NAMO BUDDHAYA - NAMO DHARMAYA - NAMO SANGHAYA !

DISCÍPULOS DO BUDDHA
Sujata
Citta, um monge indeciso
O General Siha

SUJATA

UM DEUS RESPONDE ÀS PRECES DE UMA JOVEM ADOLESCENTE

Sujata era uma menina bonita, doce e faceira, filha de uma amília rural próspera em Senani. Esta atraente vila situava-se nas cabeceirasdo rio Neranjara, a oeste de Rajagaha, a capital do Estado de Magadha. 
Sujata era uma garota totalmente inocente, que desconhecia sua própriabeleza, e não tinha arrogância. Toda manhã, ela ia, junto com os fazendeiros da casa, até os pastos, onde a relva crescia verde e vigorosa, e as fontes de água pura borbulhavam da terra aqui e acolá, em diversos lugares. Cercada pela beleza e tranquilidade da natureza exuberante, Sujata passava os dias envolvida com as tarefas do dia, olhando o gado, tirando o leite, e assim por diante. Todos do vilarejo a elogiavam: 
- "Ela é uma boa mocinha! Gostaria que minha própria filha fosse tão gentil e bondosa quanto Sujata!

Nos bancos da margem do rio Neranjara, nos arredores da vila, havia uma grande árvore nigrodha, com um tronco muito grosso e inúmeros galhos, que se ramificavam por todas as direções.As pessoas do vilarejo reverenciavam esta árvore como sagrada, como a moradia de um deus (deva). Toda manhã e ao entardecer Sujata visitava a árvore e oferecia suas preces: 
- "Senhor da árvore, por favor, envie-me um maravilhoso marido."

O deus da árvore ouviu as preces da jovem, pois logo um pedido pela mão de Sujata veio do chefe da família mais rica da vila (1). Ela foi enfeitada com guirlandas de flores, jóias, e casou-se perante seus conhecidos com grande alegria. Quando a festa terminou, ela foi depressa até a árvore nigrodha oferecer suas preces de agradecimento. Aproveitou para fazer outro pedido: 
- "Senhor da árvore, por favor, guarde e proteja minha nova família, e dê-me um lindo e sadio bebê para ser herdeiro."
O deus devia ser fã de Sujata, de tão mável que ela era, e ele também concedeu mais este desejo. Em pouco tempo, ela sentiu e carregou um bebê e, no devido tempo, deu à luz a um bebê sadio. O coração de Sujata estava cheio de alegria. Ela adorou o deus da árvore com mais fervor ainda, e servia ao esposo e à família dele diligentemente, com espírito de gratidão. 

A cada ano, na noite de lua cheia do mês de Vesakha (Wesak), Sujata preparava um prato de arroz com leite para oferecer à divindade da árvore. Ela se esmerava no preparo deste prato, que sempre ficava rico, grosso e delicioso. Seis anos já tinham se passado desde que ela havia casado com o homem mais rico do vilarejo. Agora era noite de lua cheia de Vesakha. Os raios prateados do luar cobriam os pastos e florestas, e transformavam o rio Neranjara num rio de luzes. Sujata levantou-se muito antes do amanhecer, junto com Punna, a serva - a quem amava como uma irmã mais nova -, e foi ordenhar as suas melhores vacas, sob um abrigo próximo. 
- Punna, o leite este ano parece bem mais grosso
- Sim, senhora - com ele fará um ótimo arroz com leite! 
- Quando terminarmos de ordenhar, por favor, aqueça o fogão. Eu irei enquanto isso colher um pouco de arroz. 
- Sim, dona Sujata. 

As duas mulheres derramaram o leite fresco num pote de cozinha da casa principal, adicionaram o arroz, e começaram a cozinhar a mistura. De repente, uma fragrância maravilhosa preencheu o ar da cozinha. Sujata, ocupada em alimentar o fogo com mais lenha, sentiu que acontecia algo diferente. Normalmente, ela lutava com a fumaceira que se desprendia da madeira, e com o leite que transbordava sem aviso. Mas desta vez, nem uma só gota se desperdiçou, e a madeira queimava sem fazer fumaça (2). Enquanto observava, de pé, aos acontecimentos inusitados, o arroz com leite ficou pronto - o melhor que ela já tinha feitoo!
- Punna, o deus da árvore deve estar muito satisfeito este ano! Depressa, vá limpar o altar sob a árvore para que possamos fazer logo a oferenda!


UM HOMEM SANTO ACEITA A OFERENDA DE ARROZ COM LEITE

A lua cheia caía em direção do oeste, e o céu a leste já começava a clarear. Punna correu na escuridão até a árvore nigrodha. Ao chegar lá o sol surgiu e fez a árvore brilhar sob a luz da manhã. De repente, Punna pulou de susto. Ao pé da árvore sentava-se uma figura emaciada, que mais parecia um rosto humano preso a um esqueleto. 
Porém, mesmo assim, a face parecia irradiar nobreza, serenidade, e santidade. 
- É o deus! O deus da árvore nigrodha! 

Punna girou nos calcanhares e correu num só fôlego, para contar à sua patroa o que ela tinha visto. Ao ouvir ao relato, Sujata sentiu uma alegria sem igual. 
- A divindade manifestou-se na forma humana a fim de aceitar a oferenda pessoalmente! 

Sujata e Punna encheram uma tigela de ouro até a borda com arroz com leite, e correram para a árvore. O dia já havia raiado, e o homem santo continuava sentado sob a árvore, imerso em meditação.
As duas mulheres prostraram-se ante a figura brilhante e reverentemente prepararam-se para oferecer o alimento. 

Porém, a figura que as mulheres pensavam ser o deus da aacute;rvore era, de fato, o Príncipe Siddhartha, que há seis anos estava fora dos palácios de Kapilavastu, em busca da iluminação procurando a resposta ao sofrimento para o bem de todos os seres, entre mestres e florestas. Após ter visitado diversos reinos, e procurado a iluminação em diversos mestres, o Príncipe Siddhartha decidiu ficar nos arredores da vila de Senani, próximo ao Parque dos Ascetas. Escolheu o local para realizar seus últimos esforços ascéticos: 
- Não deixarei este lugar até que tenha atingido a perfeita Iluminação. 

Ele havia passado por um jejum severo, comendo um grão de sésamo e um de arroz por dia. Quando ele entrava no "transe sem respiração", no qual a respiração normal é suspensa e a mente concentra-se em si mesma, ele perdia a consciência e caía para a frente. 
Ao acordar de seu estado de quase-morte, ele reiniciava o jejum. Realmente era uma forma extrema de ascetismo, que ultrapassava os limites humanos. 
Às vezes ele sentia estar a um passo da iluminação, mas quando acordava de sua inconsciência, via que tudo que havia conseguido havia se esvanecido com a fraqueza do corpo, causada pelo jejum. 
O Príncipe questionou-se: 
- Esta prática extrema realmente levará à extinção do sofrimento e à iluminação? Mesmo que desta maneira eu consiga extinguir todo apego ao corpo e atingir a iluminação, a saúde está comprometida e a vida por um fio. Assim, não terei condições de transmitir a descoberta que porventura faça para mais ninguém. Que proveito há em se atingir a iluminação para depois morrer, sem ter ajudado ninguém? 

O Príncipe, então, decidiu-se abandonar as práticas ascéticas e quebrar o jejum. Usando suas últimas reservas de energia, arrastou seu corpo sujo de pó e feridas até o rio Neranjara. Ali, tomou banho nas águas puras do rio, e puxou-se para a margem pegando numa raiz de árvore que avançava para o rio. Sentou-se debaixo da árvore nigrodha, e ali entrou em profunda meditação. Seu corpo emaciado e magro brilhava sob a luz do sol da manhã. 

Foi neste momento que Punna apareceu, e viu o Príncipe Siddhartha. 
A aparência do santo homem era realmente impressionante. Sujata moveu-se à frente e ofereceu a tigela com arroz e leite. A figura de repente alcançou a tigela com a mão esquerda, vagarosamente, e saboreou cada gole do alimento. 
- O deus aceitou beber o leite que preparamos para ele! 

Ambas as mulheres tremiam de emoção, sem tirar os olhos de cima daquele homem santo ali sentado. Ao tomar o leite preparado por Sujata, o Príncipe sentiu nova energia começando a espalhar-se pelo corpo. Levantou-se e andou até os arredores da cidade de Gaya, a uma curta distância, percorrendo as margens do rio Neranjara. Ele sentou-se sob uma figueira que encontrou por lá e entrou em um estado de meditação profunda. No amanhecer do sétimo dia após todo aquele acontecido com Sujata, o Príncipe Siddhartha finalmente logrou iluminar-se, tornando-se o Buddha, o Bem-aventurado. 


A PRIMEIRA MULHER DISCÍPULA LEIGA

Logo as notícias chegavam a respeito de um homem santo, conhecido como Shakyamuni, que lograra um grau de Iluminação inigualável e tornara-se o Buddha. As pessoas comentavam que Ele havia convertido os três irmãos Kashyapa, que eram ascetas nas florestas de Uruvela; diziam que Ele foi ao país de Magadha e converteu Shariputra e Maudgalyayana (estes eram discípulos de Sanjaya, eminente pensador daquela época), junto com 250 de seus seguidores. Na capital de Rajagaha, o rei e os principais magnatas tornaram-se seguidores de Shakyamuni. 
Um dia, correu um rumor de que o Buddha estaria visitando Senani. 
- Ele está vindo! Dizem que a Doutrina que prega é a mais profunda! 

O vilarejo de Senani estava excitado com a iminente visita do Buddha
Por fim, chegou o grande dia. Sabendo que o grande sábio havia chegado, a piedosa Sujata, junto com sua serva, foram até o local onde as pessoas se reuniram. Abriram caminho para chegar até a frente da congregação, e, sem olhar, fizeram reverentemente uma mesura para o Buddha. Mas quando Sujata levantou a cabeça, ela gritou de susto, pois não era este a divindade da árvore nigrodha, a quem oferecera arroz com leite, num amanhecer da lua cheia de Vesakha? 
- Então não era o deus da árvore, afinal, mas o príncipe-asceta do clã dos Sakyas, que aceitou minha oferenda! Ele bebeu, e depois disso atingiu a Iluminação! Fomos felizardas de ter feito tal oferenda para uma pessoa como ele! 

Sujata e Punna quase não puderam conter-se de alegria, enquanto ouviam ao sermão do Buddha. Quando o Buddha terminou o sermão, Sujata foi à frente, prostrou-se aos pés do Buddha, e falou: 
- Senhor, aceite-me como discípula leiga. Deste dia em diante, desejo refugiar-me em Ti e em Sua Doutrina, e recolher méritos pelas ofertas aos monges, pelo resto da minha vida. 

Punna, por sua vez, seguiu o exemplo de sua patroa. O Buddha olhou para as duas, com carinho e compaixão, e fez sinal com a cabeça, assentindo. 

Assim, Sujata tornou-se a primeira discípula leiga da comunidade budista. Ela decorou as palavras do Buddha e procurava seguí-las sem falta. Em casa, ela servia ao marido e à sua família com diligência, cuidava das necessidades de seus servos, e fazia o melhor que podia para manter a ordem da casa. Além disso, procurava não esquecer nunca os fundamentos da religião que abraçara, e sempre que podia fazia oferendas aos monges. Como resultado, ela foi amada e respeitada não somente em sua família, mas também por todos aqueles com que ela fazia contatos. Assim, sua vida foi muito feliz e pacífica. 


Zenno Ishigami, Revista Dharma World, volume 10, Março 1983, páginas 34-37.

(1) Na Índia antiga e tradicional, os casamentos são arranjados pelos pais e as meninas e meninos casam-se muito cedo, ou são prometidos em casamento.
(2) Nas áreas rurais e nas cozinhas dos mais pobres na Índia, o esterco seco e a lenha ainda alimentam fogões, de forma que é sempre uma aventura cozinhar com fuligem, mãos e rostos sujos!!!

CITTA, UM MONGE INDECISO

LEVADO A SER MONGE PELA COMIDA

Citta-Hattisariputta era um jovem fazendeiro solteiro, que vivia na cidade de Savatthi. A cada manhã ele saía, com suas cordas nos ombros, para os campos fora da cidade, e trabalhava até o anoitecer. 
Um dia, contudo, tendo conseguido terminar todos os seus trabalhos ao meio dia, ele decidiu passar no mosteiro de Jetavana, a caminho de sua casa. 
Nesta ocasião, o Buddha passava seus dias neste mosteiro, localizado nos arredores de Savatthi. Ele era muito estimado na área, e o número de pessoas que iam vê-Lo pregar aumentava a cada dia. Citta pensou que seria bom ir assistir a um sermão, daquele homem que o povo dizia ter nascido príncipe, e que agora era um Buddha

No mosteiro, a paz sobressaía no meio da floresta e na luz do outono. A quietude era total: dava a impressão de não haver ninguém lá. Então, por detrás de Citta veio uma voz: 
- Há algo de errado? 

Ao virar-se surpreso, ele viu que um monge veterano estava ali, de pé, com um caloroso sorriso. Parecia que ele tinha acabado de chegar da sua ronda diária de mendicância - sua tigela estava cheia de uma comida, que parecia deliciosa. 
Citta engoliu em seco e seu estômago começou a roncar. Ele tinha completado um dia de trabalho inteiro, e era a hora do almoço. Observando Citta, o velho monge sorriu e disse: 
- Deve ser por causa de ligações cármicas do passado que nós nos encontramos dessa maneira. Por que você não vem e compartilha de meu almoço? 

Citta hesitou por um momento, mas antes que ele pudesse saber o que estava acontecendo, já tinha estendido a sua mão. O monge colocou uma porção farta da deliciosa comida na mão de Citta. A comida era do tipo que um camponês como Citta raramente provava. Citta engoliu-a, com fome. Como era indescritivelmente deliciosa! 


Depois disto, Citta sempre se lembrava da comida esplêndida dada pelo velho monge. Quando ele se cansava de trabalhar nos campos, faminto, ele pensava:
- Camponeses, como eu, tem de trabalhar o dia inteiro, se cobrir de poeira e suor, e assim mesmo não conseguem comida tão boa. Mas se você se fizer monge, pode comer daquela maneira todo dia, e tudo o que tem de fazer é pregar e sair pedindo pelas ruas!(1).

Cada vez mais o seu trabalho pesado nos campos parecia sem sentido.
Citta tomou uma decisão: ele se tornaria um monge! Assim, poderia escapar da sua rotina pesada e suja, e levar uma vida confortável.
Um dia, Citta visitou o mosteiro de Jetavana e expressou seu desejo de se juntar à Sangha (Comunidade). O pedido foi transmitido ao Buddha, que rapidamente deu consentimento, para a surpresa de todos.

Naquele mesmo dia, a nova vida de Citta como monge começou. Mas em poucos dias ele descobriu que a vida de um monge budista não era tão confortável quanto pensava. Primeiro, havia diversos preceitos a serem observados. Tinha-se que praticar a meditação sentada, de manhã até a noite. Em certas horas, o monge tinha de sair mendigando pela Savatthi. E haviam certas tarefas a serem cumpridas, passadas pelo monge superior que havia sido apontado como instrutor pessoal do novato. E, nos momentos livres, Citta tinha de aprender de cor a recitar a Lei, memorizando-a. com relação à boa comida, que ele foi atrás ao se converter, viu que tudo que comia tinha sido comida misturada e ensossa. Nem uma só vez tinha aparecido aquela comida deliciosa que ele havia provado com aquele monge...

Pouco mais de um mês tinha se passado, e Citta estava pronto para desistir:
- Não agüento mais esta vida de monge! Estava melhor quando era camponês! Já tive o bastante disto!


UM ESPÍRITO ARROGANTE LEVA A CAMINHOS DE DESILUSÃO

Citta fugiu do mosteiro na surdina naquela noite, e correu para sua antiga casa. Na manhã seguinte, retornaria ao trabalho nos campos. Mas após três dias, foi atacado por uma sensação de vazio. E começou a sentir falta da vida monástica, que parecia tão severa. Ele lembrou-se dos monges mais velhos, que se esmeravam por cuidar e ensinar aos monges novatos, e da vida que levavam, livres de tumultos e apegos - agora ele pensava como tinha sido bom. Citta viu-se de novo na estrada, a caminho do mosteiro de Jetavana.
Ele aproximou-se do dormitório dos monges, com medo, mas os monges o receberam como se nada tivesse acontecido. Isto o aliviou tremendamente, e pensou:
- Desta vez vou manter meu treinamento, não importando quanto tenha de me esforçar. Devotar-me-ei ao estudo dos Comentários.

Citta lembrou-se de quando era criança, sendo elogiado por sua inteligência. Ele encorajou-se com o pensamento de que ele também poderia tornar-se um bom monge e atingir a iluminação. Agora ele se atirou ao treinamento religioso com toda energia. Mas após um ano, ele ainda não estava livre de paixões atormentadoras (2). Então, uma tendência à preguiça e má-vontade tomou conta dele, e ele começou a pensar na vida que levava antes, envolta nos prazeres dos sentidos:
- Esta vida de monge não é para mim. Por que estou desperdiçando meu tempo desta maneira?

Cheio de vergonha, Citta mais uma vez fugiu do mosteiro à noite e correu para casa. Ele descobriu, contudo, que não poderia fugir à sensação de vazio existencial ou frustração, que crescia mais forte a cada dia. Não importava o que fizesse, um sentimento de solidão insuportável o atacava. E assim, não havia nada mais que pudesse fazer que não voltar ao mosteiro.
Tendo quebrado os votos duas vezes, e retornado à vida leiga sem permissão, Citta apresentou-se aos seus companheiros monges cheio de vergonha, esperando ser tratado como um apóstata. Mas os olhos dos monges espelhavam gentileza, e suas atitudes amigáveis encorajaram-no a recomeçar. Ele arrependeu-se de sua fraqueza de vontade e renovou sinceramente seus votos monásticos.

Quantas vezes ele passou por este processo - se afastando e retornando à vida monástica? Não importa o quanto ele tentasse, parece que ele não conseguia conquistar sua ilusão pessoal.
Porém, no processo de idas e vindas, Citta gradualmente acabou aprendendo um bocado da Doutrina, e eventualmente igualou-se aos outros monges em termos de conhecimento teórico. Ele começou a expor os Comentários, a pedido dos outros monges. E assim, infelizmente, começou a sentir orgulho do que sabia.

Numa ocasião ele encontrava-se no Parque das Gazelas, de Baranasi (Benares), na terra de Kasi, praticando na companhia do Buddha.
Os monges veteranos também se reuniram por lá e diariamente haviam debates e discussões sobre a Doutrina no mosteiro dali. Citta foi ao salão do mosteiro para ouvir aos debates, mas, cheio de confiança em sua própria compreensão da Doutrina, ele interrompia diversas vezes os outros monges para colocar as suas próprias idéias.
Perturbado por ver as discussões serem interrompidas tantas vezes, o monge veterano Mahakotthita censurou-o:
- Amigo Citta-Hattisariputta, você não deve interromper os discursos dos monges veteranos para interpor suas opiniões próprias. Quando desejar expressar suas opiniões, você deve esperar até que os outros tenham terminado de falar.

Um outro monge muito amigo de Citta interveio, dizendo:
- Venerável Mahakotthita, por favor, pare de humilhar Citta. Ele estudou o suficiente para poder juntar-se como igual em suas discussões - é por isto que ele tentou apressentar suas opiniões aqui.

Mahakotthita assentiu com a cabeça e respondeu:
- Meu amigo, eu sei que Citta estudou cuidadosamente os Comentários e é bastante estudado. Mas existem muitos exemplos de pessoas que, enquanto parecem demonstrar modéstia e tolerância na presença de seus mestres, preceptores e outras pessoas eminentes, em seus corações são arrogantes, iludindo-se pensando que atingiram o nível de não-retorno, no qual já não há mais perigo de voltar a cair no mal. Eles se associam com as pessoas do mundo, com reis e senhores, e gente incrédula; e gradualmente eles são atraídos para a vida mundana, terminando por se tornar cheios de diversos apegos. Portanto, amigo, é muito perigoso para aquele que não atingiu a iluminação ter muito contato com pessoas mundanas, mesmo que seja para expor a Lei e os Comentários.

As palavras de Mahakotthita resultavam de uma preocupação sincera e compassiva por Citta, mas Citta prestou pouca atenção a isto e, como resultado, estava prestes a desviar do Caminho, e desta vez, de uma forma muito séria.


O EXEMPLO DA SANGHA AJUDA CITTA A OBTER A ILUMINAÇÃO

Citta tinha ido com o Buddha para a região de Kuru, localizada a nordeste do reino de Kosala. Ele permaneceu na vila de Kammasadamma, pregando a Lei a todas as pessoas da área. Ele era respeitado por todos e teve muitas oportunidades de se socializar amigavelmente com os locais. Gradualmente ele veio a sentir profunda inveja da vida agradável dos leigos.
- Eu já tenho anos de prática e sou versado nos Comentários. Com certeza, eu não vou regredir se me misturar um pouco com as pessoas.

Assim ele pensou, e quanto mais ele se associava com leigos e não-adeptos, seu coração começou a endurecer para as coisas espirituais, abrindo brechas nas regras monásticas, como tomar bebidas alcoólicas e tendo contatos com o sexo oposto.

Relatos da conduta errônea de Citta chegaram à Sangha, e o Venerável Ananda, o atendente pessoal do Buddha, foi até a vila de Kammasadamma em mendicância e para ver por si mesmo. Ananda entrou na vila pelo amanhecer e logo chegou ao portão da casa onde disseram que Citta estava. Olhando dentro, ele viu Citta dormindo, o hábito do monge jogado ao lado, deitado ao lado de duas jovens mulheres. Ele passara a noite "divertindo-se". O Venerável Ananda suspirou profundamente. Então Citta sentiu que havia alguém de pé no portão da casa. Ele levantou-se tremendo, suportado pelas duas mulheres, e aproximou-se do portão. Então ele reconheceu quem estava lá.

Sua embriaguez pareceu sumir à medida que ele esfregava os olhos várias vezes. Não - não havia engano - era realmente o Venerável Ananda que estava ali ao sol da manhã. Ananda olhou para ele com olhos cheios de tristeza. Citta sentiu como que um choque percorresse todo o seu corpo - como se tivesse sido atingido por um relâmpago. Ele se atirou aos pés de Ananda e ali ficou, imóvel. Então seu corpo começou a convulsionar com soluços.

Retornando da casa de Citta, Ananda relatou o que viu para o Buddha:
- Senhor Abençoado, esta manhã eu visitei o monge Citta. Ele estava sem o manto e em companhia de mulheres.
- O que você sentiu quando viu Citta esta manhã, Ananda?
- Abençoado, eu estou muito confuso. Eu não compreendo como alguém tão versado na Lei e tão respeitado quanto Citta pode voltar a uma vida de prazeres vulgares. Como pode ser isto?

Shakyamuni aquiesceu com a cabeça e respondeu:
- A mente de um homem é difícil de controlar. Até que a pessoa tenha atingido o estágio de "não-retorno", há o perigo de ser atraído de volta à vida comum, se relaxar a vigilância. Se a pessoa vive em meio aos de pensamentos mundanos, é bem provável que se afogue num mar de luxúria, avidez e apego. Apesar disto, Ananda, não há necessidade de se preocupar. Citta está hoje à deriva num mar de ilusão devido ao seu karma passado. Mas daqui a sete dias ele retornará a mim e pedirá para ser readmitido na Ordem. E, desta vez, ele logrará o primeiro grau de iluminação.

E assim foi. Sete dias depois, Citta veio a ter com Shakyamuni, pedindo para ser readmitido na Ordem como um monge de baixo escalão, expressando profundo arrependimento pelo seu erro.

Foi assim que Citta caiu nas garras da paixão vez atrás de outra, mesmo após ter tornado-se monge. Eventualmente, contudo, ele veio a se conscientizar que não havia outro caminho para ele, exceto o da Lei budista. Então, devotando-se completamente à sua prática, ele logrou o primeiro estágio de santidade, de "não-retorno", e mais tarde o estado iluminado como um Arahant.

Contudo, haviam uns monges que não podiam acreditar que Citta havia obtido o estágio de "não-retorno", por causa de seu comportamento passado. Mas ele não se chateava com tais comentários. Ele passou o resto de seus dias devotando-se à sua prática e a pregar a Lei. Todas as suas ações estavam de acordo com o que pregava. Com o tempo, ninguém mais veio a duvidar, e todos os companheiros monges vieram a respeitá-lo profundamente. A história de Citta é uma questão de bagagem espiritual, e conseqüente purificação como monge.

No Dhammapada encontramos as seguintes palavras do Buddha em louvor de Citta-Hattisariputta:
- É um grande bem controlar a mente, que é difícil de domar, voando aqui e acolá, indo para onde lhe apraz; uma mente controlada traz felicidade.


(1) Esta tradição ainda existe nos países do sudeste asiático. Os monges, do mais graduados até os menos graduados, saem, muitas vezes descalços, para coletar alimentos, de manhã bem cedinho. Mas os monges não pedem nem podem pedir. Quem quiser, dá a comida quando eles passam, calados. Ou os monges de um mosteiro são convidados para o desjejum ou celebração especial. 
Vemos isto especialmente na Tailândia, na Birmânia, Camboja, Laos, e Sri Lanka, e é uma tradição que vem desde os tempos do Buddha. Os tempos hoje são outros, e quantas críticas os adeptos da tradição Theravada já não sofreram por levar este modus vivendi ! A prática da mendicância é tida como polimento espiritual (simplicidade, voto de pobreza), e não como meio de vida dos monges. Além do mais, com o estabelecimento do Budismo pelos países, os mosteiros sempre cumpriram um papel social, como centros de educação não só religiosa, mas também secular, ou centros médicos e de aconselhamento para a população em geral.
(2) O que o Budismo chama de paixões são quaisquer tipo de desejos e sentimentos, enraizados no apego, que nos dominam e nos tiranizam.

O GENERAL SIHA

A CURIOSIDADE

Vesali, a capital da Confederação dos Vajjias, era uma das seis grandes cidades, ao lado de Rajagaha e Savatthi. Sua prosperidade, como centro comercial, impressionava a todos os visitantes (1). O Buddha Shakyamuni começou a visitar a área para pregar a Lei logo após a Sua Iluminação. Como resultado disto, muitos moradores da cidade foram convertidos, e eles construíram o mosteiro de "Telhados Altos", nos arredores de Vesali. Na ocasião desta história, Shakyamuni estava residindo neste mosteiro.

A nobreza da Confederação dos Vajjias estava realizando uma reunião no salão público de Vesali. O salão estava lotado com representantes de todas as partes da Confederação e, no meio das discussões públicas, aconteceu que alguém mencionou alguma coisa sobre o "asceta" Gautama. Ele e Sua Doutrina foram altamente elogiados por muitos dos presentes:
- A Doutrina das Três Jóias - Buddha, a Lei e a Comunidade (Sangha) - pregada pelo Gautama, é verdadeiramente maravilhosa! Certamente Ele é um sábio Iluminado!
- Até mesmo o Rei do estado vizinho ao nosso, Magadha, tornou-se um seguidor de Gautama!

Um certo general, sentado silenciosamente na assembléia, ouvia aos comentários atentamente. A figura impressionante era o General Siha, famoso por toda a Confederação dos Vajjias, e um piedoso seguidor da fé jainista, há muitos anos (2).

Agora Siha estava ali, ouvindo o "asceta" Gautama ser altamente elogiado pelos presentes, e ele teve a vontade de conhecê-Lo, visitá-Lo pelo menos uma vez.
- Eu já ouvi à respeito deste asceta antes, mas não sei exatamente o que Ele ensina.

Naquele dia mesmo, a caminho de sua casa, General Siha foi visitar seu mestre, Nigantha Nataputta, e lhe disse:
- Reverendo, a fama dos asceta Gautama é muito grande. Eu gostaria da fazer-Lhe uma visita e ouvir a Sua doutrina.

Siha falou assim, na esperança de poder refutar Gautama na primeira oportunidade, se Ele estivesse pregando uma doutrina "falsa". Mas o mestre jainista proibiu-o, dizendo friamente:
- General Siha, o asceta Gautama não prega nada além da inação, negando a possibilidade da vontade própria e da autodeterminação. Que necessidade tem você, um seguidor da fé jainista ortodoxa, de ouvir tais falsas doutrinas?

Assim repreendido, General Siha não teve outra escolha a não ser desistir do plano de ir conhecer o "asceta" Gautama.
Mas na assembléia seguinte, elogios ao "asceta" Gautama corriam nas bocas de todos os presentes; e como a mesma coisa aconteceu numa outra assembléia subsequente, Siha não pôde mais conter a sua curiosidade. Decidiu-se: "o asceta Gautama deve ter qualidades excepcionais, para que seja assim tão bem falado. Certamente não há necessidade alguma para mim de pedir permissão ao mestre para ir ver e ouvir à pregação de Gautama". Assim, Siha apressou-se para casa e saiu outra vez, acompanhado de seus atendentes pessoais, para visitar o Buddha, que estava pregando no mosteiro de "Telhados Altos".


TRANSFORMANDO A CRÍTICA EM ELOGIO

Com seus modos suaves e gentis e uma aparência nobre, a forma do Buddha parecia irradiar luz. Só por vê-Lo, Siha foi tomado pela emoção, e seu corpo tremeu. O Buddha notou que Siha olhava-O à distância, firme e sem pestanejar. O Buddha sorriu e fez sinal para que o general se aproximasse e sentasse próximo. O general fez uma reverência.
- General Siha, o senhor tem alguma coisa para me dizer, ou perguntar?

Siha olhou para o Buddha e disse:
- Senhor Que o Mundo Venera! Mestres de outras religiões disseram-me que o asceta Gautama prega a inação, dizendo que o homem é presa do Destino e é incapaz de agir livre e autodeterminadamente. Ou dizem que o Senhor é um aniquilacionista, que ensina que nada permanece após a morte; ou que o Senhor ensina a ter ódio do mundo - essas afirmativas são verdadeiras? Ou são meras calúnias?

O Buddha respondeu gentilmente:
- General Siha, eu não sei com que sentido esses mestres proferiram estas palavras a meu respeito. Se elas forem compreendidas da maneira que explico, então concordarei com elas: eu ensino a evitar o mal na ação, palavras e pensamentos. Neste sentido, de fato advogo a "inação". Além disso, ensino que as más ações podem ser aniquiladas destruindo-se as raízes da ânsia, da raiva e da ignorância no coração das pessoas. Neste sentido, talvez possa ser chamado de "aniquilacionista". E, finalmente, de fato abomino todas as ações más, e neste sentido pode-se dizer que ensino a "odiar" o mundo...

General Siha ficou surpreso com a positividade da resposta dada pelo Buddha. Sem uma só palavra de crítica para com os outros mestres, Ele conseguiu usar as palavras mal-intencionadas dos outros para demonstrar a Sua própria doutrina.
- Este homem é extraordinário!, pensou Siha, enquanto se preparava para colocar outra pergunta.
- Senhor Que o Mundo Venera! Alguns mestres de outras religiões dizem que és um asceta extremado, que ensina a mortificação do corpo; outros dizem que és um quietista, ensinando o quietismo como consolação. Estas afirmações são corretas?
- General Siha, eu sou aquele que incessantemente pratico a fim de cortar as raízes do mal, em pensamentos, palavras e atos. Neste sentido, sou um asceta. E eu advogo tal prática ininterrupta, de maneira que as pessoas possam ser direcionadas para o reino da perfeita paz - e neste sentido, eu ensino a "consolação".

Enquanto ouvia o Buddha respondendo tão calma e razoavelmente, um sentimento de profunda fé surgiu em Siha: "o asceta Gautama é verdadeiramente aquele que percebeu a verdade. Ele seguramente é um Buddha que, pelo poder da Sabedoria e Compaixão, transforma tudo o que é impuro em puro, e todo mau Karma em bom". Cheio de alegria, ele fez uma reverência e disse ao Buddha, com toda a sinceridade:
- Senhor Que o Mundo Venera! O Senhor mostrou a verdadeira Lei para mim, um seguidor de outro caminho. É como se levantasse uma árvore caída, ou se houvesse mostrado o caminho para aquele que está perdido. Tu és um supremo sábio, um Buddha. Por favor, permita que me torne seu seguidor, e tomar Refúgio no Buddha, no Dharma e na Sangha.

Contudo, para sua grande surpresa, o Buddha não aceitou o pedido:
- General Siha, o senhor é um eminente líder na terra dos Vajjias, bem quisto e bem conhecido, e conceituado patrono da fé jainista. Seria melhor que o senhor reconsiderasse bem a questão, antes de tornar-se um seguidor meu.

Siha não podia acreditar no que estava ouvindo. Quando ele tornou-se adepto do Jainismo, os monges jainistas saíram pelas ruas com bandeiras, que anunciavam orgulhosamente a conversão de um homem tão influente e nobre... Ainda assim, o Buddha pedia para que ele refletisse cuidadosamente antes de tornar-se um budista. Siha estava profundamente comovido: "o Buddha não tem o mínimo interesse de se aproveitar de minha pessoa influente para o benefício de Sua Ordem religiosa; Ele pensa somente na propagação da Lei".

De novo Siha fez uma reverência refez seu pedido:
- Suas palavras serviram somente para confirmar minha fé, oh Bem-Aventurado! Eu desejo tomar Refúgio nas Três Jóias. Não desviarei desta resolução até o fim de minha vida. Por favor, aceite-me como seu discípulo leigo.

Mas o Buddha ainda não assentiu:
- General Siha, por muitos anos o senhor deu generoso suporte aos monges jainistas. O senhor não deve parar de dar para eles suas oferendas (3). O senhor tem grande crédito entre os do povo, e antes de pensar em ingressar num novo caminho, deve considerar cuidadosamente que efeitos seus atos terão sobre aqueles que dependem do senhor.

General Siha sentiu seu coração esquentar. Os monges jainistas sempre falaram mal do Buddha, dizendo que Ele ensinava que somente aqueles que faziam oferendas à comunidade budista é que ganhariam mérito. De fato, o Buddha, longe de trabalhar somente pelo benefício de Sua própria Ordem, disse que Siha deveria continuar a dar suporte aos monges jainistas, mesmo se convertido ao Budismo. O que mais poderia exemplificar melhor o espírito de caridade, de religião verdadeira e virtude?

Siha não tinha mais qualquer dúvida ou hesitação. Pela terceira vez prestou humilde reverência ao Buddha e falou:
- Ouvindo o Bem-Aventurado, minha fé está mais firme, como uma rocha. Pela terceira vez, eu tomo Refúgio nas Três Jóias e prometo continuar a fazer oferendas aos diversos monges, enquanto viver. Por favor, Senhor, aceite-me como discípulo leigo.


ABSOLUTA FÉ NOS ENSINAMENTOS DO MESTRE

Tendo sido aceito como discípulo, General Siha logo pediu para que pudesse fazer oferenda de alimentos para a Sangha budista, e o Buddha concordou. Cedo na manhã seguinte, General Siha e seus atendentes receberam reverentemente a Shakyamuni e seus monges, que foram levados a um salão, onde os lugares e as refeições já estavam prontas esperando. Quando o Buddha e os monges terminaram a refeição, Siha chamou todos os membros da casa e pediu que o Buddha falasse algo sobre os méritos de se fazer oferendas. Shakyamuni respondeu:
- Aquele que dá generosamente para aqueles em necessidade obtêm os seguintes benefícios: 1- é amado por todos, 2- tem sempre amigos, 3- é respeitado por todos, 4- não sente vergonha ou medo perante seus semelhantes. Além destas quatro coisas, General Siha, existe ainda um benefício futuro que é renascer nos planos divinos de beatitude, devido à generosidade nesta vida.

General Siha ouvia atentamente às palavras do Buddha, e disse:
- Bem-Aventurado, eu conhecia os quatro benefícios ligados à prática de se fazer oferendas, mas desconhecia o benefício futuro. Mas o Senhor nos disse que aquele que dá generosamente renasce nos planos de beatitude. De hoje em diante, com completa fé, praticarei como instruis.

O Buddha Shakyamuni então ensinou a Siha as Quatro Nobres Verdades e o Nobre Caminho Óctuplo, e retornou com seus monges para o mosteiro de Telhados Altos. Siha e seus atendentes, tendo encontrado tão nobre doutrina pela primeira vez, estavam muito felizes. Então Yasomati, sua filha, com os olhos brilhando de felicidade, fez um pedido ao general:
- Pai, eu também gostaria de realizar um ato meritório. Não há alguma maneira de fazê-lo?

Siha sabia que Yasomati era uma jovem talentosa e virtuosa, e assim ele convidou o Buddha e aos monges para tomarem o desjejum da manhã seguinte, desta vez o convite em nome de Yasomati. Após ouvir o Buddha pregar, Yasomati fez votos de trabalhar para a iluminação e assim lançou a fundação de um futuro feliz, pela prática regular da doação generosa.

Além disto, a sobrinha de Siha, chamada Sihah, ao ouvir aos sermões do Buddha, foi prontamente tocada, que acabou por pedir a permissão de seu tio para entrar na Ordem como monja. O general concordou e o Buddha a admitiu na Ordem. De acordo com o Therigatha (Hinos das Irmãs), a Irmã Sihah devotou-se arduamente à prática meditativa por sete anos, mas não logrou a iluminação, porque ainda carregava muitas paixões. Desapontada, ela foi só para a floresta, passou uma corda por um galho de árvore, e estava prestes a se enforcar, quando, neste exato momento, suas ilusões remanescentes caíram por terra e ela atingiu a iluminação. Ela viveu até idade avançada e foi reverenciada como uma monja realizada.

Assim aconteceu, que o General Siha, seus familiares e atendentes, de fervorosos jainistas, tornaram-se devotos budistas, através do encontro com o Buddha. Após sua conversão, Siha continuou a realizar trabalhos de caridade, vivendo feliz, e sendo respeitado e considerado em alta estima pelo povo Licchavi.


Zenno Ishigami, Revista Dharma World, Fevereiro de 1983, páginas 23 a 27.

(1) A Índia antiga não era um país, mas reinos diversos, alguns coligados, outros não. E o que impressiona nos sutras é a descrição de reinos prósperos, em contraste flagrante com a Índia pobre de hoje.
(2) Sempre houveram adeptos do Jainismo nesta área; de fato, o fundador desta religião, Nigantha Nataputta, foi um conselheiro da casa real de Vajjia.
(3) Faz parte da religiosidade indiana que os monges, ascetas e homens santos de suas as religiões sejam assistidos em suas necessidades diárias, sendo uma delas a alimentação. Nos tempos de Buddha, haviam diversas correntes religiosas antagônicas, que procuravam por prosélitos, assim como hoje fazem as religiões cristãs; e fazer oferendas de comida era uma conseqüência natural de se adotar uma determinada religião. Era um costume já arraigado; daí a questão ser relevante para Siha.