Uma Santa Besta

por

Alfredo Carlos Barroco Esperança




Coimbra, 8 de Fevereiro de 2004


Senhor Director:

A entrevista de Mariana Cascais (MC) ao Diário de Notícias de 8 de Fevereiro é mais um libelo contra a sexualidade do que o programa de quem tutela a Educação Sexual (ES) nas escolas.

A secretária de Estado é amiga do peito e da missa dos mais sólidos guardiões da moral e dos bons costumes que, a partir do CDS, se esforçam por manter vivo o concílio de Trento e actual o espírito da contra-reforma.

MC aceitou integrar o Governo convicta de que «a religião católica é a religião oficial do Estado», advertindo disso os deputados. A amarga desilusão de quem passou o tempo a estudar catecismo e deu pouca atenção à Constituição não lhe arrefeceu o ímpeto de lutar pela promoção da virtude e prevenção do vício.

Quando afirma que «se eu quisesse não havia educação sexual», percebe-se que a sexualidade é para a pia governante o que o toucinho é para Maomé, uma coisa abominável, que compromete a salvação da alma. Assim, não é de admirar que tenha dificuldade em aceitar a ES que não exalte a castidade e que não lhe pareça errado que «a fidelidade é um meio de prevenir a sida».

Depois de ler a referida entrevista veio-me à memória Frei Gaspar da Encarnação a quem Camilo chamou «uma santa besta». Claro que não me atreveria a usar semelhante epíteto para tão devota criatura, por três razões: primeiro, porque é uma senhora, depois, porque posso ser injusto, e, finalmente, porque ela pode não ser santa.