Cultura

EU, ADMINISTRADOR?
setembro/90
Professor Claúdio Tordino


INTRODUÇÃO

A elaboração deste trabalho, devido à sua temática direcionada a aspectos extremamente individuais e pessoais, possui um enfoque muito introspectivo, para que se consiga avaliar a viabilidade MINHA como administrador.

Por essa mesma individualidade no trabalho, o desenvolvimento e os comentários pessoais foram, por bem, reunidos em uma só explanação.


TESE

Ser um administrador é uma tarefa de grandes responsabilidades, onde a exigência da capacidade do indivíduo é bastante considerável.

Mas o dom de administrar não é privilégio reservado a poucos, mas ao longo de nossas vidas e à medida que nossos caráteres são moldados alguns, nessa seleção natural, logicamente, se sobressaem.

Eu, como indivíduo ciente de minhas faculdades, concluo sem medo: sou uma pessoa capaz de ser um administrador. Conclusão essa baseada em meu autoconhecimento, em minha auto-imagem, e em análises das prováveis imagens que cada um possui de minha pessoa. E mais: essa é uma meta que busco alcançar, com a motivação necessária à conquista de meus objetivos, absorvendo toda e qualquer experiência como estímulo e conhecimento dos caminhos que serão percorridos.


HIPÓTESE

Todos os humanos sadios e perfeitos, e ainda várias exceções nesses aspectos, podem seguir a carreira de administrador. Mas claro, muitos fatores externos ao indivíduo são fundamentais no direcionamento de suas visões à área. Mais a fundo, como muitos estudiosos tentam provar ou ainda constatar, a possibilidade da herança genética no princípio da liderança, controle e carisma de alguns líderes.

Seria a liderança hereditária? Ou adquirida? Seria necessariamente a ocorrência de ambos? Ou apenas um dos fatores, desde que bem lapidado, pode costruir um grande administrador?

As questões que apresento acima são dúvidas que dificultam minhas afirmações frente ao futuro: Eu, administrador? Observe que a dificuldade não é quanto ao entendimento pois, afinal, quando se tem em mãos as hipóteses o melhor é percorrê-las cuidadosamente. Todas elas, sem distinção ou protecionismo, para o encontro das soluções através da RAZÃO. Mas a gama de possibilidades é enorme.

A probalidade de EU ser um administrador esbarra nessas dúvidas. Se a liderança e o carisma forem hereditários...? É provável, por que não? Isso considerando experiências de minha própria vivência, que às vezes também me induz a pensar: ora, não tem nada a ver!

E mesmo que todas as chances tivessem certa validade, qual indicaria o procedimento mais coerente? Será o ambiente que o decidirá? Ou a família, a rua, o trabalho, a sociedade no geral? Qual a intensidade de cada fator? São muitas questões... são muitas hipóteses...


CONSIDERAÇÕES

Perdoe-me se eu estiver sendo demasiado reticente ao expor a questão. Mas em um fato acredito piamente: mesmo os mais bem sucedidos administradores devem ter desejo de ver essas dúvidas solucionadas, pois são questões não resolvidas que atingem a todos, de uma forma ou de outra.

Acreditando-se que a liderança e o carisma sejam genéticos, somos em parte levados a lembrar que, de fato, alguns grandes líderes geraram grandes líderes. Ou pelo menos pessoas de muito carisma. Somos levados também a lembrar que a liderança de um homem é às vezes adquirida dos pais no ambiente familiar. E nesse mesmo ambiente pode surgir um líder sendo ele um filho adotivo, um servo ou um membro extra-sangüíneo da família, por exemplo.

E então?? Liderança se aprende! O caso que citei é fictício, mas duvido que durante os milênios de existência da raça humana não tenha surgido casos como esse.

Uso dos comentários e fatores expostos até então para sugerir que a liderança legítima, seja autoritária ou não, é mais eficaz quando moldada pelo ambiente exterior. E o homem-líder-administrador saberá aplicá-la de acordo com as conveniências do ambiente, e da sociedade.


DESENVOLVIMENTO E COMENTÁRIOS

"Eu, como administrador!" Para enfrentar as exigências da função, o autoconhecimento e a auto-análise são fundamentais. Mas anteriormente considerei as possibilidades. Ora, eu particularmente, não acredito que a liderança e o carisma do administrador sejam genéticos. Essas características são mais que um instinto (isso sim, hereditário, em todos os animais). É uma característica adquirida e moldada na sociedade, seja ela "micro" (família) ou "macro" (o mundo civilizado).

A liderança já esteve ao meu lado, algumas vezes. Outras, me submeteu insuportavelmente, quando de posse dos outros. E o que me revoltou (e me revolta até hoje!) não foi o fato de ao longo de minha vida pubertária a liderança estar mais com os outros, mas o fato dela, em minha visão, JAMAIS ter sido LEGÍTIMA. Estranho, mas as pessoas têm um prazer mórbido em seguir não os necessariamente mais corretos, mas os que possuem valores que, acredito, PENSAM ser corretos. Neles, sempre estava presente o carisma desmerecido. Ironicamente, eu sei que se eles analisassem superficialmente suas atitudes, perceberiam que seus valores eram incorretos. Por exemplo: aquele que briga e obtém carisma por ser mais forte; tanto ele como seus seguidores, mesmo percebendo que brigar é errado, custam a abandonar essa relação carismática. Esse "clique" desenvolve-se lento.

Curiosamente, percebi que nas famílias dessas pessoas carismáticas o clima de liderança era típico dos familiares, ou pelo menos em sua maioria. A motivação para se enfrentar os obstáculos era perceptível no espírito desse grupo. Aos mesmo tempo, aquelas pessoas viventes à margem da liderança e do carisma dos outros (às vezes, até vítimas disso) tinham um clima familiar mais esparso, menos denso, onde o conformismo parecia ser maior que a motivação. Até a maturidade dos filhos demostrava ser tardia e deficiente. Pode ser um administrador proveniente do segundo grupo? Sim. Mas em escala bem menor que no primeiro. O administrador requer, desde tenra idade, estímulo à luta, ao progresso individual e coletivo, à resistência às adversidades e à motivação pela conquista de sua satisfação, seu sucesso, seus objetivos.

Os momentos de instabilidade constante durante minha formação, intensificada desde o início da adolescência, evidenciam um terrível choque: na infância, o estereótipo de gênio bem dotado ao mesmo tempo valorizava e segregava. Os colegas cultivavam admiração por esse carisma que eu possuía ("Puxa! O mais inteligente!"...). Mas por não serem assim como eu, não por eles, mas talvez pela família ("...seu amiguinho já sabe ler, viu?") provavelmente buscavam entre eles a afirmação de sua autoconfiança entre seus "iguais". Entre si, eles se identificavam mais que comigo, por exemplo. Forma-se um vácuo, um distanciamento, prejudicando a evolução do indivíduo (eu) social.

Quando vem a puberdade, a contestação dos valores paternos é enorme, quando todos querem ao menos PARECER rebeldes. Daí, "ser correto é ser decadente" - a inversão de valores é uma constante, quando princípios tradicionais básicos são postos ao chão, pelo instinto da própria contestação ~ contradição. "Ser estudioso é ser idiota! Ser educado é ser viado!" Essa consideração é comum em certa fase e segmento da juventude, e isso não é de hoje. O resultado é fatal: rejeição e isolamento. Os segregados se fecham em pequenos grupos para se afirmarem entre si.

Nessas condições, o ímpeto de se tomar decisões e enfrentar a realidade é sufocado em doses graduais. E a sociabilidade vai diminuindo, juntamente com a própria confiança, tanto nos outros como em si próprio. As conseqüências são as seguintes, quando o indivíduo finalmente "agarra" a liderança:

1. Ele pode exercer sua autoridade de uma forma vingativa (com provável e conseqüente uso do poder) onde a liderança corre o risco de se ilegitimar;

2. Ele pode fracassar no exercício da administração através de insuficiência de conhecimento sobre as pessoas, devido a uma anterior socialização deficiente, anormal, marginal;

3. Ele pode aparentemente parecer, para os que o rejeitam, ter seus valores invertidos, "errados", e obter o carisma de quem antes o rejeitava. Essa é a obtenção do PRESTÍGIO (falso) por linhas tortas (por exemplo, a exibição de um status atraente àquelas pessoas, mesmo que apenas aparente). O importante nessa alternativa é que a pessoa em questão precisa saber separar sua falsa imagem de sua verdadeira, e não deixar que a primeira se sobreponha à segunda, interiormente, e vice-versa, exteriormente.

Eu segui o procedimento acima. De própria experiência percebi que, se devidamente seguido, este não falha. Os outros dois estão fadados à falência em tempo recorde, considerando a chance de certas exceções. Mas eu creio que sejam bastante raras.

Após essa experiência somada, reavaliada, reciclada, mesmo ainda pouca em relação ao que tenho pela frente durante a vida, agora sim, sinto-me seguro em falar a respeito de mim, um administrador.

O administrador demanda conhecimento do ser humano referentes à razão, às emoções, às vontades e aspirações do próximo, do subordinado, do concorrente, do superior e de si mesmo, além das relações possíveis entre eles, para saber tomar as melhores decisões nos momentos exatos e para a satisfação dos desejos próprios e alheios.

No exercício da autoridade, seja ela legal, tradicional ou carismática (lembremos que leis são mudadas ou até transgredidas; tradições envelhecem e/ou são renovadas; carismas se degeneram, ou viram tradição e por isso, não são intocáveis), a visão do administrador deve ser um raio X psíquico, rápido e infalível. Um breve erro de observação pode ser a diferença milimétrica entre a autoridade, legítima e merecida, e o fracasso, penoso e, às vezes, não tão merecido. Mas administrar é um jogo terrível, de sobrevivência do mais forte, não física, mas intelectual e psicologicamente.


CONCLUSÃO

Espero que essas dúvidas sejam solucionadas e as experiências e percepções válidas, para que se  possa APRENDER a administrar tão bem quanto tantos que o fazem. O potencial todos têm, desde que a formação e/ou a determinação tornem isso possível.

Cabe à pessoa ter motivação, conhecimento e consciência dos passos a serem dados, para que se concretize o EU, ADMINISTRADOR.


BIBLIOGRAFIA

"Os Três Aspectos da Autoridade Legítima"
 Max Weber

"O Poder da Autoanálise"
 Paul J. Browner

"Teoria Geral da Administração" (volume I)
 Idalberto Chiavenato
 

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