Ministério Público da União
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios

13ª e 14ª Promotorias de Justiça Criminal de Brasília

 

Chessman: um assassinato oficial

narrado por Rogério Schietti Machado Cruz
Promotor de Justiça do MPDFT

Eram 10:12 h do dia dois de maio de 1960: após 9 minutos de sofrimento, trancado em uma câmara de gás, Caryl Chessman, com 38 anos de idade, doze dos quais no Corredor da Morte, encerrava sua agonia, iniciada em 23/1/48, dia em que, após uma perseguição pelas ruas de Los Angeles, foi preso por policiais, sob a acusação de ser o já então famoso "Bandido da Luz Vermelha" (the red light bandit), responsável por roubos e estupros a casais nas colinas que rodeavam Hollywood.

Chessman correspondia à descrição do criminoso, o que, aliado ao seu passado fértil em transgressões à lei, foi suficiente para, em meio à comoção causada pelos crimes de que foi acusado, ser condenado por um Tribunal do Júri em que, dos doze jurados, onze eram mulheres.

Negando qualquer responsabilidade pelos crimes que lhe foram imputados, Chessman foi recolhido à cela nº 2455, da Penitenciária de San Quentin, de onde iniciou uma prolongada cruzada na tentativa de sensibilizar autoridades e a opinião pública quanto à sua inocência, única forma encontrada para evitar a execução da pena capital a que fora condenado.

Interpôs dezenas de recursos e petições a tribunais da Califórnia e à Corte Suprema dos EUA, logrando adiar, por 7 vezes, a data marcada para sua execução.

A sua obstinada luta pela vida espalhou-se por todo o mundo, vindo ecoar no Brasil, onde inúmeras personalidades se empenharam na tentativa de salvar Chessman do gás letal.

Um dos mais ferrenhos defensores dessa causa foi NELSON HUNGRIA, então Ministro do Supremo Tribunal Federal. Através de correspondências ao Governador da Califórnia, entrevistas a jornais e periódicos, palestras etc, HUNGRIA empenhou toda sua inteligência e prestígio de criminalista de escol à fileira dos que clamavam pela preservação da vida de Chessman.

Memorável a conferência do saudoso penalista, pronunciada no Centro Acadêmico XI de Agosto, em maio de 1959, quando disse:

De fato, foi incomum a peregrinação de Chessman. Portador apenas de curso primário, os milhares de livros lidos lhe renderam um conhecimento profundo da criminologia e do sistema penitenciário americano. Tornou-se poliglota (aprendeu a língua portuguesa em poucos meses), e, mesmo com punições disciplinares partidas da direção do presídio, que via suas feridas expostas ao mundo, publicou 4 livros, um dos quais ("2455 - Cela da Morte") tornou-se best seller no Brasil.

Nada, porém, se compara ao seu derradeiro escrito, "um documento para a posteridade" na expressão de RENÉ ARIEL DOTTI ("Chessman: crônica de uma morte anunciada" in Revista Brasileira de Ciências Criminais", RT, nº 20 - out/dez/97, de onde se extraíram as informações para este texto) a carta manuscrita por Chessman horas antes de sua morte e endereçada a um repórter do jornal San Francisco Examiner. Publicada na edição do dia seguinte à execução de Chessman, a carta-testamento se firmou como um dos mais vigorosos libelos contra a pena de morte.

Ei-la: