"Sim, sim! Eu tenho um jeito meio lagarta listrada de ser. É. Algo meio a v u l s a. Meio adulta. Meio esquecida. Do tipo que é constantemente levada pelo momento. Conscientemente conduzida pelo vento. Adepta de uma providencial alienação. Uma hora finjo ouvir sua história com um olhar dissimuladamente oculta de quem concede atenção. Outra hora não chego nem a isso e simplesmente fujo com meu violão. Meu fiel escudeiro, sincero companheiro, talvez o único a ter minha total predileção. Com ele passo horas a fio tirando acordes de ouvido, criando cifras em profusão. Me encanto com sua matemática precisa que rege a desordem dessa vida, que é esse mundo sem razão. Me assusto com sinceros sentimentos que nem sempre têm alguma explicação. Com ele me esqueço no mundo, me isolo em meu eu mais profundo, encontro minha direção. E me perco com ela. Fico sem coragem de abrir a janela. Fico com medo de ver a paisagem de fora. Não permito que alguém se aproxime e descubra meus medos como esses que lhe falo agora. Vou levando a vida encantando serpentes. Musicando o silêncio de toda essa gente que tanto gosta de me ouvir tocar. Vou recebendo todos em minha sala de estar. Vou esperando o momento certo de deixar alguém entrar naquele que é meu cômodo mais vazio e pelo qual eu venho sentindo tanto frio, naquele que é meu, mas que ainda não sei como lidar. Vou me envolvendo sem me deixar levar. Vou deixando você me observar. Vou me divertindo com o teu apaixonar. Vou m e escondendo. Dissimulando. Disfarçando. Entretendo. Vou mostrando as partes. Vou conduzindo seu olhar pra minha arte de ser todas e ser nenhuma. De ser muitas e não ter alguma. Fazendo de tudo pra te prender no fim. Sendo difícil. Sendo veneno. Sendo visível neste mundo que eu já disse ser pequeno. Trasmutando meu egoísmo em festim.
Minha função é confundir você pra mim."
(.Sim Sim. 01/04/2002 - 20:57h.)
Alice Venturi