Uma Introdução ao Necessário A Posteriori
Desidério Murcho
O objectivo deste ensaio é esclarecer algumas noções
importantes para a compreensão da ideia de que há verdades
necessárias a posteriori. Esta ideia foi introduzida e
desenvolvida por Saul Kripke (1940- ), nos anos 70 do século XX.
Hilary Putnam (1926- ) introduziu, de forma independente, algumas
das noções que conduzem a esta ideia. E Alvin Plantinga (1932-
) foi um dos primeiros filósofos a explorar algumas das noções que a
rodeiam. Mas são tantas as noções que rodeiam a ideia de que há
verdades necessárias a posteriori que praticamente todos os
filósofos contemporâneos que trabalham na área da metafísica ou da
filosofia da linguagem e da mente têm necessidade de abordar algumas
dessas noções. Filósofos como Graeme Forbes, Keith Donnellan, Bob
Hale, Nathan U. Salman, E. J. Lowe, Christopher Peacocke e Tim
Williamson, entre outros, têm abordado algumas dessas noções.
O conjunto de problemas e argumentos associados à ideia de que
existem verdades necessárias a posteriori foi introduzido em
Portugal por João Branquinho, tanto quanto sei, que ensinou vários
cursos de pós-graduação e de licenciatura na Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa que abordaram estes temas, logo após a
conclusão do seu doutoramento em Oxford, onde contactou com estes
problemas. Eu e Maria Bouça tivemos o privilégio de ser dois dos
alunos que contactaram com estas doutrinas graças a João Branquinho, e
de tê-lo posteriormente como orientador das nossas teses de mestrado,
onde estes temas são discutidos.
Modalidades
Para compreender o tema do necessário a posteriori,
o primeiro conceito que temos de clarificar é o de modalidade. Há
vários tipos de modalidades, dos quais podemos isolar os que são
talvez mais importantes: as modalidades semânticas, epistémicas e
aléticas. Comecemos pelas aléticas.
Modalidades aléticas
Tome-se uma frase como "sócrates era um filósofo". Esta
frase é verdadeira. Mas a sua verdade difere da verdade de outras
frases como a frase "se sócrates era um filósofo, sócrates era
um filósofo". Esta última frase não só é verdadeira, como não
poderia ter sido falsa. Todavia, a primeira é verdadeira, mas poderia
ter sido falsa — isto é, Sócrates foi efectivamente um filósofo,
mas poderia não tê-lo sido: poderia nunca se ter interessado pela
filosofia, ou poderia ter morrido antes de ter tido a possibilidade de o
fazer, ou poderiam ter acontecido inúmeras outras coisas que o
impedissem de ter sido um filósofo.
Nem todos os filósofos aceitam a distinção do parágrafo anterior.
Willard Quine (1908- ) acha que a distinção entre os dois
tipos de verdades é ilusória. Para mostrar isso, apresenta dois
argumentos: o argumento do ciclista matemático e o argumento dos
planetas. É fácil mostrar que estes argumentos são falácias, mas
não irei fazê-lo aqui. O importante é compreender o seguinte. A
distinção entre verdades necessárias e contingentes é intuitiva. O
que Quine procura fazer é mostrar que a distinção é uma ilusão. Mas
se conseguirmos oferecer um modelo no qual tal distinção se possa
fazer coerentemente, isto constitui uma refutação de Quine, pois o que
ele afirma é que o idioma modal não é coerente. O moral da história
é este: o partidário da filosofia de Quine não pode criticar as
ideias de Kripke com base na ideia de que o idioma modal é incoerente,
porque o que o que Kripke consegue mostrar é que tal idioma é
perfeitamente coerente. (O que aliás não é de estranhar, dada a
existência de lógicas modais completas e consistentes.) E também não
pode refutar a existência de verdades necessárias a posteriori
com os argumentos empiristas e convencionalistas de Hume, pois o que as
ideias e argumentos associados ao necessário a posteriori
mostram é precisamente um modelo epistemológico de como podemos
conhecer verdades empíricas necessárias.
Intuitivamente, as frases têm diferentes modos ou maneiras de
ser verdadeiras: podem ser verdadeiras como a frase "sócrates era
um filósofo" ou verdadeiras como "se sócrates era um
filósofo, era um filósofo". Diz-se que a primeira é uma verdade
contingente: é uma verdade, mas poderia ter sido uma falsidade. E
diz-se que a segunda é uma verdade necessária: é uma verdade e
não poderia ter sido uma falsidade. Outros exemplos de verdades
necessárias são as verdades da aritmética, como "2 + 2 =
4", e da lógica, como "p ®
P".
É fácil de ver que se uma verdade é necessária, a sua negação
é impossível. As seguintes frases são impossíveis: "2 + 2 ¹
4" e "¬(P ® P)". também é
fácil de perceber que se uma verdade é necessária, é possível.
temos assim 4 categorias: o contingente, o necessário, o impossível e
o possível. na verdade, podemos reduzir estas 4 categorias a 2 (o
possível e o necessário) ou, se quisermos ser radicais, apenas a uma
delas. mas isto são pormenores irrelevantes para o nosso caso. o que
nos interessa agora é dominar estes 4 conceitos.
Uma frase pode ser necessária ou contingente ou possível ou
impossível e tem de ser pelo menos uma destas coisas. Isto é a modalidade
alética. O termo "alética" quer dizer
"verdade" (deriva da palavra grega para verdade,
"aleteia"). Assim, falar de modalidades aléticas é falar dos
modos como uma frase pode ser verdadeira. Na realidade, é falar dos
modos como uma frase pode ser verdadeira ou falsa. Por exemplo, a frase
"2 + 2 ¹ 4" é uma falsidade
necessária; é uma impossibilidade: uma frase que é falsa e que não
poderia ter sido verdadeira. claro que há falsidades contingentes:
frases que são falsas mas que poderiam ter sido verdadeiras, como
"Sócrates nasceu no Egipto".
Modalidades epistémicas
As modalidades aléticas contrastam com as modalidades epistémicas.
Estas últimas não se referem ao modo como uma frase é verdadeira ou
falsa, mas ao modo como uma frase é conhecida. Para eu saber que a
frase "sócrates era um filósofo" é verdadeira tenho de
recorrer à experiência empírica: consultar registos históricos, por
exemplo. Mas não tenho de consultar registos históricos para saber que
a frase "se sócrates era um filósofo, era um filósofo" é
verdadeira. Posso consultar registos históricos, se quiser —
como obras medievais de lógica — para saber se esses registos afirmam
tal coisa; mas não tenho de o fazer — posso descobri-lo
unicamente pelo raciocínio. Chama-se conhecimento a priori
ao primeiro tipo de conhecimento e conhecimento a posteriori
ao segundo tipo de conhecimento.
As verdades da aritmética e da geometria, por exemplo, são a
priori. Mas as verdades da física e a biologia, por exemplo, são a
posteriori. No que respeita a estas últimas é talvez útil um
esclarecimento. Tome-se uma fórmula qualquer da física, como F = ma
(que significa que a força de um objecto é igual ao produto da
sua massa com a sua aceleração). Esta fórmula
representa uma verdade empírica, que só pudemos descobrir investigando
a maneira como o mundo efectivamente funciona; não há maneira de
descobrir sem recorrer à experiência que esta fórmula é verdadeira.
Mas é claro que esta fórmula acarreta um conjunto de consequências
lógicas e matemáticas. Por exemplo, podemos deduzir matematicamente da
fórmula dada esta outra fórmula: m = F/a. Todavia, daqui não
se segue que possamos saber que esta fórmula é verdadeira sem recorrer
à experiência. Só podemos saber que esta fórmula é verdadeira se
soubermos que a primeira o é; mas se a primeira for a posteriori
esta também o será precisamente por se basear nela. O mesmo acontece
se a primeira fórmula resultar de outra qualquer fórmula mais básica;
para sabermos que essa outra fórmula é verdadeira, teremos de recorrer
à experiência, pelo que a fórmula de chegada será também a
posteriori.
Voltando ao nosso tema, há três aspectos destacados por Kripke no
que respeita às modalidades epistémicas.
Em primeiro lugar, o a priori e o a posteriori são
relativos à estrutura cognitiva dos sujeitos em causa. Por exemplo, é
concebível que as verdades da biologia e da física sejam a priori
para Deus (se ele existe): são verdades que Deus pode conhecer sem
recorrer à experiência empírica. Isto pode acontecer por Deus ter uma
estrutura cognitiva diferente da nossa, nomeadamente por ser
omnisciente. Outros agentes cognitivos, como seres inteligentes
extraterrestres, poderão ter diferentes estruturas cognitivas e o que
para nós é a priori pode para eles ser a posteriori ou
vice-versa.
Em segundo lugar, e o que é mais importante, as modalidades
epistémicas são relativas não apenas à estrutura cognitiva, mas a
cada um dos indivíduos e aos contextos em que esses indivíduos se
situam. Imagine que estamos na Idade Média e que precisamos de um novo
sistema métrico. Eu reuno os sábios da corte e pergunto-lhes como
havemos de fazer. Um deles que já sabia do que tratava tão magna
reunião, apresenta um bordão de madeira e diz assim: "este
bordão foi-me dado pelo meu pai e acompanhou-me toda a minha vida.
chamo-lhe 'bordão da sabedoria'. para resolver o problema do nosso rei,
proponho que introduzamos a unidade de medida a que chamaremos 'real'.
cada real terá o tamanho do bordão da sabedoria". Um facto
curioso acerca destas pessoas é que, porque são elas que estão a
introduzir o significado da expressão "real", elas sabem a
priori que o Bordão da Sabedoria mede 1 real. Mas só para eles (e,
eventualmente, para um deus omnisciente) é esse fragmento de
conhecimento a priori; nenhuma outra pessoa pode saber a
priori que o Bordão da Sabedoria mede 1 real. O tamanho que um
bordão tem é algo que só podemos determinar pela experiência
empírica — excepto quando estamos a introduzir uma convenção
métrica e usamos esse bordão como padrão.
Em terceiro lugar, do facto de uma verdade expressa por uma frase ser
conhecida a priori não se segue que não possamos saber por
meios empíricos que essa frase é verdadeira; significa apenas que podemos
saber que ela é verdadeira sem recorrer a meios empíricos — mas não
temos de conhecê-la exclusivamente por meios não empíricos.
Imagine-se que eu quero saber o resultado da operação "23445 x
-23". o mais prático é usar uma calculadora. o resultado é
-539235. será que "23445 x
-23 = -539235" é uma verdade a posteriori? Afinal, eu posso
saber que esta frase é verdadeira recorrendo à experiência,
nomeadamente, recorrendo a uma máquina de calcular que me devolve um
resultado no qual eu acredito porque a calculadora sempre me devolveu
resultados correctos. Mas Kripke nota que, apesar de eu poder
recorrer a meios empíricos para saber que 23445 x
-23 = -539235, também posso descobri-lo por cálculo mental, sem
recorrer a meios empíricos. Posso fazer a conta num papel. (O papel é
um mero auxiliar de memória para o cálculo, pelo que o cálculo é
efectivamente a priori.) Por isso, consideramos que "23445 x
-23 = -539235" é uma verdade a priori, apesar de ser
susceptível de ser conhecida recorrendo a meios empíricos. O que conta
é que é susceptível de ser conhecida sem recorrer a meios empíricos;
e isto é quanto basta para que uma verdade seja a priori. Um
outro exemplo pode ajudar a clarificar este aspecto. Quando, na escola,
o nosso professor nos disse que o valor de pi era 3,14159265359...,
ficamos a saber que a frase "pi = 3,14159265359..." é
verdadeira. Mas este conhecimento foi obtido por meios empíricos.
Todavia, trata-se de uma verdade a priori porque o valor de pi pode
ser determinado por cálculo mental. Em suma, considera-se que uma
verdade é a priori desde que possa ser conhecida sem recorrer a
meios empíricos.
Analiticidade
Um terceiro tipo de modalidade, que contrasta com as modalidades
epistémicas e com as modalidades aléticas, é o que podemos chamar
"modalidade semântica", se bem que este termo não costuma
ser usado. Tome-se uma vez mais a frase "sócrates era um
filósofo". Esta frase contrasta claramente com uma frase como
"se sócrates era solteiro, não era casado". Esta última
frase exprime uma verdade analítica, ao passo que a primeira
exprime uma verdade sintética. O valor de verdade de uma frase
analítica determina-se recorrendo unicamente ao significado das
palavras e à sintaxe (isto é, ao modo de concatenação dos símbolos
que constituem a frase); mas o valor de verdade de uma frase sintética
não se determina unicamente recorrendo ao significado das palavras e à
sintaxe. Recorrendo unicamente ao significado das palavras e à sintaxe
não podemos saber se a frase "dois dias antes de morrer, sócrates
teve fome ao meio-dia" é verdadeira; mas podemos saber, só pelo
significado das palavras e pela sintaxe, que a frase "dois dias
antes de morrer, sócrates tinha dois dias de vida" é verdadeira.
Até Immanuel Kant (1724-1804), os três tipos de modalidades
não só estavam razoavelmente baralhados, como se pensava que todas as
verdades necessárias eram analíticas e a priori e que todas as
verdades contingentes eram sintéticas e a posteriori. Para
tentar resolver os problemas levantados por David Hume (1711-76),
que tinham como consequência que as verdades das ciências como a
física eram contingentes, Kant defendeu que as verdades das ciências
como a física eram sintéticas mas a priori. Esta proposta de
Kant resulta do seu pressuposto de que todas as verdades a priori
são necessárias. Assim, se as verdades das ciências como a física
fossem a priori, a sua necessidade estaria assegurada. Por outro
lado, as verdades da ciência teriam de ser sintéticas, pois não
resultavam unicamente do significado das palavras e da sintaxe das
frases.
Do meu ponto de vista, esta solução é má, pois implica uma
espécie de idealismo — o idealismo transcendental —, tendo de
admitir que as verdades das ciências como a física não têm por
objecto o mundo em si, mas apenas a nossa representação
intersubjectiva do mundo, impedindo assim qualquer perspectiva realista
da ciência. Ao defender que as verdades da ciência são a priori,
Kant não pôde continuar a pensar que as verdades da ciência eram
sobre o mundo em si, pois não faz sentido pensar que podemos conhecer a
priori a natureza íntima do mundo. Assim, Kant teve de introduzir
uma distinção entre o objecto das verdades da ciência — os
fenómenos — e o mundo em si. Podemos conhecer a priori as leis
que regulam os fenómenos porque os fenómenos são uma construção
intersubjectiva, são uma maneira especial que os seres humanos têm de
organizar os dados dos sentidos. O que Kripke trouxe à discussão, e o
que Maria Bouça discute no seu texto é a legitimidade de continuar a
pensar que todas as verdades necessárias são a priori.
Necessário a posteriori
Contra a ideia de que todas as verdades necessárias são a
priori há dois tipos de argumentos. Um dos tipos é conceptual e
procura mostrar que não há uma conexão entre as modalidades aléticas
e as epistémicas. O outro tipo de argumento consiste em apresentar um
tipo particular de contra-exemplos, isto é, de verdades que são a
posteriori, apesar de serem necessárias.
O argumento de tipo conceptual é o seguinte. Dada uma qualquer frase
necessária, a única razão que temos para pensar que essa frase terá
de ser a priori é uma ilusão.
Essa razão é a seguinte: se uma frase é uma verdade necessária,
essa frase é verdadeira em todas as circunstâncias possíveis. Mas se
é verdadeira em todas as circunstâncias possíveis, não depende da
maneira como o mundo realmente é. Logo, para sabermos que essa frase é
verdadeira não temos de saber como é o mundo: sabemo-lo a priori.
Logo, todas as verdades necessárias são a priori.
Este argumento, que constitui a única razão para pensar que todas
as verdades necessárias são a priori, depende de uma premissa
falsa. Essa premissa é a ideia de que se uma frase é verdadeira em
todas as circunstâncias possíveis, a sua verdade não depende da
maneira como o mundo é. Pelo contrário: pode muito bem acontecer que
uma frase seja verdadeira em todas as circunstâncias possíveis
precisamente em virtude da natureza do mundo. Ora, se isto acontecer,
teremos de saber como é o mundo, para podermos saber que essa frase é
verdadeira; o que significa que essa frase não será a priori,
mas sim a posteriori. Logo, nem todas as verdades necessárias
são a priori.
O argumento de tipo conceptual de pouco serviria se não
conseguíssemos encontrar exemplos de verdades necessárias a
posteriori. Esse é o objectivo do segundo tipo de argumento a favor
da ideia do necessário a posteriori.
Para apresentarmos os casos de verdades necessárias a posteriori
é conveniente fazer um pequeno périplo que constituirá um caso
análogo ao que nos interessa. Para isso, tome-se o seguinte
raciocínio:
Sócrates é um ser humano.
Todos os seres humanos são mortais.
Logo, Sócrates é mortal.
É a conclusão a priori ou a posteriori? A conclusão é
claramente a posteriori: não é o tipo de conhecimento que
possamos ter independentemente da experiência. Mas esta verdade pode
ser deduzida a partir das outras duas. Isto pode dar a ilusão de que a
conclusão é a priori, porque as verdades dedutivas são a
priori. Mas isto é, precisamente, uma ilusão.
O que eu sei dedutivamente é que se as premissas forem
verdadeiras, a conclusão é verdadeira. Para eu saber que a conclusão
é efectivamente verdadeira, tenho de saber que as premissas são ambas
verdadeiras. De modo que a questão de saber se a conclusão é ou não a
priori depende da questão de saber se as premissas podem ser
conhecidas a priori. Se todas as premissas puderem ser conhecidas
a priori, então a conclusão é a priori. Mas basta que
uma das premissas seja a posteriori para que a conclusão também
o seja, desde que a conclusão não possa ser estabelecida por outros
meios, exclusivamente não empíricos — este foi um dos aspectos
interessantes introduzidos por Kripke na caracterização da modalidade
epistémica do a priori, como já vimos.
Ora, não há nenhum raciocínio unicamente com premissas a priori
que possa estabelecer a conclusão em causa ("sócrates é
mortal"). Logo, a conclusão é a posteriori, porque para
estabelecer a sua verdade será sempre necessário recorrer a premissas
empíricas, mesmo que usemos raciocínios dedutivos. Claro que também
podemos saber directamente que Sócrates era mortal, sem recorrer a
nenhum raciocínio dedutivo; mas nesse caso é óbvio que se trata de um
conhecimento a posteriori.
Esta é a ideia simples que está por detrás da ideia de Kripke do
necessário a posteriori. Tome-se o seguinte raciocínio:
Se a água é H2O,
é necessariamente H2O.
A água é H2O.
Logo, a água é necessariamente H2O.
A conclusão é a posteriori porque uma das premissas do
raciocínio (a segunda) é a posteriori; e é necessária. Logo,
há verdades necessárias a posteriori.
Contra-argumentos
Este exemplo pode ser contestado. No que resta deste ensaio
introdutório irei discutir apenas algumas das maneiras de contestar o
exemplo.
Quando fui exposto pela primeira vez a este exemplo, pareceu-me
obscura a ideia de que a conclusão era a posteriori porque uma
das premissas também o era; era quase uma questão de magia: o
carácter a posteriori da premissa parecia transmitir-se
misteriosamente à conclusão, como uma espécie de
"contaminação". De modo que procurei contra-exemplos. E os
contra-exemplos (aparentes, como veremos) abundam. O exemplo acima tem a
forma de um modus ponens. Basta encontrar outros exemplos que
tenham a forma de um modus ponens, mas em que a consequente da
primeira premissa seja claramente a priori, para refutar o
exemplo de Kripke. (Pensava eu...)
Atente-se no seguinte argumento:
Se a água é H2O,
necessariamente 2 + 2 = 4.
A água é H2O.
Logo, necessariamente 2 + 2 = 4.
É óbvio que a conclusão é a priori. No entanto, podemos
obtê-la por meio de um raciocínio dedutivo em que pelo menos uma
premissa é a posteriori. Logo, não podemos concluir que "a
água é necessariamente h2O" é
uma verdade a posteriori só porque a obtemos a partir de um
raciocínio dedutivo em que uma das premissas é a posteriori. A
solução de Maria Bouça para este tipo de exemplos (o exemplo dela é
diferente deste) consiste em defender que a primeira premissa é
"epistemicamente irrelevante".
O que acontece com uma condicional como "se a água é h2O,
necessariamente 2 + 2 = 4" é que a sua verdade resulta
exclusivamente de dois factores: do facto de a sua consequente
("necessariamente 2 + 2 = 4") ser uma verdade aritmética; e
da semântica da condicional, que garante que qualquer condicional com
uma consequente verdadeira é verdadeira, independentemente do valor de
verdade da antecedente. este fenómeno é paralelo ao que ocorre com
argumentos com conclusões que sejam verdades lógicas ou da
aritmética, ou outras quaisquer verdades necessárias: esses argumentos
são sempre válidos, independentemente das premissas que tiverem.
Penso que esta defesa engenhosa não é a melhor, por dois motivos.
Em primeiro lugar, porque não é imune a eventuais contra-exemplos que
não sejam baseados em condicionais "epistemicamente
irrelevantes". Um desses exemplos é o seguinte:
Ou a água não é H2O
ou necessariamente 2 + 2 = 4.
A água é H2O.
Logo, necessariamente 2 + 2 = 4.
Este raciocínio é dedutivo, é válido e não tem uma condicional
"epistemicamente irrelevante". No entanto, a sua conclusão é
claramente a priori, apesar de a sua segunda premissa ser a
posteriori.
É claro que podemos tentar reeditar, também para este caso, a
estratégia que recorre à noção (ainda um pouco obscura) de
relevância epistémica. Mas não sei se isso nos levaria muito longe.
O segundo motivo pelo qual acho que esta solução engenhosa não é
a melhor é o facto de podermos oferecer uma solução que não apela à
noção de "relevância epistémica". Essa solução é a
seguinte.
O exemplo original do modus ponens em que se conclui que a
água é necessariamente H2O parece
exactamente paralelo ao contra-exemplo com a condicional cuja
consequente é uma verdade da aritmética. Mas esse paralelismo é uma
ilusão.
O paralelismo desfaz-se em pó quando compreendemos bem um dos
aspectos da caracterização de conhecimento a priori que
destaquei anteriormente: para que uma verdade seja a priori basta
que possa ser conhecida sem recorrer a meios empíricos; mas se
para estabelecer uma verdade tenho de recorrer à experiência,
então essa verdade é a posteriori.
Ora, a conclusão do hipotético contra-exemplo é susceptível de
ser conhecida por outros meios, exclusivamente a priori; mas a
conclusão do exemplo original não é susceptível de ser conhecida por
meios exclusivamente a priori. Isto é, eu posso saber que
necessariamente 2 + 2 = 4 sem recorrer a um raciocínio dedutivo com
premissas empíricas; mas não há maneira de saber que a água é
necessariamente H2O sem recorrer à
premissa de que a água é efectivamente H2O.
Assim, esta conclusão é a posteriori, mas a conclusão
aritmética é a priori, apesar de poder ser conhecida por
meios empíricos, tal como acontece quando faço uma conta numa
calculadora, ou quando o meu professor me diz qual é o valor de pi.
Logo, há verdades necessárias a posteriori e o hipotético
contra-exemplo é uma ilusão.
Outra maneira de tentar resistir à conclusão de que há verdades
necessárias a posteriori é defender que a segunda premissa, a
premissa que afirma que a água é H2O,
não é empírica. Mas isto só pode fazer-se ou a partir de uma
doutrina errada da linguagem ou de um ponto de vista kantiano.
Exploremos brevemente cada uma destas reacções.
Se tratarmos um termo como "água" como o nome próprio de
uma substância e "é h2O"
como um predicado, e se pensarmos que os nomes próprios não passam de
descrições disfarçadas, então seremos tentados a dizer que frase
"A água é H2O" é
analítica. uma vez que todas as frases analíticas são a priori,
pois a verdade destas frases depende unicamente do significado das
palavras e da sintaxe e não da maneira como o mundo é, isto
significaria que a frase "a água é h2O"
seria a priori e não a posteriori.
Esta estratégia está condenada à partida porque a própria
doutrina segundo a qual o termo "água" refere a água em
virtude de os falantes associarem este termo a uma descrição como
"o que tem a composição química expressa pela fórmula h2O"
está errada. e esta doutrina está errada pelo motivo seguinte. se
fosse verdadeira, antes de se ter descoberto que a água era h2O,
as pessoas não referiam a água quando usavam a palavra
"água". Mas isto é claramente falso: os portugueses do
século XV que usavam a palavra "água" referiam a água e
não outra coisa qualquer. Se não fosse assim, os químicos não
poderiam ter descoberto que a água era H2O,
uma vez que quando um químico dizia, antes da descoberta, "ando a
ver se descubro a composição química da água", ele não estaria
a referir a água, mas sim outra coisa qualquer (o quê?!). Logo, a
doutrina está errada.
Outra tentação, relacionada com esta, é declarar que a frase
"a água é h2O" é
analítica porque exprime apenas uma convenção: nós decidimos que
"H2O" e "água"
são termos sinónimos, como "encarnado" e
"vermelho". e do mesmo modo que a frase "Todas as coisas
vermelhas são encarnadas" é analítica, também a nossa frase o
seria.
Esta posição resulta de uma confusão elementar, mas que tem sido
uma presença constante em alguma filosofia do século XX — confusão
finalmente desfeita por Kripke. Trata-se da confusão entre o uso e a
menção das palavras. Quando eu digo "a 'banana' tem 6
letras", estou a falar da palavra "banana"; não estou a
falar de bananas. Mas quando eu digo "a banana está uma
delícia", estou a falar de um fruto que estou a comer e não de
uma palavra. Isto pode parecer demasiado elementar para poder ser
confundido, mas a verdade é que é. E é essa confusão que está
presente na tentação de afirmar que a frase "a água é h2O"
é analítica por constituir a expressão de uma convenção.
O que é convencional é que nós, portugueses, usemos a palavra
"água" para referir a água. Podíamos usar outra palavra
qualquer. Os ingleses, por exemplo, usam a palavra "water". O
que é convencional é que usemos os símbolos "h2O"
para referir uma certa estrutura química, que consiste na combinação
molecular de dois átomos de hidrogénio e um átomo de oxigénio.
podíamos usar outros símbolos quaisquer, como "IIP". mas o
que não é convencional é que aquilo que referimos com a
palavra "água" tenha a estrutura química que exprimimos com
a fórmula "h2O". que isto
não é uma convenção percebe-se perfeitamente se afirmarmos "A
água é CO2". esta frase é
falsa não porque estamos a violar a convenção linguística que
determina que a palavra "água" refere a água e não dióxido
de carbono, mas porque o que a palavra "água" refere não tem
a estrutura química referida pela fórmula "CO2".
se usarmos a frase "A água é CO2"
violando realmente a convenção linguística que determina que a
palavra "água" refere água, e usando a palavra
"água", ao invés, para referir dióxido de carbono, a nossa
frase seria verdadeira, apesar de estarmos a violar uma
convenção linguística. As convenções linguísticas não determinam,
por si, a verdade ou falsidade das afirmações: não há infelizmente
nenhuma convenção linguística que determine que eu seja professor
universitário, por exemplo, visto que o não sou. De pouco consolo me
serve que amanhã mudem as convenções e se passe a chamar
"professor universitário" a jovens investigadores
desempregados como eu: a minha conta no banco continua a igual e as
minhas perspectivas continuam negras.
Portanto, não podemos afirmar que a frase "a água é h2O"
não é a posteriori procurando mostrar que se trata de uma frase
analítica ou da expressão de uma convenção.
Podemos ser tentados a defender que o que os químicos querem dizer
com "água" é diferente do que as pessoas comuns querem dizer
com "água". Os químicos querem dizer "h2O";
as pessoas comuns querem dizer "líquido translúcido, que se bebe
e que está nos mares e nos rios e que sai, com sorte, pela
torneira". mesmo que isto fosse verdade, daqui não se seguiria que
a frase "A água é H2O"
seria analítica. pois o que os químicos fizeram foi analisar a
estrutura química de todas aquelas porções de líquido a que as
pessoas comuns chamam "água"; e descobriram que todas essas
porções de líquido tinham dois átomos de hidrogénio e um de
oxigénio; descobriram também que tinham muitas outras coisas, como
sal, no caso da água do mar, e chumbo em quantidades assustadoras, no
caso da água da torneira de lisboa; mas o que havia de comum e de
predominante era h2O.
Resta a estratégia kantiana: afirmar que frase é a priori,
apesar de sintética, porque, precisamente, é uma verdade da química e
as verdades da ciência são sintéticas a priori. Esta
estratégia não colhe porque o que está em causa com a própria
noção de verdades necessárias a posteriori é uma concepção
de ciência concorrente relativamente à concepção kantiana. Não
podemos defender que Deus existe, perante um ateu, com o argumento de
que os ateus estão enganados: isto é circular. No nosso caso, não
podemos afirmar que a frase é sintética a priori porque isto
só pode fazer-se presumindo a doutrina kantiana; mas como é a própria
doutrina kantiana que está a ser colocada em causa com a ideia de que
as verdades da ciência são necessárias a posteriori, essa
defesa kantiana seria circular: não há verdades necessárias a
posteriori, diria o kantiano, porque não há verdades necessárias a
posteriori.
Mesmo que pensemos que Kant conseguiu demonstrar que as estruturas
transcendentais existem realmente, independentemente de ter presumido
que têm de existir para que as verdades das ciências empíricas fossem
a priori, não podemos usar este resultado hipotético para
refutar a doutrina da existência de verdades necessárias a
posteriori. Isto acontece pelo seguinte. Se essa estratégia fosse
admissível, então a estratégia paralela também teria de o ser. A
estratégia paralela é refutar a doutrina de Kant com base na doutrina
de Kripke. Mas é absurdo que uma estratégia geral obtenha dois
resultados inconsistentes entre si. Logo, essa estratégia está errada.
Na verdade, o modelo kantiano e o modelo de Kripke têm de competir
entre si. Não podem aferir-se unicamente pelo facto de num modelo se
defender que as verdades da ciência são a priori, ao passo que
no outro se defende que são a posteriori. Temos de aferir os
dois modelos pela sua plausibilidade, pelas suas consequências, pelos
seus pressupostos. Ora, vistas as coisas dessa maneira, o modelo de Kant
perde. Isto acontece por dois motivos.
Em primeiro lugar, porque se baseia no pressuposto de que todas as
verdades a priori são necessárias, pressuposto quase obviamente
falso. Há verdades a priori contingentes, como "eu estou
aqui". Não preciso de recorrer a nenhuma experiência para saber
que esta frase é verdadeira: ela é analítica. No entanto, é
contingente: eu poderia não estar aqui, mas sim noutro local qualquer.
A frase "eu estou aqui" exprime a verdade seguinte: "o
desidério está em lisboa". Mas esta verdade é claramente
contingente: eu poderia estar no Porto, ou em Braga. Claro que se eu
estivesse em Braga e proferisse a frase "eu estou aqui", esta
frase exprimiria uma verdade diferente: "o desidério está em
braga". Mas pelo facto de uma frase do mesmo tipo exprimir
diferentes verdades em função do contexto não podemos pensar que essa
frase exprime uma necessidade; o que acontece realmente é que uma frase
do mesmo tipo exprime diferentes verdades, todas elas contingentes. Isto
acontece porque é essa a regra dos indexicais "aqui" e
"eu". O primeiro refere o local da elocução da frase onde
ocorre; o segundo, o locutor da frase.
Em segundo lugar, porque a doutrina kantiana tem este resultado
implausível: a ciência não revela a natureza do mundo tal como ele
é, mas apenas uma construção intersubjectiva humana. Isto poderia ser
verdade, mas é claramente contra-intuitivo. Como todas as doutrinas
contra-intuitivas, só deve ser adoptada se conseguir mostrar que
ganhamos algo com a sua adopção. Mas a única coisa que realmente
ganhamos — e a razão pela qual Kant defendeu esta perspectiva — é
a ideia de que as verdades da ciência não são contingentes, como Hume
defendia, mas antes necessárias. Mas este resultado também se pode
obter do ponto de vista de Kripke, sem termos necessidade de abandonar a
ideia pré-teórica de que os fenómenos são independentes da nossa
estrutura cognitiva. Logo, não podemos negar que a frase "a água
é h2O" é a posteriori
com base na doutrina kantiana.
Logo, nem recorrendo à ideia de analiticidade, nem à ideia de
convenção, nem à doutrina kantiana podemos refutar a existência de
verdades necessárias a posteriori, porque nenhuma dessas
estratégias consegue mostrar que a segunda premissa do nosso exemplo
não é a posteriori.
Há outras tentativas de resistir à existência de verdades
necessárias a posteriori. Casullo apresenta uma abordagem
original, procurando qualificar a doutrina do necessário a
posteriori; mas o resultado final acaba por ser o reforço da ideia
de Kripke.
Essencialismo
O aspecto mais subtil na defesa da ideia de que existem
verdades necessárias a posteriori é a defesa de condicionais
como "se a água é h2O, é
necessariamente H2O". este tipo
de condicionais representa o credo essencialista, isto é, a ideia de
que os particulares, como sócrates, têm algumas propriedades
necessariamente, isto é, propriedades que não poderiam não ter, sem
deixar de ser o que são. a defesa desta condicional, todavia, é algo
que ultrapassa o âmbito deste ensaio. no espaço que resta, vou dar
apenas uma ideia de como se estabelece este tipo de condicionais.
Há boas razões para aceitar que algumas destas condicionais
essencialistas são verdadeiras. A defesa destas condicionais faz-se em
três momentos distintos.
Em primeiro lugar, mostra-se que há condicionais essencialistas que
são quase irrefutáveis e que a ideia de que tais condicionais são
falsas resulta de uma confusão linguística. Estas condicionais
essencialistas correspondem ao que podemos chamar "essencialismo
empírico não substancial". São condicionais como "se
véspero é fósforo, véspero é necessariamente fósforo".
"véspero" e "fósforo" são nomes tradicionalmente
dados a Vénus.
Em segundo lugar, argumenta-se que se em qualquer caso há boas
razões para aceitar que algumas condicionais essencialistas são
verdadeiras, as razões que se poderiam avançar contra o essencialismo
substancial ficam enfraquecidas, pois essas razões posicionam-se contra
qualquer tipo de essencialismo. Uma vez demonstrado o
essencialismo empírico não substancial, temos um modelo
epistemológico para o essencialismo substancial. Como as posições
anti-essencialistas resultam em grande parte dos problemas
epistemológicos que o essencialismo parece enfrentar, apresentado o
modelo das verdades necessárias a posteriori, o essencialismo
substancial torna-se muito mais plausível.
O golpe final contra o anti-essencialismo consiste em avaliar as
diferentes alternativas, verificando-se que o essencialismo é a melhor
dessas alternativas. Mas há vários tipos de essencialismos. De modo
que teremos também de oferecer um princípio de escolha que nos permita
decidir-nos por um certo tipo de essencialismo e não por outro. Eu
favoreço uma versão de essencialismo naturalista, cujos pormenores
não cabe aqui esclarecer, mas que grosso modo corresponde ao
essencialismo intuitivamente associado à prática científica.
Já macei os leitores da Intelecto mais do que é tolerável,
mas espero que os esclarecimentos que ofereci ajudem a dar os primeiros
passos na deslumbrante selva metafísica da filosofia contemporânea.
Referências Bibliográficas
- Bouça, Maria (1999) Uma Defesa do Necessário A Posteriori.
Dissertação de Mestrado. Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa.
- Casullo, Albert (1977) "kripke on the a priori and the
necessary", Analysis, 37, pp. 152-159. Reimpresso em
Paul K. Moser (org.), A Priori Knowledge. Oxford: Oxford
University Press, pp. 161-169.
- Kant, Immanuel (1783) Prolegómenos a Toda a Metafísica
Futura. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 1982.
- Kant, Immanuel (1787) Crítica da Razão Pura. Tradução
de Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1989.
- Kripke, S. (1980) Naming and Necessity. Oxford: Blackwell.
- Kripke, S. (1993) "identity and necessity", in A. W.
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University Press, 161-169.
- Murcho, Desidério (1999) Essencialismo Naturalizado.
Dissertação de Mestrado. Faculdade de Letras da Universidade de
Lisboa.
- Plantinga, Alvin (1974) The Nature of Necessity. Oxford:
Clarendon Press.
- Putnam, Hilary (1975) "the meaning of 'meaning'".
Reimpresso no seu Mind, Language and Reality: Philosophical
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215-271.
- Putnam, Hilary (1983) «Possibilidade/Necessidade» in Enciclopédia
Einaudi. Lisboa: INCM, 1988, pp. 90-111.
- Putnam, Hilary (1990) «É a Água Necessariamente H2O?»,
cap. 4 do seu Realismo de Rosto Humano. Lisboa: Piaget, 1999.
Desidério Murcho
desiderio.murcho@forum.pt