ATUALIDADES
ISRAEL FORNECE SOLDADOS PARA PROTEGER SEU FANTOCHE POLÍTICO NO AFEGANISTÃO
Por Peter Symonds
Nada ressalta mais o caráter dependente e problemático do governo afegão do que a decisão desta semana de substituir os soldados afegãos que protegem o presidente provisório, Hamid Karzai, por um esquadrão de 45 a 50 soldados americanos, inclusive soldados das Forças Especiais.
Karzai agora está completamente dependente dos Estados Unidos, não só do apoio econômico, político e militar, mas também de sua segurança pessoal. A medida mostra que o presidente provisório, instalado pela loya jirga (a grande assembléia tribal) do mês passado com a ajuda de Washington, não pode depender de qualquer grupo de soldados locais que possa impedir um atentado contra sua vida.
O secretário de Defesa americano, Donald Rumsfeld, confirmou a decisão mas tentou diminuir sua importância dizendo que era uma medida de curto prazo."O que isto significa, se são semanas ou meses ou muitos meses, eu não sei", declarou ele, acrescentando que era "importante que o povo afegão não tenha uma interrupção em sua liderança ... é uma questão muito simples."
O porta-voz de Karzai, Said Tayab Jawad, assinalou que o presidente tinha feito o pedido depois do assassinato de um de seus aliados chave, o vice-presidente Abdul Qadir, no dia 6 de julho. Como Rumsfeld, Jawad tentou não dar importância à mudança, enfatizando que os americanos trabalhariam juntamente com os guardas afegãos, treinando-os no serviço de segurança.
Não importa o quanto isto possa significar, pois a decisão de colocar soldados americanos com a incumbência de proteger Karzai reflete o fato de que o presidente tem inimigos políticos, inclusive em seu próprio governo, que podem estar querendo eliminá-lo fisicamente. A alegação de que os Estados Unidos estão comprometidos com exercícios de treinamento nada mais é do que uma capa transparente. Após duas décadas de guerra, a maior parte dos adultos homens no Afeganistão sabe como manejar uma Kalashnikov e muitos terão servido como guarda-costas de comandantes de milícia locais e chefes tribais. A questão era se a guarda presidencial é confiável para cumprir com seus deveres - e claramente não é.
O assassinato de Qadir em plena luz do dia em Cabul, que está ostensivamente guardada por milhares de soldados internacionais, evidenciou as tensões políticas no país e os perigos que rondam Karzai. Qadir sofreu uma emboscada por dois atiradores que crivaram seu carro de balas e depois escaparam sem deixar vestígios. Quase três semanas depois do assassinato, não há indícios sobre a identidade dos autores ou de quem seja o mentor. Cerca de 15 pessoas foram detidas, principalmente na guarda de Qadir, que não fizeram nada para defendê-lo ou capturar os atiradores.
Muitas pessoas tinham motivos para ver o vice-presidente morto. Qadir era um negociante pashtun e senhor da guerra, da cidade de Jalalabad, com ligações com o contrabando e o comércio de ópio. Os comandantes de milícias rivais, brigando pelo controle político da cidade, ou os senhores da droga irritados com o abuso de Qadir no programa de governo de erradicação do ópio, podem ter ordenado sua morte.
No entanto, em seu funeral membros da família de Qadir se queixaram da falta de segurança. "Perguntamos por que enquanto outros ministros são protegidos com vários carros e segurança e armas, Haji Qadir foi privado das mesmas coisas", disse o irmão mais velho de Qadir, Haji Din Mohammed. A observação ficou mais evidente pois era dirigida ao ministro da Defesa, Mohammed Fahim, que tinha acabado de completar a oração fúnebre. Fahim, juntamente com dois outros importantes ministros tadjiques - o ministro do Exterior, Abdullah Abdullah, e o conselheiro de segurança Yunis Qanuni - controlam efetivamente o aparato de defesa e segurança do país.
Karzai é tão vulnerável quanto Qadir. Diferente de Qadir, que tinha uma importante base de apoio em Jalalabad, Karzai, também um pashtun, praticamente não tem nenhum. Ele preside um governo que está dividido pelas rivalidades étnicas, religiosas e regionais. Karzai é tolerado pelos poderosos do país porque é apoiado pelos Estados Unidos e é fundamental na distribuição de ajuda estrangeira da qual o Afeganistão depende bastante. Seu único acervo político é a estreita ligação com Washington, desde a época da guerra patrocinada pela CIA contra o regime pró-soviéticos em Cabul nos anos 80.
É significativo o fato de que, antes da chegada dos soldados americanos, a guarda presidencial era composta de 70 ou um pouco mais de homens oriundos do ministério da Defesa de Fahim. Segundo um artigo do New York Times, "Alguns homens do Ministério da Defesa ... admitiam que não estavam satisfeitos com a chegada dos americanos porque poderia parecer que o presidente estava nas mãos dos Estados Unidos." Um deles exclamou: "Que presidente é ele se não puder ser protegido por soldados afegãos?"
Vários críticos mostraram as preocupações sobre o poder crescente de Fahim, que reforçou sua posição depois da loya jirga, transformando-se em um dos cinco vice-presidentes do país, assim como continuou chefe do poderoso ministério da Defesa. Fahim tem algo em torno de 10.000 homens muito bem armados dentro ou nas cercanias da capital. O Guardian britânico observou: "As forças de Fahim incluem 500 veículos blindados e 300 tanques,o que seria suficientes para desalojar a força de assistência internacional que provê a segurança em Cabul."
Um artigo de ontem do Washington Post mostrou que Karzai e Fahim "estão presos a uma rivalidade cada vez maior que ameaça desestabilizar o fraco governo do Afeganistão." De acordo com o relato, Karzai criou uma comissão com o objetivo de quebrar o controle de Fahim sobre o Diretório de Segurança Nacional, um imensa rede com mais de 30.000 agentes, que opera fora dos canais legais formais e é dominada por funcionários tadjiques leais à liderança da Aliança do Norte.
O Post comentou: "O desafio de Karzai em relação ao serviço de inteligência é visto aqui como uma luta sobre quem governará o Afeganistão pós-talebã. Para o presidente de etnia pashtun e seus seguidores, o poder do serviço secreto liderado pelos tadjiques é um obstáculo importante para a democracia afegã que está mais perto de casa do que qualquer senhor da guerra que se recusou a desarmar seus homens ou os remanescentes escondidos do Talebã ou da Al-Qaeda."
A contenda não tem nada a ver com democracia. É uma luta sobre quais facções étnicas e grupos de milícias controlarão as alavancas de poder no próximo período - acima de todo aparato militar e policial. Conspirando ou não contra Karzai, os Estados Unidos não estavam querendo deixar a segugrança de seu principal aliado no Afeganistão nas mãos do ministro da Defesa, Mohamed Fahim.
Karzai enfrenta não só seus inimigos em seu próprio governo e os poderosos senhores da guerra mas, também, uma enorme hostilidade popular em razão de sua identificação com Washington. Nas regiões tribais pashtuns no sul e leste do país, há um ressentimento crescente e um ódio pelos continuados ataques aéreos e operações de terra americanos que levaram a um elevado número de morte de civis. A instalação de um esquadrão das Forças Especiais dos Estados Unidos para montar guarda 24 horas por dia a Karzai apenas confirma que ele é um fantoche político do invasor americano cada vez mais odiado.
25/07/02