Angola 1969

 

O 5º batalhão de infantaria preparava-se para mais um dia.

O Lopes imaginava o já próximo 27 de Agosto, em que ia voltar para casa. Nunca mais se haveria de esquecer daquela terra. Com estes camaradas tinha passado os melhores momentos da sua vida e isso marcou-o, como se de um ferro em brasa se tratasse. Enquanto passava a lâmina pela sempre perfeita barba, lembrava-se dos fins de tarde passados na cidade a beber cerveja e antecipava já a próxima noite, à volta da mesa das cartas. Depois de impecavelmente pronto saiu a tempo de ouvir o Comandante Fiúza a treinar os pulmões: “Vamos embora, meus merdas. Há aí muito lixo preto para varrer!”

O cheiro da terra quente e molhada pela chuva entrava pelo corpo como se fosse um bálsamo. O sol, vermelho como sangue e quente como as mais profundas entranhas do inferno começava a despontar.

Estes homens consideravam-se, até agora, cheios de sorte. Estavam numa zona sem grandes problemas, apenas com a missão de proteger uma cidade que há muito não via problemas e avançar contra o inimigo foi tarefa de meia dúzia de dias mais atribulados. Ninguém sabia o que andava ali a fazer, mas o que importava era que o tempo fosse passando o melhor possivel.

No fim do dia houve algo que os assustou. O Comandante Fiúza reuniu todo o batalhão e comunicou à última hora um ataque que ía ser feito nessa mesma noite. Os ataques , poucos diga-se, costumavem ser preparados com muita antecedencia e em conjunto com os outros batalhões da frente, mas desta vez não. Tratava-se de um ataque nocturno, de surpresa -mesmo para eles- e onde iriam avançar sozinhos.

Sairam do quartel às 22h45m. Avançaram cerca de 50 Km pelo mato. De repente o silêncio da noite foi quebrado por uma inimaginável chuva de tiros e bombas.

Quem não morreu foi preso. O Lopes sobreviveu e voltou para casa 5 anos depois.

Hoje o Lopes ouve um tubo de escape a fazer uma explosão e o seu ritmo cardiaco duplica.

No dia 27 de Agosto de 1998 o Lopes vai rever os seus camaradas. O braço que deixou em Angola nunca mais o há-de deixar esquecer aquela guerra.

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