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Desde 1953 já se procurava algum
sinal que viesse da periferia do corpo para o cérebro, sinalizando
que estava na hora de parar de comer ou que o organismo estava em
equilíbrio energético. Esse sinal, provavelmente, viria do sistema
adiposo porque ele é o órgão de estocagem de energia, sob a forma
de gordura. O paradigma era então: existiriam estes sinais? Quais
eram os sinais que viriam do sistema adiposo para o cérebro,
mostrando que a pessoa estava em equilíbrio energético?
A resposta poderia explicar o controle do equilíbrio energético de
longo prazo, no entanto, não dava explicações sobre a questão a
curto prazo. Quem sinalizaria a hora de parar de comer ou de iniciar
a alimentação, repondo as energias? Isso, provavelmente, deveria
vir do sistema gastrointestinal.
Para o primeiro paradigma - o problema do estoque de energia – o
hormônio que surgiu para explicar não era do tecido adiposo: era a
insulina, pois todo mundo sabe que quando a pessoa engorda a
insulina está alta. Além disso, a insulina aumenta quando nos
alimentamos. Então ela poderia ser aquele sinal, pois ela tem uma ação
inibidora de apetite quando injetada no cérebro (no terceiro ventrículo),
embora perifericamente baixe a glicemia e pode assim aumentar o
apetite. Isso, portanto, não explicava tudo.
Até que, com a experiência de Coleman - junção em parabiose dos
camundongos ob/ob com um camundongo normal – demonstrou-se que o
ob/ob emagreceu, o que sugeria que o animal magro passaria para o
obeso uma substância que ele produzia, e que portanto faltaria ao
ob/ob, fazendo com que o outro animal emagrecesse.
Isso foi o início. Descrevo toda a experiência sugerindo que
realmente existiam alguns sinais no organismo, informando quando tínhamos
que comer, etc
Veio, então, o primeiro hormônio do tecido adiposo, descoberto em
1994, denominado Leptina. Descrevi os mecanismos através do qual a
Leptina controlaria o equílibrio energético. Existe uma cascata,
onde a Leptina entra no cérebro e inibe o sistema neuropeptídeo Y
e estimula o sistema da pró-opiomelonocortina.
Mostrei todas as combinações de atividades que existem dentro do
hipotálamo. Depois disso expliquei sobre a questão do eixo
gastro-entero-hipotalâmico, porque como disse antes, era importante
encontrar explicações sobre a questão do equilíbrio a curto
prazo.
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Esse sinal, provavelmente, teria que
vir do tubo gastro-intestinal, porque não daria tempo da gordura
ser armazenada e emitir sinais para chegar ao cérebro.
Alguns hormônios do tubo gastro-intestinal (colecistocinina, GLP1 e
enterostatina), que sinalizam para diminuir ou aumentar o apetite,
eram substâncias conhecidas, mas há dois anos atrás descobriu-se
ghrelina. Essa substância, descoberta nas células do estômago e
duodeno, atua em um receptor do secretagogo do hormônio de
crescimento. Essa foi a primeira surpresa. O que teria essa substância,
que aumenta a produção do hormônio de crescimento, com ingestão
alimentar?
Olhando para trás vamos observar que já existiam estudos com
outros secretagogos, como é o caso da hexarelina, que ao ser
administrada as pessoas aumentavam o apetite e a produção de GH.
Moral da história: para comer precisa crescer, ou seja, existe uma
relação entre comida e crescimento. Os estudos com a ghrelina
mostram que ao injetar em humanos, aumentamos o apetite e aumentamos
o hormônio de crescimento. O que aconteceu em ratos se repetiu com
seres humanos. Ao estudar a injeção de ghrelina, comparada com
outro secretagogo, como era o caso da hexarelina ou o GHRH, a
ghrelina se mostrava com mais potência estimuladora do GH do que os
esses dois.
A partir daí discuti sobre um novo hormônio, chamado PYY 3-36, que
era conhecido de algum tempo e só recentemente, a partir de estudos
em humanos, mostrou ser um sinalizador para que o indivíduo pare de
comer.
Então, a ghrelina é um orexígeno (aumenta um pouco antes da refeição)
e, provavelmente, sinaliza para iniciar a refeição. Ao inverso, o
PYY 3-36, que é um inibidor do apetite, aumenta logo após a refeição,
sinalizando para parar de comer.
Na última parte da apresentação falei sobre um “velho” hormônio,
mas que tem grande influência e está tomando importância muito
grande no que diz respeito a questão da gordura visceral, que é o
cortisol.
Expliquei a relação que existia entre o stress e o aumento da
secreção do hormônio cortisol, que aumentaria a deposição de
gordura na região visceral-abdominal e é típico da Síndrome de
Cushing. Este é o modelo sugerido por Per Bjorntorp, que
apresentei, somado a dados de trabalho desenvolvido no nosso
hospital (tese da Dra. Andréa Vieira) , demonstrando que também há
um aumento no volume da adrenal que tem uma relação direta com
teor de gordura visceral. Quanto maior a gordura visceral, maior será
o volume da adrenal.
No trabalho, mostramos, anatomicamente, o que o Dr. Bjorntorp havia
sugerido bioquimicamente. No entanto, esse modelo não explica tudo.
Recentemente, surgiram experiências com a enzima 11 beta
Hidroxiesteroidehidrogenase do tipo 1 (HSD 1) que converte cortisona
em cortisol. Ou seja, o cortisol é metabolizado para cortisona pela
HSD 2 e existe um metabolismo de volta pela HSD1.
Esta enzima está aumentada no tecido adiposo visceral. Curiosamente
ela está diminuída no fígado. Como se uniriam os dois modelos?
Você aumenta a conversão de cortisona para cortisol e,
consequentemente, há um aumento da gordura visceral. Isso não
explicaria o eixo hipotálamo hipofisário, que teoricamente não
estaria ligado a esse processo.
Em recente estudo publicado Journal of Clinical of Endocrinology and
Metabolism, uma pesquisadora sugere que pode haver os dois
mecanismos em um mesmo paciente e aí mostrei como os dois modelos são
possíveis. O primeiro deles teria um aumento da atividade desta
enzima convertendo cortisona em cortisol, mas isso no tecido
adiposo. No fígado, o segundo, seria o inverso, a enzima estaria
diminuída, o que tenderia a reduzir o cortisol plasmático, que
reativaria o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. Assim, os dois
modelos estariam contemplados.
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