O Estado da Despesa
Terça-feira,              27 de Fevereiro de 2001
Depois das reservas da OCDE, agora é a vez da Comissão Europeia              criticar a débil política de consolidação orçamental do Governo,              manchada como se sabe pela ausência de uma estratégia segura para              debelar o exagerado peso da despesa pública na economia. O parecer              da Comissão sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento de Portugal              recomenda mais uma vez a absoluta urgência em acabar com o apetite              devorador do Estado, mas a dimensão e os custos políticos da reforma              parecem excessivos para a ambição do Governo.
Para acabar de vez com o peso da despesa pública e com os défices              crónicos que promove no orçamento é necessária uma nova cultura de              exigência. Não se pode, como fez a ministra da Saúde, prometer 26              mil cirurgias num ano, e regozijar-se por terem sido realizadas 17              mil. Depois, parece evidente que o Estado, burocratizado e              centralizado, exige uma ampla reforma. O Ministério da Educação já              deu um sinal do que pode ser feito, transferindo a gestão das              escolas secundárias para a competência das autarquias. O problema é              que o afã descentralizador que Guterres tinha prometido ao país              permanece bloqueado com a ressaca da derrota da regionalização. Mas              agora que a despesa pública surge como um mal maior para o futuro da              economia nacional, essa questão deve regressar à ordem do dia.
Porque é consensual que um Estado moderno deve estar mais próximo              dos cidadãos, deve ser mais ágil e a sua acção deve ser escrutinada              pelos destinatários dos seus serviços. Claro que esta solução não              vai impedir que a produtividade dos médicos, dos professores ou dos              quadros da administração fiscal melhore num ápice. Mas uma              descentralização efectiva é sem dúvida um primeiro passo para se              quebrar de vez o gigantismo e a mentalidade de desperdício instalada              na administração pública. Não se trata de uma questão ideológica -              quer liberais, quer os defensores de um modelo mais providencial do              Estado estão de acordo com a descentralização -, mas de              funcionalidade e eficiência.
Em vez de debates estéreis ou secundários como a idade de voto              aos 16 anos, a reforma do Estado deveria por isso merecer mais              atenção e coragem ao Governo. Porque mantendo-se a situação actual,              não é apenas o cumprimento do Pacto de Estabilidade que permanece              ameaçado. É também a viabilidade económica do país no seio da União              Europeia que perde cada vez mais sentido. Depois do acto falhado que              foi a reforma da lei eleitoral para as autarquias, espera-se então              que o Ministério da Reforma do Estado justifique a sua existência.              Sem dogmas nem reservas mentais, mas com firmeza e objectivos              declarados de reduzir e modernizar um Estado concebido para uma              sociedade de outros tempos.
M.C.