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Foi um estupro
Acusado de captar recursos em excesso
para o polêmico Chatô, o rei do Brasil, Guilherme Fontes reclama
das críticas impiedosas
Aziz
Filho
Guilherme Fontes não
parece saudoso dos tempos de galã da Rede Globo. Aos 33 anos, com uns
bons quilinhos a mais e fios de cabelo a menos, agora ele está preocupado
é com a finalização, como produtor e diretor, do longa-metragem Chatô,
o rei do Brasil, o filme mais caro do cinema nacional, com a
probabilidade de os gastos totais alcançarem a casa dos R$ 12 milhões.
É façanha considerável para um estreante num país em que cinema ainda
não é indústria. Fontes continua às voltas com problemas na Secretaria
do Audiovisual, da qual espera a aprovação da prestação de contas - o
secretário José Álvaro Moisés disse que até o momento não foram
encontradas irregularidades - e o sinal verde para captar cerca de R$ 2
milhões para os últimos 15 minutos da fita.
As filmagens foram
interrompidas em maio de 1999 por falta de recursos. Quase 100 pessoas
tiveram de ser dispensadas e Guilherme Fontes virou alvo número 1 de
grandes produtores, entre eles Luiz Carlos Barreto que o acusou de
arrecadar muito e produzir nada. O “novato que entrou na terra dos reis
para dividir um pouco o pão”, como Fontes se define, ainda teve suas
atividades bisbilhotadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
“Foi um estupro”, declara. Diante do resultado da investigação
inocentando-o, os acontecimentos começaram a mudar de rumo. Com dinheiro
novo de uma empresa de cartões de crédito, a Credicard, as filmagens
foram retomadas e agora o entra-e-sai na ZB Facilities (Zoetrope Brazil) -
finalizadora que ele montou com a tecnologia de Francis Ford Coppola no
Rio de Janeiro - em nada lembra a agonia do ano passado. Como se chegasse
ao fim do inferno astral, Guilherme Fontes rompeu um silêncio de quase um
ano para falar a ISTOÉ:
ISTOÉ - Quando
é que, finalmente, você vai concluir Chatô, o rei do Brasil?
Guilherme Fontes - Nos primeiros dias de maio quero fazer a pré-estréia
em dez capitais. Vou semear o gostinho de um filme maravilhoso. Outra
coisa é estar em circuito comercial, ter contrato com distribuidores.
Esse filme precisa de um marketing violento, direcionado, objetivo, ligado
ao produto, não um mar-keting especulativo.
ISTOÉ - Você
não gastou demais?
Fontes - Isso é folclore. Gastei rigorosamente o previsto em 1996,
quando o projeto foi aprovado. Podem todos ficar felizes, satisfeitos.
Cumpri meu orçamento com muito sofrimento, como alguém que,
financeiramente, começou do nada e que, do zero, realizou uma das mais
importantes histórias brasileiras, a de Assis Chateaubriand.
ISTOÉ - Será
a maior produção do cinema brasileiro?
Fontes - O importante é saber se é bom. Ninguém sai de um filme
falando que custou um ou dez milhões, sai falando “oba” ou “hum,
que merda”.
ISTOÉ - Quando
terminar, qual será o gasto total de Chatô?
Fontes - É muito difícil separar os custos dos vários produtos
do nosso projeto. Na fase de pesquisa, foram entregues os documentários.
Em seguida, distribuídas 40 mil fitas de 45 minutos. Em fase de filmagem
temos o seriado O caudilho e o jagunço, o longa e o making of. Ainda vou
entregar um especial de trilha sonora e de finalização, mostrando a
engenharia de produção.
ISTOÉ - O
público não tem o direito de saber quanto o filme custou?
Fontes - Eu ainda não acabei, mas sigo o mesmo plano de dezembro
de 1996, que foi de R$ 12 milhões para todos os produtos. Aliás, como o
orçamento de um filme é pensado em dólar, o preço final acaba sendo
bem menor do que o previsto. Captamos R$ 8,5 milhões. Outros R$ 2,4 milhões
são do meu bolso, que busquei com parcerias. A Globosat foi brilhante no
processo. Estão faltando uns R$ 2 milhões. O próprio filme deve montar
a credibilidade para atrair mais recursos. Quem tem de acabar de montar a
credibilidade fiscal e contábil é o Ministério. Os órgãos competentes
estão absolutamente sob controle. Os investidores não têm razão para
temer. Cria-mos um dos grandes fatos de marketing do cinema nacional.
ISTOÉ - Para
a sociedade, compensa aplicar tantos milhões em um filme?
Fontes - A sociedade não pode viver sem cultura. Se a produção
cultural não existir, não existirá a sociedade. O que salva o mundo
globalizado são as culturas próprias, as diversas formas de arte. As
indicações para o Oscar com Central do Brasil, O quatrilho, O que é
isso, companheiro? deram muita visibilidade, geraram notícias boas do
Brasil. Nunca o cinema gerou tanto espaço na mídia. Nossas participações
no cenário do cinema mundial foram magistrais, avançamos, arrasamos. A
Embratur deveria ficar feliz da vida com o cinema nacional porque vendeu
muito bem o País lá fora.
ISTOÉ - Qual
sua opinião sobre a indicação de Orfeu para eventualmente representar o
Brasil no Oscar?
Fontes - Gostei muito. Cacá Diegues é o Di Cavalcanti do cinema
brasileiro.
ISTOÉ - Mas
a projeção do cinema brasileiro não é pífia para o tamanho da nossa
economia?
Fontes - Poderia ser muito maior, mas hoje há um festival de
cinema em cada Estado. É sinal de que existe muita produção
independente, graças à Lei do Audiovisual.
ISTOÉ - Você
foi muito criticado, especialmente pelo cineasta Luiz Carlos Barreto, por
captar muito e produzir pouco. Que balanço faz dessas críticas?
Fontes - Houve muitos excessos. Tenho 33 anos, estou contando a
história de um dos brasileiros mais importantes, o cara que trouxe a
comunicação. No mundo da comunicação, é óbvio que vai gerar polêmica.
Quanto às críticas mais contundentes, digamos que eu seja aquele novato
que entrou na terra dos reis para dividir um pouco o pão. Se este pão não
viesse para o novato, estaria só com os sete reis. É natural que eles se
incomodem. Quanto à imprensa, a imprensa é assim mesmo. Está tudo
certo. O importante é que se fale do filme.
ISTOÉ - Por
que misturou realidade com ficção em Chatô?
Fontes - Quero que minha empresa tenha uma identidade muito própria
nas histórias que inventar e produzir. Assim como em Chatô,
nossos projetos galgam alguns degraus. Os documentários contam uma história
real. Se essas histórias realmente forem boas, podem virar longas de ficção
para o cinema. Com isso, exercito minha narrativa e meus roteiristas, que
são muitos.
ISTOÉ - Não
teme deturpar a história?
Fontes - Pelo contrário. Vou aguçar a curiosidade. Não há
mentira ou deturpação. Uso a história para que a gente tenha mais
curiosidade. Quem vê o filme fica com vontade de ler o livro.
ISTOÉ - Por
que no filme os nomes de personagens reais são fictícios?
Fontes - Foi uma opção clara de proteção. As pessoas estão aí,
vivas, tenho de respeitá-las. Estou em um momento em que não me
interessa a nomenclatura, mas o caráter brasileiro. Todos os personagens
são frutos da minha cabeça. Quem viveu viu. Quem não viveu vai
imaginar.
ISTOÉ - Qual
foi a participação de Francis Ford Coppola no seu filme?
Fontes - Foi de 100%. Ele atuou na roteirização, nos meus
conceitos de produção. Criamos uma empresa de finalização, a ZB
Facilities, financiamos um dos maiores filmes brasileiros. A finalização
de filmes nacionais tem sido feita só no Exterior, o que significa que
15% a 20% dos gastos com um filme acabam nos Estados Unidos.
ISTOÉ - O que falta para Chatô ficar pronto?
Fontes - Falta captar um resíduo. O Ministério está fazendo
contas, redimensionando. Acho que, no máximo em uma semana, vamos definir
métodos e caminhos para que todo mundo fique seguro, tranquilo, feliz.
ISTOÉ - O
governo pode interferir no seu filme?
Fontes - Se eu fosse eles, não faria isso. Ao concluir um filme de
uma hora e meia, vi que tenho um trabalho muito mais genial do que poderia
imaginar. Descobri que dá para finalizar com menos recursos do que previa
em maio de 1999. Eu pensava que iria precisar de seis semanas e meia de
filmagens. Em agosto, filmei mais três e meia, inclusive na França.
Imagino que as três restantes possam ser reduzidas para duas. Uma eu vou
fazer agora, graças a recursos recentes do Credicard. É o encontro de
Getúlio Vargas com Chatô no Sul, o momento aventura do filme. Acho que
posso fazer no Rio as cenas da Paraíba. E faltam os efeitos especiais com
cenas de Copacabana, mostrando o Rio da época.
ISTOÉ - As
investigações da Comissão de Valores Imobiliários e do Ministério da
Cultura não podem prejudicar sua imagem e sua carreira?
Fontes - Claro que não, pois não há nada de errado. Já foram
encerrados os processos administrativos, concluí-dos os da CVM, as
verificações do Ministério, as auditorias possíveis e imagináveis. Já
me sacudiram de tudo quanto é lado e não acharam absolutamente nada. Não
há o que me impeça de ir para a frente.
ISTOÉ - Como
você enfrentou esse período de investigações?
Fontes - Foram os piores momentos da minha vida. Eu estava criando
uma obra dificílima, com responsabilidade e lisura totais, quando a CVM
começou a ligar para todo mundo para saber se eu tinha pago ou não. Foi
um estupro. Sempre soube que fariam auditorias, mas os excessos estão no
sangue brasileiro. Todos os órgãos têm autoridade para investigar o que
quiserem. Estranho é virem só em cima de mim. Foi muito tempo de prejuízo.
Já imaginou um filme desses, um boeing desses, totalmente parado? De maio
até hoje, tive muito prejuízo em função do que foi publicado, da
suspeita de eu ter feito alguma coisa errada, desses pequenos e macabros
ataques. Além disso, o dólar dobrou e, no novo governo, mudou a maioria
dos diretores de empresas que me patrocinavam. Mas hoje estou rindo, me
divertindo porque a obra está linda.
ISTOÉ - O
que aconteceu de novo para você estar tão confiante?
Fontes - Fizeram todas as investigações e nada encontraram.
Portanto, nada mais errado do que me manter parado. Minha empresa é uma
fonte geradora de empregos e tecnologia. O próximo passo do filme é o
Ministério me aprovar no projeto Mais Cinema, de complementação. Eu me
candidatei no ano passado, mas em função do que aconteceu o Ministério
não foi tão veloz quanto poderia ter sido. Independentemente disso, meus
patrocinadores podem ficar tranquilos porque temos um grande filme na mão.
Temos uma hora e 35 minutos prontos. As metas foram cumpridas em 90% e
faltam só 15 minutos.
ISTOÉ - Por
que demorou tanto o processo de filmagem?
Fontes - Porque há uma dificuldade muito grande de se captar
recursos para fechar orçamentos. No momento em que os filmes começarem a
ser feitos com recursos totais, a margem de erro vai cair muito. Depois de
quatro anos e tantas dificuldades, é triste, mas é normal uma margem de
erro. A captação começou há três anos, em dezembro de 1996. Não é
muito tempo para um épico como Chatô. Foi pouco tempo. A aflição
é porque todo mundo está muito a fim de ver o filme. Eu também.
ISTOÉ - Você
ficou ou vai ficar rico com esta fita?
Fontes - De forma alguma. Eu reinvisto tudo. O que eu ganhei até
hoje na vida, como ator, produtor ou diretor, investi tudo nos negócios.
ISTOÉ - Em
algum momento se arrependeu de ter deixado a carreira de galã?
Fontes - Estou exercitando, atuando, dirigindo minha história,
fabricando meus sonhos, mitos e ideais. Procuro soluções para o cinema
brasileiro. Produzimos mais horas de filmes e documentá-rios do que muito
peixe graúdo. Quanto mais produzir, melhor. A Lei do Audiovisual é muito
interessante, democrática, porque permite à pessoa crescer, permite ao
jovem artista criar um projeto audiovisual. Um garoto de 18 anos que tiver
uma idéia pode seguir em frente. Tem de haver uma indústria de cinema no
Brasil. Hoje está dando sopa. É possível, para muitas pessoas,
investir. Há muito espaço para isso.
ISTOÉ - O
que é melhor, atuar em novelas ou produzir filmes?
Fontes - Olho meus amigos na tevê e fico com saudades, querendo
fazer coisas. Mas estou apaixonado por produzir filmes.
Fonte: Revista ISTO É, 2 de Fevereiro de 2000 - www.zaz.com.br/istoe
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