"Sinais da Revelação de Deus"
Revelação e Nova Jerusalém
O Contexto da Revelação de Deus, o templo celeste e a terra prometida, que o rodeiam, apresentam traços do paraíso reencontrado, visualizado, experimento como no Ap 21, 1-5. Este texto, que convida a imaginação a ir além do tempo, prossegue a sua descrição da Nova Jerusalém (Ap 21, 9-27 usando imagens de Ezequiel e Isaías. Lugar de reunião dos eleitos, que vem de todas as partes (Ap 21, 24-26). A Nova Jerusalém abraça, em si mesma, a glória de Deus (Ap 21, 11). A sua dependência, em relação a Cristo, é caracterizada pelo fato de que os seus doze alicerces trazem "os nomes dos doze apóstolos do Cordeiro" (Ap 21, 14). A sua inclusão, numa criação inteiramente sacralizada, está na seguinte citação:
"Não vi nenhum templo, pois o seu templo é o Senhor, o Deus todo-poderoso, e o Cordeiro. A cidade não precisa do sol ou da lua para a iluminarem, pois a glória de Deus a ilumina, e sua lâmpada é o Cordeiro" (Ap 21, 22-23).
Com isso vemos um simbolismo "figurativo" da nova Jerusalém, do novo templo, da nova aliança que os profetas usavam para evocar a felicidade prometida ao povo de Deus. Além do recurso do simbolismo figurativo, temos a linguagem com o uso de verbos importantes (p.ex. ver, ouvir) para mencionar a realização da promessa de Deus outrora revelada.
Assim, o texto narra que João viu um novo céu e uma nova terra. Ele viu descer do céu, de junto de Deus, a cidade santa , uma Jerusalém nova (Ap 21, 2 ). Nisto, aquele que vê é o mesmo que pode, acertadamente, proclamar. João usa aqui o verbo ver a fim de mostrar-nos como já se pode contemplar a realização da promessa de Deus. Deste modo, João apresenta como se concretizará o futuro que Deus revela na história. Trata-se da reconstrução do céu, uma reconstrução que tem por fundamento a utopia e a esperança do povo na realização do novo. Assim, dizemos que "o tema da Jerusalém celeste é quase clássico no judaísmo tardio. Ele remonta com certeza as profecias de Isaías 60, onde a restauração da cidade é anunciada em termos tão extraordinários que é preciso relacioná-los com uma cidade escatológica fundamentalmente transfigurada" .
Para João, o ponto de partida de sua esperança escatológica consiste, antes de tudo, na crença alicerçada no ato salvífico de Deus em Jesus, e na sua obra redentora, que significa vitória. Assim, chegar-se-á à vida eterna, isto compreendido como a vitória final sobre os adversários, sobre as tentações, as seduções e as perseguições. Será enfim, a realização da esperança. Por isso se dirá que a fé e a esperança passarão. Sobrará, portanto, só o amor. Surge, assim, da mão do Criador a novidade, toda a criação será recriado! No entanto, "a criação de que se fala aqui não se contrapõe à do Gênesis no sentido que se pressuponha a destruição da realidade criada no início para ser recriada de outra maneira" .
No livro da Revelação, João afirma ter visto ( Ap 21,1), em sua experiência no Ressuscitado e, segundo o Espírito Santo, a realização concreta do novo céu e da nova terra. Essa realização, na perspectiva simbólica de João, quer abarcar a expressão da renovação da era messiânica. Isso, por sua vez, se cumpre através da presentificação do Filho amado do Pai: Jesus Cristo. Assim, os "novos céus e a nova terra" que Deus então criará (Is 65, 17) darão, por sua vez, à morada dos homens a fisionomia do paraíso primitivo, com sua fertilidade e suas condições de vida maravilhosa (Am 9, 13; Os 2, 23ss; Is 11, 6-9; Jr 23, 3; Ez 47, 1s; Zc 14, 6-11). Portanto, "este é, sem dúvida, o núcleo do texto: os cristãos fiéis, os vencedores, trazem o homem novo, o do Cristo vivo (2.17; 3,12); a vida deles é um culto novo (5, 9; 14, 3); que o cordeiro finalmente tornou possível; eles são os cristãos da novo Jerusalém (3, 12; 21, 2). É a proclamação de um novo modo de viver um universo que participa desta renovação" .
Assim, a 'posse' da terra tem um sentido escatológico, por que em si, uma vez a ela pertencendo, já demonstra por iniciada a nova terra desde o céu. Assim, poderíamos dizer que o cume, o ponto alto da esperança do Povo de Deus, está na Promessa de Jesus: "Bem-aventurados os mansos, porque receberão em herança a terra" (Mt 5, 4). Esta é, sem dúvida, a grande promessa referendada em Ap 21, 7. No mesmo sentido, as palavras de Paulo, expressam igual significado: toda criação será um dia renovada, libertada da corrupção, transformada pela glória de Deus ( cf. Rm 8, 19ss). Essa renovação coincide com a glorificação do Filho sentado no trono de Deus ( cf. Mt 19, 28) onde o céu deve acolher tudo até os tempos da restauração de todas as coisas ( cf. At 3, 21).
Adentrando a reflexão, vemos que João é aquele que ouve e, quem ouve tem a possibilidade de tomar consciência dos fatos no horizonte comunitário. A expressão de João: eu ouvi uma voz forte...( Ap 21,3), colabora, nessas circunstâncias à conscientização da comunidade no tocante a renovação de todas as coisas.
A renovação geral proposta é relativa ao ambiente em que vivem os filhos de Deus. Neste sentido, a renovação de todas as coisas, interessa especialmente a Jerusalém. Por que em torno da nova Jerusalém é que gira todo o empenha do Senhor Deus para que tudo realmente se renove. Isso acontecerá de modo integral no final dos tempos (Ap 21, 6). "Aí se conclui e se completa a criação e a redenção de tal maneira que se cria uma nova dimensão do ser no cosmos, um cosmos integrado por Jesus Cristo em Deus e, com o cosmos, serão integrados também os homens" . Quanto as relações que se formam com a nova criação, "conclui-se e se aperfeiçoa a solidariedade insolúvel entre o homem e o cosmo, aquela solidariedade que inclui um SIM e AMÉM do Deus Criador de toda a realidade criada" .
Quanto a cidade santa, a Jerusalém, João a simboliza como o lugar ideal, alegre, festivo e celebrativo, onde se encontram os fiéis que louvam e glorificam a Deus. Essa visão, e até numa perspectiva mítica , visa proteger a comunidade do Povo de Deus frente a injustiça e a exploração do homem pelo homem. E que, no tocante a localização espacial, refere-se ao céu, isto é, uma Jerusalém celeste . Isso, por sua vez, tem como fonte inspiradora em João, os textos do profeta Oséias (2, 19.21), bem como Isaías (44, 6; 54, 1ss.; 61, 10) e Ezequiel (16). Esse contexto alude a proximidade de Deus como o povo, um Deus que está unido a criatura semelhante a um casal que se dá em casamento.
É nesta perspectiva, que o texto nos fala em morada de Deus ( Ap 21, 3-4), e que desta feita, tem como indicativo, a presença divina de Deus em nosso meio . A nova Jerusalém é a morada de Deus na terra . João escreve inspirando-se em Lv 26, 11, onde se lê: "Estabelecerei minha morada em meio de vós e não vos rejeitarei. Caminharei entre vós, e serei para vós Deus e vós sereis o meu povo". Neste sentido ainda, podemos recordar o modo joanino de colocar a questão: "o Verbo se fez carne e pôs sua morada entre nós"(Jo 1, 14).
Do que dissemos até aqui, pode-se concluir que, tanto o céu, que agora é novo, como a terra que se renovou sucumbindo toda forma de morte; tornam-se o triunfo da vida. "A ordem vem sobrepor-se ao caos; a luz sobre a trevas; a compaixão triunfa sobre todo o pranto, clamor e dor, já não há mais nenhuma maldição. Essa superação remete à transcendência que não seja, desta feita, a negação da materialidade ou da coporeidade, mas sim sobre a morte, o caos, a dor, as trevas, o sofrimento e a maldição. No entanto, continuará havendo céu, terra, cidade; continuará havendo história, porém agora sem morte e sem maldição" . Vivemos na cidade terrena, organizada e fraterna. Aqui tudo o que é do céu chega a ser visível sobre a terra. Desaparece, por assim dizer, a distinção entre céu e terra; agora tudo é terra, embora seja um terra transcendente e sem morte que toca os céus. Deus que tudo cria e renova, faz aqui sua morada: o céu desce a terra. O salvífico e o libertador são descendente, a fim de redimir a terra. Então, o novo é a redenção. Jerusalém se resplandece da glória de Deus.
A nova terra é o lugar da reconciliação e da comunhão total da humanidade. É a concretização da nova Jerusalém. Ela será o lugar do encontro e da comunicação entre milhares de seres humanos, o lugar da unanimidade e da multiplicação dos contatos e das relações. Portanto, na nova terra, a humanidade será um só povo, sem dominação nem autoridades, nem mediações, pois serão um povo de reis e sacerdotes (Ap 1, 6). Será, deste modo também, o fim da pobreza, da tristeza e do luto. Não haverá mais fome, nem sede, nem lágrimas. O que era a condição humana na terra está superado. Talvez aqui perguntas podem ser feitas no tocante à realização desta promessa. Por exemplo: diante da mistura de amor e ódio pode-se acreditar numa nova criação ?
Por isso, "quando se insiste no aspecto futuro da realidade anunciada, tomamos o cuidado de sublinhar a relação entre a realização vindoura e as premissas atuais. De outro lado se quer visualizar as realidades presentes à luz que sobre elas projeta o seu cumprimento derradeiro" .
"Na confiança no poder renovador de Deus vos conclamamos: participai da antecipação do Reino de Deus e fazei com que já hoje se torne visível algo da nova criação que Cristo consumará em seu dia" . Assim dizemos que, com a Ressurreição de Jesus, os cristãos já estão no céu com ele e que o Pai o "ressuscitou e os fez tomar assento nos céus"(Ef 2, 6). Por esta razão, a obra de Jesus consiste em unir indissoluvelmente a terra ao céu, em fazer com que 'venha o Reino dos céu', que a vontade de Deus se faça 'na terra como no céu'(Mt 6, 10). Da mesma forma, deseja que toda a humanidade seja 'reconciliada por ele na terra como no céu'(Cl 1, 20).
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