Nada Mais
Não
há mais que inventar.
Não há mais que dizer.
A sintaxe está gasta.
As imagens estão gastas.
Mesmo a Morte está gasta
E todos os poetas
O deviam saber.
A
moral está já gasta.
Gasta a anormalidade,
E a imoralidade,
E a amoralidade.
Gastos
os sentimentos
E todos os tormentos,
Mais os grandes amores
E todos os pavores.
Gastos os rios e serras,
Mais os erros das guerras.
Gasta a Ciência e a Arte.
Gastos,
lutos, enterros,
Cemitérios, jazigos,
Lágrimas, desesperos,
Sacrilégios e perigos,
Crimes, roubos e monstros,
Lirismos e jardins,
Naufrágios, terramotos
E o dilúvio do Fim,
Planetas e vigílias
De mortes pressentidas,
Mais o amor das famílias.
Gastas todas as vidas!
Que
tudo está já gasto
Porque morreste um dia.
Porque à tua paixão
Opuseram traição.
Aos teus braços de mel
Só opuseram fel.
Ao teu canto, ao teu riso
De ave do Paraíso,
Opuseram cegueiras,
--Monte das Oliveiras!
E
se à minha paixão
Opuseram traição;
Se ao meu canto, aos meus risos,
Negaram Paraísos,
E cegaram meus olhos
Com pedradas certeiras,
Foi bem mais triste o teu
Monte de Oliveiras.
Todo
o futuro é gasto
Porque morreste um dia.
Procurar-te,
é bem pouco.
Achar-te, era demais.
Em mim, em qualquer ponto,
Te escondes e te esvais...
Natércia Freire