O POETA 


Un souvenir heureux est peut-être sur terre 
Plus vrai que le bonheur. 
A. DE MUSSET 

Era uma noite: - eu dormia... 
E nos meus sonhos revia 
As ilusões que sonhei! 
E no meu lado senti... 
Meu Deus! por que não morri? 
Por que no sono acordei? 

No meu leito adormecida, 
Palpitante e abatida, 
A amante de meu amor, 
Os cabelos recendendo 
Nas minhas faces correndo, 
Como o luar numa flor! 

Senti-lhe o colo cheiroso 
Arquejando sequioso 
E nos lábios, que entreabria 
Lânguida respiração, 
Um sonho do coração 
Que suspirando morria! 

Não era um sonho mentido: 
Meu coração iludido 
O sentiu e não sonhou... 
E sentiu que se perdia 
Numa dor que não sabia... 
Nem ao menos a beijou! 

Soluçou o peito ardente, 
Sentiu que a alma demente 
Lhe desmaiava a tremer, 
Embriagou-se de enleio, 
No sono daquele seio 
Pensou que ele ia morrer! 

Que divino pensamento, 
Que vida num só momento 
Dentro do peito sentiu... 
Não sei!... Dorme no passado 
Meu pobre sonho doirado... 
Esperança que mentiu... 

Sabem as noites do céu 
E as luas brancas sem véu 
Os prantos que derramei! 
Contem do vale as florinhas 
Esse amor das noite minhas! 
Elas sim... que eu não direi! 

E se eu tremendo, senhora, 
Viesse pálido agora 
Lembrar-vos o sonho meu, 
Com a fronte descorada 
E com a voz sufocada 
Dizer-vos baixo: - Sou eu! 

Sou eu! que não esqueci 
A noite que não dormi, 
Que não foi uma ilusão! 
Sou eu que sinto morrer 
A esperança de viver... 
Que o sinto no coração! 

Riríeis das esperanças, 
Das minhas loucas lembranças, 
Que me desmaiam assim? 
Ou então, de noite, a medo 
Choraríeis em segredo 
Uma lágrima por mim! 
Dorme, meu coração! Em paz esquece 
Tudo, tudo que amaste neste mundo! 
Sonho falaz de tímida esperança 
Não interrompa teu dormir profundo! 
Tradução do Dr. Octaviano 

Fui um douto em sonhar tantos amores... 
Que loucura, meu Deus! 
Em expandir-lhe aos pés, pobre insensato, 
Todos os sonhos meus! 

E ela, triste mulher, ela tão bela, 
Dos seus anos na flor, 
Por que havia de sagrar pelos meus sonhos 
Um suspiro de amor? 

Um beijo - um beijo só! eu não pedia 
Senão um beijo seu 
E nas horas do amor e do silêncio 
Juntá-la ao peito meu! 

_____ 

Foi mais uma ilusão! de minha fronte 
Rosa que desbotou 
Uma estrela de vida e de futuro 
Que riu... e desmaiou! 

Meu triste coração, é tempo, dorme, 
Dorme no peito meu! 
Do último sonho despertei e n'alma 
Tudo! tudo morreu! 

Meus Deus! por que sonhei e assim por ela 
Perdi a noite ardente... 
Se devia acordar dessa esperança, 
E o sonho era demente?... 

Eu nada lhe pedi: ousei apenas 
Junto dela, à noitinha, 
Nos meus delírios apertar tremendo 
A sua mão na minha! 

Adeus, pobre mulher! no meu silêncio 
Sinto que morrerei... 
Se rias desse amor que te votava, 
Deus sabe se te amei! 

Se te amei! se minha alma só queria 
Pela tua viver, 
No silêncio do amor e da ventura 
Nos teus lábios morrer! 

Mas vota ao menos no lembrar saudoso 
Um ai ao sonhador... 
Deus sabe se te amei!... Não te maldigo, 
Maldigo o meu amor!... 

Mas não... inda uma vez... Não posso ainda 
Dizer o eterno adeus 
E a sangue frio renegar dos sonhos 
E blasfemar de Deus!