“Em São
Paulo tudo é possível. É possível que chova. É possível que caia do nada uma
daquelas famosas garoas. É possível que faça sol. É possível que você avance o
farol. É possível que você fique preso no trânsito. É possível que você demore
horas pra chegar. É possível que você nem chegue. É possível que você se perca. É possível que você definitivamente
se ache. É
possível que você não entenda a lógica dos ônibus de portas trocadas e dos
cobradores sem uniforme. É possível que você não se afobe como os metrôs sem
ar-condicionado e nem se confunda com suas quatro linhas coloridas. É possível
até mesmo encontrar pura beleza num Sesc tipo Itaquera, num jardim escondido no
Ibirapuera, nos riscados cinzentos de seus intermináveis arranha-céus. É
possível que você se encante com a proeza dos outdoors espalhados. É
possível que você seja contaminado e volte falando assim, meu, meio que cantado. É possível que você
entenda que a Avenida Paulista nada mais é do que nossa Presidente Vargas com
um buraco no meio em seu início e sem a majestosa Candelária no final. É
possível que você veja em apenas uma hora e meia todo o esplendor de uma
Bienal. É possível que você queira voltar. É possível que você não queria mais
sair de lá. É possível que você sinta saudades da sua terra
natal. É possível que você encontre a felicidade nesta terra que você já disse
ser feia. É possível que ela te prenda
entre suas urbanas teias. É possível que você dê vexame. É
possível que você perceba que nada na vida é unânime.
É possível que você entenda que São Paulo também é cidade maravilhosa, mas só
que ao seu jeito. Sem tantas praias. Sem tantos verdes. E com uma Augusta. É
possível que você não veja nada disso e queira voltar a todo custo. É
possível que coisas esquisitas aconteçam por lá. É possível que você conheça
deliciosas pessoas. É possível que você se
decepcione profundamente com outras. É
possível que você se perca em boates de uma só letra.
É possível que você se arrependa. É
possível que você se esbalde. É
possível que você borre todo o esmalte com o vento levemente gelado de fim de
tarde que certamente entrará pela sua janela. Pelas janelas de São Paulo, onde
a vista também vale a pena e onde minha alma comprovou-se não ser tão pequena
ao deslumbrar-se com esta beleza cinzenta que quase não se acredita. Pelas
janelas de São Paulo, onde a vista também é bonita.”
Alice
Venturi
(.Tudo
é possível em São Paulo. 22/04/2002 –
19:26h.)