Senhor Director,
"A igualdade, não discriminação e não confessionalidade do Estado" são pressupostos da Constituição da República Portuguesa postergados pelo reduzido amor ao texto constitucional e excesso de temor à Conferência Episcopal dos Senhores Deputados que votaram a nova lei da "liberdade religiosa". Por levantados e sentados, como de costume. Ou melhor, por levantados (poucos) e de joelhos (quase todos).
A Assembleia da República não pode confundir-se com o cabido da Sé Patriarcal e os seus membros não podem gravitar na órbita do clero, nem procurar nas leis que aprovam as indulgências que mais facilmente teriam obtido no Ano do Grande Jubileu que já findou.
Nunca vi necessidade, em regime democrático, de haver um diploma regulador da liberdade religiosa no plano institucional, prática aliás seguida em diversos países. Não precisa disso a Igreja - a católica ou qualquer outra - para estar autorizada a poder "livremente cobrar dos fiéis colectas e quaisquer importâncias ... no interior e à porta dos templos" (Art. 5.º da Concordata). A menos que pretenda, isso sim, satisfazer a gula à mesa do orçamento onde pretende ir buscar o óbolo, ficando "isenta de qualquer imposto ou contribuição", bem como os "eclesiásticos pelo exercício do seu munus espiritual" (Art. 8.º), ou arrogar o direito de que "as dioceses serão subsidiadas pelo Estado (Art.º 27).
A Concordata que em 7 de Maio de 1940, em nome da Santíssima Trindade, foi assinada por um cardeal pelo Vaticano e um General e dois Doutores, cujas condecorações são ridiculamente mencionadas no texto, pela parte de Portugal, não honram a Santa Sé nem o Estado Português democrático que há muito prescindiu de apresentar "objecções de carácter político geral" antes de "a Santa Sé proceder à nomeação de um arcebispo ou bispo residencial", direito que o Art.º 7.º lhe confere.
Penso que a Concordata não é necessária.
Alfredo Carlos Barroco Esperança
Coimbra, 9 de Junho de 2001
Nota: esta carta foi publicada com destaque no correio dos leitores do «Expresso».