Palpites

Fernando Madrinha

25 fevereiro 2001





«Como pode o Executivo garantir que vai reduzir em um quarto os crimes
associados à droga? Porquê um quarto e não um quinto? Ou que diminuirá
em um terço o consumo de heroína? Ou - mais curioso ainda - que vai
duplicar as quantidades de drogas apreendidas? Se o Governo consegue
quantificar de uma forma tão precisa estes objectivos a três anos, quer
dizer, se sabe exactamente o que fazer para os atingir, é caso para nos
interrogarmos por que não foram eles definidos e alcançados há mais
tempo.


O GOVERNO aprovou uma resolução em que define 30 objectivos ambiciosos
de um plano de combate à droga, mas, na realidade, esse plano não
existe. Sabe-se quais são os resultados em vista, mas, exceptuando a
previsão de verbas a investir até 2004 - 32 milhões de contos -
ignoram-se os passos concretos que vão ser dados para se cumprirem os
objectivos pré-definidos. Isto é, o Governo diz quanto vai investir e
aonde quer chegar nos próximos três anos, mas não diz exactamente como.

A resolução do Conselho de Ministros e o discurso de António Guterres a
explicá-la a um grupo de jovens, com encenação a preceito, têm um grande
mérito. Por uma vez, ouviu-se falar de combate ao tráfico e ao
branqueamento de capitais, de campanhas de prevenção de âmbito geral e
para as diferentes idades escolares, de tratamento de toxicodependentes
e da sua reinserção social. Por uma vez, o discurso oficial não se
limita a estabelecer a confusão na cabeça de pré-adolescentes que, ao
verem o telejornal, já duvidam e perguntam aos pais se, afinal, a droga
não faz mal ou se ainda é proibida. Por uma vez, não se fala só de
descriminalização, distribuição de seringas e salas de chuto - tudo para
facilitar e quase induzir o consumo.

Esse é o mérito principal da iniciativa. Mas, quando se observam melhor
os 30 objectivos do Governo, percebe-se que não estamos exactamente na
presença de um plano ou de um programa de trabalho devidamente
fundamentado, mas de uma simples declaração de intenções. Como pode o
Executivo garantir, por exemplo, que vai reduzir em um quarto os crimes
associados à droga? Porquê um quarto e não um quinto? Ou que diminuirá
em um terço o consumo de heroína? Ou - mais curioso ainda - que vai
duplicar as quantidades de drogas apreendidas?

Se o Governo consegue quantificar de uma forma tão precisa estes
objectivos a três anos, quer dizer, se sabe exactamente o que fazer para
os atingir, é caso para nos interrogarmos por que não foram eles
definidos e alcançados há mais tempo. Se não sabe, mas, depois de falar
com as polícias e com as instituições envolvidas no apoio a
toxicodependentes ou na sua recuperação, acredita que isso será
possível, então tem de admitir que alguns dos principais «objectivos»
são, afinal, meros palpites.

Claro que os palpites do Governo, quando assumidos em letra de forma e
com a solenidade que mereceram, têm o valor de um compromisso. Mas,
então, conviria que o horizonte para a concretização destes objectivos
fosse 2003 e não, como sucede com alguns itens, 2004. Isto é, depois de
o actual Governo ter terminado o seu mandato e já não poder ser avaliado
pelo grau de execução do compromisso agora assumido.


fmadrinha@mail.expresso.pt




comentarios

2 comentários 1 a 2


  2001 às 21:43
ainda não percebeu a cambada de incompetentes que existe no governo? e
ainda por cima irresponsáveis.

  Fevereiro 2001 às 4:11
O TROMBONE

Muito Bem.
E já agora. O Vitelino diz: 'agora é a sério';. Isto é grave. Quer dizer
que os ultimos 100, 5 milhões de contos nos ultimos anos para o combate
à droga foram a brincar?
Afinal onde é que se gastou o dinheiro?
Porque é que não se sabe ainda hoje quantos toxicodependentes existe, já
que nunca foi feita uma estatítistica para esse efeito?
Quem é que está interessado em que não se saiba quantos são? Os senhores
de gabinete que usaram os 100, 5 milhões 'a brincar' e agora vão receber
mais 32 milhões?