Obs.: O texto abaixo e os que antecedem cada letra, foram retirados do encarte do LP.

Este é um registro da maior parte das canções do Legião Urbana nunca antes lançadas em disco, mas já conhecidas através de apresentações ao vivo e gravações piratas. São nove canções em versão original de estúdio, que hoje soariam deslocadas, por tudo que já passamos juntos, de dois anos pra cá. Não há mais inocência e vai-se longe o tempo onde "Que País é Este" era um perigoso grito de rebeldia (1978): hoje resta a lembrança nostálgica de um tempo que dificilmente vai voltar. Era um tempo onde Freud e Jung ainda eram discutidos seriamente em mesas de bar e onde a rota das drogas passava pela Amazônia e somente de lá para os grandes centros. Não se falava abertamente como hoje de tantas coisas, coisas que toda criança sabe hoje em dia, nem pelos jornais. Drummond estava vivo, John Lennon e Sid Vicious também. Nosso país iria crescer e mudar para melhor e todos acreditaram. Até aí morreu o Neves (trocadilho imperdoável mas necessário) e cantar que "temos todo o tempo do mundo", porque "somos tão jovens" lembra um tempo distante, um tempo perdido mesmo. Muito mais ainda o inconformismo juvenil, por pura diversão, das canções do grupo Aborto Elétrico, origem de parte do repertório inicial da Legião Urbana, isso já quase cinco anos depois. As letras destas nove canções refletem uma ingenuidade adolescente mas só por terem sido escritas há quase nove anos atrás. A temática continua atual, às vezes até demais. "Nas favelas, no Senado, sujeira pra todo lado" é de certa forma adolescente e ingênuo mas, depois de uma letra como "Índios", que trata do mesmo assunto, poderia até ser a mesma música, para onde ir? Há uma diferença de sete anos entre as duas e o que mudou? Parece até que queremos "vender todas as almas dos nossos índios em um leilão" ainda, do jeito que as coisas vão.

Que País é Este

Conexão Amazônica

Tédio (com um T bem grande pra você)

Depois do Começo

Química

Eu Sei

Faroeste Caboclo

Angra Dos Reis

Mais do Mesmo


QUE PAÍS É ESTE   Top
(Renato Russo)

QUE PAÍS É ESTE - Uma das marcas registradas da Legião Urbana junto com "Geração Coca-Cola", escrita em 1978 para o então Aborto Elétrico e, mais tarde, incorporada definitivamente ao repertório da legião. Com seu ritmo tribal e seus três acordes, foi a música de abertura de virtualmente todas as apesentações ao vivo da banda, também por ser ideal para auxiliar na passagem do equilíbrio do P.A. (power amplification) e do som no palco. Seu refrão (com direito a ô-ô-ô-ô e participação do público é simples, direto e eficaz. Nunca foi gravada antes porque sempre havia a esperança de que algo iria realmente mudar o país,tornando-se a música então totalmente obsoleta. Isto não é aconteceu e ainda é possível se fazer a pergunta do título, sem erros. Jimmy Page dizia que o bom rock é que não se aprende na escola. Outros atacam: "para ser roqueiro basta pendurar uma guitarra no pescoço e sair por aí, fazendo a música mais primária do mundo." Oras, mas é este mesmo o espírito da coisa! O ataque continua: "O rock é isso mesmo, um bate-estaca, a coisa mais elementar que existe, mais primitiva, menos inventiva que pode acontecer. O rock não é novidade, é uma imposição, é uma ditadura. É um sistema estético com a intenção de embotar a cabeça do jovem. Sim, pois se você fica com aquele bate-estaca o dia inteiro na cabeça, você se esquece da realidade que o cerca, de coisas realmente importantes." Dois apartes aqui. Realmente o rock não pode ser novidade já que é uma forma musical que nasceu em 1955, tem mais de trinta anos portanto. Bate-estaca ou não, juvenil ou não, preste atenção à letra de "Que País É Este". Não nos parece coisa de quem se esquece da realidade que o cerca. Comparar o rock com ditadura? Que país é este? Quem é Jimmy Page?

Nas favelas, no senado
Sujeira pra todo lado
Ninguém respeita a Constituição
Mas todos acreditam no futuro da nação

Que país é este?

No Amazonas, No Araguaia, na Baixada Fluminense
Mato Grosso, Nas Geraes e no Nordeste tudo em paz
Na morte eu descanso mas o sangue anda solto
Manchando os papéis, documentos fiéis
Ao descanso do patrão

Que país é este?

Terceiro mundo se for
Piada no exterior
Mas o Brasil vai ficar rico
Vamos faturar um milhão
Quando vendermos todas as almas
Dos nossos índios em um leilão

Que país é este?


CONEXÃO AMAZÔNICA   Top
(Renato Russo / Felipe Lemos)

CONEXÃO AMAZÔNICA - Mais bate-estaca. E dos bons. Assim como "Que País É Este" abriu caminho para temas mais tarde utilizados nas letras do grupo (principalmente no primeiro Lp), "Conexão Amazônica", de 1980, definiu a sonoridade característica de grande parte dass músicas da Legião Urbana: um ritmo espaarso, quase marcial, repetido como um mantra elétrico sobre o qual é feito uma variação vocal e instrumental (guitarras e efeitos diversos). Bate-estaca! Esta continua até hoje proibida pela censura por causa da temática. Lembrando que discutir Freud e Jung em mesas de bar acontecia de verdade naqueles tempos (pelo menos em Brasília) e que o tema da música está hoje em todos os jornais e, pasmem, até nas novelas! Gente, até em chamadas no horário infantil (aquele anúncio do pó). Bem, alimento pra cabeça nunca vai matar a fome de ninguém, mesmo.

Estou cansado de ouvir falar
Em Freud, Jung, Engels, Marx
Intrigas intelectuais
Rodando em mesa de bar
Yeah, yeah, yeah

O que eu quero eu não tenho
O que eu não tenho eu quero ter
Não posso ter o que eu quero
E acho que isso não tem nada a ver
Yeah, yeah, yeah

Os tambores da selva já começaram a rufar
A cocaína não vai chegar
Conexão amazônica está interrompida
Yeah, yeah, yeah

E você quer ficar maluco sem dinheiro e acha que está tudo bem
Mas alimento pra cabeça nunca vai matar a fome de ninguém
Uma peregrinação involuntária talvez fosse solução
Auto-exílio nada mais é do que ter seu coração na solidão
Yeah, yeah, yeah


TÉDIO (COM UM T BEM GRANDE PRA VOCÊ)   Top
(Renato Russo)

TÉDIO (COM UM T BEM GRANDE PRA VOCÊ) - A terceira música da época em que o Renato Russo tinha o Aborto Elétrico (muda o nome desse conjunto, meu filho). Sempre quisemos ter uma música entre parênteses. Algo como "(I can't get no) Satisfaction" ou então "(Baby, I'm on) Fire". Faz parte da primeira leva: é de 1979 e totalmente boba. Gravada em primeiro take é ótima para festas e era uma espécie de hino dos punks de Brasília daquela época. Os mais modernos podem cantar "césio com um C, se desejarem. Só Não foi incluída no primeiro disco porque achamos que deveríamos falar sobre coisas mais sérias. Soldados, por exemplo. Na verdade, foi mesmo por que o Biquini Cavadão já tinha lançado uma música com o mesmo nome.

Moramos na cidade, também o presidente
E todos Vão fingindo viver decentemente
Só que eu não pretendo ser tão decadente não

Tédio com um T bem grande pra você

Andar a pé na chuva, às vezes eu me amarro
Não tenho gasolina, também não tenho carro
Também não tenho nada de interessante pra fazer

Tédio com um T bem grande pra você

Se eu não faço nada, não fico satisfeito
Eu durmo o dia inteiro e aí não é direito
Porque quando escurece, só estou a fim de aprontar

Tédio com um T bem grande pra você


DEPOIS DO COMEÇO   Top
(Renato Russo)

DEPOIS DO COMEÇO - Nosso ska, da época do revival Two-Tone, 1982 ou '83. A letra contém diversas mensagens em código, ideal para quem gosta de descobrir significados secretos em letras de música. Cuidado entretanto. Interpretar estes versos provavelmente dirá mais sobre quem tenta decifrá-los do que propriamente sobre a música em si. É conhecida através de uma gravação pirata de um show em Santos em 1983, que circula também em Brasília e no sul do país.

Vamos deixar as janelas abertas
Deixar o equilíbrio ir embora
Cair como um saxofone na calçada
Amarrar um fio de cobre no pescoço

Acender um intervalo pelo filtro
Usar um extintor como lençol
Jogar pólo-aquático na cama
Ficar deslizando pelo teto

Da nossa casa cega e medieval
Cantar canções em línguas estranhas
Retalhar as cortinas desarmadas
Com a faca surda que a fé sujou
Desarmar os brinquedos indecentes
E a indecência pura dos retratos do salão
Vamos beber livros e mastigar tapetes
Catar pontas de cigarros nas paredes

Abrir a geladeira e deixar o vento sair
Cuspir um dia qualquer no futuro
De quem já desapareceu
Deus, Deus, somos todos ateus
Vamos cortar os cabelos do príncipe
E entregá-los a um Deus plebeu

E depois do começo
O que vier vai começar a ser o fim


QUÍMICA   Top
(Renato Russo)

QUÍMICA - Também gravada em primeiro take (baixo, guitarra e bateria de uma só vez), está aqui em uma versão diferente da que foi inclída nas cópias cassete do segundo Lp. Grito de guerra dos vestibulandos, escrita em 1981 para violão e voz.

Estou trancado em casa e não posso sair
Papai já disse, tenho que passar
Nem música eu não posso mais ouvir
E assim não posso nem me concentrar

Não saco nada de Física
Literatura ou Gramática
Só gosto de Educação Sexual
E eu odeio Química

Não posso nem tentar me divertir
O tempo inteiro eu tenho que estudar
Fico só pensando se vou conseguir
Passar na porra do vestibular

Não saco nada de Física
Literatura ou Gramática
Só gosto de Educação Sexual
E eu odeio Química

Chegou a nova leva de aprendizes
Chegou a vez do nosso ritual
E se você quiser entrar na tribo
Aqui no nosso Belsen tropical
Ter carro do ano, TV a cores, pagar imposto, ter pistolão
Ter filho na escola, férias na Europa, conta bancária, comprar feijão
Ser responsável, cristão convicto, cidadão modelo, burguês padrão
Você tem que passar no vestibular

Não saco nada de Física
Literatura ou Gramática
Só gosto de Educação Sexual
E eu odeio Química


EU SEI   Top
(Renato Russo)

EU SEI - Duas grandes redes de rádio transmitiram extensivamente uma gravação (pirata, por sinal) das apresentações de fim de ano em Brasília, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional. Quando é hora do set acústico, qual não foi a surpresa ao termos grande parte do público clamando por "sexo verbal, sexo verbal!". Esta canção, antes conhecida por "18 e 21" aqui aparece com seu título definitivo. Das nove canções esta talvez seja a que está mais próxima do espírito do segundo Lp. Foi escrita em 1982, depois do Aborto Elétrico, pouco antes do aparecimento da Legião Urbana. Somente três canções não foram incluídas nesta antologia: "A canção do Senhor da Guerra", por ser muito parecida com outras canções acústicas (a versão elétrica nunca foi aprovada pela banda), "O Grande Inverno na Rússia", por ser experimental demais e "Dado Viciado", para evitar confusões com o guitarrista Dado Villa-Lobos, que não é o personagem citado na canção. Isto permitiu espaço para a inclusão de "Faroeste Caboclo".

Sexo verbal não faz meu estilo
Palavras são erros, e os erros são seus
Não quero lembrar que eu erro também

Um dia pretendo tentar descobrir
Porque é mais forte quem sabe mentir
Não quero lembrar que eu minto também

Eu sei

Feche a porta do seu quarto
Porque se toca o telefone pode ser alguém
Com quem você quer falar
Por horas e horas e horas

A noite acabou, talvez tenhamos que fugir sem você
Mas não, não vá agora, quero honras e promessas
Lembranças e estórias

Somos pássaro novo longe do ninho

Eu sei


FAROESTE CABOCLO   Top
(Renato Russo)

FAROESTE CABOCLO - Com duração de nove minutos, apresentada pela primeira vez (sob vaias iniciais dos punks) no Morro da Urca, em 1983. A música é de 1979, anterior a "Eduardo e Mônica", seguindo a mesma linha: uma estória completa com personagens, começo, meio e fim. A letra (como todas as outras do disco) permanece no original, rimas pobres e tudo.

Não tinha medo o tal João de Santo Cristo
Era o que todos diziam quando ele se perdeu
Deixou pra trás todo o marasmo da fazenda
Só pra sentir no seu sangue o ódio que Jesus lhe deu
Quando criança só pensava em ser bandido
Ainda mais quando com um tiro de soldado o pai morreu
Era o terror da cercania onde morava
E na escola até o professor com ele aprendeu

Ia pra igreja só pra roubar o dinheiro
Que as velhinhas colocavam na caixinha do altar
Sentia mesmo que era mesmo diferente
Sentia que aquilo ali não era o seu lugar
Ele queria sair para ver o mar
E as coisas que ele via na televisão
Juntou dinheiro para poder viajar
E de escolha própria escolheu a solidão

Comia todas as menininhas da cidade
De tanto brincar de médico aos doze era professor
Aos quinze foi mandado pro reformatório
Onde aumentou seu ódio diante de tanto terror
Não entendia como a vida funcionava -
Discriminação por causa da sua classe ou sua cor
Ficou cansado de tentar achar resposta
E comprou uma passagem e foi direto a Salvador

E lá chegando, foi tomar um cafezinho
E encontrou um boiadeiro com quem foi falar
O boiadeiro tinha uma passagem e ia perder a viagem
Mas João foi lhe salvar
Dizia ele: - Estou indo pra Brasília
Neste país lugar melhor não há
Estou precisando visitar a minha filha
Eu fico aqui e você vai no meu lugar

E João aceitou sua proposta e num ônibus entrou no Planalto Central
Ele ficou bestificado com a cidade
Saindo da rodoviária viu as luzes de Natal
- Meu Deus, mas que cidade linda!
No ano novo eu começo a trabalhar
Cortar madeira, aprendiz de carpinteiro
Ganhava cem mil por mês em Taguatinga

Na sexta-feira ia pra zona da cidade
Gastar todo o seu dinheiro de rapaz trabalhador
E conhecia muita gente interessante
Até um neto bastardo do seu bisavô:
Um peruano que vivia na Bolívia
E muitas coisas trazia de lá
Seu nome era Pablo e ele dizia
Que um negócio ele começar

E o Santo Cristo até a morte trabalhava
Mas o dinheiro não dava pra ele se alimentar
E ouvia às sete horas o noticiário
Que sempre dizia que o seu ministro ia ajudar
Mas ele não queria mais conversa
E decidiu que, como Pablo, ele ia se virar
Elaborou mais uma vez seu plano santo
E sem ser crucificado a plantação foi começar

Logo, logo os maluco da cidade souberam da novidade:
- Tem bagulho bom aí!
E João de Santo Cristo ficou rico
E acabou com todos os traficantes dali
Fez amigos, freqüentava a Asa Norte
Ia pra festa de rock pra se libertar
Mas de repente
Sob uma má influência dos boyzinhos da cidade
Começou a roubar

Já no primeiro roubo ele dançou
E pro inferno ele foi pela primeira vez
Violência e estupro do seu corpo
- Vocês vão ver, eu vou pegar vocês

Agora o Santo Cristo era bandido
Destemido e temido no Distrito Federal
Não tinha nenhum medo de polícia
Capitão ou traficante, playboy ou general

Foi quando conheceu uma menina
E de todos os seus pecados ele se arrependeu
Maria Lúcia era uma menina linda
E o coração dele pra ela o Santo Cristo prometeu
Ele dizia que queria se casar
E carpinteiro ele voltou a ser
- Maria Lúcia, pra sempre vou te amar
E um filho com você eu quero ter

O tempo passa e um dia vem a porta um senhor de alta classe com dinheiro na mão
Ele faz uma proposta indecorosa
E diz que espera uma resposta, uma resposta de João
- Não boto bomba em banca de jornal nem em colégio de criança
Isso eu não faço não
E não protejo general de dez estrelas, que fica atrás da mesa
Com o cú-na-mão
E é melhor o senhor sair da minha casa
Nunca brinque com um Peixes de ascendente Escorpião
Mas antes de sair com ódio no olhar, o velho disse:
- Você perdeu sua vida, meu irmão

Você perdeu a sua vida meu irmão.
Você perdeu a sua vida meu irmão
Essas palavras vão entrar no coração
E eu vou sofrer as consequências como um cão
Não é que Santo Cristo estava certo
Seu futuro era incerto e ele não foi trabalhar
Se embebedou e no meio da bebedeira
Descobriu que tinha outro trabalhando em seu lugar
Falou com Pablo que queria um parceiro
E também tinha dinheiro e queria se armar
Pablo trazia o contrabando da Bolívia
E Santo Cristo revendia em Planaltina

Mas acontece que um tal de Jeremias, traficante de renome
Apareceu por lá
Ficou sabendo dos planos de Santo Cristo
E decidiu que com João ele ia acabar

Mas Pablo trouxe uma Winchester-22
E Santo Cristo já sabia atirar
E decidiu usar a arma só depois
Que o Jeremias começasse a brigar

(O Jeremias, maconheiro, sem-vergonha,
Organizou a Rockonha e fez todo mundo dançar)
Desvirginava mocinhas inocentes
E dizia que era crente, mas não sabia rezar

E Santo Cristo a muito não ia pra casa
E a saudade começou a apertar
- Eu vou me embora, eu vou ver Maria Lúcia
Já está em tempo de a gente se casar
Chegando em casa então ele chorou
E pro inferno ele foi pela segunda vez
Com Maria Lúcia, Jeremias se casou
E um filho nela ele fez

Santo Cristo era só ódio por dentro e então o Jeremias prum duelo ele chamou
- Amanhã às duas horas na Ceilândia, em frente ao lote 14, é pra lá que eu vou
E você pode escolher as suas armas, que eu acabo mesmo com você, seu porco traidor
E mato também Maria Lúcia, aquela menina falsa pra quem jurei o meu amor

Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter na televisão
Que deu notícia do duelo na TV
Dizendo a hora, o local e a razão

No sábado, então às duas horas todo o povo
Sem demora foi lá só para assistir
Um homem que atirava pelas costas e acertou o Santo Cristo
E começou a sorrir
Sentindo o sangue na garganta
João olhou pras bandeirinhas e pro povo a aplaudir
E olhou pro sorveteiro e pras câmeras
E a gente da TV que filmava tudo ali

E se lembrou de quando era uma criança
E de tudo o que vivera até ali
E decidiu entrar de vez naquela dança
Se a via-crucis virou circo estou aqui
E nisso o sol cegou seus olhos e então
Maria Lúcia ele reconheceu
Ela trazia a Winchester-22
A arma que seu primo Pablo lhe deu

- Jeremias, eu sou homem, coisa que você não é
E não atiro pelas costas não
Olha pra cá filha-da-puta, sem-vergonha
Dá uma olhada no meu sangue, vem sentir o teu perdão

E Santo Cristo com a Winchester-22
Deu cinco tiros no bandido traidor
Maria Lúcia se arrependeu depois
E morreu junto com João seu protetor

E o povo declarava que João de Santo Cristo era santo porque sabia morrer
E a alta burguesia da cidade não acreditou na história que eles viram na TV
E João não conseguiu o que queria quando veio pra Brasília com o diabo ter
Ele queria era falar pro presidente pra ajudar toda essa gente só faz sofrer.


ANGRA DOS REIS   Top
(Renato Russo / Marcelo Bonfá / Renato Rocha)

ANGRA DOS REIS / MAIS DO MESMO - Estas foram feitas logo após a gravação do "Dois". As letras são as mais recentes entre todas aqui. Este disco, junto aos outros dois Lps completa o registro da Legião Urbana em sua atual formação.

Deixa, se fosse sempre assim, quente
Deita aqui perto de mim
Tem dias em que tudo está em paz
E agora todos os dias são iguais

Se fosse só sentir saudade
Mas tem sempre algo mais
Seja como for
É uma dor que dói no peito
Pode rir agora que eu estou sozinho
Mas não venha me roubar

Vamos brincar perto da usina
Deixa pra lá, a angra é dos reis
Porque se explicar se não existe perigo?

Senti teu coração perfeito batendo à toa
E isso dói
Seja como for
É uma dor que dói no peito
Pode rir agora que eu estou sozinho
Mas não venha me roubar

Vai ver que não é nada disso
Vai ver que já não sei quem sou
Vai ver que nunca fui o mesmo
A culpa é toda sua e nunca foi
Mesmo se as estrelas começassem a cair
E a luz queimasse tudo ao redor
E fosse o fim chegando cedo
E você visse nosso corpo em chamas
Deixa pra lá

Quando as estrelas começarem a cair
Me diz, me diz pra onde é que a gente vai fugir?


MAIS DO MESMO   Top
(Renato Russo / Dado Villa-Lobos / Marcelo Bonfá / Renato Rocha)

Ei menino branco o que é que você faz aqui
Subindo o morro pra tentar se divertir
Mas já disse que não tem
E você ainda quer mais
Por que você não me deixa em paz?

Desses vinte anos nenhum foi feito pra mim
E agora você quer que eu fique assim igual a você
É mesmo, como eu vou crescer se nada cresce por aqui?
Quem vai tomar conta dos doentes?
E quando tem chacina de adolescentes
Como é que você se sente?

Em vez de luz tem tiroteio no fim do túnel
Sempre mais do mesmo
Não era isso que você queria ouvir?

Bondade sua me explicar com tanta determinação
Exatamente o que sinto, como penso e como sou
Eu realmente não sabia que eu pensava assim
E agora você quer um retrato do país
Mas queimaram o filme

E, enquanto isso, na enfermaria
Todos os doentes estão cantando sucessos populares
(e todos os índios foram mortos)