Richard Stallman sobre UnitedLinux e Software Livre (Richard Stallman on UnitedLinux and Free Software) |
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Richard M. Stallman é o fundador do movimento Software Livre que criou a base para o sistema operacional GNU/Linux. Desde que fundou o projeto em 1984, Stallman, conhecido pela comunidade como RMS, tem utilizado seu tempo programando e promovendo o software livre com a esperança de eliminar completamente a necessidade de softwares não-livres.
RMS concordou gentilmente em ser entrevistado por Timothy Butler da OfB. Você pode encontrar a entrevista, em sua íntegra, abaixo.
Open for Business: Você poderia dar aos seus leitores um breve resumo do que é Software Livre [Free Software] como e qual sua relação com Software de Código Aberto [Open Source Software]?
Richard M. Stallman: Software livre é o nome de uma categoria de software; também é o nome de um movimento.
O “livre” em “software livre” refere-se à liberdade, e não preço [“free” em inglês pode significar ambos]. Um programa é livre se os usuários possuem algumas liberdades básicas ao usá-lo. Você deve ter a liberdade de executá-lo conforme sua vontade, a liberdade de estudar o código fonte e modificá-lo para que ele satisfaça suas necessidades, a liberdade para redistribuir cópias para outras pessoas e a liberdade para divulgar uma versão melhorada. A liberdade de vender cópias também está incluída. Se um programa permite aos usuários estas liberdades, ele é software livre.
No Movimento do Software Livre, desde 1984, nós objetivamos dar aos usuários de computador estas liberdades. Criticamos software não-livre como antiético por pisar na liberdade dos usuários, e queremos substituir o sistema anti-social de software não-livre com o sistema social do software livre. Desenvolvemos um sistema operacional livre, o GNU, para tornar possível utilizar um computador sem aceitar software não-livre. Agora queremos um conjunto completo de aplicativos para usar com o GNU.
O critério delas pelo qual definem código aberto é muito similar à nossa definição de software livre, mas não é idêntico. Se você sabe que um programa é código aberto, as chances são que ele também seja também software livre, mas não é uma certeza.
OfB: Algumas pessoas sugeriram que tanto Código Aberto
quando Software Livre são termos confusos em seu significado
exato, e um termo mais específico como “Software Libre” é
preferível. A Free Software Foundation (FSF) já considerou
alguma vez utilizar um termo que possui menos chance de duplo sentido?
RMS: Nós consideramos, mas todas as alternativas disponíveis em inglês têm seus problemas e nenhuma delas seria boa. Em outras línguas, quando existe uma palavra que significa liberdade de forma não ambígua, nós a utilizamos.
OfB: Quais são algumas das vantagens do Software Livre para empresas?
RMS: Software livre significa que você controla o que o seu computador faz. Software não-livre significa que alguma outra pessoa faz isso, e de certa forma controla você. Software não-livre mantém os usuários divididos e individualmente sem saída; software livre dá poder aos usuários. Todas estas razões aplicam-se tanto para usuários de negócios como para indivíduos.
Para um negócio, há a vantagem adicional que o suporte para um software livre vem de um mercado livre. Suporte para um programa proprietário é normalmente um monopólio, pois só a companhia que é dona do programa pode mudá-lo tanto para corrigir um erro ou adicionar nova funcionalidade. Se você está pretendendo pagar por suporte, você normalmente terá um melhor suporte pelo seu dinheiro quando você usa software livre.
OfB: A Iniciativa do Código Aberto recebe mais publicidade
relacionada à promoção do Código Aberto e
Software Livre na empresa do que a FSF. Você vê a FSF tendo
um papel mais visível promovendo o Software Livre ao
nível empresarial no futuro?
RMS: O Movimento do Código Aberto tem mais atenção da imprensa porque nosso trabalho é freqüentemente nomeado com o slogan deles; isto tem o efeito de dá-los o crédito pelo nosso trabalho. Em 1999, muitas pessoas achavam que o Movimento do Código Aberto tinha absorvido ou substituído o Movimento do Software Livre; hoje em dia elas normalmente pensam que nós estávamos trabalhando junto com o Movimento do Código Aberto o tempo todo. Em fevereiro passado, a [revista] New Scientist disse até mesmo que eu o fundei. Espero que esta entrevista ajude a corrigir esta informação incorreta.
O Movimento do Código aberto concentra sua atenção em empresas. No Movimento do Software Livre, nós intencionalmente nos concentramos em indivíduos. Uma razão é que parece mais urgente libertar indivíduos do que empresas; indivíduos são realmente pessoas, enquanto corporações são somente tratadas como pessoas. Outra razão é que pensamos que indivíduos têm mais chances de juntar-se a nós para defender a liberdade. Entretanto, empresas deveriam ter as mesmas liberdades que os usuários ao usar software. Toda a empresa que usa o GNU/Linux está beneficiando-se das liberdades que nós trabalhamos para dar a ela.
OfB: Por falar em computação empresarial, em um
artigo escrito na última semana, você comparou a
licença do novo grupo UnitedLinux à do Windows no sentido
que ela restringe a liberdade do usuário. Você gostaria de
explicar um pouco mais este assunto?
RMS: Nós desenvolvemos o sistema operacional GNU, um substituto compatível do Unix, para que os usuários fosse livres para compartilhá-lo e modificá-lo. Unix não era software livre; ele estava disponível sob licenças restritivas. Não era incomum ele ser licenciado por computador, ou mesmo pelo número de usuários que poderiam logar nele.
Em 1991, a última lacuna no GNU era o kernel; então Linus Torvalds escreveu um kernel gratuito, Linux, e disponibilizou-o sob a Licença Pública Geral GNU. Adicionar o Linux ao GNU produziu um sistema operacional livre, o sistema GNU/Linux. (Muitos usuários acreditam que o sistema todo é Linux, e as companhias que produzem pacotes do sistema divulgam este erro.)
Conforme o GNU/Linux foi tornando-se popular, desenvolveu uma reputação de um sistema poderoso e confiável. Milhares e depois milhões de usuários o adotaram, algumas vezes somente pelo seu benefício prático, sem preocuparem-se com a liberdade que ele os dava. Companhias começaram a criar pacotes e redistribuir o GNU/Linux, o que era bom; mas elas também começaram a adicionar ao sistema software que não era livre, o que prejudica o seu propósito. Hoje em dia todos os criadores de pacotes comerciais do GNU/Linux adicionam software não-livre. Muitos deles – com a notável exceção do Red Hat e Mandrake – desenvolvem software não-livre para incluir ao GNU/Linux. A Caldera tem sido um dos piores agressores. Ainda é possível obter uma versão completamente livre do GNU/Linux, mas você precisa saber aonde procurar e precisa pensar sobre o que você está fazendo.
O “UnitedLinux” leva este retrocesso um passo adiante com o seu licenciamento “por usuário”. Usuários desta distribuição estarão tão restritos quanto se fossem usuários do Unix ou Windows.
De fato, a Caldera não pode aplicar esta licença restritiva a todo o sistema. A maioria dos programas está licenciada sob a Licença Pública Geral GNU, que protege a liberdade de cada usuário e torna ilegal incluir qualquer restrição. Acredito que a Caldera saiba bem como tentar impor uma “licença por usuário” nestes programas. Entretanto, algumas partes do sistema, embora normalmente disponíveis como software livre, possuem licenças frouxas que permitem que intermediários imponham suas próprias restrições. A Caldera poderá usar estes pontos de vulnerabilidade. Ela também pode adicionar programas não-livres ao sistema. Mesmo que muito do sistema permaneça software livre no sentido legal, na prática os usuários provavelmente acharão que ele não é.
Muitas pessoas chamam o sistema todo como “Linux” porque eles não sabem que isso é um erro; elas estão seguindo outras que estão desinformadas. No caso da Caldera, eu acho que este erro é intencional. Usuários que sabem que o sistema oferecido a eles com uma “licença por usuário” é na verdade uma versão do GNU, e que nós o desenvolvemos para que eles pudessem ter liberdade, podem questionar se a Caldera realmente os estão tratando apropriadamente. Eles podem começar a valorizar a sua própria liberdade e a rejeitar o sistema perverso que não é nem unido nem Linux. A Caldera provavelmente acha mais seguro ensinar aos usuários que o sistema é Linux e que ele foi desenvolvido por um apolítico estudante do colegial “só para se divertir”.
OfB: A FSF está fazendo algum lobby para este grupo para
que mudem para um esquema de licenciamento de Software Livre?
RMS: Eu não vejo nenhuma função em tentar convencê-los; eles certamente sabem que caminho tomaram, e espero que imaginem o que nós diríamos a respeito disso.
Nós iremos continuar a ensinar para o público sobre a importância da liberdade de compartilhar e mudar o software, e iremos citá-los como um exemplo do caminho errado. Usuários que entendem o que eles fizeram e que valorizam a liberdade irão escolher outra versão do GNU/Linux.
OfB: Com o recente lançamento do KDE 3.0 e também com a aproximação do lançamento do GNOME 2.0, quais são suas idéias sobre o quanto preparado estão os desktops KGX (Kde/Gnu/LinuX) e GNOME/GNU/Linux para uso normal em empresas? Você os vê como um competidor à altura do Windows em um futuro próximo?
RMS: Eu não posso prever o futuro. Eu só posso dizer que nós solicitamos a sua ajuda, seja com dinheiro ou trabalho, para que o GNOME, o desktop GNU, possa fazer um progresso mais rápido.
OfB: Agora que já se passaram quase duas décadas
desde o seu GNU announcement original, o GNU está onde
você pensou que estaria?
Nem um pouco. No início eu não esperava que o sistema GNU estivesse rodando em cinco anos. Eu não esperava que o GNU fosse alcançar grande popularidade entre pessoas que não estavam interessadas em liberdade, nem que elas pensariam que ele era algo diferente de GNU e desenvolvido por outra pessoa.
Também não esperava que um movimento rival que rejeita a liberdade dos usuários como um imperativo ético e preocupa-se principalmente com empresas iria tentar cooperar com nosso trabalho – mas pensando bem acho que uma pessoa politicamente mais experiente poderia ter previsto isto.
OfB: Onde você vê o GNU nos próximos vinte
anos? Você vê o kernel do Linux permanecendo uma parte
crítica do sistema GNU?
RMS:
Eu não posso dizer o que acontecerá no futuro, porque isso
depende de escolhas que você irá fazer. A liberdade dos
usuários pode triunfar se você decidir lutar por isso.
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Traduzido por Erik Kohler. <ekohler
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