Monge Marcelo Barros
"O mundo não alcançará a paz se as religiões não colaborarem. Por motivos históricos, as religiões não entrarão neste caminho se as Igrejas cristãs não avançarem na busca da unidade". Esta reflexão, proposta pelo teólogo suíço Hans Küng, hoje é convicção de muita gente, em diversas religiões e igrejas. O ecumenismo não é um assunto apenas interno das Igrejas. Interessa a todo mundo que busca a paz mundial.
Desde a década de 60, a busca da unidade entre as igrejas e o diálogo entre as religiões tem sido preocupação constante do ministério dos papas. João XXIII escreveu uma carta sobre este tema, criou em Roma um Secretariado para a Unidade. Afim de melhor preparar a Igreja Católica à unidade, convocou todos os bispos católicos do mundo e convidou representantes de outras igrejas para participar. Paulo VI ajoelhou-se em meio à sala do Concílio e, publicamente, pediu perdão aos irmãos de outras igrejas pela parte de culpa que a Igreja Católica tem na divisão. João Paulo II continuou este exame de consciência. Em todas as suas viagens, tem falado deste assunto. As recentes fotos mostram o papa (acabrunhado pela idade e pela doença) como o primeiro líder católico a orar na mesquita de Damasco, junto com os irmãos muçulmanos. Há dois anos, um representante seu assinou com autoridades luteranas um acordo que punha fim a uma divisão de 500 anos sobre a justificação.
O atual movimento pela unidade das Igrejas não é iniciativa católica. Nasceu em 1910, no seio das Igrejas protestantes. A Igreja Católica não concordou. Só em 1964, em meio ao Concílio Vaticano II, publicou um documento no qual diz: "A divisão é contrária à vontade de Cristo, é um escândalo para o mundo ao qual os cristãos pregam amor e, assim sendo, é um obstáculo ao cumprimento da missão". Até hoje, a Igreja Católica não participa oficialmente do Conselho Mundial de Igrejas que, desde 1948, reúne confissões evangélicas e ortodoxas, congregando, hoje, 340 Igrejas.
A união desejada entre as Igrejas respeita a autonomia de cada uma e a diversidade de ritos e doutrinas. Visa a unidade de espírito na diversidade e não a uniformidade de estruturas eclesiásticas. Esta unidade é dom de Deus. O primeiro trabalho para alcançá-la é a oração. Na Igreja Católica e em Igrejas evangélicas, há mais de cem anos, surgiu o costume de dedicar os dias antes de Pentecostes a uma Semana de Oração pela Unidade das Igrejas. Um pioneiro desta prática, o padre Paul Couturier, nos convidava a orar "pela unidade que Deus quiser, quando e do modo que Ele quiser".
No Brasil, nesta última semana de maio, oito Igrejas diferentes estão vivendo esta espiritualidade e meditando na palavra de Jesus: "Eu sou o caminho, a verdade e a vida". Dizendo isso, Jesus não negou o valor das outras religiões e caminhos espirituais. Ele elogiou a fé de samaritanos, curou o filho do oficial romano e a filha de uma mulher cananéia. Para os cristãos, Jesus é um paradigma universal. Nele, reconhecemos estar em presença do caminho, verdade e vida de Deus, em qualquer igreja, religião ou cultura, na qual a pessoa se entrega à realidade última e se dedica à causa da justiça, da paz, da fraternidade e da solidariedade. Numa palavra: à causa da vida.
Que esta semana da unidade ajude os cristãos
a descobrir em Jesus o caminho que nos leva aos outros e nos faz contemplar
a presença de Deus no diferente. Isso levará as Igrejas e religiões
a se engajarem mais na humanização da sociedade. Poderíamos
dizer da unidade o que uma história judaica diz da redenção:
Um dia, Yehouda Amicai sentou-se com dois pãezinhos no jardim perto
da porta da Cidadela em Jerusalém. Um guia disse ao povo: "Vêem
aquele homem sentado com dois pãezinhos? Ao seu lado, há um
arco da época romana". Amicai escreve: "A redenção
será proclamada somente quando os guias disserem: "Vêem
aquele arco da época romana. Não é importante. Mas, ali
perto do arco, há um homem que comprou fruta e verdura para a sua família".