ATUALIDADES
Pode haver alguma coisa mais patética do que a manifestação árabe contra a guerra? Um milhão de britânicos marcharam pelas ruas de Londres, mais de meio milhão de espanhóis, em Madri, 200.000 em Paris e Nova York. E no Cairo? Bom, apenas 600 egípcios apareceram em sua capital para protestar contra a próxima invasão do fraterno Iraque - cercados por 3.000 policiais. Para contrastar - e que contraste - 2.000 israelenses protestaram em Tel Aviv contra a guerra.
Que diabo está acontecendo com os árabes? Provavelmente, de todos as pessoas do mundo, eles - e somente eles - serão os que mais sofrerão com a invasão de sua pátria pelos americanos. Eles - e somente eles - têm vontade e capacidade de compreender que esta aventura militar americana tem por objetivo - conforme o secretário de estado, Colin Powell, declarou francamente na semana passada - modificar o mapa do Oriente Médio.
No entanto, confrontados com a catástrofe, os árabes estão como ratos. Seus líderes até que concordam com eles - mas não deixarão que suas respectivas populações se manifestem.
O presidente Mubarak, do Egito, deixou bastante evidente que é muito pouco o que se pode fazer para refrear o presidente Bush. O rei Abdullah, da Jordânia, disse que é quase "nada" o que os árabes podem fazer para evitar a guerra. O que faz com que os árabes, cada vez mais, se perguntem para que servem seus líderes. Os presidentes e reis do mundo árabe concordam com suas populações, mas não desejam vê-las manifestando a opinião desses governantes.
Uma coisa é o sr. Mubarak criticar os Estados Unidos, outra, bastante diferente, é a população egípcia fazer o mesmo. Que diabos pensavam os 3.000 policiais de segurança, enquanto cercavam seus irmãos e irmãs que protestavam?
É bem verdade que 200.000 sírios protestaram contra a guerra em Damasco. Porém, ninguém protesta na Síria a menos que esteja de acordo com o governo, o que vale dizer que este protesto "popular" em particular foi organizado pelo Partido Socialista Árabe Baath da Síria. Mas, pelo menos os sírios não levaram retratos de Saddam Hussein, como fizeram seus vizinhos em Beirute. Porque nas capitais árabes, há um problema especial. Frequentemente a oposição árabe à guerra é dificultada pelo apoio árabe ao ditador iraquiano.
Há duas semanas atrás, no Cairo, retratos do líder iraquiano foram retirados dos protestos contra a guerra. No sábado, em Beirute, homens que tinham lutado uns contra os outros na guerra civil libanesa reuniram-se para se opor à invasão do Iraque pela América, mas foram obscurecidos pelo número muito maior de libaneses que apoiavam Saddam Hussein e carregavam retratos do desgraçado homem para prová-lo.
Sayed Hassan Nasrallah, chefe do exército da guerrilha Hisbolá, censurou os árabes pelo seu "silêncio" e recomendou que eles "reavaliassem" a posição em relação à Europa depois dos protestos contra a guerra - isto, lembrem-se, proveniente de um homem que chefia uma organização cujos grupos satélites já fizeram dezenas de ocidentais reféns no Líbano, durante os anos 80.
Sayed Nasrallah também lamentou o fato de a "maior demonstração muçulmana da história" - a concentração de dois milhões de peregrinos muçulmanos em Meca para o Hajj - não ter usado slogans como "Morte à América" ou "Não à Guerra". Nasrallah também acusou "certos regimes árabes de "apoiarem a guerra ou de aprová-la em segredo". E, é lógico, nós todos sabemos quem são eles.
Publicado no The Independent em 18 de fevereiro de 2003