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TEMPO É... DINHEIRO ?
Antes de mais, um abraço a todos os amigos portugueses leitores da SuperXadrez! Voltar ao vosso convívio é para mim um forte motivo de regozijo. O tema que hoje trago até vós relaciona-se com a enorme polémica que está a provocar a decisão da FIDE de alterar o ritmo do jogo. Não tenho ideia do impacto que esta questão tem tido em Portugal, mas penso tratar-se de um tema de grande importância para todos. Como sabem a FIDE decidiu em 26-12-2000, em Teerão criar um novo controlo de tempo aplicável todos os eventos de FIDE a partir de 1.1.2001. Quem não gostou da medida foi a Federação de Xadrez da Alemanha; e os motivos apontados são vários. O primeiro desses motivos está relacionado com o próprio modo de actuação da FIDE que, de acordo com a Federação alemã, foi pouco democrática, na medida em que nenhuma federação terá sido consultada. Mas antes das críticas, recordemos o que decidiu a FIDE: O novo ritmo de jogo seria: 40 lances em 75 minutos, resto dos lances em 15 minutos, 30 segundos adicionais por cada lance efectuado (o que implica a utilização de relógio electrónico). De acordo com esta decisão, uma partida de 40 lances teria um tempo de reflexão, para cada jogador, de 1 hora e 35 minutos. Para uma partida de 50 lances, 1 hora e 55 minutos; para uma partida de 60 lances, 2 horas; para uma partida de 80 lances, 2 horas e 10 minutos e para uma partida de 100 lances, 2 horas e 20 minutos. Que significaria isto? Segundo a Federação alemã (apoiada também na posição oficial da Federação holandesa) os ritmos acelerados tornar-se-iam norma no xadrez. E acusa a FIDE de ceder face à pressão dos media e do desejo de uma mais fácil organização de torneios. Sucede que já anteriormente, em missiva de 8/1/2001, a Federação de Xadrez da Holanda aponta tremendas contradições no conteúdo de diversas normas da FIDE; por exemplo, como seria possível obter normas de mestre com o novo controle de tempo? Mas, segundo a Federação alemã, o argumento decisivo da sua congénere holandesa contra a decisão é, que de acordo com os próprios estatutos da FIDE esta decisão não é, pura e simplesmente, válida. Segundo a Federação Holandesa, apenas a Assembleia Geral da FIDE que se realizará apenas no Outono de 2002, na Eslovénia, poderá proceder a tal alteração. Esta decisão atinge de tal modo o âmago, a essência do xadrez, que apenas deveria ter sido tomada após amplo debate a nível internacional, o que, nem de longe nem de perto, terá sido feito. Em conformidade, a Federação Holandesa solicitou ao Presidente da FIDE que cancele a decisão até a uma ampla discussão do problema na futura Assembleia Geral de 2002. Em 21.1.2001 a Federação de Xadrez da Alemanha vem apoiar, em absoluto, o protesto da Federação de Xadrez Holandesa, alegando que as federações apenas tiveram conhecimento das importante alterações através de informação veiculada pela Internet e que nenhum jogador de topo alemão apoiou o novo controle de tempo. E acrescentam que (aliás argumento já referido pela Federação holandesa) a decisão da FIDE não é válida, porque os estatutos da FIDE, simplesmente não lhe dão cobertura. Diz Egon Ditt, Presidente da Federação alemã: "Nós não toleraremos a violação dos estatutos" Que pensar de tudo isto? Bom, a título meramente pessoal, também entendo que apenas a Assembleia Geral da FIDE, corpo constituído por delegados de todas as federações nacionais, tem autoridade absoluta para decidir no importante aspecto do ritmo de jogo. Mas essa é apenas uma parte da questão, a parte formal; no que toca ao conteúdo que penso desta questão? Passe algum exagero da Federação Holandesa, também me parece que acelerar em demasiado o ritmo de jogo pode ter sérias consequências, nomeada- mente a de abrir caminho para uma preponderância excessiva dos jogadores que fazem da táctica a sua principal arma e diminuir, as possibilidades daqueles que, na opinião de muitos, são os "verdadeiros" xadrezistas, isto é, que actuam de acordo com o verdadeiro espírito da modalidade: Reflexão profunda sobre as posições, e não a procura sistemática de situações, mesmo com prejuízo consciente de aspectos estratégicos, em que o adversário seja induzido em erro, por qualquer "ratoeira" táctica. Na verdade, a redução do tempo de reflexão pode, em muitas situações-limite, ter um peso decisivo. Isto, claro, em termos puramente teóricos. Talvez daqui a alguns anos ninguém se lembre desta discussão e todos assumam a necessidade de ritmos mais rápidos. Mas, na verdade muitos como eu, sentem que o verdadeiro xadrez é aquele que o tempo não constitui um factor preponderante e que a pressão do relógio deve limitar ao mínimo a criatividade dos jogadores. Claro que, como referi antes, a primeira questão que se deve colocar é de natureza formal. A decisão do Board é válida ou não? Pessoalmente, penso que não e que se deveria aguardar até à próxima Assembleia Geral da FIDE, para tomar uma decisão definitiva, promovendo-se um amplo debate sobre a questão até lá. Enfim: Está aberta a discussão. Terão os amigos leitores da SuperXadrez uma palavra a dizer sobre o assunto? Espero que sim. Um abraço para todos.
Estocolmo, 27 de Janeiro de 2001 Johan Lundström |