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                                                               Jobim
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Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim nasceu em 25 de Janeiro de 1927, na Tijuca, Rio de Janeiro. Em 1956 trabalhou como pianista e escreveu música em parceria com Billy Blanco, Dolores Duran, e  Newton Mendonça. Foi nesta época que encontrou  Vinícius de Moraes, começando uma grande amizade entre ambos.. " Com  Vinícius, eu pude escrever mais de três músicas por dia, disse Tom Jobim.
Como compositor, arranjador, intérprete, produtor e até como amigo de botequim, Tom atraiu para si todo mundo que veio antes dele. É só estudar seu currículo e suas amizades, admirações e parcerias. Tom - ironicamente, o homem da bossa nova, o modernizador das harmonias, o artista que deu um alcance internacional à música brasileira - era um ardente cultor do passado. E nunca se cansou de dizer que só acreditava no novo de quem também soubesse fazer o velho.
Ele era um compositor do piano, não do violão, como os fundadores da música brasileira: Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Sinhô, Ary Barroso, Custódio Mesquita - e há traços de todos eles em sua obra. Ary era seu amigo e, numa época em que a bossa nova estava na mira dos musicossauros como “pouco brasileira”, foi um dos primeiros nomes da velha guarda a exaltar publicamente seu talento. Tom, por sua vez, gravou, de Ary, Na Batucada da Vida (duas vezes), Pra Machucar meu Coração e Aquarela do Brasil - esta com uma grandeza épica e deliciosas ginga e sensualidade, numa época (cerca de 1970) em que a ordem era menosprezar como “patrioteiros” os sambas-exaltação de Ary.

Mas Tom era também um homem do violão, como o demonstra seu amor por Dorival Caymmi, de quem foi tão próximo e com quem partilhou discos e shows. Tom via em Caymmi um irmão mais velho e fez com que seus filhos crescessem juntos com os dele. Gravou Maracangalha, Saudade da Bahia e várias outras músicas de Caymmi, como se ele próprio, Tom, não tivesse uma obra inteira com que se ocupar. Ouvindo-os em dueto, é fácil perceber o quanto tinham em comum musicalmente, além da paixão pelo mar e pelas pescarias.

           Tom gravou Pixinguinha (Carinhoso), que admirava como músico, compositor e bebum, e nunca esqueceu que o choro foi uma de suas profundas influências - confira o quanto de choro está contido em Chega de Saudade, a música inaugural da bossa nova. Tom era também ligado à música dos bailes fuleiros de carnaval, o que se nota ao ouvir a ênfase que dava em seus arranjos ao mais carnavalesco dos sopros, o trombone - e não foi por acaso que, com Miúcha e Chico Buarque, ele gravou A Turma do Funil, de Mirabeau, sucesso do carnaval de 1956. Falando em trombone, acrescente-lhe a flauta (outro instrumento que Tom privilegiava em seus arranjos) e você terá a espinha dorsal do tão brasileiro “conjunto regional” do passado.

Para um homem tão associado ao mar, era impressionante a ligação de Tom com o mundo rural e, em Matita Perê (o LP de Águas de Março), ele fez um disco inteiro com sabor de Guimarães Rosa. O próprio baião o atraía e está presente em boa parte de seu disco Stone Flower. Também nunca perdeu de vista o folclore e tornou-se até parceiro de Jararaca, ao adaptar O Boto. Folclore? Tom seria capaz de discutir Villa-Lobos com o próprio Villa-Lobos. Sem falar em Radamés Gnatalli e Leo Peracchi, mestres brasileiros da orquestração moderna e que ele tinha como heróis. E as muitas valsas, serestas e modinhas que compôs? Eram sua maneira de visitar o Brasil de 1900, o Brasil de seus avós maternos, os Brasileiro de Almeida.

Noel não viveu para ouvir Três Apitos e João Ninguém gravados por Tom. Que pena. Ele iria adorar ...
Texto baseado em artigo publicado na Revista Ícaro Brasileira, de autoria de Ruy Castro, 51 anos, que é jornalista e escritor, além de autor de Chega de Saudade - A História e as Histórias da Bossa Nova e Estrela Solitária - Garrincha (Companhia das Letras). Mora no Rio de Janeiro e é colaborador de O Estado de S. Paulo 

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