezes bem grande, no sentido de trilhar um caminho espinhento, mas instigante, na resolução do problema inicialmente formulado.
BIBLIOGRAFIA
BUENO, S. “Minidicionário da Língua Portuguesa”. São Paulo: FTD, 2000.
HISSA, C.E.V. “A Mobilidade das Fronteiras: Inserções da Geografia na Crise da Modernidade”. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2002
HISSA, C.E.V. “O Projeto de Pesquisa: Valores e Contextos”. Cad. Geografia. Belo Horizonte, V.07, n.º 09, Pp. 39-55 , 1997.
LAKATOS, E.M. & MARCONI, M.A. “Metodologia do Trabalho Científico”. In: HISSA, C.E.V. “O Projeto de Pesquisa: Valores e Contextos”. Cad. Geografia. Belo Horizonte, V.07, n.º 09, Pp. 39-55 , 1997.
NOTAS
(1) Este pequeno artigo foi elaborado principalmente a partir da leitura de Hissa (1997) e das aulas ministradas por este professor, no Instituto de Geociências da UFMG, no primeiro semestre de 2002. VOLTAR
(2) Geógrafo, Mestrando em Geografia Humana – IGC/UFMG – Contato: vlfonseca@hotmail.com VOLTAR
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