ARTIGO_1
Jaime Kemp em.:

RÁPIDO DEMAIS... CEDO DEMAIS...

 

 

 

 

 

 



     Embora a grande maioria de minhas lembranças infantis não sejam agradáveis, há alguns momentos que se destacam em minha mente como fatos extremamente prazerosos. Um deles refere-se à pescaria que meu pai e eu costumávamos fazer periodicamente.

     Tudo era muito emocionante para mim. Nós gostávamos de colocar no bagageiro da nossa pick-up Ford, modelo T, 1929, todo equipamento de camping e pesca, e partir em direção às montanhas do norte da Califórnia, em busca de um rio tranqüilo, aparentemente repleto de peixes e, esquecer da vida por uns dias.

     À noite dormíamos em barracas. Durante o dia nadávamos, pescávamos e assávamos os peixes ali mesmo, numa espécie de fogão à lenha que construíamos muito rudimentarmente, mas muito eficaz. Era muito divertido! Que saudades eu sinto daquelas horas maravilhosas ao lado de meu pai!

Recordando minha infância e adolescência, o fator mais relevante que posso detectar é que me foi dado tempo e oportunidade de crescer, amadurecer e evoluir conforme a necessidade de cada fase. Eu não fui atropelado e bombardeado pela mídia, por costumes, por modismos. Eu cresci à vontade, naturalmente.

     Nunca fui um pequeno adulto.  Durante todos os verões sempre andei descalço, sentindo a força da terra em meus pés; brinquei de mocinho e bandido até a pré-adolescência; fui um escoteiro dedicado e entusiasmado por muitos anos. Ninguém me forçou a ser o que ainda não podia ser; ninguém exigia atitudes e comportamentos que eu não tinha condições de ter.

     Eu cresci como um rio que corre livre e calmo. A vida foi me ensinando a crescer da maneira que ela julgava normal e natural.

     Após quatro décadas, observo as crianças de minha vizinhança, ou os filhos e netos de meus amigos e concluo que já não é mais assim. Você também já notou isso? Meninas de nove, dez anos de idade, usam brincos enormes e chamativos, às vezes dois, três, quatro numa mesma orelha; depilam suas pernas e sobrancelhas; maquiam seus rostos de modo pesado, demasiadamente artificial; pintam, frisam, cortam e recortam seus

cabelos e andam enfeitadas por uma grande e variada quantidade de penduricalhos. Agora, a moda é usar brincos no nariz, nos lábios, na língua, no umbigo.

     Em meu ministério com adolescentes nas escolas, tenho visto centenas delas. Sua aparência é um misto de inocência e confusão. São semelhantes a pequenos bezerrinhos, incautos e desprotegidos que rumam para o matadouro. Elas têm medo, mas não podem confessar.

Estão crescendo rápido demais, cedo demais.

     Tudo isso me faz lembrar de uma festa para a qual fui convidado.

     A menina estava completando sete anos de idade. Ela brincava descontraída e alegremente com seus amiguinhos de esconde-esconde, cabra-cega, pega-pega, colocar o rabo no burro, etc. Havia bolo, sorvete, cachorro-quente e outras delícias.  Mas quando ela foi abrir seus presentes, depois de todos terem cantado o "Parabéns à Você", toda magia da ingenuidade infantil se foi. Ela ganhou uma calça jeans Calvin Klein de sua tia, roupas íntimas Christian Dior de sua avó e um exuberante vestido de festa Yves Saint Laurent da mãe.

     Entendam-me, minha preocupação não está em presentear uma criança com roupas bonitas, mas na mensagem sutil que há no ataque feroz que as grandes grifes colocam em suas propagandas, que é: "Criança, cresça rápido! Você é um consumidor em potencial!"

Músicas, livros, filmes e TV, gradativamente têm explorado o crescimento precoce de nossos meninos e meninas. Tais fatores e imagens obrigam e impulsionam as crianças a serem o que naturalmente não seriam, a evoluir rápido demais sem a maturidade necessária.

     Sentimentos e emoções são elementos complexos na integração do desenvolvimento infantil. Eles têm seu tempo e ritmo e não podem ser apressados. O crescer, atualmente, já suscita certas dificuldades, e isso é ainda pior para os garotos e garotas que são pressionados a serem adultos, pois dentro deles ainda há uma criança confusa, amedrontada e despreparada. Existe também o risco de sua estrutura emocional não resistir e de se desequilibrarem por toda a vida.

Os traumas infantis peculiares desta época, em meu modo de entender, têm relação com o que estou expondo nesse artigo. A pressão sofrida pelas crianças a serem adultos mirins, as tem precipitado a se tornarem alcoólatras ainda muito jovens, a prostituírem-se durante a pré-adolescência, a envolverem-se em criminalidade e a praticarem suicídio num índice alarmante. Certamente, essa situação evidencia que há algo errado. É um alerta para cada um de nós.

As Escrituras sabiamente declaram: "Tudo tem o seu tempo

determinado, e há tempo para todo o propósito do céu" ( Eclesiastes 3.1 )..

Sei que não posso mudar o mundo. A mensagem da mídia é muito forte, no entanto, precisamos nos conscientizar do que está acontecendo. Esse é o primeiro passo. A seguir, gostaria de deixar uma sugestão aos pais: Que tal darmos tempo para as crianças serem crianças? Crescerem vagarosa e cuidadosamente, protegidas, respeitadas, amadas, compreendidas, com toda chance de desfrutarem de sua ingenuidade?

Que Deus dê sabedoria aos pais para, cada um em seu contexto, conseguir equacionar os tempos atuais com a necessidade de um crescimento normal. Se não for assim, será rápido demais, será cedo demais!

(Este artigo foi originalmente impresso na Revista Lar Cristão 38, como Artigo Tema, pg. 7)