Ronald Kyrmse                                 kyrmse@yahoo.com.br

POLINEMAS
Ronald E. Kyrmse

Polinemas são as formas, topologicamente diferentes entre si no plano, de unir segmentos retos pelas suas extremidades. O caráter bidimensional decorre da restrição ao plano, e a união dos segmentos implica a não-descontinuidade dos polinemas. Quaisquer dois segmentos unidos por ambas as respectivas extremidades não integram polinema — ou seja, um polinema não contém segmentos duplos.

O conceito de polinema surgiu da abordagem empírica: "Quantas figuras diferentes podem ser construídas com n segmentos?", e trata-se com efeito de uma generalização dessa questão. O termo deriva do grego nêma "fio".

Em particular, para n segmentos, os polinemas são ditos de ordem n. Utilizam-se convenientemente as denominações mononema, dinema, trinemas etc.
Nós são pontos onde dois ou mais segmentos se ligam.
Braços são extremidades livres de segmentos. Um polinema que não possui braços é dito abráquio.
Ciclos são subconjuntos do plano completamente cercados por segmentos do polinema, sem serem atravessados por nenhum outro segmento.
Os números de segmentos, nós, braços e ciclos de um dado polinema são designados respectivamente por x, y, z e k. O conjunto dos polinemas de mesmo x, y e z é notado como [x, y, z], e cada um de tais conjuntos não contém necessariamente um único polinema; na verdade comumente ocorre o oposto.

Existem os seguintes números de polinemas das oito primeiras ordens:

x
1
2
3
4
5
6
7
8
Número
1
1
3
5
12
30
79
227
Uma listagem desses polinemas é dada.

Teorema 1
Tese: A relação x + 1 = y + z + k é válida para todo polinema.
Hipótese: Todo polinema de ordem superior a 1 pode ser derivado do mononema por acréscimos sucessivos de segmentos.
Demonstração: A demonstração ocorre por indução completa: Se a relação valer para o mononema, e puder ser demonstrado que valerá para um dado polinema caso valha para outro que tem um segmento a menos, será então válida para todos os polinemas.
Para o mononema a relação vale, pois x = 1, y = 0, z = 2, k = 0.
Seja um polinema P0 com x = x0, y = y0, z =z0, k = k0. Há cinco maneiras diferentes de se acrescentar um novo segmento, produzindo os polinemas Pi (1 £i£ 5) com x = xi, y = yi, z =zi, k = ki:
1. Ambas as extremidades do novo segmento se ligam a nós de P0:

x1 = x0 + 1; y1 = y0; z1 = z0; k1 = k0 + 1
2. Uma extremidade do novo segmento se liga a um nó de P0 e a outra permanece livre:
x2 = x0 + 1; y2 = y0; z2 = z0 + 1; k2 = k0
3. Uma extremidade do novo segmento se liga à extremidade livre de um braço de P0 e a outra permanece livre:
x3 = x0 + 1; y3 = y0 + 1; z3 = z0; k3 = k0
4. Uma extremidade do novo segmento se liga à extremidade livre de um braço de P0 e a outra a um nó de P0:
x4 = x0 + 1; y4 = y0 + 1; z4 = z0 - 1; k4 = k0 + 1
5. Ambas as extremidades do novo segmento se ligam a extremidades livres de braços de P0:
x5 = x0 + 1; y5 = y0 + 2; z5 = z0 - 2; k5 = k0 + 1
Desta maneira, todo incremento de uma unidade em x implica um incremento igual na soma y + z + k. Portanto, a relação mencionada permanece válida em todos os casos.
Q. E. D.

Os cinco casos de acréscimo de segmento tratados no teorema acima podem ser ilustrados pela Figura 1, onde a linha mais espessa representa o novo segmento.

Para possibilitar a referência unívoca a diferentes polinemas, propõe-se um sistema de nomenclatura que supõe a existência de uma cadeia de segmentos principal (a mais longa cadeia contínua), ou de um polinema abráquio central, e descreve as cadeias laterais anexadas a essa cadeia ou polinema abráquio. Seguem-se alguns exemplos dessa nomenclatura:
Figura 2: 6(b1,b2) - A cadeia central compõe-se de 6 segmentos e possui duas cadeias laterais no nó b: uma de 1 segmento e outra de 2 segmentos.
Figura 3: 7(2b1,c1,d1) - A cadeia central tem 7 segmentos, e hhá quatro cadeias laterais: duas no nó b, ambas com 1 segmento, e uma com 1 segmento em cada um dos nós c e d.
Figura 4: 9(d3(b1)) - A cadeia central tem 9 segmentos; no nó d há uma cadeia lateral com 3 segmentos, que por sua vez tem uma sub-cadeia de 1 segmento no seu próprio nó b.
A nomenclatura de polinemas abráquios segue uma sistemática específica. A denominação do polinema da Figura 5, por exemplo, é C72B, contendo C (de cíclico), 7 (o número de segmentos), o subscrito 2 (o número de ciclos) e a maiúscula B, designando-o como o segundo na seqüência dos polinemas abráquios com x = 7, k = 2.

Corolário do Teorema 1
Os polinemas abráquios podem ser interpretados como diagramas de Schlegel de poliedros. Assim, por exemplo, C63 é o diagrama de um tetraedro, e C84B é o diagrama de uma pirâmide de base quadrilátera.
Por essa analogia:
o número de segmentos x representa o número de arestas A;
o número de nós y representa o número de vértices V;
o número de braços z é nulo, pois se trata de polinemas abráquios;
o número de ciclos k é menor em uma unidade que o número de faces F, pois este inclui também o contorno poligonal do diagrama de Schlegel, que no polinema não é considerado um ciclo.
Do Teorema 1, tem-se que:

A + 1 = V + 0 + (F - 1)
portanto:
A + 2 = V + F
Esta é a forma conhecida da Fórmula dos Poliedros de Euler, aqui demonstrada através das propriedades dos polinemas.

Observação Histórica
A idéia que originou os polinemas é de 1973. Só está sendo publicada agora, mais de um quarto de século depois. Eu a havia apresentado por carta a Martin Gardner - que então ainda escrevia sua coluna "Mathematical Games" na revista Scientific American - e esta foi a resposta dele, de 3 de novembro de 1973:
Obrigado por sua carta. Incluí um problema muito semelhante ao seu em uma antiga coluna que foi reimpressa no meu livro The Unexpected Hanging and other mathematical diversions [sic]; vide página 79 e segs.
Mostrei as figuras topologicamente diferentes que podem ser formadas com 1, 2, 3, 4, 5 ou 6 fósforos. No entanto, não considerei as junções como contas [eu havia dito que poderíamos interpretar os segmentos como seções de fio, unidas por contas em suas extremidades - RK], de modo que na minha interpretação uma "cauda" com dois fósforos é o mesmo que uma cauda com um fósforo, e um quadrado é o mesmo que um triângulo. Conseqüentemente minhas listas têm algumas figuras a menos que as suas.
Gosto da sua abordagem do problema, e manterei sua carta arquivada. Não vi em forma impressa precisamente o mesmo problema, tal como você o define. Gosto mais da sua versão do que daquela que usei, porque acho que é mais fácil de entender.

Vide também: Eric Weisstein's World of Mathematics
 

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