RAIMUNDOS - PORRADA SONORA
O GRUPO DE BRASÍLIA CHEGA AO QUARTO DISCO PROVANDO QUE AINDA TEM
MUITA LENHA PARA QUEIMAR. CONFIRA TUDO NAS PALAVRAS DO BATERISTA
FRED!
Como vcs chegaram ao título Lapadas do Povo?
Fred: Era uma coisa assim, que a gente sentiu que o som deste
disco estava mais coeso, quem escutasse faixa a faixa iria
receber uma lapada bem no meio do ouvido, na cara mesmo. E
Lapadas para povo porque a gente vendeu muito disco, era para o
povão mesmo, para a galera que compra o nosso disco.
Esse é o quarto disco?
Fred: Seria o quarto considerado em discografia da
banda, mas na verdade ele é considerado como o terceiro de
carreira. O Cesta Basica foi um projeto. Não foi um cd de
carreira. Foi um projeto que a gente fez tudo aquilo que a gente
queria, sem compromisso com nada, Ter que fazer música.
Queríamos gravar umas coisas que a gente gostava de tocar, de
outras pessoas, registrar uma coisa muito legal, que foi o
Holywood Rock para a gente.
Mas o Cesta Básica vendeu bastante.
Fred: Ele acabou vendendo como um disco de carreira.
Acho que deve estar na casa de duzentos e poucos mil.
Isso é bastante em termos de Brasil.
Fred: Mas a caixa foi limitada. A principio só iria
vender 20 mil cópias, e acabou. Só que a gente não tem só 20
mil fãs. Então lançamos produtos separados, porque a caixa
seria para quem tivesse condição, ou aquele fã mais louco que
vai ter o negócio e falar "pô, eu sou fã mesmo, eu tenho
a caixa". Mas ao mesmo tempo a gente colocou os produtos
separados para vender separado, para quem quando tiver grana vai
lá e compra. Agora, a verdade de início a gente não teve essa
visão. É muito egoísmo nosso lançar só para 20 mil fãs.
Então nós lançamos 20 mil caixas mas os produtos você
encontra separado.
Como a banda está encarando o sucesso hoje?
Fred: A gente encara numa boa, não pensamos muito
nisso, não. Nós somos um bom vendedor de disco, mas é
estranho, só vivendo pra falar. Não muda nada. Tem gente que
muda, mas não sei nem porque. Continua a mesma coisa.
Vocês já pararam pra pensar numa explicação porque
vocês fazem tanto sucesso?
Fred: Não sei. Na época em que a gente apareceu tinha
uma carencia muito grande de uma galera mais nova que de repente
não viveu os anos 80, quando teve o primeiro boom do rock
nacional, e tinha uma carência de alguma coisa nova para seguir
junto com as pessoas que vinham dos anos 80. Eu acho que a gente
deu muita sorte na época de estar no lugar certo, fazendo a
coisa certa, na hora certa, e a gente apareceu. Acho que é meio
por aí.
Mas vocês já estão com 4 discos mantendo o sucesso.
Fred: A gente está mantendo e está legal. É bom
manter.
Sim, mas me diz uma banda que tem 3 discos que são
sucesso total.
Fred: Skank
Não, estou falando de rock pesado!
Fred: Aí você me pega.. (risos). Mas o sucesso deles
é muito legal. porque é legítimo anos 90. A gente precisava
acompanhar, eu acho que os anos 90 estava devendo bandas para
acompanhar as bandas dos anos 80, saindo do aspecto rock pesado.
Agora esse rock pesado eu realmente não sei.
Porque o Raimundos continua pancadaria total.
Fred: Nós fazemos o que gostamos. Eu lembro quando
trocamos de gravadora e as pessoas falavam, "xi, eles foram
pra Warner, agora fodeu, os caras vão ficar fazendo musiquinhas
para agradar". Só que aqui na Warner nunca teve isso. Até
as músicas de sucesso que a gente fez, é porque tinham alguma
coisa a ver com a gente. Tem esse lado brincalhão mesmo, desde o
primeiro disco, numa gravadora independente.
É, dá para você perceber que não é uma coisa assim
comercial, feita pensando no sucesso. É do jeito que a música
saiu.
Fred: Isso é muito legal. Nós nunca tivemos problemas com nada.
A única coisa que o nosso diretor artístico pede é para que
sejamos sempre Raimundos.
E com essa bagagem de estrada já tem um estilo
Raimundos? Deixando as influências de lado, já tem alguma coisa
própria?
Fred: Deve ter. Eu sou suspeito para falar porque estou dentro da
banda. Quando estava voltando de Los Angeles, eu coloquei a fita
do novo disco para uma molecada escutar no walkman e eles
falaram: "Pô, é a cara de Raimundos". Eu acho que a
gente tem uma coisa legal, por mais que uma música possa parecer
com uma do Ramones, quando começa a cantar voce percebe que é
Raimundos. A gente tem uma cara própria até quando tem as
influências na música.
De repente vocês estão sendo até escolas para bandas
que estão começando?
Fred: Tem muita banda que até fala isso. Eu recebo
muita demo-tape que o pessoal fala geralmente que se espelhou na
gente. E isso é legal, é uma coisa muito gratificante.
E como é fazer som pesado com letras sem censura e
conseguir com que as músicas toquem nas rádios?
Fred: Eu não sei. Eu acho que a mentalidade mudou um pouco.
Desde o cara que faz a programação da rádio, mudou um pouco.
Hoje em dia é mais facil. Eu lembro que no primeiro disco da
gente foi muito dificil. Emplacamos a musica Selim, que todo
mundo fala que é comercial... A música pode ser comercial, mas
a letra, nunca! Nós fomos perseguidos até pela polícia
federal, em Santo Angelo, no Rio Grande do Sul. Acho que é
porque a gente falou de ânus e vagina. Se a gente falasse boceta
e cu, ninguém iria nos perseguir. Mas falamos o nome científico
da coisa e deu merda. Por que estão perseguindo o Planet Hemp?
Eles distribuem maconha nos shows? Não distribuem, eles estão
lá cantando. Vai quem quer. São aquelas coisas que você não
entende. E mesmo assim elas tocaram nas rádios. É muito louco
se você for pensar nisso. Temos tudo aquilo para não tocar nas
rádios mas mesmo assim toca. É ponto para quem faz esse tipo de
som. O primeiro disco da gente foi dificil. Uma coisa que
melhorou muito nossa música tocar em rádios foi quando o
Mamonas Assassinas surgiu. Eles faziam quase a mesma coisa e
conquistaram a criançada. então não tinha como não tocar. E
outras bandas que de repente tem letras mais picantes também
conseguiram tocar nas radios.
Eu me lembro que no primeiro disco vocês estavam
dormindo em hotel pulguento e essas coisas. E como é que está
hoje? Já está todo mundo com o boi na sombra?
Fred: A vida melhorou com certeza. Mas não está assim, não.
Rico a gente ainda não ficou. Mas assim, eu tenho a minha vida,
ainda não tenho apartamento próprio, ninguem no Raimundos tem
apartamento proprio ainda. Mas tenho um carro que é novo, alugo
um apartamento, moro num lugar legal. Mas nada que possa dar o
luxo de falar "na hora que eu quiser parar de trabalhar e
abrir um comércio", aí já me limita demais. Estou vivendo
bem. Superbem só quando eu comprar o meu apartamento. Aí vou
ter onde morrer, um lugar meu. É gratificante voce fazer o que
gosta e conseguir sobreviver disso. Agradeço a Deus por isso.
O Raimundos é uma das poucas bandas de rock pesado que
tem uma estrutura legal para shows.
Fred: O mercado de show é muito dificil. Se voce não
tiver alguém por traz para maquinar essa parte, fica difícil. E
desde o início nós tivemos pessoas que queriam nos ajudar. Até
hoje, nossa agência está sempre correndo atrás. A gente é uma
banda de estrada, muito do que a gente conquistou foi na estrada.
Dava a cara a tapa. Fizemos uma turnê duas vezes no nordeste
enquanto que tinha banda que não ia lá há cinco anos. Chegamos
a ir de van de São Paulo até a Bahia, e ficar pingando, com o
equipamento atrás, neguinho dormindo um escorado no outro, e
depois fazer Fortaleza, Belem, de ônibus de linha, 24 horas de
viagem, sem saber se chegando lá o show iria acontecer
realmente. Acho que é por isso que conseguimos fazer uma turnê
legal hoje em dia, porque a gente nunca ficou parado esperando as
coisas acontecerem. É todo mundo novo, cheio de saúde, vai
ficar sentado engordando? Apesar que eu estou engordando até na
estrada, mas ficar sentado só engordando é fogo.
Vocês já tocaram com várias bandas internacionais. Já
aconteceu de vocês serem fãs de uma banda e os caras deram uma
de rock star?
Fred: Acho que rolou uma coisa com o pessoal do Suicidal. Um
roadie chegou e pediu autógrafo em todos os CDs, e no meio tinha
um CD pirata gravado na Itália, e o Mike Muir se recusou a
autografar e foi até meio grosso. Deve ter sido só isso, mas
não tiro a razão dele ter ficado puto. Um que eu pensei que
fosse super antipático, e não é, é o vocalista do Smashing
Pumpkins. O cara ficou batendo papo, e eu sempre pensei que fosse
uma bicha, chatíssima. (risos)
Você vê algum tipo de futuro para as bandas brasileiras
de metal?
Fred: Ficam dizendo que o metal morreu... O metal não
morreu porra nenhuma. Agora, é um mercado difícil. A gente tem
um costume muito estranho de som da época, do som da moda. Mas
essas bandas sobrevivem. Uma banda que eu não entendo é o
Dorsal Atlântica. É do caralho, acho que se der uma chance para
o pessoal escutar, tudo muda.
Você tem saudades de Brasília?
Fred: Tenho, eu fui criado lá. Na minha época era
muito legal, não sei como é hoje para uma criança ser criada
lá. Eu fui criado largado, era assim com todo mundo da minha
época. Tinha os prédios, a galera, ficava brincando o dia
inteiro, e quando a mãe queria que subissemos, dava um grito da
janela.
E você tem saudades dos shows undergrounds de lá?
Fred: Tenho. Tudo o que foi bom e é bom a gente lembra
com carinho. Tudo foi válido, Brasília é uma cidade muito
legal. Pena que a imagem que passa de Brasília é que lá só
tem político ladrão, mas as pessoas esquecem que os políticos
que vão roubar lá não são só de lá, eles vem do país
inteiro roubar lá. Aí quem leva a culpa é quem mora lá. Vem
político de todos os lados roubar lá, e todo brasiliense é
político ladrão? A gente escutou isso a infância inteira.
E para finalizar qual seria a mensagem do Raimundos hoje?
Fred: O recado da gente é muito rock'n'roll, fazer o
som e mostrar, matar a cobra e mostrar o pau. Eu quero ver cada
vez mais a galera fazendo um som.
Cezar Nemitz
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