Contemporânea

Página da disciplina de História Contemporânea da UDESC
Criada em maio de 2001
Responsável pela criação e manutenção:
Profa: Janice Gonçalves


"Carta aberta aos operários"

 

Carta aberta aos operários (1918)

Companheiros!

O duplo incêndio da guerra e da revolução esvaziou nossas almas e nossas cidades. Os palácios do luxo de ontem estão aí qual esqueletos calcinados. As cidades devastadas esperam novos construtores. O turbilhão revolucionário arrancou dos espíritos as raízes nodosas da escravidão. A alma do povo aguarda uma semeadura grandiosa.

Dirijo-me a vocês que receberam a herança da Rússia, a vocês que amanhã (acredito!) se tornarão os donos do mundo inteiro, e pergunto: com que edifícios fantásticos hão de cobrir o lugar dos incêndios de ontem? Que músicas e canções hão de espalhar-se das suas janelas? A que Bíblias abrirão suas almas?

Vejo espantado como da ribalta dos teatros ocupados ressoam "Aídas" e "Traviatas", com toda espécie de condes e cavalheiros espanhóis, como nos versos aceitos por vocês, estão as mesmas rosas das estufas senhoriais e como saltam os olhos de vocês ante gravurinhas que representam a magnificência do passado.

Será que, amainadas as tempestades desencadeadas pela revolução, vocês sairão, em dias feriados, de correntinha sobre o colete, para jogar solenemente o críquete, diante dos sovietes distritais?

Saibam que para os nossos pescoços, pescoços de Golias do trabalho, não existem números adequados de colarinho nos guarda-roupas da burguesia.

Somente a explosão da Revolução do Espírito nos purificará das velharias da arte de outrora.

Que a razão vos proteja da coação física contra os restos da antigüidade artística. Entreguem-nos às escolas e às universidades, para o estudo da geografia, dos costumes e da história, mas vocês devem repelir indignados aquele que lhes oferecer esses objetos petrificados em lugar do pão da beleza viva.

A revolução do conteúdo - socialismo-anarquismo - é inconcebível sem a revolução da forma: o futurismo.

Disputem com avidez os pedaços da arte sadia, jovem e rude que lhe entregamos.

A ninguém é dado saber que imenso sóis hão de iluminar a vida futura. Talvez os pintores transformem a poeira cinzenta das cidades em arco-íris centicores, talvez das cumeeiras das montanhas então ressoe sem cessar a música tonitroante dos vulcões transformados em flautas, talvez obriguemos as ondas dos oceanos a ferir as cordas das redes estendidas entre a Europa e A América. Uma coisa está clara para nós: fomos nós que inauguramos a primeira página da novíssima história das artes.

 

Fonte: SCHNAIDERMAN, Boris. A poética de Maiakóvski. São Paulo: Perspectiva, 1971. (Debates) p.119-120. A carta foi originalmente publicada no primeiro e único número da Gazeta futuristov (Jornal dos futuristas) de 15 de março de 1918.