Quem tem por hábito
adquirir, para seu consumo, fruta regional, sabe que existe uma espécie
de pêro chamada de “pêro domingo” ou mais correctamente por
“pêros Domingos”.
É um pêro
caracterizado pelo seu forte aroma, pela sua grande suculência e
longa durabilidade depois de colhido.
Ainda que seja produzido
por toda a ilha, a freguesia do Jardim da Serra talvez constitui o seu
principal habitat, estando também na origem da denominação
porque é conhecido e que não tem nada a ver com o dia em
que, depois de criar o mundo, Deus o escolheu para descansar.
Há cerca de 80
anos atrás, numa altura em que, pouco tempo tinha passado, desde
que haviam caído as flores dos pereiros e estes começavam
a mostrar os primeiros frutos, dois comerciantes de fruta, naturais do
Jardim da Serra, fechavam contrato relativamente à aquisição
um pomar de pêros, lá para os lados da serra do Campanário.
Das clausulas do contrato
verbal estabelecido entre vendedor e comprador, para além do montante
apalavrado, constava o direito dos compradores colherem todos os pêros
do pomar, com excepção dos produzidos por um ou dois pereiros,
que o vendedor havia reservado para consumo próprio e, naturalmente,
também para oferecer, com era seu hábito, um safatinho de
pêros a uns compadres e conhecidos que tinha lá para os lados
da cidade e também ao sr. Vigário.
Na altura em que os pêros
começaram a amadurecer, os compradores lá os foram colher,
fazendo-o não de uma vez, mas consoante os iam vendendo, a fim de
evitar que se estragassem. Afinal de contas, não dispondo de quaisquer
meios para a sua conservação, era sempre melhor os manter
na árvore, enquanto tal fosse possível.
Quando já quase
todos os pereiros se encontravam despojados dos seus frutos, acabam por
serem seduzidos pela aparência dos pêros, que o dono do pomar
havia reservado para si e que ainda permaneciam nas respectivas árvores.
Na realidade, estes pêros
nada tinham a ver com os que haviam adquirido e, depois de meterem o dente
num deles, não resistiram à tentação de encherem
um pequeno cesto de mão, daqueles que utilizavam para colher os
pêros na altura em que se encontravam em cima das árvores.
Na realidade estes pêros
apresentavam um bom aspecto, exalavam um odor forte e agradável
e tinham um sabor majestoso.
Chegados à loja
onde habitualmente armazenavam a fruta enquanto não a transportavam
para venda no mercado, e depois de saborearem alguns, foram os restantes
colocados à parte e ali permaneceram esquecidos várias semanas,
sem que, contrariamente aos outros, apodrecessem.
Seduzido pelas características
destes pêros e sobretudo pela sua longa durabilidade, depois de colhidos,
sem que para isso fossem necessárias grandes medidas de conservação,
um dos comerciantes, chamado de Domingos dos Ramos, numa passagem pela
propriedade onde os tinha colhido, apanhou um galho da respectiva árvore
e utilizou-o para enxertar alguns dos pereiros que possuía junto
à sua residência, no sítio do Luzirão, na freguesia
do Jardim da Serra.
Tendo as enxertias resultado,
logo as características superiores destes pêros, em comparação
com outros, se divulgaram junto da população que os passou
a referenciar como sendo os pêros dos pereiros do sr. Domingos ou
simplesmente pêros do Sr. Domingos e a fazer questão de também
efectuar enxertias deste tipo de pêro nas suas propriedades.
Sendo desconhecida da
população a sua denominação científica
o sr. Domingos passou a constituir a única referência relativamente
a esta espécie de pêro, o que fazia com que, para os individualizar
de outros, se utilizasse a expressão de pereiros ou pêros
do Sr. Domingos, que rapidamente evoluiu para pêros domingos.
Na realidade, numa altura
em que os meios de conservação de fruta não existiam,
nem a sua importação se verificava, a durabilidade
dos pêros depois de colhidos era uma característica a ter
em conta por quem os comercializava e o pêro domingos apresentava
uma particularidade única, uma vez podia ser conservado até
finais de Maio princípios de Junho, facto que levava o povo a dizer
que os últimos pêros domingos correspondiam às primeiras
cerejas.
A comprovar tal característica,
não raras vezes, sendo habito fazerem-se ofertas de cerejas às
pessoas com elos de ligação mais apertada, ao surgirem as
primeiras cerejas, se reunissem no mesmo cesto de oferta cerejas e pêros
domingos .