Ensino Prático da Homeopatia Veterinária

Fórum de Saúde Pública

XXVIII Congresso Brasileiro de Homeopatia, 05 de setembro de 2006, Florianópolis - SC.

Elias Carlos Zoby

Num futuro próximo a Homeopatia brasileira terá de vencer dois grandes desafios institucionais: profissionalização docente e formação prática discente.

Essas duas questões andam lado a lado nos problemas e soluções. Uma via de pista dupla.

Após o golpe militar de 1964 a classe dos professores foi drasticamente prejudicada em sua formação, remuneração e liberdade de expressão. Só a última já foi restaurada.

Parece ter sido instaurada uma ideologia dominante de que é possível formar bons profissionais sem bons professores. Esta falsa premissa, não explicitada, e até negada, se reflete hoje em todos os níveis e áreas do conhecimento, inclusive na Homeopatia.

- É possível formar alunato sem formar professorado?

- Quem somos nós, professores de Homeopatia?

- Quem nos diplomou "professores"?

Essa questão da creditação pode ser solucionada pelas associações nacionais das classes envolvidas.

É necessária a profissionalização docente homeopática. Só assim poderá existir o comprometimento com a formação discente, com o resultado do ensino. Nosso "professor" ensina por diletantismo, quase por "caridade". Como pode ser esperado que o clínico, já tão pressionado pelas demandas sociais, se interesse e pague por cursos de magistério se ele não terá retorno. Sua profissão é a clínica, dela ganha a vida.

É necessário preparar docentes.

Uma sugestão é que após o curso de formação ele passe por períodos de monitoria e apresentação de seminários remunerados; que a escola ofereça e cobre freqüência a cursos e palestras extracurriculares (Homeopatia, línguas, didática); exigência de publicação científica e apresentação de temas livres em congressos homeopáticos; seja estimulada e exigida titulação de especialista num curto prazo.

- Por que a especialização, se o normal é o mestrado para o ensino?

- Porque Homeopatia é prática de clínica geral, não existe sem o fenômeno clínico.

Mestrado e doutorado virão em etapas posteriores.

Vamos aos cursos

Iniciei a estudar Homeopatia há 21 anos. Num curso médico, que abria exceção e aceitava veterinários. Aulas expositivas ilustradas por casos humanos. Nossos ambulatórios eram com pacientes humanos, nas provas analisávamos e respondíamos casos clínicos... humanos. E essa era a praxe país a fora.

Depois... os mesmos cursos colocaram veterinários em seu corpo docente. Aulas práticas em seus consultórios particulares. Grande passo! Óbvio e indispensável. Resultado: alunos de segundo ano atuando de uma forma que eu só tínha alcançado após vários anos de tatear no escuro.

E parou!

Um consultório, ou clínica particular, não está preparado para servir como local de ensino para um Curso de Formação em Homeopatia.

Em 2000 o CFMV habilitou a AMVHB a conceder títulos de especialização em Homeopatia (Res. 662).

Em 2006 a AMVHB ainda luta para que as escolas sigam padrões curriculares mínimos, tanto em conteúdo quanto em carga horária. As dificuldades vão desde as susceptibilidades pessoais dos dirigentes que acham que "seu" curso é bom e suficiente, mesmo que não tenha o mínimo exigido; à silenciosa recusa em ensinar os clássicos da filosofia homeopática enquanto mantêm o currículo no papel; passando pela deficiência de aulas práticas, da absoluta à parcial; e tentativa de dar formação pela internet. Nada contra a suplementação à distância, mas a formação tem de ser presencial, requer o contato direto entre o mestre e o aluno, a troca de experiências entre os colegas de turma que vivenciam dificuldades semelhantes, ao lado dos doentes.

Por que tantos colegas fazem os cursos e não praticam Homeopatia, não se profissionalizam?

Com o "boom" da Homeopatia nos anos de 1970-90 os consultórios médicos viviam cheios de pacientes crônicos. E os cursos refletiam isso.

Houve aumento do número de cursos mesmo quando a fase áurea já se acabava (1990...). Isso levou a um ciclo vicioso:

causando o fechamento de vários deles.

Demanda veterinária

O iniciante é chamado a atender casos agudos, graves ou não. De insuficiência respiratória a dermatite úmida aguda. E a urgência é a tônica em grande parte das clínicas veterinárias, mesmo antigas.

Entretanto insistimos no ensino quase exclusivo sobre casos crônicos, preferentemente cães e gatos.

A falta de prática leva à pouca segurança até sobre os postulados doutrinários da Homeopatia.

É imprescindível que o curso dê embasamento para praticar a boa Homeopatia, tirando da urgência e continuando o tratamento para o § 9 do Organon - "os mais altos fins". É possível ser feito usando só Homeopatia.

Destreza sine qua non para o iniciante

Competências mínimas para alguém ser chamado homeopata iniciante.

- Atender casos "comuns", agudos e crônicos, sem recorrer à alopatia.

- Ter e ler: Organon e Doenças Crônicas, Filosofia e Repertório de Kent, Encyclopedia de Allen; algumas matérias médicas condensadas e clínicas, como as de Boericke ou Nilo Cairo e Farrington ou Kent.

- Saber primeira e segunda prescrições; observações prognósticas; diferenciar tipos de agravações x patogenesias, cura clínica x cura homeopática x supressão.

- Usar associadamente matéria médica e repertório.

- Conhecer gênio e sintomas gerais importantes de todos os policrestos, e medicamentos menores de importância veterinária para casos agudos.

- Conhecer as doenças e seus similares, gênio epizoótico.

Sugestões aos cursos

1) Que sigam a nota ao parágrafo 271 do Organon, escrita há quase 200 anos: "Até que o Estado, algum dia, após haver alcançado a compreensão da indispensabilidade de medicamentos homeopáticos perfeitamente preparados, faça-os preparar por uma pessoa competente e imparcial, a fim de fornecê-los a médicos homeopatas especializados em curar e examinados praticamente, bem como teoricamente e assim legitimados, em hospitais homeopáticos, de modo que os médicos, não somente se convençam desses instrumentos divinos de curar mas também passem a distribui-los gratuitamente aos seus doentes (ricos e pobres)." (Grifo meu.)

2) Formação integral. Conhecimento doutrinário. Autopatogenesias: 1º e 2º anos. Patogenesias com animais: 2º e 3º anos. Práticas, práticas, práticas... em grandes e pequenos animais. Do crônico aos prontos-socorros e UTIs.

Estrutura Mínima de Clínica-Escola

- Consultório com biblioteca à mão (MMPs, MMCs, repertórios diferentes, doutrina), telefone, computador, medicamentos.

- Internação de animais.

- Plantonistas alunos, com professor de sobreaviso.

- Copa / cozinha, servente.

Quando tivermos essas necessidades atendidas, de docentes, curriculares e estrutura para ensino prático, olharemos então para trás e diremos uns para os outros, após um longo suspiro: Que salto!

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