O Computador

Carlos Augusto de Oliveira Jr.



     E o homem inventou o computador. Os jornais da época dedicaram uma edição especial à nova invenção, que iria revolucionar o mundo. O mundo dos cientistas. O primeiro computador não foi feito pra você jogar, ou para eu digitar este texto, mas apenas para projetos científicos.
     A imprensa marcou uma entrevista coletiva com a nova máquina. Deve-se lembrar que isto ocorreu lá na casa dos anos cinqüenta, e o computador ainda não falava. Aliás, o computador não fazia nada. Não sei por que causou tanto alvoroço, mas já que o causou, vamos relembrar aquela célebre data.
     Os repórteres perguntavam o que a máquina já podia fazer. Os cientistas respondiam que ela era uma máquina inteligente, que podia pensar, assim como o homem. Ao pedirem uma demonstração, uma pessoa, contratada especificamente para isso, digitou "2+2" e apertou uma tecla grande, chamada ENTER, mais ou menos do tamanho da palma de sua mão. Silêncio no local... todos aguardavam o que a nova revolução mundial iria responder. Um repórter ainda cochichou que achava que a máquina não servia pra nada, quando surgiu incrivelmente na tela: "3.999999999". "É uma ótima aproximação!", gritou um cientista. E os repórteres, que ocupavam a rua ao lado (pois o computador era tão grande e orgulhoso que requeria um prédio só para ele), apenas sussurraram um longo "Ooooh!". No outro dia, a manchete na primeira página: "O computador substitui o professor de matemática: basta pressionar uma tecla".
     E o homem desenvolveu o computador. Foi um capricho dos cientistas, eles o estavam considerando um pouco lento, só porque, como ele estava acostumado a calcular "2+2", demorou quase três meses para calcular "2+3". E ainda errou.
     E o homem diminuiu o tamanho do computador. E, por incrível que pareça, ao invés dos cientistas ficarem decepcionados, ficavam cada vez mais felizes ao descobrirem que um computador com a metade do tamanho do anterior, conseguia fazer o dobro das coisas que o outro fazia.
     E o homem viabilizou o computador. Na década de setenta, o computador tomou o tamanho de apenas uma mesa e sua utilização foi se tornando cada vez mais fácil: qualquer PhD em programação utilizava-o com facilidade. Mas não estavam conseguindo vender o produto, até terem uma idéia de gênio: criar os joguinhos para computador. Em pouco tempo, cerca de cinco ou seis residências, só nos Estados Unidos, já possuíam computadores próprios: um recorde de vendas nesse ramo. Com o apurado, a indústria diminuiu ainda mais o tamanho do computador e resolveu incrementá-lo à família.
     E o homem domesticou o computador. O preço do produto caiu muito na década de oitenta. Casas do mundo inteiro já possuíam computadores. Alguns já o chamavam de Rex, outros queriam saber como fazer para adquirir seu pedigree, mas o que interessa é que esse bichinho invadiu as residências de todo o planeta.
     E o homem aprendeu a usar o computador. Tudo foi se tornando mais fácil em sua utilização. Qualquer adulto conseguiria utilizar o computador, desde que tivesse um filho por perto para ensiná-lo. Alguns, após anos de utilização apenas em jogos, um dia descobriam, espantados: "Olha, filho, ele também escreve! Agora entendi pra que é que serve este teclado".
     E o homem se apaixonou pelo computador. Jovens e adultos de todo o mundo começaram a utilizar o computador como uma necessidade, não só pra se divertir, mas também, às vezes, para trabalhar. Eles passavam o dia inteiro em frente àquela máquina, na escola ou na empresa, e quando chegavam em casa, iam direto para o escritório ou para o quarto, onde se encontrava outro computador. E ali ficavam por horas e horas, e acabavam por dormir tarde da noite, se ainda dormissem. Aquela máquina conseguia fazer tudo o que eles precisavam, lhes dava prazeres, lhes dava recursos para o trabalho, fazia cálculos, servia como enciclopédias, dava acesso a outros computadores de todo o mundo... mas faltava alguma coisa naquela máquina. Alguma coisa, que ninguém sabia o que, mas que ali não estava presente. Os homens começavam a se perguntar o que estava faltando: seria um programa novo? Uma nova forma de acessório? Seria algum tipo novo de prazer?
     E a mulher desligou o computador.


Retornar ao índice de contos
Retornar à pagina principal