Euler
O iluminismo, movimento surgido no século XVII em oposição ao absolutismo, teve origem nas idéias de Descartes e Newton, herdando delas o racionalismo, a dúvida metódica e o mecanicismo. Representa a exaltação à razão, de onde, através de uma rigorosa análise, viria o conhecimento maduro e a predominância da lógica. De forma genérica, a razão seria o supremo guia do indivíduo. É dessa época, também a crença na liberdade econômica, na liberdade individual, e o que era muito estranho - na igualdade de todos os homens perante a lei.
Este contexto gerou a idéia de um Deus destituído de atribuições éticas. Um ser diferente, onipotente, criador e ordenador de todas as coisas. Assim, não eram necessários ritos, orações e sacramento, para louvar o Senhor, pois a nova crença era fixada em rituais mais simples como é o ritual da observação. O homem descobriu que o sistema solar era regido por leis eternas e imutáveis, portanto o criador estaria refletido na própria natureza. Com este novo pensamento, sérias críticas foram feitas à igreja, que se preocupava com suas missas artificiais e distanciava-se cada vez mais da inteligência criadora. Em suma, o iluminismo opunha-se à superstição, à autoridade despótica e à tradição. Prescrevia o poder da razão humana como única maneira para se construir um mundo melhor.
Esse era o espírito de vários imperadores, inclusive de Pedro, o grande, e seus sucessores, que tentando ocidentalizar a Rússia atraíram grandes intelectuais, entre eles Euler.
Disse, certa vez, o acadêmico francês François Arago, que Euler podia produzir matemática sem qualquer esforço aparente, assim como peixes nadam, os animais respiram ou os pássaros se sustentam no ar.
Leonhard Euler, nasceu a 15 de abril de 1707, na cidade de Basiléia, Suíça. Seu pai, Paul Euler, era pastor luterano e possuía muitos conhecimentos de matemática. Ministrou ao filho tanto ensinamentos bíblicos quanto matemáticos, mas considerou sempre sua carreira religiosa como mais importante, mantendo-se na expectativa de que seu filho seguisse o seu caminho. Porém , cedo, Euler pôs fim às esperanças do pai, demonstrando ser um péssimo estudante de teologia, mas apresentando grande interesse pela matemática.
Em 1723, com 15 anos, entrou na Universidade da Basiléia, estudando com Jean Bernoulli, o grande matemático da época. Na Universidade iria estudar também medicina, astronomia, física, línguas orientais, teologia e filosofia.
Em 1727, foi convidado pela imperatriz Catarina I da Rússia, para ser membro da Academia de Ciências de São Petersburgo, onde deveria atuar na área de medicina. No dia em que chegou, a imperatriz faleceu, e mudanças políticas na Academia fizeram que ele assumisse a cadeira de filosofia.
Euler era tão dedicado ao seu trabalho, que três anos depois assumiu o cargo de professor de física e em 1733 sucedeu Daniel Bernoulli, que retornou à Basiléia, na cobiçada cadeira de cálculo. Com isso o mundo da matemática entrou na época do grande Euler.
A Academia de São Petersburgo criara um jornal de matemática, neste deveriam ser publicados somente idéias originais. Os editores jamais tiveram preocupações neste sentido, pois Euler produzia tantos artigos, que tiveram de pedir-lhe que parasse de envia-los, ou não teriam tempo de publicar os já recebidos. Euler, como podemos notar, foi um grande trabalhador e adepto da filosofia de Cauchy : A vida é só trabalho. Diz a lenda que estava sempre produzindo, mesmo quando brincava com seus filhos, que eram treze.
A fecundidade de seu esforço, nenhum matemático jamais superou, pois isso permitiu-lhe escrever quinhentas obras, incluindo artigos para revistas e livros inéditos.
Devido a esse ritmo exaustivo de trabalho, produzindo até mesmo durante as refeições, foi acometido de uma congestão cerebral e perdeu a vista direita. Esse pequeno infortúnio, no entanto, não o abateu, continuando a trabalhar da mesma forma.
Na área da física, dominou e desenvolveu a mecânica de modo inigualável, sendo ainda hoje ensinada como ele a concebeu. Examinou cada aspecto das aplicações das leis de Newton e clarificou, reformulou e sobretudo enriqueceu aquilo que estudou, tornando obsoletos quaisquer estudos anteriores. De certa forma, tinha o Toque de Midas, rei a quem o deus Dionísio deu o poder de transformar tudo o que tocasse em ouro.
Euler herdou não só a matemática instrumental de Leibniz e dos Bernoulli, mas também os conceitos profundos de física desenvolvidos por homens como Stevin e Huygens. Dominou e ampliou os conceitos e métodos de Newton, dando ênfase à dinâmica dos fenômenos celestiais.
No início do século XVIII, estudou os sistemas mecânicos, sujeitos a pequenas oscilações, considerando cordas de certa elasticidade, tencionadas por peso. Assim, Euler desenvolveu equações que lhe permitiu estudar e prever tais fenômenos elásticos, chamadas mais tarde de equações diferenciais e usadas em grande escala por todos os homens da ciência. Foi com estas equações diferenciais que Lagrange chegou à sua famosa equação da onda.
As equações diferenciais logo despertaram o interesse de todos os matemáticos europeus.
Em 1741, Frederico II da Prússia convidou-o para lecionar e pesquisar na Alemanha, assumindo a cadeira de matemática da Academia de Berlim. Tempos depois tornou-se diretor desta instituição. Em 1754, recebeu uma aluna muito especial : a princesa Anhalt Dessane, estudiosa de física e matemática. O rei, conhecendo a escandalosa competência de Euler, nomeou-o professor particular de sua sobrinha. As lições que deu à moça transformaram-se depois, em seu famoso livro Cartas a uma Princesa da Alemanha.
Dos estudos de Euler resultaram vários livros, talvez o mais importante seja Introdução à Análise Infinitesimal, em que reuniu a teoria do cálculo diferencial e integral, através de notações mais amplas e eficazes. Esta obra influenciou bastante a Segunda metade do século XVIII, garantindo com isso a perpetuação das idéias de Descartes, Newton e Leibniz.
Em 1766, a convite da Imperatriz Catarina II, voltou a São Petersburgo, onde retomou os trabalhos deixados 25 anos antes. Tempos depois, aos 69 anos, sofreu um duro golpe ao perder a esposa, mas tentou recuperar-se casando-se com a cunhada, irmã de sua mulher : segundo o seu ponto de vista, o casamento com uma mulher é como a resolução de uma equação diferencial, as condições de contorno são iguais só muda a condição inicial do problema.
Em 1783, foi acometido de uma catarata no olho esquerdo e ficou completamente cego. Procurando uma maneira de sistematizar suas idéias, contratou um secretário particular, o que lhe permitiu manter o mesmo ritmo de produção. Durante esta fase, Euler concluiu que : para se fazer matemática, não precisamos enxergar, andar, Ter braços ou mesmo corpo. Só precisamos Ter espírito, vontade, perseverança e principalmente, convicção na mais bela estrutura lógica criada pelo homem. Só assim será possível proporcionar conhecimentos à humanidade, fazendo o homem senhor da terra, dos ares e dos mares. Conseguirá talvez até o absurdo de dar condições ao homem para que ele vá a lua, a lua de Deus.
Euler faleceu na tarde ensolarada do dia 18 de setembro de 1783, vítima de uma parada cardíaca. Suas últimas palavras foram : Estranho, não estou enxergando matemática.