ATUALIDADES
CONVITE NEOCOLONIAL À GUERRA TRIBAL
Noam Chomsky(*)
"O que temíamos aconteceu", escreve o sociólogo israelense, Baruch Kimmerling, em jornal de grande circulação em Israel. Judeus e palestinos estão "retornando ao tribalismo supersticioso ... A guerra parece ser o destino inevitável", uma guerra "colonial maligna". Esta perspectiva é bastante provável, se os Estados Unidos derem sua autorização tácita, com consequências terríveis que podem repercutir mais à frente.
Não há, é claro, qualquer semelhança entre os "grupos étnico-nacionais" de volta ao tribalismo. O conflito está centrado nos territórios que enfrentam uma pesada ocupação militar desde 1967. O conquistador é o poder armado maior, contando com maciço apoio militar, econômico e diplomático da maior superpotência glogal. Seus subjugados estão sozinhos e sem defesa, muitos mal sobrevivendo em campos miseráveis.
A crueldade da ocupação vem sendo duramente condenada, há anos, por grupos de defesa dos direitos humanos internacionais e isralenses. Os objetivos do terror, da estrangulação econômica e da humilhação diária não são desconhecidos. Eles foram articulados nos primeiros anos da ocupação por Moshe Dayan, um dos líderes israelenses mais "solidários" com a condição dos palestinos, que aconselhou seus pares do Partido Trabalhista a dizer aos palestinos que "vocês continuarão a viver como cachorros e quem quiser pode partir."
O processo de paz de Oslo alterou as modalidades mas não o conceito básico. Um pouco antes de se juntar ao governo de Ehud Barak, o historiador Shlomo Ben-Ami, um arauto no círculo americano-israelense, escreveu que "os acordos de Oslo tinham se baseado em conceitos neocolonialistas". O objetivo era impor aos palestinos "a dependência quase total à Israel" em uma "situação colonial" que deveria ser "permanente". Ele logo se transformou no arquiteto das propostas do governo Barak, que eram praticamente idênticas ao plano final de Bill Clinton.
As propostas foram elogiadíssimas no comentário americano; os palestinos e Yasser Arafat foram acusados pelo fracasso e subseqüente violência.
Aquela apresentação "foi uma fraude praticada pelos israelenses ... e opinião pública ... internacional", escreveu Kimmerling com precisão. Ele observa que basta dar uma espiada no mapa para mostrar que os planos Clinton-Barak "apresentaram aos palestinos termos impossíveis". De forma decisiva, Israel reteve "dois blocos de assentamentos que, na verdade, dividem a Cisjordânia em duas partes. "Os enclaves palestinos também estão separados do centro da vida palestina em Jerusalém; a Faixa de Gaza permanece isolada, sua população virtualmente prisioneira.
Os assentamentos israelenses em territórios palestinos dobraram durante os anos do "processo de paz". aumentando no período Barak, que deixou para o novo governo de Ariel Sharon "um legado surpreendente", conforme a imprensa israelense relatou quando da transição de governo no início deste ano. "Os números mais elevados de alojamentos começaram nos territórios" já época em que Sharon supervisionava os assentamentos, em 1992, antes de Oslo. Esta é a realidade viva de uma população desesperada.
A natureza da dependência neocolonial permanente foi ressaltada pela Alta Corte de Justiça de Israel, em novembro de 1999, quando rejeitou, ainda, uma outra petição palestina que se opunha à expansão da cidade (judaica) de Maale Adumim, situada a leste de Jerusalém, e que divide praticamente a Cisjordânia.
A Corte sugeriu que "poderia advir algum benefício para os residentes das vizinhanças (vilarejos palestinos) em decorrência do desenvolvimento econômico e cultural" de toda a cidade judaica. Enquanto eles tentam sobreviver sem água potável ou campos para cultivo, as pessoas cujas terras foram tomadas podem se deliciar com uma bela paisagem de amplas casas, jardins verdes, piscinas e outras amenidades que fazem parte dos assentamentos fortemente subsidiados por Israel.
Logo após a II Guerra Mundial, as convenções de Genebra baniram a repetição dos crimes nazistas, inclusive a transferência das populações dos territórios ocupados ou ações que prejudicassem os civis. Os Estados Unidos são obrigados a "garantir o respeito" a essas convenções.
Contando apenas com a oposição de Israel, as Nações Unidas têm declarado, repetidamente, que as convenções de Genebra se aplicam aos territórios ocupados; os Estados Unidos se abstêm de votar, relutando em assumir uma posição pública de violação aos princípios fundamentes da legislação internacional, que exige uma ação imediata contra os assentamentos e expropriações, ataques contra civis com helicópteros fornecidos pelos Estados Unidos, punição coletiva e outras medidas repressivas usadas pelas forças de ocupação. Washington continuou a prover os meios de implementar essas práticas, recusando-se até a permitir a presença de observadores que poderiam reduzir a violência e proteger as vítimas.
Há 25 anos, houve um quase unânime consenso internacional no que se refere a um acordo político: tratado de paz total, com o estabelecimento de um estado palestino após a retirada de Israel, uma saída que tem boa aceitação até mesmo dentro de Israel. Mas foi bloqueado por Washington desde o veto, em 1976, a uma resolução do Conselho de Segurança baixada para este fim.
Está longe de ser uma solução ideal, mas as prováveis alternativas atuais são muito piores.
Los Angeles Times - 13/08/01
Extraído de http://www.egroups.com/messages/inin
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(*) Noam Chomsky, um
conhecido filósofo e ligüista americano, sempre se interessou por política. Sua
tendência para o anarquismo e o socialismo foi o resultado do que ele chama de
"a comunidade radical judaica de Nova York". Desde 1965, ele se transformou em
um dos mais conhecidos críticos da política externa americana. No final do ano passado,
ele proferiu uma palestra no MASSACHUSETTS INSTITUTE OF TECHNOLOGY (MIT), sobre do
conflito no Oriente Médio, cuja tradução pode ser encontrada neste site: A Crise Atual do Oriente Médio