ANJINHO 

And from her fair and unpolluted flesch 
May violets spring! 
HAMLET 



Não chorem... que não morreu! 
Era um anjinho do céu 
Que um outro anjinho chamou! 
Era uma luz peregrina, 
Era uma estrela divina 
Que ao firmamento voou! 

Pobre criança! Dormia: 
A beleza reluzia 
No carmim da face dela! 
Tinha uns olhos que choravam, 
Tinha uns risos que encantavam!... 
Ai meu Deus! era tão bela. 

Um anjo d'asas azuis, 
Todo vestido de luz, 
Sussurrou-lhe num segredo 
Os mistérios doutra vida! 
E a criança adormecida 
Sorria de se ir tão cedo! 

Tão cedo! que ainda o mundo 
O lábio visguento, imundo, 
Lhe não passara na roupa! 
Que só o vento do céu 
Batia do barco seu 
As velas d'ouro da poupa! 

Tão cedo! que o vestuário 
Levou do anjo solitário 
Que velava seu dormir! 
Que lhe beijava risonho 
E essa florzinha no sonho 
Toda orvalhava no abrir! 

Não chorem! lembro-me ainda 
Como a criança era linda 

No fresco da facezinha! 
Com seus lábios azulados, 
Com os seus olhos vidrados 
Como de morta andorinha! 

Pobrezinho! o que sofreu! 
Como convulso tremeu 
Na febre dessa agonia! 
Nem gemia o anjo lindo, 
Só os olhos expandindo 
Olhar alguém parecia! 

Era um canto de esperança 
Que embalava essa criança? 
Alguma estrela perdida, 
Do céu c'roada donzela... 
Toda a chorar-se por ela 
Que a chamava doutra vida? 

Não chorem... que não morreu! 
Que era um anjinho do céu 
Que um outro anjinho chamou! 
Era uma luz peregrina, 
Era uma estrela divina 
Que ao firmamento voou! 

Era uma alma que dormia 
Da noite na ventania 
E que uma fada acordou! 
Era uma flor de palmeira 
Na sua manhã primeira 
Que um céu d'inverno murchou! 

Não chorem! abandonada 
Pela rosa perfumada, 
Tendo no lábio um sorriso, 
Ela se foi mergulhar 
- Como pérola no mar - 
Nos sonhos do paraíso! 

Não chorem! chora o jardim 
Quando marchado o jasmim 
Sobre o seio lhe pendeu? 
E pranteia a noite bela 
Pelo astro ou a donzela 
Mortos na terra ou no céu? 

Choram as flores no afã 
Quando a ave da manhã 
Estremece, cai, esfria? 
Chora a onda quando vê 
A boiar um irerê 
Morta ao sol do meio-dia? 

Não chorem!... que não morreu! 
Era um anjinho do céu 
Que um outro anjinho chamou! 
Era uma luz peregrina, 
Era uma estrela divina 
Que ao firmamento voou!