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Abrir os olhos para a solidariedade

Francisco Neto de Assis

Sou partidário da hipótese de que o crescimento da lista de espera por transplante é resultado do aumento do acesso aos serviços de saúde e também de um serviço de saúde que negligencia as ações preventivas das doenças por causa da adoção de um modelo mecanicista e reducionista em detrimento de uma visão sistêmica, que enfocaria o indivíduo como um todo indissociável, interagindo com o seu meio físico e social. Neste contexto, muitas ações de saúde pública, apesar da elevada resolutividade individual, tem contribuido pouco para a saúde da população.

Mesmo assim, vibro com as notícias que dão destaque para pessoas que têm a incrível capacidade de em momento de extrema dor, doar os órgãos de um ente querido recém falecido.

Foi o que aconteceu no último dia três de janeiro, quando uma captação de múltiplos órgãos ocorrida na Santa Casa beneficiou pessoas que esperavam córneas, rins, fígado e coração. Elas estão revendo o mundo mais da cor do céu, se livraram da escravidão da hemodiálise, vivem com menos melancolia e vão amar por mais muitos e muitos anos.

Uma parceria entre as Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplantes (CIHDOTT), a Azonasul e o Conselho Municipal de Saúde permitiu a realização, em dezembro do ano passado, do I Fórum de discussão do processo doação e transplante de órgãos na região sul do RS, com a participação do Ministério da Saúde e da ADOTE. Como resultado, foi produzido um documento que traça, em verdade, um plano estratégico para responder uma questão inquietante: Como aumentar a notificação e captação de órgãos e tecidos em Pelotas? Naquela oportunidade foi dito que o Fórum seria um marco na história dos transplantes em nossa cidade e esse desafio foi assumido por todas as CIHDOTT. A captação de órgãos no início do ano pode ser um sinal dessa disposição.

Pelotas, dada sua situação geográfica, tem a possibilidade de identificar por ano entre 40 e 60 potenciais doadores de múltiplos órgãos, ou seja, pessoas em situação de morte encefálica. Tem todas as condições estruturais para tal: hospitais, clínicos, cirurgiões, enfermeiros e pessoal de apoio capacitado. Com respeito à doação de tecidos tem mais: uma unidade de saúde habilitada para captar, transportar, processar e armazenar tecidos oculares de procedência humana para fins terapêuticos, de pesquisa ou ensino. Além disso, essa unidade está também muito bem equipada para realizar transplante, pois para isso foi concebida, e conta com profissionais, capacitados e autorizados pelo Ministério da Saúde para realizarem tal procedimento.

Entre janeiro e setembro de 2006, segundo levantamento realizado pelo Conselho Municipal de Saúde, pelo menos 460 pessoas poderiam ter sido doadoras de córneas nos hospitais de Pelotas. No mesmo período, entretanto, apenas um par de córneas foi captado. Enquanto isso, pelo menos 1500 pessoas esperam por uma córnea no Rio Grande do Sul e muitas delas são pelotenses.

Só nos falta, portanto, abrir os olhos para a solidariedade.

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(c) 2007 F. N. de Assis