O Joãozinho foi o menino mais feliz que eu alguma vez conheci.
Porquê?
Porque o Joãozinho tinha um dom que muito poucos meninos têm. Tinha o maravilhoso dom de voar.
Quando se tem o dom de voar, como ele, pode-se fazer tudo o que a nossa imaginação quiser. Saltar por cima da mais alta montanha, passear perdidamente no mais longinquo país, passar uma manhã de Verão a mergulhar no mais fresco dos mares, uma tarde de Inverno a chapinhar no mais quente dos vulcões ou dormir, à noite, na mais fofa e doce nuvem.
Vou-vos contar a história, do dia em que o conheci. Foi já há muito, muito tempo, mas nunca mais me esquecerei dela.
Foi num dia de Inverno e eu tinha muito frio. Eu estava sózinho e triste. Não tinha uma casa para me abrigar, como os outros meninos, não tinha uma familia e não tinha sequer um amigo com quem pudesse brincar.
Quando estava a começar a adormeçer apareceu, vindo do nada, alguém que me perguntou:
- Estás sózinho?
- Estou.
- Posso-te fazer companhia?
- Gostava muito.
- Como te chamas?
- Carlitos. E tu?
- Eu sou o Joãozinho. Não gostavas de ir passear comigo?
- Gostava muito.
Levantámo-nos e fomos andando, lado a lado, conversando sobre o vento, sobre a lua, sobre o sol e sobre o mar.
A certa altura perguntou-me:
- Ó Carlitos, não gostavas de vir comigo? Não precisas de ficar sozinho e fazias-me companhia. A mim e aos meus amigos.
- Claro que gostava. Mas onde é que tu moras?
- Eu moro onde o sol não se põe, onde a brisa é pura como a água das montanhas e onde o céu é azul como nunca viste.
- Mas isso fica muito longe?
- Depende.
- Depende de quê?
- Da tua vontade de conhecer a felicidade.
- O que é isso?
- É o que tens se imaginares que aquela nuvem que está atrás daquela montanha, que está por cima daquele rio que corre ao lado do mar da alegria é bela como o que de mais belo alguma vez alguém viu.
Olhei em volta e disse, triste:
- Mas eu não vejo nuvens, nem montanhas, nem rios, nem mares e nem sei o que é a alegria…
- Então olha para o céu… Vês o sitio onde as estrelas são de ouro, onde o vento é prata e as nuvens são de algodão?
Olhei e vi, no céu, uma nuvem.
- Vejo uma nuvem brilhante como um diamante, parece doce como um morango, cheira a rosas das mais belas e tem a forma de uma estrela do mar.
- Então, se viste, podes vir comigo…
Dito isto, pegou em mim e levou-me, pela mão, a voar pelo céu.
Senti então o que nunca tinha sentido e que nunca serei capaz de descrever.
Borboletas gigantes que voavam à nossa volta. Golfinhos coloridos que se riam connosco. Dóceis leões que brincavam com os nossos cabelos. Principes e Princezas em cavalos alados. Nuvens doces que se deixavam trincar. Estrelas de cores garridas e brilho dourado. Animais que nunca tinha visto. A infancia que nunca tinha tido.
Eu fui o ar que respirarava. Fui o céu em que voava. Fui o Sol e fui a Lua. Fui a terra e fui a vida.
Quando voltámos e antes ainda de poder agradecer aquele dia maravilhoso ele desapareceu, tal como aparecera e nunca mais o vi.
Mas eu já não estava sozinho. A minha vida estava cheia de aventuras e brincadeiras, de sonhos e de paixões.
Perdi o medo
e perdi a tristeza, ganhei asas e já consigo voar. Fui Deus só por um minuto
e fiquei criança para sempre.