Frei Betto
Orar é entrar em sintonia com Deus. Há muitas maneiras de fazê-lo, e não se pode dizer que esta é melhor que aquela. Há orações individuais ou coletivas, baseadas em fórmulas ou espontâneas, cantadas ou recitadas.
Nós, ocidentais, temos dificuldade de orar, devido ao nosso racionalismo. Em geral, ficamos na soleira da porta, entregues à oração que se apóia nos sentidos (música, dança, mirar vitrais ou paisagens etc) ou na razão (fórmulas, leituras, reflexões etc). Orar é entrar em relação de amor. Como ocorre entre um casal, há níveis de aprofundamento entre o fiel e Deus.
Na oração, é preciso entregar-se a Deus. Se temos resistência à oração é porque, muitas vezes, tememos a exigência de conversão que ela encerra. Parar diante de Deus é parar diante de si mesmo. Como num espelho, ao orar vemos o nosso verdadeiro perfil dobras do egoísmo realçadas, mágoas acumuladas, inveja entranhada, apegos enrijecidos. Daí a tendência a não orar ou fazer orações que não revirem ao avesso a nossa subjetividade.
Os místicos, mestres da oração, sugerem aprendermos a meditar. Esvaziar a mente de todas as fantasias e idéias, e deixar fluir o sopro do Espírito no silêncio do coração. É um exercício cujo método a literatura mística ensina. Mas é preciso reservar tempo para isso. Assim como a relação de um casal arrefece se não há momentos de intimidade, do mesmo modo a fé se debilita se não nos recolhemos em oração.
Só a força do Espírito
dilata o coração. Portanto, uma vida de oração
se avalia, não pelos momentos entregues a ela, e sim pelos frutos na
vida cotidiana: os valores elencados como bem-aventuranças no Sermão
da Montanha (Mateus 5, 1-12). Ou seja, pureza de coração, desprendimento,
fome de justiça, compaixão, destemor nas perseguições
etc.