INDUSTRIALIZAÇÃO E DESIGUALDADES REGIONAIS
No Brasil, o status de país de industrialização recente - conhecido também pela sigla em inglês NIC (New Industrialized Country) - foi alcançado a partir de 1970 pela modernização conservadora conduzida pelo Estado, que produziu transformações significativas na economia sem romper com a ordem social hierarquicamente organizada.
A gestão autoritária do território foi um instrumento essencial para criar fronteiras, isto é, áreas onde se conquistavam novas terras e se produziam mudanças aceleradas; garantir os domínios , ou seja, territórios controlados por oligarquias solidamente estabelecidas, e consolidar uma cidade mundial (São Paulo) como lugar que estabelece ligações com a economia mundial.
A fronteira não se resume a uma vasta extensão de terras sem dono a ser explorada por homens também - pretensamente - livres, tampouco representa um determinado tipo de periferia dependente de um centro. Ela é um espaço econômico, social e político que não está plenamente organizado e tem a capacidade de gerar novas realidades.
Os domínios são áreas consolidadas, com estruturas políticas relativamente estáveis, mantidas por alianças com interesses locais e regionais que participam diretamente do núcleo de poder político, e que deram sustentação ao projeto de modernização conservadora.
Assim, perpetuaram-se formas tradicionais de propriedade da terra e de controle do comércio, graças a toda sorte de instrumentos políticos que garantem privilégios adquiridos e criam barreiras à entrada de novos concorrentes.
Fronteiras e domínios são articulados, ou seja, criados e postos em prática pela cidade mundial, que, em países de industrialização recente, é, ao mesmo tempo e no mesmo lugar, centro de gestão, de acumulação de capital em escala mundial e núcleo de comando de uma vasta rede urbana que conecta a multiplicidade de lugares existente no Brasil.
A política territorial do Estado manteve domínios, expandiu fronteiras e fortaleceu a cidade mundial. Como exemplo de manutenção de domínio, a persistência da questão regional no Nordeste; da expansão de fronteira e, a configuração de uma imensa fronteira de recursos no Norte e Centro-Oeste e de fortalecimento da cidade mundial , a conformação de um vasto complexo urbano-industrial comandado por São Paulo.
Um balanço desse período recente mostra que, apesar da intervenção direta do Estado, persistem na economia nacional os mecanismos geográficos que levaram ao desenvolvimento desigual das regiões brasileiras. E a desigualdades resultam do ritmo diferenciado de acumulação da riqueza e de geração da renda, nas diferentes parcelas do território nacional.
A análise das grandes regiões brasileiras, que utiliza a classificação definida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste, é útil para um primeiro contato com as mudanças recentes ocorridas no Brasil, que revelam a situação atual na distribuição territorial da riqueza e as desigualdades regionais na divisão social da renda.
A industrialização foi responsável pela maior concentração de população e de renda no Sudeste. Sua integração com o Sul já era importante desde o início do desenvolvimento industrial, por causa do fornecimento, pelo Sul, de alimentos e matérias-primas agrícolas.
O Nordeste, a segunda região mais populosa, ainda é a área mais pobre do país, com uma participação na renda nacional inferior à metade de seu peso demográfico, isto é, de sua grandeza populacional. A integração do Nordeste ao Sudeste é um processo que se completa na década de 1970 pela intervenção planejada do Estado.
DADOS
BÁSICOS SOBRE AS MACRO-REGIÕES BRASILEIRAS
Região |
área total |
área (%) |
População abso- luta (1991) |
População relativa (1991) |
Renda (milhões de US$) 1985 |
Renda 1985 (%) |
Norte |
3.864 |
45,4 |
10.146 |
6 ,9 |
8 .828 |
4 ,3 |
Nordeste |
1.546 |
18,2 |
42.387 |
29,0 |
27 .511 |
l3 ,5 |
Sudeste |
925 |
l0 ,9 |
62.121 |
42,6 |
118 .139 |
58,3 |
Sul |
578 |
6,8 |
22.080 |
15,1 |
35 .914 |
17,7 |
Centro-Oeste |
1.593 |
18,7 |
49.420 |
6 ,4 |
l2 .667 |
6 ,2 |
Brasil |
8.506 | 100,0 | 149.420 | 100,0 | 203 .059 | 100,0 |
O Centro-Oeste iniciou, de fato, seu processo de integração com a fundação de Brasília, em 1960. Sua rede de infra-estrutura viária facilitou a expansão da soja, cultura agrícola que "abriu" os cerrados e integrou definitivamente o Centro-Oeste ao mercado nacional, na década de 1980.
O Norte, que abrange a grande Planície Amazônica, é ainda uma imensa superfície florestada e um imenso vazio demográfico. Os esforços de ocupação dessa área, realizados a partir da década de 1970 com a abertura de rodovias que partiam de Brasília, permitiram o crescimento populacional em manchas na borda sul da grande massa florestal. Entretanto, a atividade econômica ainda é em grande parte dispersa ou, então, concentra-se ao longo de poucos eixos que partem de cidades encravadas aqui e ali, e ao longo dos rios e rodovias.
Os grandes projetos agropecuários e mineradores instalados a partir da década de 1970 na Amazônia seguem basicamente esse padrão, mesmo em Carajás, a grande província mineral da região, onde a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) é o elemento de integração do território sob seu controle com o mercado mundial.
Dessa maneira verificamos que, apesar da forte intervenção do Estado, o ritmo de desenvolvimento desigual é o responsável pelas disparidades entre as regiões brasileiras, o que resulta em uma grande concentração de pessoas, investimentos e informações na área geoeconômica comandada pela cidade mundial, São Paulo, conhecida também como o Centro-Sul.