citações de autores diversos
Jameson, Fredric. (1996). Pós-Modernismo.A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio.
É bastante lógico, então, que o pós-modernismo em arquitetura se apresente como uma espécie de populismo estético, como sugere o próprio título do influente manifesto de Venturini, Aprendendo com Las Vegas. Por mais que se queira reavaliar essa retórica populista, ela teve, pelo menos, o mérito de dirigir nossa tenção para uma característica fundamental de todos os pós-modernismos enumerados acima, a saber, o apagamento da antiga (característica do alto modernismo) fronteira entre a alta cultura e a assim chamada cultura de massa ou comercial, e o aparecimento de novos tipos de texto impregnados das formas, categorias e conteúdos da mesma indústria cultural que tinha sido denunciada com tanta veemência por todos os ideólogos do moderno, de Leavis ao New Criticism americano até Adorno e a Escola de Frankfurt. De fato, os pós-modernismos têm revelado um enorme fascínio justamente por essa paisagem "degradada" do brega e do kitsch, dos seriados de TV e da cultura do Reader's Digest, dos anúncios e dos motéis, dos late shows e dos filmes B hollywoodianos, da assim chamada paraliteratura - com seus bolsilivros de aeroporto e suas subcategorias do romanesco e do gótico, da biografia popular, histórias de mistério e assassinatos, ficção científica e romances de fantasia: todos esses materiais não são mais apenas "citados", como o poderiam fazer um Joyce ou um Mahler, mas são incorporados à sua própria substância.(p. 28)
O que ocorreu é que a produção estética hoje está integrada à produção das mercadorias em geral: a urgência desvairada da economia em produzir novas séries de produtos que cada vez mais pareçam novidades (de roupas a aviões), com um ritmo de turn over cada vez maior, atribui uma posição e uma função estrutural cada vez mais essenciais ã inovação estética e ao experimentalismo. Tais necessidades econômicas são identificadas pelos vários tipos de apoio institucional disponíveis para a arte mais nova, de fundações e bolsas até museus e outras formas de patrocínio. De todas as artes, a arquitetura é a que está constitutivamente mais próxima do econômico, com que tem, na forma de encomendas e no valor de terrenos, uma relação virtualmente imediata. Não é de surpreender, então, que tenha havido um extraordinário florescimento da nova arquitetura pós-moderna apoiado no patrocínio de empresas multinacionais, cuja expansão e desenvolvimento são estritamente contemporâneos aos da arquitetura. Mais adiante vou argumentar que esses dois novos fenômenos têm uma inter-relação dialética mais profunda do que o mero financiamento deste ou daquele projeto. Porém é neste ponto que devo lembrar ao leitor o óbvio, a saber, que a nova cultura pós-moderna global, ainda que americana, é expressão interna e superestrutural de uma nova era de dominação, militar e econômica, dos Estados Unidos sobre o resto do mundo: nesse sentido, como durante toda a história de classes, o avesso da cultura é sangue, tortura, morte e terror.(p. 30-31)
Minha exposição vai enfocar cada um dos seguintes elementos constitutivos do pós-moderno: uma nova falta de profundidade que se vê prolongada tanto na "teoria" contemporânea quanto em toda essa cultura da imagem e do simulacro; um consequente enfraquecimento da historicidade tanto em nossas relações com a história pública quanto em nossas novas formas de temporalidade privada, cuja estrutura "esquizofrênica" (seguindo Lacan) vai determinar novos tipos de sintaxe e de relação sintagmática das formas mais temporais de arte: um novo tipo de matiz emocional básico - a qual denominarei de "intensidades" -, que pode ser mais bem entendido se nos voltarmos para as teorias mais antigas do sublime; a profunda relação constitutiva de tudo isso com a nova tecnologia, que é uma das figuras de um novo sistema econômico mundial; e, após um breve relato das mutações pós-modernas na experiência vivenciada no espaço das construções, algumas reflexões sobre a missão da arte política no novo e desconcertante espaço mundial do capitalismo tardio ou multinacional.(p. 32)
Nessa situação, não há mais escopo para a paródia, ela teve seu momento, e agora essa estranha novidade, o pastiche, vem lentamente tomar seu lugar. O pastiche, como a paródia, é o imitar de um estilo único, peculiar ou idiossincrásico, é o colocar de uma máscara lingüística, é falar em uma linguagem morta. Mas é uma prática neutralizada de tal imitação, sem nenhum dos motivos inconfessos da paródia, sem o riso e sem a convicção de que, ao lado dessa linguagem anormal que se empresta por um momento, ainda existe uma saudável normalidade lingüística. Desse modo, o pastiche é uma paródia branca, uma estátua sem olhos: está para a paródia assim como uma certa ironia branca - outro fenômeno moderno interessante e historicamente original - está para o que Wayne Booth chama as "ironias estáveis" do século XVIII. (p. 44-45)
(...)Com o colapso da ideologia do estilo do alto modernismo - como alguma coisa tão específica e inconfundível quanto impressões digitais, tão incomparável quanto cada corpo (que era, para o jovem Roland Barthes, a própria fonte da invenção e da inovação estilísticas) -, os produtores culturais não podem mais se voltar para lugar nenhum a não ser o passado: a imitação de estilos mortos, a fala através de todas as máscaras estocadas no museu imaginário de uma cultura que agora se tornou global. (p. 45)
(...)De forma bastante apropriada, a cultura do simulacro entrou em circulação em uma sociedade em que o valor de troca se generalizou a tal ponto que mesmo a lembrança do valor de uso se apagou, uma sociedade em que, segundo observou Guy Debord, em uma frase memorável, "a imagem se tornou a forma final da reificação" (A sociedade do espetáculo).
É de esperar que a nova lógica espacial do simulacro tenha um efeito significativo sobre o que se costumava chamar de tempo histórico. O próprio passado é, assim, modificado: o que antes era, no romance histórico, segundo a definição de Lukács, a genealogia orgânica de um projeto burguês coletivo - ou, para a histografia de resgate de um E. P. Thompson, ou, ainda, para a "história oral" norte-americana, que visam à ressurreição dos mortos de uma geração anônima e silenciada, a dimensão retrospectiva indispensável para qualquer reorientação vital de nosso futuro - transformou-se, nesse meio tempo, em uma vasta coleção de imagens, um enorme simulacro fotográfico.(p. 45)
(...) Os estilos modernistas ficam assim marcados com essa conotação burocrática, de forma que romper com ele produz esse sentido de "alívio", embora o que toma seu lugar não seja nem a utopia nem a democracia, mas simplesmente as construções privadas das corporações do Estado pós-bem-estar pós-moderno.(p. 317-318)
A outra definição de reificação que tem sido relevante nos últimos anos é a do "apagamento dos traços da produção" do próprio objeto, da mercadoria assim produzida. Esse procedimento consiste em ver a questão do ponto de vista do consumidor: sugere o tipo de culpa da qual as pessoas são liberadas se conseguirem não se lembrar do trabalho que foi necessário para produzir seus brinquedos e suas mobílias. Na verdade, essa é a razão para termos nosso próprio mundo-objeto, e paredes, e uma distância amortecedora e um silêncio relativo a nosso redor; é para esquecer de todos esses inúmeros outros por algum tempo; você não quer pensar nas mulheres do terceiro Mundo cada vez que usar seu processador de textos, ou em todas aquelas pessoas de classe baixa, com suas vidinhas de classe baixa, cada vez que você decidir usar ou consumir seus outros produtos de luxo: seria como ter vozes dentro de nossas cabeças; de fato, isso "viola" o espaço íntimo de nossa privacidade ou das extenções de nosso corpo. Assim, para uma sociedade que quer se esquecer das classes sociais, a reificação nesse sentido de embalar-o-consumidor é realmente muito funcional; o consumismo como cultura envolve muito mais que isso, mas esse tipo de "esmaecimento" é certamente a precondição indispensável a partir da qual todo o resto é construído.(p. 318)
Sevcenko, Nicolau. (1995). O Enigma Pós-Moderno. Em: Pós-modernidade. Oliveira, R.C., Sevcenko, N., Santos, J. F., Peixoto, N.B., et al. 5a ed, UNICAMP, 1995.
(...) Trata-se antes de uma atitude nascida do espanto, do desencanto, da amargura aflitiva, que procura se reconstruir em seguida como uma alternativa parcial, desprendida do sonho de arrogância, de unidade e poder, de cujo naufrágio participou, mas decidiu salvar-se a tempo, levando consigo o que pode resgatar da esperança.(p.45)
(...) Da mesma forma não há qualquer unidade dentre as experiências artísticas e filosóficas que tem sido postas sob a legenda do pós-modernismo. Aliás, não há sequer acordo sobre o significado deste termo. os americanos em geral o consideram como uma mera correspondência na área cultural do advento da tecnologia pós-industrial, baseada nos recursos da cibernética e informática. Outros autores o entendem como uma crítica voltada à negação total das vanguardas, que exalta o período anterior ao modernismo e se inclina para um retorno às fontes da história e ao passado. Outros ainda o denunciam como uma mera pasteurização dos cacoetes das vanguardas, sem vitalidade e sem compromissos. Concepções todas essas de fundo reacionário e que esvaziam o sentido crítico profundo do movimento, como uma proposta de práticas culturais alternativas, hoje em dia na Europa altamente identificadas com o pacifismo, a ecologia, o feminismo, os movimentos de liberação sexual e manifestações afins.(p. 53)
(...) O pós-moderno sem dúvida traz ambigüidades - aliás é feito delas e deve ser criticado e superado. É isso que ele propõe: a prudência como método, a ironia como crítica, o fragmento como base e o descontínuo como limite.
Não há como negar que existe aí uma bela, generosa e multifacetada esperança. O anseio de uma justiça que possa ser sensível ao pequeno, ao incompleto, ao múltiplo, à condição de irredutível diferença que marca a materialidade de cada elemento da natureza, de cada ser humano, de cada comunidade, de cada circunstância, ao contrário do que nos ensinam a metafísica e o positivismo oficiais. A sensibilidade para a expressão inevitável do acaso, do contraditório, do aleatório. O espaço para o humor, o prazer, a contemplação, sem outra finalidade senão a satisfação que o homem neles experimenta. O aprendizado humilde, que já tarda, da convivência difícil mas fundamental com o imponderável, o incompreensível, o inefável - depois de séculos da fé brutal de que tudo pode ser conhecido, conquistado, controlado. (p. 54)
Baudrillard, Jean. (1992). A Transparência do Mal. 2a ed., Campinas:Papirus.