GRANDES MESTRES

DA POESIA

 

FLORBELA ESPANCA

Breves referências sobre sua vida: Florbela d’ Alma da Conceição Espanca nasceu em Vila Viçosa - Portugal a 8 de dezembro de 1894, filha de Antonia da Conceição Lobo e de João Maria Espanca. Fruto de amores extraconjugais foi, no entanto, levada para casa do pai onde foi criada. A falta da mãe e a pouca presença do pai serão marcantes em sua vida. É a busca de alguma coisa que complete o seu sentido de viver, que será uma presença constante em toda a sua obra.
Em 08 de dezembro de 1913, Florbela casa-se com um antigo colega do Liceu, Alberto Moutinho. Este casamento no entanto não resulta em continuidade. Em 1917, vai para Lisboa e matricula-se na Faculdade de Direito. Não se sabe até hoje a razão porque Florbela se matricula em Direito apesar de Letras ser a sua vontade tantas vezes expressa.
Em 1921 dá-se um novo casamento, com Antonio Guimarães, um oficial da Guarda Nacional Republicana, que não traz à poetisa a estabilidade afetiva procurada. O amor intensamente buscado não o encontra ainda.
Numa nova tentativa, contrai um terceiro casamento em 15 de outubro de 1925 , com Mário Lage que, no entanto, também não lhe traria a felicidade.
Na sua obra, na poesia, mas especialmente nas Cartas e no Diário do Último Ano, podemos constatar esta incessante procura do amor, a incompreensão, o ideal nunca encontrado, a dor que não se apaga.
O seu apego ao irmão Apeles morto tragicamente num desastre aéreo em 1927 também foi um contributo para que toda a sua angustia se refletisse em grande parte de sua obra. No final desse ano Florbela escreve o livro de contos, Máscaras do Destino e o dedica “ A meu Irmão,ao meu querido morto”

“ A minha vida! que gâchis! - Se eu nem mesmo sei o que quero!” (Diário, 6 Fev.1930).
Ela sempre foi a incompreendida:
“Só se pode ser feliz simplificando, simplificando sempre, arrancando, diminuindo, esmagando, reduzindo; e a inteligência cria em volta de nós um mar imenso de ondas, de espumas, de destroços, no meio do qual somos depois o náufrago que se revolta, que se debate em vão, que não quer desaparecer sem estreitar de encontro ao peito qualquer coisa que anda longe: raio de sol em reflexo de estrelas” (Diário, 23 Jan.1930).
E ela não “simplificou” . E, por isso, na madrugada do dia em que completava 36 anos de idade, abandonou a vida.
“ E não haver gestos novos nem palavras novas” - (Diário, 2 Dez.1930).
Há na vida de Florbela uma data que parece ser tocada pelo destino: Nasce a 8 de dezembro, casa pela primeira vez em 8 de dezembro, suicida-se a 8 de dezembro. E precisamente , 8 de dezembro é o dia de Nossa Senhora da Conceição e foi na Igreja dedicada a Nossa Senhora da Conceição em Vila Viçosa, que Florbela d’ Alma da Conceição Espanca foi batizada.

 

Bibliografia:

Livro de Mágoas – Publicado em 1919
Livro de Soror Saudade – publicado em 1923
Charneca em Flor – publicado em 1931, por iniciativa do prof. Guido Batelli; no mesmo ano saiu uma Segunda edição desta obra seguida dos sonetos de Reliquae; é também por iniciativa de Guido Batelli que serão publicados os poemas de Juvenília;
Cartas, - 1913;
As Máscaras do Destino - 1927
Dominó Negro – Dois livros de contos – 1931

Mais tarde, uma edição de Sonetos inclui os anteriores, Livro de Mágoas, Livros de Soror Saudade, Charneca em Flor e Reliquiae.

A poesia de Florbela tem sido cantada por alguns dos grande intérpretes da canção. Destacam-se Teresa Silva Carvalho e Luís Represas, dos Trovantes, em Portugal. No Brasil, Fagner, cantor e compositor brasileiro musicou seu poema "Fanatismo".
No teatro, algumas obras lhe têm sido dedicadas. Em Portugal, em 1987 foi representado “Bela-Calígula”, e “Florbela” em 1991/1992.
No Brasil, em 1996, com texto de Maria da Luz, e produção de Miguel Falabella, a atriz Zezé Polessa trouxe à cena a personagem que teve uma vida intensa, onde sua poesia caracterizava-se em verdadeiros espasmos d’alma. Em “A Bela do Alentejo” monólogo denso, intercalado com textos de Florbela, fez com que o público respirasse poesia, integrando-se ao seu poço de sofrimentos, onde uma alma feminina, dilacerada, mostra a dor e a emoção em todos os seus poemas.

 

A poesia:

 

Ser Poeta
(Florbela Espanca)

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente...
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

 

O Meu Alentejo


Meio-dia. O sol a prumo cai ardente,
Doirando tudo...Ondeiam nos trigais
D’oiro fulvo, de leve...docemente...
As papoilas sangrentas, sensuais...

Andam asas no ar; as raparigas,
Flores desabrochadas em canteiros,
Mostram, por entre o oiro das espigas,
Os perfis delicados e trigueiros...

Tudo é tranqüilo, e casto, e sonhador...
Olhando esta paisagem que é uma tela
De Deus, eu penso então: Onde há pintor,

Onde há artista de saber profundo,
Que possa imaginar coisa mais bela,
Mais delicada e linda neste mundo?!

 

Nunca Mais!

Ó castos sonhos meus! Ó mágicas visões!
Quimeras cor de sol de fúlgidos lampejos!
Dolentes devaneios! Cetíneas ilusões!
Bocas que foram minhas florescendo beijos!

Vinde beijar-me à fronte ao menos num instante,
Que eu sinta esse calor, esse perfume terno;
Vais a chorar à porta onde outrora o Dante
Deixou toda a esp’rança ao penetrar no inferno!

Vinde sorrir-me ainda! Hei de morrer contente
Cantando uma canção alegremente, doidamente,
À luz desse sorriso, ó fugitivos ais!

Vinde beijar-me a boca ungir-me de saudade
Ó sonhos cor de sol da minha mocidade!
Cala-te lá destino!...
“Ó Nunca, nunca mais...!”

 


Anoitecer

A luz desmaia num fulgor d'aurora,
Diz-nos adeus religiosamente...
E eu que não creio em nada, sou mais crente
Do que em menina, um dia, o fui...outr'ora...

Não sei o que em mim ri, o que em mim chora,
Tenho bênçãos d'amor pra toda a gente!
E a minha alma sombria e penitente
Soluça no infinito desta hora...

Horas tristes que são o meu rosário...
Ó minha cruz de tão pesado lenho!
Ó meu áspero e intérmino Calvário!

E a esta hora tudo em mim revive:
Saudades de saudades que não tenho...
Sonhos que são os sonhos dos que eu tive...

 

Teus Olhos

Olhos do meu Amor! Infantes loiros
Que trazem os meus presos, endoidados!
Neles deixei, um dia, os meus tesoiros:
Meus anéis, minhas rendas, meus brocados.

Neles ficaram meus palácios moiros,
Meus carros de combate, destroçados,
Os meus diamantes, todos os meus oiros
Que trouxe d’Além-Mundos ignorados!

Olhos do meu amor! Fontes...cisternas...
Enigmáticas campas medievais...
Jardins de Espanha...catedrais eternas...

Berço vindo do céu à minha porta...
Ó meu leito de núpcias irreais!...
Meu suntuoso túmulo de morta!...

 


Horas Rubras

Horas profundas, lentas e caladas
Feitas de beijos sensuais e ardentes,
De noites de volúpia, noites quentes
Onde há risos de virgens desmaiadas...

Oiço as olaias rindo desgrenhadas...
Tombam astros em fogo, astros dementes,
E do luar os beijos languescentes
São pedaços de prata p’las estradas...

Os meus lábios são brancos como lagos...
Os meus braços são leves como afagos,
Vestiu-os o luar de sedas puras...

Sou chama e neve branca e misteriosa...
E sou, talvez, na noite voluptuosa,
Ó meu Poeta, o beijo que procuras!



Material cedido por Marilena Gomes Ribeiro

http://www.yanaza.hpg.com.br

 

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