AAA Ilustre Casa de Ramires



 
 
 
 

Publicado após a morte do autor, o livro é baseado no cruzamento de duas narrativas interligadas. É um dos melhores romances de Eça de Queiros do que se refere ao estilo e construção romanesca. Nele, o autor apresenta como possível saída para Portugal um retorno à aristocracia e ao colonialismo, como forma de restaurar a glória do país.

A Ilustre Casa de Ramires é um romance de dicção claramente realista. Pertence à terceira fase da obra de Eça de Queirós, quando o autor abrandou sua crítica feroz da segunda fase(Realista-Naturalista) para usar uma linguagem épica que demonstra seu desejo de rteconciliar-se com Portugal. O narrador é onisciente, construindo e explorando com agudeza os conflitos interiores de Gonçalo Mendes Ramires, o personagem principal. O distanciamento e a objetividade do narrador permitem ao leitor acompanhar a lenta e progressiva transformação de Ramires em direção a sua reabilitação moral e social. A narração maneja com habilidade uma linguagem que oscila entre o tom irônico e o lirico, passando pelo satírico eo épico. A linguagem de Eça de Queirós apresenta uma consciÊncia crítica da tradição literária lusitana e européia, refletindo as contradições da própria nação.

Uma característica do texto queirosiano é a intertextualidade, ou seja, a superposição de um texto a outro, e a paródia, além da metalinguagem. Há, aqui, uma recuperação das novelas de cavalaria medievais, muito exploradas pelo romance europeu. O grande romancista britânico Walter Scott e o escritor português Alexandre Herculano são lembrados de forma intertextual por meio da paródia e da sátira.

A história se passa na última década do século XIX, um dos períodos mais difíceis e humilhantes de Portugal. Especialmente por conta do episódio conhecido como Ultimato, em que a Inglaterra exigiu que Portugal se retirasse das áreas africanas que estavam em seu domínio. Por meio da figura de Gonçalo Ramires, o autor tenta sintetizar as fraquesas eas glórias de Portugal. Com isso faz do destino pessoal do personagem uma "alegoria" daquilo que lhe parecia ser a única saída possível para os impasses e as contradições de Portugal, que foi tão poderoso no passado. A tragetória do fidalgo Gonçalo Mendes Ramires — filho de uma família nobre e antiga de Portugal — é o centro da obra. O personagem tem entre seus antepassados heróis portugueses envolvidos na história do país e da Europa. Mas logo no início da narrativa ele representa justamente o oposto desse heroísmo e dessa glória. Gonçalo nada mais é do que um fidalgo sem firmeza moral: fraco, covarde e ambicioso que, para alcançar seus objetivos, é capaz de romper com todo e qualquer princípio moral.
 

O que surpreende o leitor no jogo narrativo de Eça de Queirós é a justaposição entre o passado eo presente, mais precisamente entre o tempos gloriosos de Portugal e sua decadência. De um lado temos a mediocridade da vida provinciana e de sua aristocracia decadente. De outro o passado glorioso de Portugal, há muito perdido. Romance de formação e narrativa medieval se fundem de tal maneira que são elevados à condição de "alegoria" do desejado destino português, que só poderia ser retomado por meio de uma reconciliação com o passado colonial da nação. Gonçalo só se reabilita, moral e pessoalmente, quando decide abandonar Lisboa com toda a sua hipocrisia social, partindo para África.

Passado e presente, glória e decadência, grandeza e fragilidade estão de tal forma unidos em A Ilustre Casa de Ramires como o estão na vida portuguesa. Essas contradições que marcaram Portugal na segunda metade do século XIX movimentam o romance e criam o dinamismo interno tão rico e verdadeiro do personagem Gonçalo. A solução encontada pelo autor para o destino de seu personagem (Gonçalo=Portugal) pode parecer utópica e sonhadora, mas nem por isso deixa de ser uma aspiração da alma lusitana.







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