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Em: 25-NOV-1999

A última exigência da Junta

Militares guineenses chegam a um acordo com políticos para acabarem com as inexplicáveis mordomias dos ex-governantes

Luís Naves em Bissau

Os ministros do Governo guineense subiram ontem à base aérea de Bissalanca com um mau pressentimento, julgando que iam ouvir severas críticas do general Ansumane Mané, ao mesmo tempo que iriam conhecer os exactos termos do pacto de regime que a Junta Militar quer impor nas vésperas de eleições legislativas e presidenciais. Mas nenhuma das duas coisas sucedeu, na manhã quente e quieta. A reunião durou duas horas e terminou num ambiente distendido.

Houve distribuição de elogios e nenhum indício sobre o futuro desenho das instituições da Guiné-Bissau. O Executivo, que termina o seu mandato dentro de três dias, recebia afinal a despedida de uma entidade que, por sua vez, também desaparece com as eleições. O pacto, aprovado pelo comando supremo da Junta Militar, visa regular a transição de poder após as eleições, mantendo os militares na cena política.

Os detalhes foram aqui divulgados à tarde pela Agência Lusa. A Junta Militar será dissolvida, surgindo um conselho consultivo onde participam dez militares, bem como o Presidente da República, primeiro-ministro, alguns ministros e representantes dos partidos com assento parlamentar. Este órgão terá duração de dez anos e será apresentado aos partidos políticos no sábado, na véspera das eleições. Em resumo, um quadro muito mais suave que o da Magna Carta que circulou na semana passada.

Ontem de manhã, os ministros chegaram preocupados à base aérea porque sabiam que no dia anterior - quando o comando supremo discutiu internamente o pacto - o primeiro-ministro Francisco Fadul tinha sido acusado, em termos muito duros, de não resolver os problemas do país, falhando todas as promessas.

O governante, que também é membro da Junta Militar, defendeu-se com veemência, recordando que faltara financiamento internacional para regularizar o problema dos antigos combatentes e que tinha aprovado legislação sobre outras matérias, dando credibilidade exterior ao regime transitório. A defesa de Fadul terá suavizado os militares. Em substituição do pacto, o tema da reunião era a última exigência da Junta: o fim das mordomias.

Na Guiné-Bissau, há 132 secretários de Estado que recebem salário vitalício, com direito a carro e casa. Uma vez no Poder, a mordomia serve para toda a vida. Além disso, muitos políticos ficaram com casas do Estado e, segundo um actual governante, "muitos destes ex-ministros ganham mais do que aqueles em funções". Toda esta situação resulta de uma lei que terá de ser revogada pela Assembleia Nacional nos próximos dias.

Foi, por isso, com surpresa e alívio, que o Governo, comparecendo em peso na base aérea, percebeu ser este o tema da convocação: "Acabem com isso." "Se os antigos ministros deixam funções, porque continuam a receber?", perguntava no final da reunião o comandante Lamine Sanhá, um dos altos dirigentes da Junta. Por seu lado, Francisco Fadul explicou que "estes direitos e regalias constituem um peso enorme no tesouro".

O Governo, adiantou, já tem pronto um diploma que modifica este regime e quer identificar com precisão o património que foi alienado. Em relação ao pacto, Fadul disse tratar-se de um documento que discute "preocupações de ordem moral e ética". Questionado sobre a negociação de um texto desta importância na véspera de eleições, o primeiro-ministro referiu que "todas as alturas são boas quando os resultados são bons".

A reunião de ontem serviu para apaziguar de alguma forma uma situação que parecia tornar-se de dia para dia mais instável. A Magna Carta, que foi conhecida na semana passada, causando profunda indignação entre os políticos reformistas, era um texto que poria na prática o Poder em mãos militares.

A confirmar-se a intenção do comando supremo da Junta de suavizar o documento, há muito mais probabilidades de os partidos aceitarem a partilha de poder, circunstância em que o processo guineense passa a ser uma curiosidade política nesta região de África. Serão respeitados os vencedores da revolta militar e os vencedores do sufrágio universal. E desenha-se uma hipótese de futuro para este país.

MAI guineense avança garantias de transparência

O ministro da Administração Interna garantiu que o Governo guineense está empenhado em que as eleições de 28 de Novembro sejam "um processo-modelo", assentes na "transparência, na liberdade e na justeza dos resultados".

Caetano Intchama, que tem sob a sua tutela as forças da ordem pública, salientou à Lusa o "civismo e a tranquilidade" com que tem decorrido a campanha eleitoral no país, enaltecendo a postura dos militares face ao processo eleitoral, ao demonstrarem "cumprir a promessa de não quererem o Poder".

"Todos os candidatos estão a gozar da mesma protecção e igualdade de tratamento", disse o ministro guineense, contrapondo com o que se passou nas eleições de 1994.

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