Retirado do
livro "Satanomicon", por Lord Ahriman
O Satanismo
propugna pela auto-afirmação do ser humano, afinal ele é
o seu próprio deus. Contudo, deveria ser um processo natural, raramente
o é.
Nos tempos
antigos, a religião era panteísta por causa da ignorância
e medo do ser humano acerca de inúmeros fenômenos,bem como
a necessidade de rogar por coisas benfazejas. Assim, o trovão, a
lua, o sol, a colheita, a morte, todos tinham (ou eram) os seus deuses.
Numa segunda
evolução, o homem percebeu que a maioria dos fenômenos
possuíam uma explicação científica ou filosófica.
Não havia necessidade de haver inúmeros deuses. Bastava um
único deus ou, no máximo, uma trindade, correspondendo aos
aspectos principais da existência, como criador, conservador e transformador.
No novo aeon,
o homem começa a perceber que, se existe um deus fora de si, porque
não pode haver um dentro também? Afinal, deus não
está em toda parte? Não seria o homem o seu próprio
deus? Não teria ele sempre criado os deuses externos à sua
própria imagem e semelhança?
Essa possibilidade
agora existe, pois, pela primeira vez, ele aceita e trabalha seu lado "negro",
a parte de que não gosta, que reprime e, desta forma, também
o sufoca; destarte, o primeiro passo para a integração da
sua natureza interna começa a ser dado. Ele passa a se respeitar
e considerar que não há porque ser submisso, nem se sujeitar
a filosofias ultrapassadas, que, em nada, acrescentam.
Entrementes,
quando o homem percebe a sua própria potencialidade, também
surge um outro problema. Se ele é um deus, então é
superior a tudo e a todos. Só ele importa! O resto não passa
de reles mortais!
Na verdade,
o novo aeon caminha para o "euteísmo", "o homem é o seu próprio
deus". A compreensão equilibrada disto o leva a encarar os outros
como estrelas iguais a ele. A conseqüência disto é que
passa a ter uma auto-afirmação sadia, consciente, natural,
sem necessidade de se ostentar de forma contraproducente. O seu brilho
aparece por si mesmo, de forma espontânea!
Malgrado a
humanidade caminhe em passos largos para o euteísmo, neste primeiro
momento, é a egolatria que aparece, a necessidade de auto-afirmação
exagerada, como aconteceu com o Movimento Feminista também em sua
primeira fase, para, depois, entrar tranqüilamente numa fase de equilíbrio.
O Novo dicionário
da Língua Portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira,
apresenta as seguintes definições de Egotismo ou Egolatria:
1) Sentimento excessivo da própria personalidade; 2) Tendência
a monopolizar a atenção, mostrando desconsideração
pelas opiniões alheias.
Como se manifesta
o indivíduo ególatra? Bem, citemos alguns exemplos: 1) É
o motorista que não dá passagem aos outros, pois acha que
a rua é sua, que ele tem prioridade sobre os demais sempre! 2) É
o aluno que faz toda sorte de perguntas aos professores, para aparecer
perante a turma, e não descarta sequer a possibilidade da perda
de tempo precioso, nos estudos,provocando debates inúteis, que não
levam a nada! 3) É o cidadão que vê a manutenção
de uma rede telefônica, passa pelo funcionário e o ofende,
apenas para demonstrar superioridade perante problemas que não pode
resolver! 4) É a moça que se veste como uma "femme fatale",
com o único objetivo de provocar os olhares cobiçosos dos
homens! 5) É o senhor que, apesar de nunca ter praticado esporte
na sua vida, resolve comprar uma bicicleta, com capacete, luvas de carregar
objetos etc. e sai igual a uma árvore de Natal para um passeio que
o deixará estafado, tentando provar a si e aos seus vizinhos o grande
atleta que é!
O problema
é que o Ego não passa de um pálido reflexo do Eu.
É somente a forma como o Eu se expressa na Terra. O Eu é
a essência do ser, o seu deus interno à espera de ser despertado.
Preencher o Ego é o mesmo que tentar encher uma peneira com água.
Nunca será suficiente.
O indivíduo
ególatra, além de estar mais distante da autêntica
expressão do seu Eu, possui um ego fraquíssimo, daí
a sua compulsão cíclica em se auto-afirmar, que não
ocorre de forma natural, mas sim doentia. Realmente, ele nunca está
satisfeito, pois, tendo personalidade fraca, a dos outros sempre o incomoda,
pois aponta as suas feridas, que são os furos da peneira, por onde
a água da maturidade se escoa.
Outros fatores
que acompanham o ególatra são o medo de ser desmascarado;
a auto-ilusão hipócrita que alimenta os seus devaneios; o
profundo incômodo que uma pessoa equilibrada acarreta em sua presença
etc.
Como o ególatra
normalmente possui uma certa inteligência, costuma aplicar-se em
determinado assunto, é por aí que vai dar vazão ao
seu objetivo em incomodar os outros e, desta forma, se impor.
No exemplo
do aluno, ele vai ler tudo sobre um capítulo da matéria para
tentar achar algum "furo" no seu professor e, assim, mostrar que "sabe"
mais que ele. No caso do ciclista, ele vai infernizar os ouvidos dos outros,
discorrendo acerca de todos os aspectos esportivos da bicicleta (técnicas,
equipamentos etc.), para mostrar o quanto ele é sábio na
escolha do esporte.
Nunca sabe
a hora de parar e o fenômeno se torna cíclico. Quando percebe
que realmente causou incômodos aos outros, pede desculpas ou vem
com a "velha" saída da humildade, mostrando pessoas que sabem mais
do que ele ou tentando provar que não sabe tanto assim. Se os outros
aceitam os seus argumentos, o ególatra sai vencedor, porque provou
ser superior também na forma de se defender, que é uma manifestação
menos óbvia dessa doença.
Contudo, se
alguém o desmascara ou toca numa ferida sua, perante a qual lhe
faltam argumentos e se sente acuado, a sua tendência é se
tornar agressivo, numa última tentativa de "calar a boca" do outro
ou então se vingar.
Essa é
a razão, por exemplo, das discussões violentas e irracionais
entre os motoristas. Também é o aluno que denigre a imagem
de um professor, por este ter mostrado, perante a turma, que aquele ainda
tem muito a aprender.
A Egolatria,
apesar de não estar diretamente mencionado em nenhum compêndio
conhecido, pode ser perfeitamente considerado um tipo ou subtipo de pecado
satânico, que mistura a auto-ilusão, a estupidez e a compulsão,
como ingredientes principais, numa mistura mais ou menos homogênea.
Dificilmente
o ególatra consegue mudar a si mesmo, a não ser quando a
vida lhe prega alguma e, pela primeira vez, ele encara o aspecto enfermiço
do processo inteiro, a estrutura falha e quebradiça onde se encontra.
A Egolatria
não passa de uma peneira furada, sombra do verdadeiro Eu, no qual
a parte visível (e também ilusória) se manifesta mais
viva, posto que imperfeita.
Contudo, este
momento também passará. Aí, então, o homem
será uma estrela, sem tentar apagar a dos outros, mas... simplesmente
desvelando a sua!
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