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ATUALIDADES

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ESTE CONFLITO TERRÍVEL É A ÚLTIMA GUERRA COLONIAL

Por Robert Fisk

Ariel Sharon pode controlar seu povo? Pode controlar seu exército? Pode impedir que seus soldados matem crianças, armando ciladas em pomares ou atirando granadas em campos de refugiados? Sharon pode impedir que a gentalha do exército destrua centenas de casas palestinas em Gaza? Sharon pode "quebrar" os colonos judeus e impedi-los de roubar mais terra dos palestinos? Ele pode proibir que seu serviço secreto assassine  seus inimigos palestinos ou efetue "mortes seletivas", como a BBC, em seu esforço de evitar a crítica israelense, ainda ontem chamava essas execuções?

É claro que é proibido fazer essas perguntas. Portanto, vamos "legalizá-las". Os suicidas de Jerusalém e Haifa são repugnates, maus, revoltantes, inesquecíveis. Eu vi o resultado imediato da explosão suicida da Pizzaria, em Jerusalém, em agosto passado. Mulheres e crianças israelenses dilaceradas pelos explosivos que continham pregos para garantir que aqueles que sobrevivessem ficassem marcados pelo resto da vida.

Eu me lembro da rastejante mensagem de condolências de Iasser Arafat e pensei comigo mesmo como qualquer israelense: não acredito numa única palavra. De fato, não acreditei numa única palavra. Arafat costumava usar as mesmas expressões eloquentes de pesar quando seus atiradores assassinavam libaneses inocentes durante a guerra civil no país. Porcaria, pensava naquela época, e ainda penso.

Mas houve um indício do verdadeiro problema somente horas depois do último banho de sangue em Israel. Colin Powell, o secretário de estado americano, estava sendo questionado, com a subserviência característica da CNN, sobre sua reação à chacina. Nada, disse ele, pode justificar este "terrorismo". E ele prosseguiu referindo-se à condição dos palestinos que sofrem "50% de desemprego".  Parei neste ponto. Desemprego? Então era isto o que o sr. Powell achava disto tudo?

E minha mente voltou ao seu discurso na Universidade de Louisberg, em 20 de novembro, quando ele começou, ou pelo menos era o que esperava que acreditássemos, por sua iniciativa no Oriente Médio. O tema foi: "Os palestinos precisam ...". Os palestinos precisam "acabar com a violência"; os palestinos precisam "prender, julgar e punir os autores destes atos terroristas"; os palestinos "precisam entender que, ainda que legítimas suas reivindicações" , observem as palavras "ainda que", "eles não podem ser ... guiados pela violência"; os palestinos "precisam perceber que a violência teve um impacto terrível em Israel". Somente quando o general Powell disse à sua audiência que a ocupação israelense da Cisjordânia e Gaza precisava acabar é que ficou claro que Israel estava ocupando a Palestina.

A realidade é que o conflito israelo/palestino é a última guerra colonial. Os franceses achavam que estavam lutando a última batalha deste tipo. Há muito tempo eles tinham conquistado a Argélia. Eles construíram suas fazendas e acampamentos na parte mais bonita do norte da África. E quando os argelinos exigiram a independência eles os chamaram de "terroristas" e atiraram nos manifestantes e torturaram seus guerrilheiros inimigos e mataram em "mortes seletivas" seus antagonistas.

Da mesma forma, estamos respondendo ao último massacre em Israel, de acordo com as regras do Departamento de Estado, CNN, BBC e Downing Street. Arafat  conseguiu ficar vivo, cumprir sua obrigação como o policial do ocidente no Oriente Médio. O presidente Mubarak faz isto no Egito, o rei Abdullah na Jordânia, o rei Fadh na Arábia Saudita. Eles controlam suas populações para nós. É responsabilidade deles. Eles devem cumprir com suas obrigações morais sem qualquer referência à história ou à dor e sofrimento de seus povos.

Portanto, vou contar uma historinha. Algumas horas atrás escrevi este artigo, exatamente 4 horas depois do último homem bomba ter se explodido e às suas inocentes vítimas em Haifa. Eu visitei um hospital infecto e mal equipado em Queta, a cidade paquistanesa de fronteira, para onde as vítimas afegãs dos ataques aéreos americanos eram trazidas para tratamento. Cercado por um exército de moscas na cama n° 12, Mahmat - a maior parte dos afegãos não têm nomes de família - me contou esta estória. Não havia câmaras da CNN, nem repórteres da BBC neste hospital para filmar o paciente. E nem haverá. Mahmat estava dormindo em sua casa, na aldeia de Kazikarez há seis dias atrás, quando uma bomba vinda de um B-52 americano caiu em sua aldeia. Ele estava dormindo em um cômodo, sua esposa com as crianças. Seu filho Nourali morreu, assim como Jaber de 10, Janaan de 8, Salamo de 6, Twayir de 4, e Palwasha, a única menina, de 2 anos.

Mahmat diz que "o avião voa tão alto que não podemos ouvir e o teto cai sobre eles". Sua esposa Rukia, que ele me deu permissão para ver, está deitada na outra sala (cama n° 13). Ela não sabia que seus filhos estavam mortos. Ela tinha 25 anos mas parecia 45. Um tecido cobria sua testa. Seus filhos, como muitos afegãos inocentes nesta Guerra medonha pela civilização são as vítimas que Bush e Blair jamais admitirão. E olhando o apelo de Mahmat por dinheiro, a bomba americana tinha destruído suas roupas e ele estava nu debaixo do cobertor do hospital, eu pude perceber uma coisa terrível: ele e o irado primo ao lado dele, e seu tio e o irmão da esposa no hospital atacando a América pelas mortes infligidas às suas famílias...

Presumo que um dia os parentes de Mahmat talvez tenham    tanto ódio dos Estados Unidos que quererão se vingar, quando, então, serão tomados como terroristas, os homens da violência. Podemos até perguntar se seus líderes conseguem controlá-los. Eles não são bin Ladens. A família de Mahmat disse que "não somos nem Taleban nem árabes", mas, francamente, podemos culpá-los se um dia resolverem atacar os Estados Unidos por causa do terrível e sangrento crime cometido contra sua família? Os Estados Unidos podem parar de bombardear aldeias? Washington pode convencer suas forças especiais a proteger os prisioneiros? Os americanos podem controlar seu povo?


Publicado no Independent    em 4/12/01

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