Capítulo 7: Conselho dos Nove

            Frustração acumulava-se dentro de Lethe, consumindo-a como uma doença. Ela nunca admitiria isso para alguém, é claro, mas era verdade.
            Seus aposentos, felizmente, não foram tocados pelo poder de Jupiter Dragon. Não que a destruição do quarto teria feito muita diferença. Sono não veio naquela noite, sempre dançando fora do alcance da ex-Senshi. Ela não sabia se era por preocupação ou alegria.
            Uma parte distante da sua mente perguntou por que ela deveria sentir alegria, mas Lethe trancou-a com uma prática inacreditável. Uma pessoa tende a adquirir prática nas coisas que faz muito.
            O seu quarto era simples, talvez simples demais para alguém que comandava um exército inteiro. Um universo inteiro. Uma mesa ocupava um dos cantos do lugar, com uma cadeira confortável, e uma cama ocupava o canto oposto. Um baú em um terceiro canto, oposto à porta, era onde ela guardava sua possessões. Não que ela tivesse muitas. Bens materiais sempre pareceram vazios para Lethe, mesmo antes dela se tornar Lethe. Uma das poucas coisas que se mantiveram constantes durante toda sua vida. Ela mesma costumava ser constante, mas não era mais. Ser contante era tedioso, e Lethe não tinha mais a paciência que tivera antes. Como alguém podia ser paciente com o mundo todo não sendo?
            Uma risada nasceu da sua boca, e ela não tentou contê-la. Pluto continha suas risadas. Lethe ria sempre que podia. Pluto era uma tola. Ela nunca Viu tudo. Nunca se permitiu Ver tudo. Talvez ela soubesse o que aconteceria se ela o fizesse, e tenha tentado evitar. Definitivamente isso. Lethe tinha uma lembrança vaga, muito antiga, de Ver a si própria como Lethe. Ela ficara horrorizada na época. Ou melhor, Pluto ficara. Na verdade, a Guardiã do Tempo recordou-se, essa foi a primeira coisa que ela Viu. Antes de ser Pluto, antes de ser Lethe. Quando ela era apenas a filha mimada de uma família nobre.
            Ela parou de rir, simplesmente porque a vontade de rir passou. Ela se recusava a exercer qualquer controle sobre si mesma. Controle era uma fantasia das pessoas, irreal. O Tempo não era controlado, e nada era mais antigo que o próprio Tempo. Se Ele não era controlado, controle não era bom.
            Lethe franziu a testa. Mesmo assim, ela não gostava quando os eventos não rumavam na direção que ela queria. Como, por exemplo, a fuga dos Dragon Kishi. Ela não fora surpreendida daquele jeito desde a última vez que conversou com Dark Angel.
            Seu bom humor destruído, Lethe se levantou da sua cadeira, e caminhou até o seu baú. Se ajoelhando ao lado dele, ela tocou o cadeado que mantinha a tampa fechada. A tranca abriu-se, e a ex-Senshi sorriu para si mesma. Qualquer um que tentasse mexer nas suas coisas tentaria abrir o cadeado usando-se de métodos físicos, sem perceber que ele abriria apenas sob o toque de sua dona.
            O interior do baú estava bagunçado. As roupas estavam emboladas e amassadas. Os livros que Lethe trouxera estavam abertos e com páginas rasgadas. Ignorando a falta de ordem, ela enfiou a mão dentro do baú, procurando por um objeto em particular. Após alguns segundos de busca, ela tirou uma pequena caixa de madeira de dentro.
            Cuidadosamente colocando-a no chão na sua frente, Lethe abriu-a, colocando a tampa ao lado da caixa.
            Um espelho servia como segunda tampa, e Lethe sabia porque. Foi uma medida de segurança que ela... Não, Pluto colocou na caixa, para impedir que Lethe utilizasse do que se encontrava no interior.
            Lethe chegou a tentar evitar que seus olhos fixassem-se nos olhos da
imagem no espelho. Ela, é claro, não conseguiu. O espelho não poderia ser movido por alguém que não confrontasse seu próprio reflexo, e isso valia para ela, também.
            Os olhos na imagem eram loucos, desesperados. Uma mão fria pareceu apertar o coração de Lethe, e ela quase largou o espelho e fugiu. Por mais que ela tentasse, porém, ela não conseguia desviar seu olhar.
            Então, com um grito, Lethe virou seu rosto para o lado, tremendo. Apalpando o chão ao redor da caixa desesperadamente, ela pegou a tampa de madeira e colocou sobre o espelho, finalmente escondendo-o do resto do mundo.
            Suspirando aliviada, Lethe pegou a caixa e colocou dentro do seu baú. Ela já tentara abrir a caixa onze vezes antes, e falhou em todas suas tentativas. Pluto realmente foi inteligente ao colocar o Espelho lá. E corajosa. Lethe duvidava que Pluto pudesse abrir a caixa, pudesse encarar sua imagem.
            Soltando outro suspiro, a Guardiã do Tempo se levantou, fechando seu baú, e colocando o cadeado no lugar. Caminhando até a porta, Lethe saiu do quarto, pensando em como podia encontrar os quatro Dragon Kishi que fugiram.

            ****

            Os olhos de Ken abriram-se ao som de alguém chamando-o. A voz era baixa e fria, sem emoção alguma. Ao mesmo tempo, era familiar o suficiente para que o Dragon Kishi da Terra não atacasse a pessoa que acordou-o por instinto.
            - Ken. Acorde. - Ryu falou pela terceira vez. Vendo os olhos verdes de Ken finalmente abrirem-se, o líder dos Dragon Kishi continuou. - Temos que continuar andando. Não podemos ficar parados por muito tempo.
            Soltando um leve gemido, Ken se levantou, fazendo uma careta quando os seus ossos estalaram com o movimento. Ele soltou um olhar de desgosto na direção da parede onde ele se encostara para dormir, depois olhou ao redor. A falta de luz não o surpreendeu. Eles estavam, afinal, num túnel que estava quase completamente isolado do resto do mundo, e dezenas de metros abaixo das ruas de Tóquio.
            Ele esfregou seu cabelo curto enquanto examinava os seus arredores, instintivamente fazendo um reconhecimento do lugar onde estava. Ryu escolhera um lugar sem lâmpadas para passar a noite, e a escuridão era quase opressiva. O túnel em si não era nada especial, sendo exatamente igual ao que era alguns quilômetros antes.
            A mão direita de Ken finalmente alcançou sua nuca, procurando pelo rabo-
de-cavalo que estivera lá alguns dias antes. Não pela primeira vez, Ken se perguntou se Ami ia gostar do novo visual dele. O sorriso momentâneo que o pensamento trouxe desapareceu quando o Kishi se lembrou da situação atual dele e dos outros três Inner Dragon Kishi que restaram do time.
            - Como está Kyoko? - ele perguntou, finalmente caminhando na direção de Ryu, que estava acordando Akai.
            - Dormindo. - foi a resposta. - O sangramento dela parou com as ataduras que nós fizemos ontem, mas ela não vai aguentar muito tempo.
            Ken fez que sim. Ele vagamente se lembrava de fazer alguns curativos improvisados nos ferimentos da loira. Sem tratamento especializado, porém, ele duvidava que Kyoko sobrevivesse muito tempo. E mesmo se eles conseguissem tirá-
la do Japão e levá-la para um hospital, era improvável que ela conseguisse mexer as pernas e o braço esquerdo novamente. Os torturadores haviam mantido um tratamento quase que constante de eletricidade nos três membros, segundo Akai. E eles tinham se dado ao trabalho de inserir eletrodos em boa parte dos nervos terminais de Kyoko... Talvez até em todos. Algo que precisava de muito tempo e uma paciência quase sobrenatural... O Kishi tentou imaginar o que mais eles poderiam ter feito se Minako e Ship não tivessem feito o que fizeram.
            - Vamos. - Ryu chamou, com Kyoko em seus braços. A loira ainda dormia, o que era bom. Ken duvidava que ela tivesse dormido o suficiente nos últimos dias, tanto por ter sido torturada quanto por ter que aguentar a dor que devia ter acompanhado-a no tempo entre as sessões.
            Sem falar nada, Akai seguiu o Kishi da Lua. Ken suspirou, se lembrando de mais um dos inúmeros problemas que eles enfrentavam. Kano Akai não falara uma palavra sequer desde que eles entraram nos esgotos. Mesmo suspeitando que essa fosse uma reação natural, Ken sabia que eles não tinham como lidar com isso no momento. Além disso, ele nunca se incomodou a fazer pesquisas profundas de psicologia, e não podia ter certeza se a reação ERA natural. Por mais que ele e Ami costumassem parecer saber de tudo para os outros, ambos sabiam suas forças e fraquezas. Ami tinha um domínio admirável sobre biologia, psicologia, geografia e geometria, enquanto Ken era melhor em física, química, história e álgebra.
            Xingando a si mesmo, ele tentou afastar a imagem de uma garota com olhos e cabelos azuis da sua mente, forçando-se a concentrar-se em planos para escapar do Japão. Estava claro para ele que o Ginzuishou teria que ser recuperado durante uma missão mais organizada.
            - Ryu? - ele chamou.
            Sem responder, Ryu parou de andar, esperando que Ken estivesse ao seu lado para começar a caminhar novamente. Akai não hesitou nem olhou para os lados, mantendo seu passo constante. Ryu virou seus olhos vermelhos para Ken, silenciosamente questionando.
            - Como nós vamos sair do Japão? - Ken perguntou.
            - Nós não vamos. - Ryu respondeu, com uma voz desprovida de qualquer sentimento. - Não ainda. O Ginzuishou tem que ser recuperado.
            Ken piscou:
            - Mas... E Kyoko?
            Ryu olhou para a loira em seus braços, depois para Ken:
            - Se conseguirmos arranjar um jeito de mandá-la junto com você e Akai de volta, o faremos. Eu vou recuperar o Ginzuishou.
            Ken sabia que essa era sua grande oportunidade. Ele podia se oferecer para acompanhar Kyoko de volta para a civilização, provavelmente junto com Akai. Eles com certeza encontrariam um barco ou um avião que estivesse em condições de sair do Japão. Mesmo assim, Ken hesitou. Ele podia se lembrar da primeira vez que encontrou Ryu, quando um grupo de garotos mais velhos que ele ameaçaram-no no orfanato. O pequeno artista marcial havia se colocado entre ele e os garotos, e ordenado que os atacantes fossem embora. A voz dele já tinha aquele tom ameaçador, um tom que Ryu nunca pareceu perceber ter. Quando os garotos se recusaram a recuar, Ryu derrotou os três. Oh, ele tinha ficado com um olho roxo e um ombro deslocado, mas bateu muito mais que apanhou.
            - Eu vou ficar. - Ken falou, sabendo que Ryu precisava de sua ajuda. O kalyriano nunca admitiria, mas ele precisava. - E eu acho que elas concordarão comigo.
            Fazendo que sim, Ryu mudou a posição de Kyoko sutilmente, fazendo que a cabeça dela balançasse menos com o seu andar. Sem falar mais nada, ele apressou seu passo, até retomar a posição que estivera originalmente, voltando a caminhar no mesmo ritmo que Ken e Akai.
            Ken suspirou, e enfiou suas mãos no que restaram dos seus bolsos. Seu cérebro aparentemente decidiu que era hora de lembrá-lo dos últimos dias, jogando imagens de Ship explodindo em energia, de Mamoru morrendo. Ele imaginou como a morte de Kitty foi, e soltou outro suspiro. Ele sempre soube, desde o dia que aceitou se tornar um Dragon Kishi, que o grupo encontraria seu fim de um jeito sangrento. Ele, ou melhor, Whisper, Silver e os outros sempre foram diferentes dos seus antecessores. Eles aprenderam mais rápido que as expectativas, como se pudessem prever que seriam alguns dos poucos que se recordariam do Milênio de Prata. Eles enfrentaram mais ameaças que a maioria das gerações anteriores de Dragon Kishi, passaram por mais que muitos heróis de livros de aventura.
            Agora, dois deles haviam morrido.
            Ken esfregou seus olhos, e não ficou surpreso ao encontrar lágrimas lá. O Dragon Kishi não fez esforço algum para segurá-las. Ele podia se dar ao luxo de chorar pelos seus companheiros mortos na presença de amigos. Ele não podia mostrar-se vulnerável para seus inimigos, mas se Ken não podia mostrar seus verdadeiros sentimentos na frente dos seus melhores amigos, quando ele os mostraria?
            Ele não notou que Ryu estava observando-o. Por um breve momento, emoções inundaram os olhos vermelhos do kalyriano, mas logo eles voltaram a ser duas
poças de sangue, inexpressivos, insensíveis.

            ****

            A sala de jantar do "Gin no Umi" estava escura. As cortinas estavam fechadas, impedindo a entrada de luz, e a porta, trancada. Estava longe de ser o local mais privado do mundo, mas, considerando o que ela tinha em mãos, Usagi acreditava que era o melhor que ela conseguiriria.
            Claro, preparar o ambiente para uma reunião séria era relativamente fácil. Era apenas necessário uma mesa grande o suficiente para todos os envolvidos sentarem e uma sala que impedisse que as discussões feitas em seu interior fossem presenciadas por pessoas que não deviam presenciá-las. Considerando o respeito que os poucos que as Senshi e os Outer Kishi trouxeram consigo no navio, uma segurança avançada não era necessária.
            Agora, Usagi enfrentava outro problema.
            Os presentes estavam discutindo. E não era uma discussão amigável. Usagi podia parecer estúpida, até mesmo agir como tal, mas ela não era. Todas as reuniões das Senshi e associados só funcionavam porque sempre havia alguém com mais força de vontade que os outros. Ou talvez fosse simplesmente a presença mais imponente. Naquele momento, sinceramente, não importava. Quando o grupo todo se reunia, Ryu ou Setsuna conduziam a reunião. Sem os Dragon Kishi por perto, Setsuna assumia a posição de guia e moderadora. Quando Setsuna não participava das reuniões, as outras Outer Senshi também não participavam. Entre
as Inner, Rei ou Minako conduziam a conversa, dependendo da seriedade da situação.
            Simples, na verdade.
            O problema era que Setsuna, Ryu e Minako não estavam presentes, e tanto Rei quanto Haruka estavam disputando pelo domínio da discussão. As duas tinham temperamentos parecidos demais, e ambas eram quase iguais em força de vontade e imponência. Especialmente depois que Rei descobriu ser uma kalyriana. Aparentemente, a arrogância de Ryu era algo familiar, já que a Senshi do Fogo começou a apresentar um comportamente similar desde que ficara sabendo da sua relação sanguínea com o Dragon Kishi. Ou talvez sempre tivesse estado lá, mas Usagi nunca tivesse notado. De novo, não era importante.
            As Senshi se dividiram, assim como os Outer Dragon Kishi. Mais ou menos a metade dos presentes estava argumentando a favor de Rei, enquanto a outra metade defendia Haruka. Uma situação desagradável, aquela. Ami estava em silêncio, sentada à direita de Usagi, apenas observando. Luna e Artemis, também mantendo-
se fora da discussão, estavam à esquerda da princesa.
            A própria Usagi apenas observava, sua expressão estranhamente séria. Ela podia praticamente ouvir os conselhos de sua mãe do Milênio de Prata, a rainha Serenity. Ela, ou melhor, a princesa Serenity assistiu diversos encontros no palácio da Lua, e sua mãe frequentemente reservava algum tempo após esses eventos para explicar para ela o porquê de cada decisão tomada, e as técnicas que ela usara para manter a discussão sobre controle. A mais jovem Serenity achava aquelas reuniões extremamente tediosas. Usagi, porém, estava agradecendo aos kamis pela insistência de sua mãe.
            Sem falar nada, Usagi se levantou de sua cadeira. Ela não era a primeira a fazer isso, já que Andrea e Makoto já pareciam ter levado a discussão para o lado pessoal, e estavam prontas para decidir as suas diferenças da forma mais física possível.
            Deixe que eles tenham um tempo para se divertir, rainha Serenity dizia, e tome controle quando tudo parecia o mais caótico possível.
            Ami olhou para Usagi, uma expressão surpresa passando brevemente por suas feições, logo substituída por uma de calma. Luna e Artemis também olharam para ela, mas enquanto Luna parecia surpresa, Artemis tinha uma expressão de satisfação. Ele claramente sabia o que Usagi ia fazer, e já tinha previsto a ação tempos antes.
            - Chega. - Usagi falou, sua voz séria e fria. A discussão continuou, com todos os seus participantes simplesmente ignorando a loira. A mesa teria que ser retangular da próxima vez, Usagi pensou. A mesa que eles estavam usando naquele momento era circular, e as chances dela atrair a atenção dos outros simplesmente levantando era pequena. - CHEGA. - ela rosnou, apoiando-se na mesa com as duas mãos.
            Um silêncio quase opressivo cobriu a sala como um cobertor cobriria um corpo, com os oito que estiveram discutindo olhando para a Senshi da Lua, olhos arregalados. Ami olhou cuidadosamente no rosto de cada um dos oito, mantendo sua própria expressão neutra. Apesar de tudo, ela e Usagi foram as primeiras a fazerem parte das Senshi, e a princesa sempre foi a líder delas. Na noite anterior, depois da conversa com Midori, a loira pediu que Ami servisse como conselheira. Confusa até pouco atrás, a Senshi do Gelo finalmente entendeu o plano de sua melhor amiga. Usagi iria reestabelecer a organização nas Senshi.
            Fazia sentido, na verdade. Com Tóquio destruída, Ami podia seguramente dizer que as vidas de todas as Senshi nunca mais seriam as mesmas. Os seus deveres como Senshi, antes uma espécie de hobby para um grupo de garotas com sonhos e futuros, passou a ser a única coisa que não mudaria no futuro próximo. Uma pedra no meio de uma correnteza. E se as Senshi iriam funcionar como deviam, Usagi teria que oficialmente assumir sua posição como líder. Ela escorregaria no caminho, e era para isso que Ami estaria à sua direita. Para ajudá-la a caminhar, para ser a mão amiga que manteria-a equilibrada.
            - Agora que essa discussão vazia e sem utilidade está fora do caminho, sentem-se. - Usagi falou. Ela estava seguindo, naquele momento, uma das muitas sugestões de Ami. Manter a fala o mais limpa e clara possível.
            Depois de hesitar por um instante, todos obedeceram. Usagi fez que sim para si mesma, mais para mostrar para os outros sua satisfação que como um ato instintivo, e sentou-se também. Ami passou um pequeno bloco de folhas de papel para a princesa, que Usagi olhou por apenas um segundo antes de dirigir-se aos outros:
            - Ontem, Reika veio me pedir para que déssemos uma explicação mais completa para ela e os outros civis. - chamar os poucos que acompanharam as Senshi no "Gin no Umi" daquele jeito soava estranho, mas Ami insistiu no termo. Ela alegou que "humanos" soaria prepotente. - E eu vim aqui pedir a opinião de vocês sobre a história que contaremos. Sugestões, idéias, conselhos. Tudo será considerado. - um pequeno sorriso se formou nos lábios da loira, e ela comentou. - A partir de hoje, o Conselho dos Nove está reaberto.
            Hotaru piscou, surpresa. Ami sorriu para si mesma. A Senshi da Morte e Destruição foi a única a reagir. Obviamente, ela se lembrava mais do lado político do Milênio de Prata que os outros. A própria Ami não se lembrava de tanto assim, mas Usagi tinha uma clareza quase absurda em uma quantidade imensa de eventos. Com o canto dos seus olhos, Ami viu Luna piscar, também surpresa. A reação de Artemis, porém, foi intrigante. O gato branco fez que sim quase imperceptivelmente, como se já estivesse esperando aquela declaração. Por um breve momento, Ami tentou recordar-se com clareza da posição de Artemis na corte de Serenity, mas desistiu em seguida. A única posição que ela lembrava ter ouvido o gato clamar era a de guardião de Sailor Venus e conselheiro da Rainha da Lua. A última, porém, era improvável, já que era o mesmo título que Luna possuía.
            - Majestade? - Hotaru chamou, cautelosamente. Os outros presentes lançaram breves olhares na direção dela, mas não deixaram qualquer surpresa tocar seus rostos.
            - Não, Sailor Saturn. - Usagi respondeu, balançando a sua cabeça. - Eu não tenho um reino para governar, e não sei se aceitaria um se me fosse oferecido. - a loira parou abruptamente, e abriu a boca novamente, quase como se fosse falar algo. Em seguida, ela balançou a sua cabeça e fixou seu olhar em Hotaru novamente.
            A Senshi de Saturno fez que sim:
            - Entendo, Sailor Moon.
            Ninguém falou mais nada, todos aparentemente perdidos em seus próprios pensamentos. Ami silenciosamente contou quantos segundos Usagi esperou para voltar a falar, a não esteve surpresa ao notar que Artemis e Luna pareciam fazer o mesmo. Dois segundos antes dos cento e trinta e cinco estabelecidos para propostas de assuntos nas reuniões do Conselho dos Nove, a Senshi da Lua falou:
            - Como eu disse antes, estamos aqui para decidir exatamente o que devemos contar para os civis do "Gin no Umi". - Usagi olhou ao redor da mesa, como se esperasse sugestões. Ami, porém, estava pensando em outra coisa. Não permitir o tempo mínimo era uma falha séria no protocolo, mas Artemis não parecia tão incomodado quanto ela ou Luna. Na verdade, ele estava sorrindo levemente.
            - Eu não sei por que DEVÍAMOS falar algo, Usagi. - Rei falou com uma voz firme e confiante. Ami franziu sua testa sutilmente. A sacerdotisa estava tentando assumir o controle da reunião.
            - Essa decisão já foi tomada, Sailor Mars. - a voz de Usagi estava fria. - Nós VAMOS contar algo, e nós VAMOS falar apenas a verdade. O que está em questão aqui é QUANTO nós vamos falar.
            Rei piscou, obviamente surpresa. A própria Ami, que ajudara Usagi a se preparar para a reunião, estava surpresa. As discussões da sacerdotisa e da princesa normalmente começavam quando Rei questionava uma decisão de Usagi, que frequentemente levava a loira a insultar a Senshi do Fogo.
            - Mas... - a voz de Rei não estava mais tão confiante quanto antes, e a firmeza tinha desaparecido completamente.
            - Se tem alguma sugestão relevante ao assunto da reunião, Sailor Mars, expresse-a. - Usagi falou.
            A Senshi em questão abriu a boca para responder, depois fechou-a. Sem falar nada, Rei sentou-se, com uma expressão surpresa. Ninguém comentou, o que era relativamente bom, na opinião de Ami.
            Um sorriso satisfeito apareceu nos lábios de Usagi, e ela finalmente sentou-se. Lançando mais um olhar ao redor da mesa, ela perguntou:
            - Alguém tem alguma sugestão relevante?
            Cautelosamente, como se estivesse se aproximando de um animal feroz, Chris ergueu sua mão. Todos os olhos da sala se viraram na direção dele, e o Kishi forçou sua própria voz a ficar estável enquanto apresentava suas idéias...

            ****

            Ryu continuou caminhando, metodicamente alternando sua atenção entre seus arredores e sua Ligação, ou, mais especificamente, a posição das patrulhas youmas mais próximas. Ele poderia ter apontado diretamente para cada uma delas. Em seus braços, ele podia sentir uma certa umidez, significando que Kyoko estava sangrando novamente. Seu estômago estava vazio, mas não era difícil ignorá-lo.
            A caminhada já durava quase duas horas. Eles teriam que ir para a superfície em breve. Havia um hospital nas redondezas, e com certeza haveria suprimentos adequados para os ferimentos de Kyoko, assim como comida. Roupas, também.
            Satori Ryu acreditara que nada podia abalá-lo. Ele já havia enfrentado de tudo, já havia visto de tudo. Ele era um Dragon Kishi, e poucas coisas podiam vencê-lo. E se algo pudesse fazê-lo, os seus companheiros o ajudariam a derrotar o que quer que tivesse vencido-o.
            Que tolo que ele fora.
            Tudo que foi necessário para vencê-los, no final, foi um plano bem bolado e mais ou menos uma dúzia de youmas. Ele se perguntou como isso não acontecera antes.
            Seus companheiros caíram, um a um. Ele não pôde fazer nada a respeito. Nada. De que adiantavam anos de treinamento, se ele não podia salvar seus melhores amigos? Se ele não pôde salvar Minako?
            Lembrar do nome dela foi como enfiar uma estaca no próprio coração. Ele errou um de seus passos, mas seu próprio instinto corrigiu o erro, fazendo com que o que poderia ter sido uma queda se tornasse apenas um cambaleio.
            Ryu mentalmente rosnou para si mesmo. Minako estava morta. Ela sacrificou sua própria vida para salvar Ryu e os outros, e o Dragon Kishi da Luz sabia o quanto a loira teria ficado ofendida se ele sugerisse que a vida dela valia mais. Ele podia imaginar os olhos azuis irritados olhando para ele, acompanhados por um "você está dizendo que eu não tenho bom gosto suficiente para escolher alguém com uma vida tão importante quanto a minha?", que o deixaria completamente sem resposta.
            Mas isso não aconteceria, aconteceria? Ryu sentiu uma gargalhada amarga subindo por sua garganta, mas segurou-a. A diferença entre gargalhar e chorar era pequena, e ele não sabia se poderia segurar os soluços que com certeza seguiriam a risada.
            E ele não podia chorar.
            Os outros dependiam dele. A situação atual deles finalmente superou o choque de Ken algum tempo antes, e o Earth Dragon ainda soluçava. Akai estava em silêncio absoluto. Sua mente provavelmente estava em automático, para que ela não tenha que lidar com a situação atual.
            Não que Ryu pudesse culpá-la. Aquilo era exatamente o que ele queria fazer.
            Mesmo assim, ele não podia se dar ao luxo de chorar pela morte de seus companheiros. Não naquele momento, talvez nunca. As vidas deles não voltariam ao que eram antes. O Japão estava completamente destruído, e apenas o sacrifício de Pluto impedia que o resto do mundo tivesse um destino similar. Nenhum deles tinha poder algum, e certamente não teriam a facilidade que tinham antes para derrotar seus inimigos.
            E Minako morreu.
            Ryu nunca tinha realmente notado como sua vida dependia da dela. Ele tinha poucos laços com o mundo, mas ela com certeza fora o mais forte.
            Mamoru também tinha morrido. Com ele, o sonho de Crystal Tokyo. Afinal, como uma cidade poderia ser fundada sem um dos seus fundadores? Usagi ficaria arrasada.
            Mas Ryu não ia se entregar. Então, a vida dele não tinha mais objetivo nenhum. O futuro brilhante do mundo tinha sido reduzido a um sonho impossível. Dois de seus melhores amigos tinham morrido, e a terceira estava no caminho certo para o mesmo destino. O seu guardião, uma figura que esteve com ele desde o começo de sua carreira também fora assassinado.
            E daí?
            Ele não ia morrer. Nada de sentimentalismo barato, de dizer que não adiantava viver. Antes de conhecer Minako, ele tinha uma missão. E ele não precisava de laços com o mundo para cumprí-la.
            Ele já sabia o que iria fazer. Primeiro, recuperar o Ginzuishou e fechar o portal que Dark Angel abriu. Depois, dar um jeito de encontrar Usagi e os outros, e recompor o grupo. Eles podiam não ter poderes, mas ainda possuíam mais conhecimento sobre o inimigo que qualquer nação do mundo.
            Finalmente, Ryu viu uma porta metálica. O ferro usado para forjá-la estava enferrujado, e a única tranca estava praticamente aberta. Sem dizer nada, ele parou de andar, vagamente notando que Ken e Akai fizeram o mesmo.
            Ainda em silêncio, ele passou Kyoko para os braços de Ken, e sacou sua espada. A lâmina da katana refletia a pouca luz que as lâmpadas produziam exatamente como o metal de uma espada comum faria. Mesmo assim, a katana dos Satori resistiu a um impulso que destruiu todos os metais nas celas onde eles estiveram presos. Mais um inesperado, Ryu pensou enquanto caminhava até a porta.
            Com um movimento rápido, ele cortou a tranca em dois pedaços, e guardou sua espada na bainha dela. Ryu calmamente abriu a porta, deixando seus olhos investigarem todo o interior antes de entrar.
            Era uma escadaria. Haviam poucas dúvidas na mente do Kishi da Luz sobre o lugar onde a escada terminaria, mas ele não tinha opções. Precisava levar Kyoko para um hospital o mais rápido possível, e precisava que fosse um distante da fortaleza dos youmas. De nada adiantaria parar para tratar os ferimentos da Dragon Kishi se eles fossem pegos novamente.
            - Ryu? - Ken chamou, sua voz vindo de alguns metros atrás de Ryu.
            - Não faça barulho. - foi a fria resposta. - Nós estamos indo para um hospital.
            Ken ficou em silêncio, ainda carregando Kyoko. Akai também estava subindo as escadas, seus passos mais silenciosos que os de Ken. Ela parecia não respirar, movendo-se com um silêncio que muitos invejariam.
            Após quase cinco minutos de subida, eles chegaram a outra porta.
            - Ela está fechada por fora. - Ken falou, olhando por cima do ombro de Ryu. Gastando um instante para jogar um olhar na direção do Kishi da Terra, o kalyriano recuou um passo e chutou, rezando para que a tranca dessa porta estivesse tão ruim quanto a na entrada.
            A porta não cedeu com o primeiro chute, mas o segundo foi o suficiente para que ela abrisse com muito mais velocidade que o necessário, fazendo um som ainda mais desnecessário. A katana de Ryu estava em suas mãos quase que instantaneamente, e seus olhos examinavam a estação de metrô onde eles saíram. Essa, porém, pertencia às linhas que eram utilizadas pelo público. Mesmo assim, estava completamente vazia.
            Lentamente caminhando para o meio da estação, Ryu deixou sua Ligação procurar por possíveis perseguidores, certificando-se que ninguém iria surpreendê-los. Após alguns segundos de tensão, ele fez sinal para que os outros seguissem-no, e começou a caminhar até a saída, ainda atento a qualquer movimento ao seu redor. Sua Ligação só funcionaria se os youmas estivessem "perturbando" a natureza, e com a natureza tão instável quanto estava, ele não duvidava que ela aceitasse os youmas como parte de si. Pelo menos, alguns deles.
            Após longos e tensos minutos, o pequeno grupo chegou à saída do metrô. Cautelosamente, Ryu enfiou a cabeça para fora, olhando para ambos os lados, depois para cima. Quando não encontrou nada, ele saiu, e examinou o outro lado da rua. Não havia ninguém.
            - Venham. - ele falou.
            Ken e Akai saíram, o Kishi da Terra olhando ao seu redor com um certo nervosismo, enquanto a ruiva se limitava a examinar o que estava na frente dos seus olhos. Se aquilo era confiança resultada do choque ou confiança nele, Ryu não sabia. E ele não podia se dar ao luxo de refletir sobre aquilo naquele instante. Ele reconheceria a região mais facilmente se estivesse nos telhados, como ele frequentemente estivera, anos antes, quando fazia sua patrulha, mas não era muito difícil ter uma idéia da direção que eles deviam seguir.
            Ainda com sua espada em mãos, ele começou a andar na mesma direção que as placas indicavam que o trânsito seguiria. Se voltasse a ter trânsito em Tóquio. Um rápido olhar para trás confirmou que Ken e Akai estavam seguindo-o, ambos em silêncio.
            Caminhar pelas ruas desertas de Tóquio estava se provando, novamente, uma experiência quase surreal para Ryu. Oh, ele não duvidava que ainda houvessem pessoas espalhadas pelo país. Em Tóquio, porém, ele sabia que os poucos sobreviventes já deviam ter sido recolhidos pelos youmas. Não havia sinal de vida algum nas ruas, nem mesmo uma janela se abrindo, um som de porta batendo. Nada.
            - Quem diria que Tóquio ficaria assim um dia? - Ken perguntou, obviamente apenas para si mesmo. Nem Ryu nem Akai responderam, preferindo continuar examinando a rua desolada. Se a falta de pessoas fosse descartada, seria difícil notar que invasores de outra dimensão tinham dominado a cidade. A destruição e o caos normalmente atribuídos a tais situações claramente não eram parte dos planos dos youmas. - Kyoko voltou a sangrar, Ryu.
            Ryu fez que sim. Ele já esperava isso. Os curativos que eles fizeram eram precários na melhor das hipóteses, e o ambiente onde eles foram aplicados era o menos sanitário possível em uma cidade do porte de Tóquio. Mesmo assim, o hospital estava a menos que dez quadras. Mais alguns minutos e... A linha de pensamento de Ryu se perdeu completamente, e ele voltou toda sua atenção para sua Ligação, consequentemente parando de andar.
            - Que houve? - Ken perguntou com um tom irritado.
            - Youmas. - Ryu respondeu, olhando para trás e franzindo a testa levemente. Estranhamente, a crescente lunar existente lá não parecia mudar quando ele fazia isso. - Um ou dois quilômetros de distância.
            - Kuso. - Ken sussurrou, olhando para Kyoko.
            - Continuem por essa rua, Ken. Até chegar numa rua maior. Vire para a esquerda, depois à direita na outra avenida.
            O Kishi da Terra fez que sim:
            - Entendi. E você?
            - Eu vou servir de isca. - foi a resposta. - Devo alcançá-los em pouco tempo.
            Então, Ryu começou a correr na direção oposta àquela que mandou seguirem, sem hesitação alguma em seus passos. Ken e Akai ficaram observando por alguns segundos, depois começaram a caminhar na direção que o kalyriano indicou, sem olhar para trás.

            ****

            A reunião já durava horas. Muito mais, certamente, que os presentes esperavam. Moon fez questão que o Conselho dos Nove examinasse todos os conflitos grandes que ocorreram desde o despertar das Senshi. Como a primeira a começar a combater, Sailor Venus, não estava presente, o ponto de partida foi o dia em que Usagi se tornou Sailor Moon pela primeira vez.
            Makoto, particularmente, não conseguia acreditar quão tedioso era ficar discutindo batalhas passadas. Apesar de suas dúvidas iniciais, ela já percebera algum tempo antes que era importante revelar alguma coisa para os passageiros não-combatentes do "Gin no Umi". Não era justo que eles abandonassem todas suas vidas sem sequer saber exatamente porque o estavam fazendo.
            Não que eles pudessem retornar ao Japão num futuro próximo.
            Se aquele impulso de energia que Ship criou era alguma pista do que estava acontecendo em Tóquio, Makoto ficaria surpresa se sobrasse muitas coisa da cidade. Podia não ser o que ela esperava da vida, mas tinha-se que jogar com as cartas que eram dadas. A morte de Maury fora dias antes, mas já parecia um evento distante. Foi, também, um dos acontecimentos mais duros de sua vida.
            Não era que ela acreditasse que Maury fosse o grande amor da sua vida, nem nada parecido. Era apenas que ele foi mais um conhecido dela que morreu. Aconteceu antes, e com certeza aconteceria mais vezes. Era estranho, mas Makoto já superara a morte de seu amante. Um golpe duro, sim, mas não o mais duro que ela já recebeu.
            Ela decidiu que tinha amadurecido consideravelmente nos últimos dias.
            Oh, ela ainda iria chorar e ficar triste à menção do nome de Maury por muito tempo. Não tinha ilusões quanto a isso. Mas não estava tendo pensamentos suicidas ou em uma depressão profunda. Estava apenas triste.
            Então, ela percebeu que Usagi estava se levantando. Ou Serenity. Makoto ainda estava tentando descobrir qual delas estava conduzindo a reunião. A princesa da Lua teria sido um prato cheio para psicólogos, a Senshi de Júpiter decidiu. Era improvável que existisse um caso mais desenvolvido de dupla personalidade. Especialmente porque ambas personalidades tinham memórias e almas diferentes.
            Finalmente, o grupo estava se retirando da sala, e se dispersando ao chegar lá fora. Mexendo os ombros, Makoto caminhou até a porta, e virou à direita, rumando para o seu quarto. Não estava com humor para treinar ou conversar com alguém.
            - Se importa em ter companhia? - Andrea perguntou, se aproximando.
            Talvez uma boa conversa não fosse tão ruim.
            - Fique à vontade. - ela respondeu, colocando um sorriso no seu rosto.
            Com Andrea ao seu lado, Makoto decidiu que não iria para o seu quarto. Ele estava bagunçado demais... Ela não tinha encontrado paciência para arrumá-lo antes.
            - A nossa situação não está muito boa, está? - Andrea perguntou, suspirando.
            - Não. - Makoto respondeu. - Não, não está. Na verdade, é a pior que já tivemos até hoje.
            - Ninguém pensou em roubar os poderes de vocês antes? - a canadense perguntou, surpresa.
            - Na verdade, não. - respondeu a Senshi. - Mas o grande problema não é esse.
            - As... mortes, então. - Andrea concluiu.
            - Em parte. - Makoto falou. - Eu acho que o pior é a nossa moral.
            - Moral?
            - Acho que sim. Não é fácil, sabe, perder. Não quando se está acostumada a ganhar. Um hábito difícil de quebrar.
            Andrea fez que sim, ficando em silêncio. Era verdade, por mais cruel que parecesse. Se as Senshi entrassem em batalha achando que perderiam, elas perderiam.
            - E Usagi-chan? - Andrea perguntou, subitamente.
            - Nani?
            - E ela? Por que ela está como estava hoje?
            Makoto abriu a boca para dizer que não sabia, mas uma voz interrompeu-a:
            - Porque ela é a sua líder.
            As duas garotas se viraram para a direção de onde a voz veio, e viram que foi Artemis que falou.
            - Não é tão difícil de entender. - ele continuou. - Vocês tinham perdido a perspectiva e ninguém estava assumindo o comando. Então, Usagi assumiu.
            - Mas... Usagi-chan? Uma líder? - Andrea perguntou, um pouco duvidosa.
            - É difícil de aceitar. - Artemis admitiu. - Mas não tanto. Ela tem o potencial. Tem até um pouco de treinamento, das lembranças de Serenity.
            Makoto fez que sim. Ela mesma já tinha experimentado um ou dois flashbacks de sua vida passada. Nada muito intenso, felizmente, mas ela se lembrava o suficiente para descrever alguns de seus lugares favoritos. Se lembrava de rostos e acontecimentos.
            O resto das memórias estava lá, ela sabia, mas era como se estivessem flutuando fora de seu alcance. Ocasionalmente ela conseguia agarrar uma, mas essas memórias podiam escapar com tanta facilidade quanto vinham. Poucas chegavam a tomar residência permanente na mente da Senshi de Júpiter.
            - Dessa vez é sério, não é? - Makoto perguntou, olhando para o oceano.
            Artemis voltou seus próprios olhos para as águas:
            - É.
            - Jeez. - Andrea comentou, olhando para os dois. - Do jeito que vocês agem, parece que nem são heróis... Não se preocupem. Eu tenho certeza que Ryu vai voltar com nossos poderes, vamos atacar Dark Angel e tudo vai terminar bem. - e, com isso, ela saiu caminhando em direção ao seu quarto, cantarolando para si mesma.
            Artemis e Makoto continuaram ali, imóveis, olhando para o oceano, cada um perdido em seus próprios pensamentos. Então, subitamente, a Senshi começou a rir.
            - O que houve? - Artemis perguntou.
            - Chega a ser engraçado, sabe? - Makoto perguntou. - Eu sempre me perguntei o que nos levaria a mudar nosso estilo tão radicalmente. Sabe, governar uma cidade, não esconder o que somos. Sempre me perguntei o que nos levaria a fazer essa escolha.
            - E o que tem de engraçado nisso?
            - O engraçado, Artemis, é que nada nos levou a fazer essa escolha. - ela suspirou tristemente. - Nós não tivemos escolha. - Makoto se virou, e começou a caminhar para sua cabine, consciente dos olhos de Artemis nas suas costas.
            O gato branco esperou até ela sumir de vista para suspirar, balançando sua cabeça:
            - Sempre há escolhas. Só porque nós instintivamente fizemos as melhores delas, não quer dizer que não as fizemos. - lançando um último olhar para o mar, Artemis, também, retornou para a cabine onde dormia.

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