CAPITULO I: CONCEITOS FUNDAMENTAIS
A Realidade Virtual apesar de ser um paradigma recente, pode ser referenciada sob várias perspectivas, sejam elas políticas, culturais, científicas ou técnicas. Em face a esta diversidade, faz-se necessário fundamentá-la através de conceitos que possam ter um relacionamento mais profundo com ela. Por isso, este capítulo, tem como finalidade um caráter introdutório dos assuntos "Ciberespaço", "Cibertempo" e "Espaço e Tempo", que entendemos serem a luz necessária ao estudo da RV. O mundo é incrivelmente dinâmico e em constante adaptação com as exigências de uma vida mais confortável e cheia de tecnologias modernas. O mais admirável de tudo isto, é que, quando se percebe tais novidades, não são mais novidades: são artifícios do dia a dia, um serviço construído e embutido no cotidiano. A Internet é uma dessas tecnologias, que a partir de sua disseminação e evolução surpreendentes, contribuem para que cada vez mais, a interação entre os seres humanos seja mediada pelo computador. LANCE STRATE (1996, Prof. responsável pelo Departamento de Comunicação e Mídia da Fordham University, Nova York), argumenta que tal convivência digital entre as pessoas, conectados por esta estrutura virtual de escala mundial e em constante evolução, propicia ao Ciberespaço (Cyberspace) a possibilidade de transcender todas as criações humanas, através do suporte à emergência de uma consciência distribuída entre milhares de pessoas, separadas por grandes distâncias físicas, mais capazes de reagir em grupo como membros de uma comunidade (vizinhos de bairro, colegas de trabalho, correligionários ou familiares). Desta forma, hoje o Ciberespaço passa a ser compreendido sob duas perspectivas: como via expressa de informações, interligadas por conexões de computadores em rede e como Realidade Virtual. No primeiro caso, o Ciberespaço é visto, como uma "Highway" (auto-estrada eletrônica), na qual um grande número de pessoas "viajam" a todo momento, seja através da Internet, BBS ou dos Videotextos. No segundo caso, o Ciberespaço é associado a um ambiente virtual projetado, capaz de dar ao ser humano condições de vivenciar uma situação real ou imaginária, assim como, de estimular nossas sensações corporais, através da imersão, ou seja, a sensação de estar dentro do ambiente, em um espaço tridimensional. " Estamos caminhando para uma interligação total dessas duas concepções do Ciberespaço, pois as redes vão se interligar e, ao mesmo tempo, permitir a interação por "mundos virtuais" em três dimensões" ANDRÉ LEMOS (1996). Entretanto, há diferentes correntes de pensamentos que procuram definir esta questão. O sociólogo ANDRÉ LEMOS, que é um dos grandes estudiosos e divulgadores da RV atualmente, é um dos que acredita que no futuro não haverá mais separação entre estas duas correntes de tecnologia, como mostra a citação acima. Contudo, apesar de o Ciberespaço ser um fenômeno contemporâneo, é importante esclarecer que WILLIAM GIBSON (1984) em seu livro "Neuromancer", foi o primeiro, que se tem conhecimento, a utilizar o termo Cyberspace, interpretado mais diretamente como "Espaço Cibernético", para designar uma representação gráfica de dados abstraídos dos bancos de dados de todos os computadores do sistema humano. GIBSON enfatiza: "(...)Ciberespaço. Uma alucinação consensual vivenciado por bilhões de legítimos operários, em cada nação, onde são ensinados a crianças conceitos matemáticos... A representação gráfica de dados abstraídos dos bancos de dados de cada computador presente no sistema humano(...)" GIBSON, descreveu uma rede de computadores universal, contendo todo o tipo de informações, na qual seria possível acessar e explorar os dados de forma multisensorial, afirma PIMENTEL (1995) e onde pessoas com implantes nos seus corpos, poderiam transmitir informações diretamente para o computador. Por conseguinte, o neologismo de GIBSON e sua respectiva visão do futuro, originou-se na cultura popular, um fato que incitou alguns a desacreditarem do conceito de Ciberespaço por ele proferido em seu livro acima citado. Porém, outros levaram o termo e a idéia a sério, tal como, BENEDIKT (1991), um dos primeiros arquitetos do conceito de Ciberespaço, editor do livro "Cyberspace: First Steps", que diz: "O Ciberespaço totalmente desenvolvido, ainda não existe fora da ficção científica e imaginação de algumas centenas de pessoas" (1991, p.123). Em seguida enfatiza: "Atualmente o Ciberespaço está sob construção" (1991, p.124). Ele ainda descreve o Ciberespaço como: "(...) rede global, sustentada, acessada, gerada por computadores. Multidimensionais, artificial ou realidade virtual no qual cada computador seria como uma janela, vista ou escutada por objetos não necessariamente físicos, ou representações de objetos físicos, mas algo em forma de personagens e ações compostos de dados ou por informação (..)" (p.122-123). BENEDIKT, ainda procura por uma ponte que una ficção científica e realidade, porém situa o seu Ciberespaço no futuro. No entanto, MICHAEL HEIM (1993 p.150), em seu livro "The Metaphysics of Virtual Reality", conecta a profecia de GIBSON com as tecnologias atuais na seguinte definição: "(...) A junção da informação digital e percepção humana, a Matrix da civilização onde bancos permutam dinheiro (créditos) e investigadores de informações navegam várias camadas de informações, armazenadas nos espaços virtuais. Edificações no Ciberespaço devem possuir mais dimensões que as edificações físicas possuem, enquanto o Ciberespaço deve refletir diferentes leis de existência. É dito que o Ciberespaço é onde você está, quando tem uma conversa telefônica ou onde seu dinheiro eletrônico flui para fazer existir, ou onde os emails eletrônicos viajam (...)" Desta forma, como acima citado, HEIM insinua que já entramos na era do Ciberespaço, na qual sua descrição funde-se com a noção de GIBSON, acerca da abstração dos dados com os mais comuns conceitos de RV. Para muitos, incluindo BENEDIKT, os termos Ciberespaço e Realidade Virtual são sinônimos. Numa abordagem similar, HOWARD RHEINGOLD (1993, p.5), afirma no "Virtual Community: Homesteading on the Eletronic Frontier" que: "(...) O conceito espacial onde palavras, relações sociais humanas, dados, riqueza e poder, são manifestados por pessoas, utilizando tecnologias CMC (Computer Mediated Comunications) (...)" (1993, p. 5) PIERRE LEVY (1995), por outro lado, procura desfazer a oposição entre o real e o virtual, refletindo sobre as possibilidades que as novas mídias e o ciberespaço, oferecem para fazer da sociedade um organismo multifacetado de coletividades inteligentes. Sem recair no deslumbre com a velocidade de transmissão e recepção das informações que a Internet favorece, destaca que a revolução cultural que ela desencadeia, reside no fato de ser um ambiente de memórias compartilhadas, onde os mundos virtuais são intermediários da troca não apenas de informações, mas da união de pensamentos, onde compartilhar-se-ão além das memórias, os planos na construção de um cérebro cooperativo, formando consequentemente uma rede de hipertextos comunitários. Essa esfera de compartilhamento e circulação de dados, é que faz do ciberespaço um ambiente propício para o desenvolvimento de uma inteligência coletiva. A socialização das mensagens é inerente a sua própria constituição, e isso faz com ela seja o embrião de uma tecnodemocracia: "(...) Ora, o espaço cibernético, dispositivo de comunicação
interativo e comunitário, apresenta-se justamente como uns dos instrumentos
privilegiados da inteligência coletiva. Para LEVY, na inteligência humana seu espaço é disperso, seu tempo é a eclipse e seu conhecimento o fragmento. Contudo, na inteligência coletiva percebe-se a reintegração destes fatores. LEVY, estimula as pessoas ao engajamento na direção da inteligência coletiva, ao inventar-se como espécie, a descobrir ou inventar um coletivismo além da escrita e da linguagem, tal que o tratamento da informação seja disseminado e coordenado por toda parte, de tal forma, que integrem naturalmente, todas as atividades humanas, voltando-se as mãos da sociedade, transformando esta concepção de tempo cíclico e cósmico, na simultaneidade absoluta dos eventos. LEVY, acredita que o ciberespaço jamais será o criador de uma sociedade inteligente, porém, é o ambiente mais propício possível para o seu desenvolvimento: "Ele condensa toda a ambivalência das tecnologias de comunicação contemporâneas. Pode se transformar em ferramenta de dominação, por meio do controle da circulação de informação, mas também pode constituir um espaço de navegação infinita. Isso, nos transformaria em nômades de um novo estilo, percorrendo espaços que se metamorfoseiam e se bifurcam a nosso pés, forçando-nos à heterogênese". O tratamento dado ao Ciberespaço neste TCC, tem caráter fundamentalmente introdutório, visando buscar uma síntese abrangente sem excessivo rigor em suas definições. O objetivo real, é traçar um breve panorama de como a tecnologia de RV pode ser influenciada sobre este espaço, quando aplicada ao indivíduo, a sociedade e ao mundo em que se vive. Hoje, uma nova geração de tecnologias de hardware, está sendo desenvolvida para integrar o corpo físico com o Ciberespaço. Estas tecnologias enquadram-se em dois tipos de desenvolvimento computacionais. O primeiro, é a RV e o segundo, Computação Onipresente, ou seja, segundo WEISER (1993, p. 7): "É um ambiente de computação no qual cada pessoa está interagindo continuamente com centenas de computadores interconectados por um ambiente de rede sem fios". No entanto, integra computadores com o espaço real, onde as fronteiras entre a realidade e o Ciberespaço, são borradas ou indefinidas" Por outro lado, definir o conceito de espaço não é tarefa
fácil, visto que o mesmo não possui uma forma definitiva e uniforme
que o represente. Por isto, ao referenciarmos a variedade de espaços
que podem ser encontrados, iniciaremos contextualizando o espaço físico,
que teoricamente, existe independentemente da presença do ser humano.
EDWARD T. HALL (1966) em seu livro "Proxemics", afirma que há também para o espaço perceptivo a tendência em equipará-lo com o espaço visual, além de que, também confirma-se a existência de outros espaços como o auditivo, tátil, térmico e o olfativo genérico. Consequentemente, o espaço perceptivo, baseia-se nas interações de todos estes sentidos humanos. Outra distinção que, muitas vezes, leva ao não reconhecimento, é aquele estabelecido entre o espaço perceptivo e o espaço conceitual, onde o sentido de espaço é gerado em nossas mentes. Portanto, o espaço conceitual pode incluir memórias do espaço perceptivo, assim como espaços fictícios e imaginários que nunca foram percebidos, mais que são de fundamental importância, pois são onde os planos são feitos e as ações futuras visualizadas, aonde olhamos quando voltamo-nos ao interior através do pensamento. As investigações de HALL, mostram que os seres humanos têm
incrementado os sentidos de espaço baseado-se nas interações
com outros existentes. Há, por exemplo, um senso de um espaço
pessoal, aquele que representa um espaço individualizado, territorialmente
falando, e um sentido de espaço social, que representa uma área
que é partilhada com outras. Nossos espaços são, além
disso, definidos através de designações verbais tais como
público ou privado, sagrado ou profano e através de modificações
físicas, tais como a arquitetura. Um livro, por exemplo, ocupa um espaço
físico como um objeto, entra numa relação espacial com
o leitor, expõe informação como palavras dispostas em uma
página (muitos objetos podem ser arranjados em uma dada área física)
e devem produzir uma adicional experiência de espaço nas imaginações
dos leitores através das decodificações de seus conteúdos.
MEYROWITZ (1985), diz que o espaço eletrônico, é separado de qualquer idéia de locação física, caracterizando-se por prover "senso de lugar nenhum". Em outras palavras, todas as formas de espaço são cibernéticas, e portanto todas devem ser referidas ao Ciberespaço. Entretanto, ainda que se admita esta posição teórica de MEYROWITZ, por razões de precisão, é favorável limitar o uso do termo Ciberespaço para estas formas de espaço eletrônico e quando associada com as tecnologias computacionais. Pois, a precedente decomposição das variedades de espaços, propicia a existência de diferentes tipos de Ciberespaço. Existe, por exemplo, o ciberespaço físico do próprio computador, que se constitui pela estrutura de seus chips, circuitos e a sua arquitetura. Esta estrutura física, determina os possíveis padrões do fluxo eletrônico e portanto as operações básicas do computador. Mas há também um ciberespaço lógico, que incluí o endereço de memória do computador. Em relação a este encadeamento de idéias, BOLTER (1984, p. 83) afirma: "(...) a faixa de números que podem ser relacionadas na busca e armazenamento de dados (...)". Desta forma, o ciberespaço lógico inclui as localizações onde a informação é armazenada e processada na memória e os setores e trilhas onde ela é salva em um meio ótico ou magnético. Por conseguinte, o ciberespaço físico é quase nunca diretamente acessado, ou ainda conceitualizado por profissionais da área de Informática, pronuncia BOLTER: "Este espaço lógico existe na mente do programador(...) O programador, ignora tais qualidades que não tem suporte na solução em seu problema (tal como o padrão de fios elétricos e transistores formando a memória) e é deixado com as qualidades fundamentais do espaço eletrônico. Espaço lógico não é a memória de computador liberada de suas limitações físicas, visto que incorporar a realidade da informação no computador, impõem restrições e oferece possibilidades que o programador não pode ignorar totalmente; ela é a memória do computador reduzida em sua essência" (p. 84). Assim sendo, a descrição de BOLTER do espaço lógico como um campo abstrato, geométrico e matemático no qual o programador pode construir suas estruturas de dados, tem muito em comum com a descrição de GIBSON de um ciberespaço fictício baseado na visualização do dado abstrato. Como RHEINGOLD (1991) sugere, a evolução da tecnologia do computador tem sido na direção do distanciamento entre o usuário e o hardware, desta forma reduzindo ou eliminando o acesso ao ciberespaço físico. Portanto, através do desenvolvimento de várias interfaces, computadores criaram um ciberespaço perceptivo, que deve incluir o espaço visual do monitor do computador, interfaces gráficas de usuários e dispositivos de entrada táteis, tais como o teclado, joystick e o mouse. Ao mesmo tempo, a capacidade de irmos além de nossas percepções, particularmente através da comunicação verbal mediada por computador, resulta em uma forma de ciberespaço conceitual. Portanto, as percepções e os conceitos humanos, construíram a experiência do ciberespaço e através da interação computador-homem ou da computação para a comunicação interpessoal, gerou-se uma espécie de ciberespaço pessoal que inclui um sentido de territorialidade direcionada aos "desktops" pessoais e arranjos de arquivos e diretórios, os espaços de trabalho nas estruturas principais dos computadores e os sentidos envolvidos que verificam como nos movemos em diferentes níveis de computadores ou ainda de que maneira podemos conectar-nos a eles, seja por nossos sentidos pessoais de ciberespaço, no qual pode-se afirmar que há a fusão do ser humano com o computador, tornando-os "Ciborgs". Também pode-se entrar em um ciberespaço social compartilhado, tal como uma lista de discussão, geralmente, esses que ganham um sentido de grupo em uma comunidade virtual, e que também desenvolvem um sentido de responsabilidade na direção de um ciberespaço social no qual está situado, visto que, como residentes de uma vizinhança, podem tomar responsabilidade da área de limpeza e segurança. Finalmente, as relações entre os espaços conceituais, perceptivos e físicos, tem sido objeto de estudo de vários debates ao longo dos séculos, sejam em conjunto, no mesmo espaço físico ou separados geograficamente por distâncias reais que as redes eliminam, possibilitando a alunos e professores desenvolverem trabalhos cooperativos, consultar bases de dados distantes e especialistas longínquos, aprofundando os seus conhecimentos. A intenção deste trabalho, não é entrar em tal discussão, mas meramente evidenciar as distinções, pois, estes três tipos formam a base para todas as outras formas de espaço experimentados, assim como, para a criação de um ambiente virtual ideal. Com a RV, esta capacidade pode ir além do que se imagina, permitindo a criação de espaços de trabalho virtuais compartilhados, onde os participantes vêem representações mais ou menos realistas uns dos outros (clones), podendo inclusive trabalhar em conjunto. Nas sociedades arcaicas o tempo é a-histórico, não linear, regido pela experiência mística e não pela sucessividade dos eventos. O homem primitivo tem ligação com o cosmos, com o tempo abstrato. Os primitivos viviam num "presente contínuo". O tempo é natural, demarcado pelo fogo, pela água e pela terra. Medido por ciclos: sazonais, solares, menstruais, etc.. O caráter cíclico, em que o tempo recomeça, passa pela regeneração e atualização dos fenômenos próprios das pessoas e situações dessas comunidades. Observa-se que na era da informática, o Cibertempo por si só representa a interação de vários fenômenos diferentes. Primeiro, existe a função de contagem do tempo nos computadores como o computador constrói uma sensibilidade interna ao tempo e mede a passagem do tempo no mundo externo para coordenar ações e eventos. Segundo, existe a função de representação do computador, tal qual um mensageiro, ele carrega um senso dramático, fictício ou simbólico do tempo, tanto quanto um senso de passado, presente e futuro. Terceiro, existe a nossa própria experiência subjetiva do tempo, tal como quando interagimos com e através das tecnologias de computadores, como o processamento constitui uma atividade humana e é um evento que influencia a nossa percepção de tempo e o nosso senso próprio e de comunidade. Tradicionalmente, as origens do computador são traçadas à partir de dispositivos que auxiliavam nos cálculos numéricos tais como o ábaco, ou à partir de máquinas que executavam funções de controle, como as máquinas automáticas de tear de JAQUARD; como inovação tecnológica revolucionária, comparações foram feitas também com a máquina à vapor e a prensa de GUTENBERG, segundo descreveu TOFFLER em 1981. Entretanto, quase sempre esquecido está o parentesco próximo entre o computador e o relógio mecânico desenvolvido na Idade Média. O cientista J. DAVID BOLTER (1984), um dos poucos a fazer esta conexão, argumenta: "O computador é uma extensão do relógio mais que da máquina à vapor. O relógio provê informações de uma forma mais conveniente e eventualmente mais precisa que o relógio de sol jamais o fez no passado, mas não interfere fisicamente na vida exceto pelo alarme." (1984). Como computadores antigos, os relógios antigos eram caros e delicados, necessitando de um esforço cooperado para se adquirir um. Quando os relógios tornaram-se comuns, entretanto, tornaram-se não só meramente úteis porém inevitáveis. Homens e mulheres começaram a trabalhar, comer e dormir em função do relógio, e tão logo eles decidiram regular as suas ações através desta medida arbitrária de tempo, o relógio foi transformado de uma expressão de orgulho cívico em uma necessidade da vida urbana. O computador também foi transformado de artigo de luxo em necessidade para os negócios, governos e a sociedade moderna. Computadores e relógios são ambos dispositivos que não produzem produtos materiais, e sim informação pura; a arbitrariedade das horas e minutos uniformes produzidos pelo relógio implica que, tal como o computador, o relógio é uma tecnologia de simulação. Além do mais, como LEWIS MUMFORD (1963) deixou claro: "A principal função do relógio é coordenar e sincronizar atividades e eventos. É uma tecnologia antiga de controle, precursora da cibernética e da computação" (1963).. Outra observação acerca deste assunto, fora feita por BOLTER (1984) e LEVY (1992), que citaram: "Os relógios são formas autômatas, máquinas auto-suficientes, e além do mais, ancestrais do moderno computador de VON NEUMANN". Desta forma, os computadores e os relógios forneceram metáforas para o corpo, mente e o universo. Logo, o computador eletrônico realmente funciona como um relógio, o que é essencial para as suas habilidades de levar instruções e manipular dados. O processador central do computador carrega internamente um relógio eletrônico cujos pulsos extremamente rápidos determinam quando uma operação foi concluída e outra será iniciada. A freqüência do relógio (números de ciclos por segundo, medidos em milhões de megahertz) determina a velocidade do processamento do computador, e não é incomum para computadores incorporarem relógios adicionais para realizarem outras funções, como artefatos de tempo delicados, os relógios podem ser utilizados para medirem a duração e determinar o exato momento no tempo, ou ainda fornecer alarmes ou sinais de alerta. A função do relógio é mostrar o tempo do mundo externo, mas, enquanto que, os relógios tradicionais somente medem a passagem do tempo e não são vistos como "geradores tempo" (bits que podem gerar informações), o processador central gera tempo para o mundo interno do computador. Este "batimento cardíaco eletrônico" é o tempo à medida que o mundo dos microcomputadores é idealizado. Portanto, o cibertempo corresponde à noção de ISAAC NEWTON (1934, p. 6) sobre o tempo: "O tempo absoluto, verdadeiro e matemático em si mesmo e em sua própria natureza flui de forma igual, sem nenhuma noção do exterior." Embora o tempo absoluto se ajuste às intuições da maioria das pessoas sobre a natureza do tempo, geralmente é aceita a idéia entre cientistas e filósofos de que o tempo não existe independentemente das ações, movimentos e eventos, mas é de fato gerado por mudanças físicas (logo, a relatividade do tempo em relação à velocidade). É claro que o computador faz parte deste universo e retira energia do mundo externo, mas ao contrário, o micromundo é um sistema fechado, e o computador faz o tempo absoluto se manifestar internamente. Cibertempo é o entremeio dos tempo absoluto e digital. Isto se refere à algo mais do que relógios digitais, apesar de os próprios não serem insignificantes. Desenvolvidos no final da década de 60, os relógios digitais juntamente com calculadoras eletrônicas assinalaram o início de uma explosão contínua de consumo eletrônico; novamente, mostrando que a genealogia típica do computador inclui a calculadora, e de leve, o relógio digital. E como calculadoras, os novos relógios geraram um grau de controvérsias à medida que encurtaram os métodos de longa duração da "enumeração" (neste caso, devido ao seu modo de representação temporal). Uma das objeções ao mostrador digital de tempo é que o designe tradicional do relógio proporciona um contexto que inclui toda possível hora do dia, da qual nós calculamos o tempo "correto". O mostrador digital, por outro lado, é o tempo descontextualizado, representando somente o presente momento, o qual necessita apenas ser lido. Então, o desenho do relógio proporciona uma noção de passado e futuro, tanto que só lembramos do tempo alguns minutos antes ou depois das horas exatas; o mostrador digital é inteiramente centrado no presente, representando o tempo como nada mais que uma quantidade discreta. Apesar de significativo, o debate sobre mostradores apenas arranha a superfície da digitalização do tempo dos computadores. Internamente, dentro do micromundo do processador central do computador, a sua noção de tempo é digital da mesma forma. O tempo humano é geralmente analógico, isto é, nós tendemos a pensar no tempo como contínuo e, além do mais, infinitamente divisível. Nós podemos olhar o relógio, contar os segundos e minutos à medida que passam, notar os ponteiros marcando as horas, mas normalmente vemos isto como um subproduto da mecânica do relógio, não o verdadeiro tempo da natureza; fluindo sem divisórias, tanto quanto pulsa periodicamente. O Cibertempo, ao contrário, é baseado em uma série de pulsos eletrônicos distintos e separados; tal como é o caso do tempo absoluto do micromundo, estes pulso eletrônicos não marcam simplesmente o tempo, também, o que se passa por tempo no ciberespaço. O Cibertempo é portanto baseado em unidade indivisíveis, fazendo manifestar o conceito do chronon (referencia ao foton), a menor unidade do tempo. A noção de que o tempo, tal como matéria, é feita de átomos ficou popular entre os intelectuais durante a Idade Média. Observa-se que o tempo digital não é só uma medida quantitativa do tempo, mas é também um conceito qualitativo, pode-se afirmar que um relógio comum produz somente uma série de segundos, minutos e horas idênticos, enquanto um computador transforma segundos em microsegundos ou nanosegundos em informação. O tempo digital é inteiramente arbitrário, completamente separado dos ritmos naturais e percepções humanas, além do que, inteiramente controlável e maleável. O Cibertempo é o tempo absoluto, digital e rápido. Uma ênfase na velocidade é consistente a sociedades baseadas em espaço; sociedades como as nossas as quais a ênfase é sobre comunicação por distância, expansão territorial e extensão de controle centralizado. Além do mais, culturas de base espacial são centradas no presente, negligenciando tradição e história, não voltadas para a manutenção da continuidade entre passado e futuro. O aumento da velocidade eleva a nossa habilidade de mandar mensagens pelo espaço e além do território de controle, enquanto valoriza o imediato e o efêmero, tanto que, o elétron foi colocado em questão há um século e meio, desde a introdução da telegrafia. Até a transmissão instantânea de informação pela mídia eletrônica, o computador contribuiu para o processamento de informação a uma velocidade elétrica. E isto forneceu-nos um modo de medirmos a instantaneidade da tecnologia eletrônica. A citação de BOLTER (1984, p.100) confirma o exposto acima: "Qualquer um que trabalhe com computador é introduzido a um segundo mundo temporal, um mundo de nanosegundos (bilionésimo de um nanosegundo)". O nanosegundo representa o chronon do cibertempo, o seu átomo temporal indivisível. A velocidade de passagem do nanosegundo torna-o essencialmente subliminar, como RAFKIN (p. 23-24) deixou claro: " Apesar de ser possível conceber teoricamente um nanosegundo,
e mesmo manipular o tempo nesta velocidade de duração, não
é possível experimentá-lo. Isto marca uma guinada radical
no modo como seres humanos se relacionam com o tempo. Nunca antes o tempo havia
sido organizado a uma velocidade além do reino do consciente (...) O
cibertempo representa a abstração final do tempo e a sua completa
separação da experiência humana e dos ritmos naturais."
(p. 23-24). E de longe não achamos muito evocativo falar na velocidade de fuso, mas nós nos importamos muito pouco com fusos-horários. Quando sentado em um terminal de computador, o passar de segundos parecem intermináveis e cinco minutos parecem uma eternidade. A hipervelocidade se junta à impaciência, a velocidade à intolerância, ambas online e no mundo real. A instantaneidade da velocidade eletrônica normalmente impõe a aniquilar com a distância, deixando-nos com uma noção vazia de tempo. GIBSON manifestou esta idéia em seu livro "Neuromancer" da seguinte forma: "Se o Ciberespaço for "espaço vazio" o Cibertempo será um tempo vazio." O tempo, tanto quanto o espaço, quebram quando nos aproximarmos da velocidade da luz, tanto que o tempo rápido de um computador é quase sempre associado à atemporalidade, e a hipervelocidade com a quebra do historicismo. Internamente, o fato de o cibertempo ser absoluto, digital e veloz torna possível um alto nível de sincronização; externamente, a hipervelocidade do computador torna-se uma tecnologia de controle poderosa. Portanto, a habilidade do computador de controlar e coordenar à interesses de velocidade e eficiência permitiram noções mais flexíveis de tempo. O computador introduz a idéia de divisão de tempo, inicialmente um processo no qual computadores centrais são capazes de acomodar múltiplos usuários. Movendo-se em hipervelocidade, o computador é capaz de movimentar de volta e além programas e usuários diferentes, balanceando uma variedade de capacidades tão rapidamente que o usuário não fica nem ciente da atenção dividida do computador. A introdução da divisão de tempo em computadores centrais tornou a programação interativa via terminais de vídeo possível e levou ao primeiro sistema de correio eletrônico; uma variação da divisão de tempo dentre diferentes computadores ligados em rede produziu formas mais sofisticadas de comunicações mediadas por computadores, tais como as notícias e grupos de discussão. Então, a sincronização extrema do computador resulta em uma forma mais elástica de tempo, substituindo o que HALL referia como tempo monocrônico, uma noção linear, de uma coisa de cada vez, do temporal. O cibertempo é policrônico e envolve muitas coisas simultaneamente, além do mais, olhar adiante para a integração dos computadores e redes de computadores em um grande relógio global. A infra-estrutura ciberespacial seria muito provavelmente unida a superestrutura de satélites orbitais; satélites contemporâneos, tais como o NAVSTAR dos Estados Unidos já emitem em tempo de até milionésimos de segundo. A centralização na gerência do tempo e sua inseminação instantânea através da matriz global, parecem ser o próximo desenvolvimento lógico, especialmente devido ao aumento das taxas de transações globais em hipervelocidade e a mudança para uma sociedade de 24 horas, o que leva a acreditar, que iremos encontrar a nós mesmos nos referindo mais e mais freqüentemente ao horário mediano de Greenwich (ou algum outro novo padrão internacional) SWATCH tanto quanto a nossa hora regional, e novos relógios que vierem a ser vendidos serão capazes de receber sinais horários transmitidos (talvez em conjunto com os produtos de comunicação celular), além de manter a sincronização com o relógio mundial. De uma forma, o tempo absoluto seria estabelecido em um nível global, ou podemos dizer que um micromundo global seria estabelecido; quando o mundo contiver uma rede ciberespacial, o cibertempo irá se tornar a hora mundial (novo modelo do Relógio SWATCH). Logo, o conceito de cibertempo tem sido contrastado com nossas concepções com relação ao tempo real. O tempo real é relativo e formado por mudanças físicas, enquanto que o cibertempo é absoluto e independente de seu micromundo. O tempo real é contínuo e infinitamente divisível, enquanto o cibertempo é atomístico e digital. O tempo real é ligado aos ritmos da natureza e percepção humana, enquanto o cibertempo é rápido, baseado na hipervelocidade do nanosegundo. Também nas culturas modernas literárias do ocidente, o tempo real é monocrônico, enquanto que o cibertempo é altamente policrônico, envolvendo formas extraordinariamente complexas de sincronização. Seria incorreto, entretanto, colocar o cibertempo em posição contrária ao tempo real, a medida que o computador funciona como um relógio tradicional, medindo o tempo do mundo exterior, o cibertempo engloba o tempo real como um de seus modos temporais. De fato, o termo tempo real se refere aos tempos do universo físico e percepção humana e também à interface entre o momento presente do computador e o momento presente do mundo físico. Quando os dois coincidem e permanecem sincronizados, o computador é dito funcionar em tempo real. O conceito de tempo real está, além do mais, ligado à habilidade do micromundo de se tornar sintonizado ao mundo externo (uma habilidade que a tecnologia do computador divide com outros meios). A interface não é monodirecional, entretanto, já que o tempo real também se refere à habilidade de sincronização as atividades do mundo exterior com a batida rítmica do cibertempo digital. O tempo virtual produz futuros virtuais e futuros hipertextuais e multidimensionais. O prospecto parece abrir e liberar possibilidade para mudanças. De outras formas, ele torna trivial o futuro, tornando-o "permanentemente efêmero", substituindo noções de fé e progresso, evolução. O futuro como uma realidade a ser preparada é substituído por um futuro como uma realidade virtual, um estado atemporal que é experimentado no presente. A simulação pode ser transferida do passado para o presente e para o futuro repetidamente, mas ela existe no presente. Mesmo que futuro múltiplos sejam simulados, eles serão futuros sempre prontos para se manifestarem na programação. Nesta mesma linha, a previsão é uma tentativa de se trazer conhecimento do futuro para o presente, apesar de processar o futuro como informação. Dado este conhecimento, nós podemos então agir para controlar este futuro; e com ou sem a previsão, o programa cria um futuro pré-determinado. Portanto, na era dos computadores, acredita-se que o poder temporal irá ser definido como tendo-se acesso e o controle sobre colunas de dados extraídos de experiências passadas, e sendo capaz de programar efetivamente realidades futuras. O cientista GARY GUMPERT (1987), explica como os dispositivos de armazenamento (fitas magnéticas, CD-ROM, e outros) produzem ambigüidade na percepção do presente, o agora, tornando impossível dizer se uma transmissão é ao vivo ou gravada. O registro digital dos computadores, simulações programadas, s egurança em hipervelocidade e a realidade virtual estendem esta ambigüidade para incluir o futuro também. No cibertempo, nós vemos a distinção entre passado, presente e futuro quebrar, com os três tempos se tornando indistintos e essencialmente intercambiáveis. Em algumas vezes, o cibertempo faz manifestar através do argumento extraído do livro "Cyberspace and Communication" (p.386) colocado primeiramente por SANTO AGOSTINHO (séc. V) da seguinte maneira: "É muito claro que nem o futuro e nem o passado existem, e além do mais, não é muito correto dizer que existem três tempos, passado, presente e futuro. Pode ser correto dizer que existem três tempos, um presente de coisas passadas, um presente de coisas presentes e um presente de coisas futuras. Alguns tempos de tais diferenças existem na mente, mas não onde eu possa ver. O presente das coisas passadas é a memória; o presente das coisas presentes é a percepção direta; e o presente das coisas futuras é a expectativa." SANTO AGOSTINHO (séc. V) SANTO AGOSTINHO, sugere que somente o presente é objetivamente real,
enquanto passado e futuro existem somente na mente; como o computador é
extensão da mente, ele similarmente cria "um presente de coisas
passadas e futuras". No cibertempo, passado e futuro entram em colapso
no presente, contribuindo para o sentimento quase místico de ausência
do tempo, algumas vezes associado com o ciberespaço; isto também
é consistente com o tempo espacializado, descontextualizado e comodista
discutido pelos pós-modernistas. Mais ainda, o tratamento do passado
e futuro pelo computador se enquadra com os conceitos dos físicos de
espaço-tempo, no qual o tempo é simplesmente um outro conjunto
de coordenadas a serem trabalhadas graficamente; o modelo de espaço-tempo
espacializa o tempo, tornando-o estatístico e fixo. Portanto, este conceito
de tempo centrado no presente é um tempo de dimensão zero, o tempo
reduzido à certeza absoluta, porém o ciberespaço e o cibertempo
também implicam o outro extremo, que o tempo é infinitamente maleável,
que nós mesmos podemos antecipar e pré-determinar o futuro. O
problema então é a auto-afirmação e o isolamento
do mundo do tempo natural. Ambos extremos minam as noções tradicionais
de passado e futuro.
|