Modo de Apresentação
Sara Bizarro

 

Em "Über Sinn und Bedeutung" (1892), "Sobre o Sentido e a Referência", Frege apresenta a distinção entre Sinn (Sentido ou modo de apresentação de um objecto) e Bedeutung (que pode ser traduzido tanto por significado como por denotação ou referência).

Frege introduz esta distinção quando trata o comportamento estranho das frases de identidade que podem ser ao mesmo tempo verdadeiras e informativas. O exemplo de Vénus ilustra claramente esta questão. Por um lado, a frase "A estrela da manhã é a estrela da manhã" é trivialmente verdadeira e não informativa. Por outro lado, a frase "A estrela da manhã é a estrela da tarde" não é trivialmente verdadeira visto pode mesmo ser considerada como uma descoberta importante da astronomia da babilónia. Assim sendo, as expressões "a estrela da manhã" e "a estrela da tarde", embora tenham o mesmo referente, "Vénus", têm um valor cognitivo diferente visto que é possível que alguém que compreenda ambas acredite na primeira e não na segunda.

Este "problema da informação" implica aparentemente uma violação da lei da substituição dos idênticos de Leibniz. Para solucionar o problema Frege introduz a distinção entre Sentido e Referência, entre Sinn e Bedeutung. A defesa de Frege é assim a de que embora a expressão "a estrela da manhã" e a expressão "a estrela da tarde" tenham o mesmo referente — o planeta Vénus — mesmo assim estas expressões têm um sentido (Sinn) diferente. A diferença no sentido destas expressões está no facto do planeta Vénus ser apresentado por cada uma delas de uma maneira diferente. O sentido é assim considerado por Frege como o modo de apresentação do objecto. No caso da expressão "a estrela da manhã" o seu modo de apresentação seria algo do tipo "a estrela muito brilhante que aparece no céu imediatamente antes do sol nascer". No caso da expressão "a estrela da tarde" seria qualquer coisa do tipo "a estrela muito brilhante que aparece no céu imediatamente depois de anoitecer". Com esta distinção Frege salva a lei da substituição de idênticos pois visto que as expressões tratadas têm um sentido diferente e a substituição de uma pela outra não pode ser considerada uma substituição de idênticos.

A distinção entre Sinn e Bedeutung aplica-se tanto a nomes próprios como a frases. No caso dos nomes próprios o sentido de um nome é o modo de apresentação do objecto referido pelo nome e a referência é o próprio objecto. No caso das frases o sentido de uma frase é o pensamento que ela exprime e a sua referência é o seu valor de verdade (literalmente o Verdadeiro ou o Falso). A atribuição de sentido a nomes e deste tipo de referência peculiar a frases é uma das características mais originais da filosofia da linguagem de Frege. No entanto, a legitimidade da utilização de entidades como o Verdadeiro e o Falso enquanto referentes de frases foi posta em causa e também é defensável que a atribuição de sentido a nomes próprios não se segue do argumento de Frege. O exemplo aqui apresentado pode ser usado para nomes próprios se substituirmos a expressão "a estrela da manhã" por "Véspero" e "a estrela da tarde" por "Fósforo" (os dois nomes referem Vénus). Mesmo assim, a única conclusão inevitável do argumento de Frege é a de que na análise dos nomes exige algo mais do que a análise da sua referência. De qualquer forma, a distinção entre Sinn e Bedeutung tem inspirado proveitosamente a maior parte da filosofia da linguagem contemporânea.

Referências:

Frege, Gottolb, "Über Sinn und Bedeutung" (1892), trad. inglesa. "On Sense and Reference" in Geach, P. e Black, M. (eds), Translations from the Philosophical Writtings of Gottolb Frege, Blackwell, Oxford, 1952, pp. 56-78

 

Sara Bizarro
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