Os Pensadores do Método
Científico
René Descartes
Vida
e Obra:
Descartes nasceu no dia 31 de março de 1556 em
Touraine, França. Aos oito anos foi estudar no colégio
La-Flèche, onde permaneceu durante o período de 1604
a 1612 recebendo uma educação jesuítica, por ele
mesmo criticada na primeira parte do seu Discurso
do método. Descartes considerou seu preparo
insuficiente para garantir-lhe uma orientação segura
na compreensão do mundo e de seu tempo, constatando
dessa forma a fragilidade da cultura escolástica da
época.
Em 1618, Descartes engajou-se nos exércitos de Maurício
de Nassau, participando inclusive da Guerra dos Trinta
Anos. Como soldado percorreu toda Europa, período em
que despertou seu interesse pelos estudos de física e
de matemática, sendo introduzido por Beckeemam na física
de Copérnico. Descartes voltou a Paris onde freqüentou
os meios intelectuais e foi aconselhado pelo Cardeal Bérulle
a estudar filosofia e a buscar a conciliação entre
seus interesses e a doutrina cristã para não colocar
em risco sua segurança.
Já em 1628 Descartes instalou-se na Holanda, onde se
sentiu seguro para continuar seus estudos devido à
tolerância filosófica e religiosa daquele país.
Longe dos compromissos sociais de Paris, Descartes
encontrou maior disponibilidade para continuar a busca
do método ideal de pesquisa científica. No período
entre 1628 e 1650, o ano de sua morte, Descartes
escreveu vários trabalhos muitos somente publicados
em tempos póstumos, suas principais obras foram: O
discurso do método, As meditações Metafísicas,
Os princípios de filosofia, O tratado do homem e o
Tratado do mundo.
Desde 1619 Descartes pensava em seu método,
entretanto somente depois de sua chegada a Holanda é
que começou a escrever sobre o assunto. Iniciou seus
escritos pelas regras do método, contidas nas Regulae
ad directione ingenii que só foram publicadas após
sua morte, em 1701. No mesmo período começou também
a compor um tratado de metafísica que foi um protótipo
das Meditações e, em 1633, terminou o Tratado
do Mundo. Contudo, quando recebeu a notícia da
condenação de Galileu, Descarte optou por renunciar
a publicação da obra, evitando entrar em confronto
aberto com a Igreja. Naquele momento, retirou do
tratado original três (3) ensaios, que publicou em
1637 sob os títulos: A Dióptrica, Os
Meteoros e A Geometria, antepondo-lhes um
prefácio que foi o Discurso do Método.
Apologia
da Razão:
"A personalidade de Descartes marca a decisiva
viragem do Renascimento para a Idade Moderna" (Abbagnano,1982:37).
Descartes dá continuidade ao dualismo platônico, por
reconhecer que a problemática do conhecimento
envolvia o homem e o mundo, sujeito e objeto. Assim,
optou por solucionar a questão através do sujeito.
A razão humana é a base da filosofia cartesiana, que
foi proposta em total sintonia com o pensamento
humanista, onde o homem é colocado no centro da questão,
como sujeito no mundo objetivo. Descartes buscou para
si a solução das questões que lhe interessavam,
através de um procedimento essencialmente autobiográfico.
Seu trabalho foi descrever o seu procedimento
individual, sem se preocupar em ensinar um método ao
qual todos devessem seguir.
Descartes
não procurou senão resolver o seu próprio
problema; porém a verdade é que a solução
encontrada por ele não vale só para si, mas para
todos os homens, porque a razão que constitui a
substância de toda a subjetividade humana é
igual em todos os homens (Abbagnano,1982: 41).
Para Descartes a base do conhecimento foi a metafísica
e sua unidade foi a razão, utilizando-se da dúvida
metódica ele atingiu o cogito ("penso
logo existo") recolocando de forma sistemática a
dúvida na existência de todas as coisas. Assim, só
lhe restou a própria dúvida em forma de pensamento
(duvido logo existo), desse processo emergiu a razão
como a unidade do conhecimento ou, pelo menos, neste
primeiro momento, como unidade da dúvida.
O cogito é o espírito que descobriu a si mesmo, a
primeira verdade descoberta de maneira insofismável,
todavia, como garantir a esse espírito outra verdade
que não seja sua própria existência? Para responder
a esta questão Descartes propôs a existência lógica
de Deus.
A razão se mostrou puramente especulativa fora dos
limites da experiência, Por isso, Descartes partiu
então para provar racionalmente a existência de
Deus. Segundo seu pensamento, a presença da dúvida
no espírito determina a consciência de uma "não
dúvida", a consciência da perfeição, o
sentido do perfeito está nos homens e em sua busca.
Para Descartes esse foi o legado de Deus aos homens. O
sentido de verdade, inspirado pela onipresença e
onisciência de Deus, é o elemento mediador entre a
razão humana e o mundo. A utilização de um
argumento lógico, com base na racionalidade humana
foi a diferença básica estabelecida entre a
filosofia cartesiana e a doutrina escolástica.
O
Método Cartesiano: Descartes usou os princípios
do processo matemático como a base de construção de
seu método, sua tarefa principal foi emancipar a prática
do método matemático para todas as ciências.
As
longas cadeias de raciocínios tão simples e fáceis,
de que os geômetras costumam servir-se para
chegar às suas mais difíceis demonstrações
proporcionaram-me o ensejo de imaginar que todas
as coisas que o homem pode ter conhecimento se
seguem do mesmo modo e que, desde que se abstenha
de aceitar por verdadeira uma coisa que não o
seja e que respeite sempre a ordem necessária
para deduzir uma coisa da outra, nada haverá tão
distante que não se chegue a alcançar por fim,
nem tão oculto que não se possa descobrir
(Descartes).
Descartes definiu seu método como um conjunto de
regras que, devidamente observadas, conduziriam ao
conhecimento verdadeiro. Impossibilitado de tomar o
falso pelo verdadeiro, só restaria ao seguidor do método
a ampliação do conhecimento sem nenhum esforço
mental inútil. Na segunda parte do Discurso sobre
o método, Descartes apresenta quatro regras
fundamentais:
- Regra
da evidência: Jamais aceitar alguma coisa como
verdadeira, se isto não for evidente, caso a
coisa não se apresente clara e distintamente ao
espírito sem deixar margem de dúvida, não pode
ser considerada como verdadeira. Esta não é uma
regra conclusiva, entretanto, é uma regra
exclusiva, caso a proposição não atenda a condição
de verdade evidente, deve ser imediatamente excluída.
"O acto com que o espírito atinge a evidência
é a intuição" (Abbagnano,1982:44). A intuição
é puramente racional e, por sua imediatividade,
opõe-se à conjectura e antecede à dedução, de
forma instantânea a mente colhe seu o próprio
conceito e se torna transparente para si mesma.
- Regra
da análise: Em geral, uma dificuldade é um
conjunto de pequenos problemas, a análise da
questão procura separar detalhadamente todas as
partes do problema em maior número possível,
entender as particularidades de cada uma e sua função
como componente do todo. Agindo desse modo,
elimina-se as complicações supérfluas e
torna-se mais simples o problema, ordenando sua
solução em torno da resolução das dificuldades
encontradas em cada uma das partes.
- Regra
da síntese: A partir do desmembramento de uma
dificuldade em pequenos problemas e da solução
dos problemas em partes, deve-se conduzir os
pensamentos por ordem, começando pelos objetos
mais simples e fáceis de se conhecer e aos poucos
ir rejuntando as partes e elevando o grau de
complexidade das questões. Esse processo exige um
procedimento ordenado análogo ao da geometria e
prescreve que todo saber possa ser ordenado dessa
forma. A ordem assim designada é a ordem da dedução,
que é outro ato fundamental do espírito humano.
A ordem dedutiva parte das coisas simples que
Descartes chamou de absolutas para as mais
complexas e interdependentes, que devem ser
deduzidas e são denominadas relativas.
- Regra
da enumeração: "Fazer sempre enumerações
tão completas e revisões tão gerais que se
fique certo de não omitir nenhuma. A enumeração
controla a análise, enquanto a revisão controla
a síntese." (Abbagnano,1982:46).
A partir da intuição, desencadeia-se o processo
dedutivo para comprovar e explicar uma tese. O
problema é repartido através da análise e os dados
analisados são recompostos através da síntese. O
controle do processo é feito através da enumeração,
que garante o rigor científico da comprovação.
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